Migrânea com aura: lamotrigina pode ser uma alternativa eficaz na profilaxia?

A migrânea, ou enxaqueca, é um tipo de cefaleia incapacitante relativamente comum e, além de sintomas como náuseas, vômitos e foto e fonofobia, pode ser precedida ou associada à aura, como são chamados os sintomas neurológicos focais e transitórios, reversíveis. A fisiopatologia da aura da enxaqueca tem sido associada à depressão alastrante cortical (DSC), porém sua relação direta com a migrânea ainda não é compreendida.

Conforme os pesquisadores entendem melhor a fisiopatologia da enxaqueca, novas terapias são estudadas para a doença, porém no caso daquelas com aura ainda há uma limitação de estudos buscando prevenir e/ou reduzir a frequência ou duração desses sintomas focais.

Pensando nisso, um estudo publicado, na última semana, no BMJ Neurology Open, buscou avaliar a eficácia da lamotrigina em comparação com o topiramato, medicamento de primeira linha para profilaxia da migrânea, nos casos de enxaqueca com aura.

A lamotrigina, assim como o topiramato, é uma droga antiepiléptica bloqueadora dos canais de sódio, que induz a inibição indireta da liberação de glutamato neuronal, bloqueando assim a propagação do DSC em todo o córtex cerebral.

Lamotrigina para migrânea com aura

O estudo retrospectivo avaliou registros clínicos de 1.152 pacientes de uma clínica de cefaleia de janeiro de 2014 a fevereiro de 2019. Os critérios de inclusão para inscrição foram:

  • Um diagnóstico de enxaqueca com aura ou aura sem enxaqueca de acordo com os últimos critérios diagnósticos da Headache International Society;
  • Dois anos ≥ 18 anos;
  • Início da enxaqueca antes dos 50 anos;
  • Presença de ataques de enxaqueca por pelo menos um ano antes de entrar no estudo;
  • Pelo menos dois ataques de enxaqueca com aura ou aura sem enxaqueca por mês nos três meses anteriores.

Os critérios de exclusão foram:

  • Qualquer outra cefaleia que não seja de migrânea;
  • Cefaleia crônica definida como mais de 15 dias de cefaleia por mês;
  • Coexistência de cefaleia por uso excessivo de medicamentos;
  • Qualquer outra condição médica comórbida grave (por exemplo, doença cardíaca, hepática, renal e psiquiátrica);
  • Outros tratamentos preventivos para enxaqueca nos últimos três meses antes de entrar no estudo; falha anterior de mais de dois agentes profiláticos.

Um total de 53 pacientes foram recrutados para alocação em tratamento ou com topiramato (n = 25) ou com lamotrigina (n = 28). A escolha dos grupos foi baseada no julgamento clínico do neurologista, levando em consideração a clínica do paciente, contraindicações aos medicamentos, tratamentos preventivos ineficazes anteriores e também as preferências do paciente.

Os tratamentos foram iniciados gradualmente, para diminuir os efeitos colaterais, e os pacientes foram acompanhados por, pelo menos, seis meses após o início. A dosagem variou de 25 mg a 100 mg duas vezes ao dia para ambos os medicamentos, de acordo com a avaliação de cada paciente.

Resultados

  • Os grupos eram pareados por sexo, mas não por idade, uma vez que os pacientes tratados com lamotrigina eram mais jovens do que aqueles tratados com topiramato (idade média de 37 e 46 anos, respectivamente);
  • Setenta e um por cento dos pacientes tratados com lamotrigina (20/28) já haviam sido tratados anteriormente com outro agente profilático para enxaqueca, enquanto no grupo do topiramato apenas 48% (12/25) tinham feito uso de outras terapias profiláticas, embora essa diferença não fosse estatisticamente significativa;
  • Dois pacientes do grupo da lamotrigina e um paciente do topiramato interromperam o tratamento após alguns dias devido a efeitos colaterais graves e, portanto, foram excluídos da análise de resultados;
  • Tanto a lamotrigina quanto o topiramato foram altamente eficazes na redução da frequência mensal da migrânea de pelo menos 50% no final do acompanhamento, e nenhuma diferença substancial entre os dois grupos de tratamento foi relatada.;
  • Em relação a frequência e duração da aura, as respostas foram melhores no grupo da lamotrigina em comparação com o grupo do topiramato (88% vs 79% e 73% vs 54%, respectivamente), embora a diferença não tenha significância estatística;
  • Sobre as taxas de resposta ideais, que seriam o paciente relatar o desaparecimento completo das crises de enxaqueca e da aura: as taxas tenderam a ser maiores nos pacientes em uso da lamotrigina em comparação aos pacientes tratados com topiramato (27% vs 13% e 50% vs 37%, respectivamente);
  • A lamotrigina mostrou reduzir a duração da aura por episódio de 15 min, enquanto o topiramato não mostrou eficácia relevante na redução deste parâmetro (p = 0,062);
  • Os efeitos colaterais foram significativamente mais frequentes nos pacientes em uso do topiramato em comparação com aqueles do grupo da lamotrigina (p = 0,004).

Os efeitos colaterais mais frequentes do topiramato foram: parestesia transitória, perda de peso, tonturas, sonolência e sintomas cognitivos, como dificuldades de concentração/atenção, pensamento lento e alterações de humor. Já os da lamotrigina foram: fadiga, ansiedade, sonolência e náusea.

Conclusões

O estudo demonstrou que o topiramato não foi eficaz em reduzir a frequência e duração da aura no acompanhamento de seis meses, apesar de ser comprovadamente eficaz na prevenção da migrânea. Já a lamotrigina mostrou uma redução da frequência e duração da aura, além de mais de três quartos dos pacientes com resposta à aura também relatarem uma redução da frequência de crises de enxaqueca durante o período de tratamento, sugerindo uma eficácia potencial do medicamento na profilaxia.

As diretrizes atuais não indicam a lamotrigina, por não ter se mostrado eficaz em ensaios clínicos. O estudo em questão mostrou que, principalmente naqueles que possuem efeitos colaterais fortes ao topiramato, a lamotrigina poderia ser uma opção de segunda linha, porém, por não alcançar relevância estatística, novas pesquisas devem ser feitas a partir desses resultados.

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/migranea-com-aura-lamotrigina-pode-ser-uma-alternativa-eficaz-na-profilaxia/

Autor: Redação PEBMED

Referências bibliográficas:

  • Smeralda CL, Gigli GL, Janes F, et al. May lamotrigine be an alternative to topiramate in the prevention of migraine with aura? Results of a retrospective study. BMJ Neurology Open 2020;2:e000059. August 24, 2020. doi: 10.1136/bmjno-2020-000059. Available at <https://neurologyopen.bmj.com/content/2/2/e000059>

Importância do parto normal frente à cesárea

O desenvolvimento da microbiota do indivíduo é iniciada ainda no útero materno, entretanto, foi demonstrado que fatores relacionados ao ambiente de trabalho de parto e nascimento influenciam o processo inicial, no recém-nascido, de colonização por bactérias não patogênicas. Estudos mostram que existem diferenças distintas no perfil da microbiota daqueles nascidos de parto normal em comparação com os nascidos de cesárea.1

O intestino humano é o habitat de um ecossistema microbiano diverso e dinâmico. A microbiota humana desempenha um papel crítico nas funções que sustentam a saúde e é um ativo positivo nas defesas do organismo, com atuação direta na construção do sistema imunológico. O estabelecimento da microbiota intestinal humana durante a infância pode ser influenciado por vários fatores, incluindo o modo de parto.5

Evidências científicas sugerem, portanto, que o tipo de parto está envolvido no desenvolvimento da microbiota neonatal e pode explicar parcialmente os resultados de saúde pediátricos associados ao nascimento por cesárea. Especificamente, a microbiota intestinal de bebês nascidos de parto normal se assemelha mais à microbiota vaginal de suas mães e, dessa forma, consiste mais comumente em um perfil de colonização bacteriana potencialmente benéfica.4

Estudos e ensaios também apontam que a colonização direta do intestino da criança começa após a ruptura da membrana placentária, durante o trabalho de parto. Por exemplo, a microbiota intestinal de crianças nascidas de parto vaginal exibe enriquecimento em Bifidobactérias, Bacteroides, espécies de Escherichia e Parabacteroides, em comparação com a microbiota intestinal de bebês nascidos por parto cesariano, o qual é rico em microrganismos associados à pele, à boca e ao ambiente circundante. Há autores que propõem que um suposto desequilíbrio no padrão normal de colonização associado ao tipo de parto pode ser um fator influenciador à suscetibilidade futura dessas crianças para doenças crônicas como alergias, diabetes, doenças autoimunes e síndrome metabólica.2,3

Considerando que a primeira grande colonização microbiana ocorre no nascimento, é fundamental que os profissionais de saúde de trabalho de parto estejam atentos aos fatores que podem alterar a composição da microbiota durante este processo. As implicações de várias atividades e fatores exclusivos para o ambiente de trabalho de parto e nascimento podem influenciar a microbiota de mulheres e recém-nascidos, entre estes fatores, temos como exemplos:1 

  • A rota de nascimento; 
  • O uso de antibióticos; 
  • Os procedimentos de enfermagem.


A diversidade e o padrão de colonização da microbiota intestinal estão significativamente associados ao tipo de parto durante os primeiros três meses de vida do recém-nascido. A microbiota intestinal saudável é considerada promotora do desenvolvimento e maturação do sistema imunológico, enquanto o intestino anormal é considerado a principal causa de infecções gastrointestinais graves durante a infância. Contudo, é preciso que se estabeleça ainda, em novos estudos e ensaios clínicos, quais são os impactos do modo de parto na saúde dos bebês em cada fase da vida, para além dos primeiros 90 dias de vida.5

Referências

1 – Alexis B Dunn, Sheila Jordan, Brenda J Baker, Nicole S Carlson. The Maternal Infant Microbiome: Considerations for Labor and Birth. The American Journal of Matern Child Nursing. Nov/Dec 2017; 42 (6): 318-325.

2 – Indrio F, Martini S, Francavilla R, Corvaglia L, Cristofori F, Mastrolia SA, et al. Epigenetic matters: the link between early nutrition, microbiome, and long-term health development. Front Pediatr. 2017; 5: 178.

3 – Laforest-Lapointe I, Arrieta MC. Patterns of Early-Life Gut Microbial Colonization during Human Immune Development: An Ecological Perspective. Front Immunol. 2017; 8: 788.

4 – Diana Montoya-Williams, Dominick J Lemas, Lisa Spiryda, Keval Patel, O’neshia Olivia Carney, Josef Neu, Tiffany L Carson. The Neonatal Microbiome and Its Partial Role in Mediating the Association between Birth by Cesarean Section and Adverse Pediatric Outcomes. Neonatology. 2018; 114 (2): 103-111.

5 – Erigene Rutayisire, Kun Huang, Yehao Liu, Fangbiao Tao. The mode of delivery affects the diversity and colonization pattern of the gut microbiota during the first year of infants’ life: a systematic review. BMC Gastroenterology. 2016 Jul 30; 16 (1): 86.

Medidas preventivas para o trabalho presencial do profissionais da saúde e o tratamento de pacientes com o uso de imunossupressores.

Medidas preventivas básicas para o trabalho presencial de profissionais de saúde e o tratamento de pacientes com o uso de imunossupressores.

O retorno ao trabalho presencial demanda especial diligência quanto às ações diferenciadas para o distanciamento social e para o uso de dispositivos de prevenção a infecções. O Ministério da Saúde, desde o início da pandemia do SARS-CoV-2, indicou que tais medidas fossem estabelecidas por estados e municípios, a partir de seus distintos cenários. Além do distanciamento, a OMS (Organização Mundial da Saúde) também preconiza como ação de caráter preventivo o uso adequado de máscaras em distintas atividades diárias, entre elas, procedimentos médicos como consultas e exames clínicos.1,2,3

Gastroenterologistas, endoscopistas e profissionais relacionados às atividades dos mesmos devem permanecer vigilantes e revisar periodicamente os equipamentos de proteção pessoal, especialmente durante procedimentos endoscópicos. Nesse sentido, o uso de máscaras e protetores faciais é elementar nos cuidados ao paciente no contexto da pandemia pelo SARS-CoV-2, assim como a atenção na remoção apropriada de tais dispositivos.3

Antecedendo consultas e procedimentos de exames clínicos, é recomendado que, preventivamente, seja seguido um protocolo de perguntas sobre viagens, contatos com infectados e sintomas respiratórios recentes que indiquem infecção pelo vírus. Casos suspeitos, evidentemente, devem ser encaminhados para as clínicas de saúde voltadas ao tratamento do SARS-CoV-2. 3

A máscara, especificamente, é um item pessoal, que não pode ser compartilhado por parceiros. Trata-se de um objeto de proteção fundamental e de caráter preventivo contra a disseminação do vírus, e que precisa de cuidados específicos no seu manuseio e na sua higienização.3

O uso de imunossupressores e implicações da dieta na microbiota intestinal 

A flexibilização da quarentena traz um novo quadro de risco para pacientes que fazem uso de imunossupressores, uma vez que as taxas de isolamento social são menores. Dessa forma, a rigidez na conduta do tratamento médico, na adoção de hábitos alimentares saudáveis e a disciplina no seguimento de medidas sanitárias de prevenção atuam como fatores preponderantes no sucesso de uma resposta imunológica positiva.1,2,3 

O uso de imunoterápicos, como inibidores de ponto de controle imunológico (ICIs), revolucionaram o cenário terapêutico no que se refere ao tratamento de várias doenças graves. A saúde da microbiota intestinal está fortemente ligada às respostas terapêuticas a esses medicamentos.4 

No cenário da pandemia pelo SARS-Cov-2, pacientes com hepatite autoimune, transplante hepático ou outras condições que requerem a utilização de imunossupressores não devem interromper seu tratamento, uma vez que o risco de progressão da doença ou complicações superam os riscos de contrair o vírus.3   

Ensaios clínicos avaliam o impacto de diversos fatores em pacientes em tratamento com imunoterápicos. Transferência da microbiota fecal, probióticos, prebióticos, consórcios de bactérias e uma gama de intervenções dietéticas são alguns destes fatores.4  

A utilização de antibióticos deve ser rigidamente gerenciada conforme o avanço do tratamento com imunoterápicos. Inibidores da bomba de prótons, por exemplo, devem ser descontinuados quando não forem claramente indicados e, também, pacientes devem ser aconselhados a minimizar o consumo de carne animal e aumentar a ingestão de vegetais, com foco na variedade. Uma alta ingestão de fibras (> 30 g/dia) mostrou ser benéfica para aumentar a chance de resposta aos imunoterápicos.4  

Alimentos fermentados podem ter um efeito benéfico sobre a microbiota intestinal e devem ser introduzidos sempre que possível. O ideal é que todos os pacientes que façam uso de imunoterápicos sejam encaminhados, antes do início do tratamento, a um profissional da saúde com conhecimento sobre microbiota intestinal.4  

A microbiota intestinal tem papel essencial na resposta imunológica do corpo a infecções e em manter a saúde de maneira geral. Sendo assim, uma dieta balanceada que seja rica em fibras, em vegetais e em outros alimentos probióticos é essencial para a promoção da saúde e para a composição do tratamento de doenças graves.4

Referências

1 – Ministério da Saúde. Diretrizes para Distanciamento Social. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/ministerio-da-saude-apresenta-diretrizes-para-auxiliar-na-decisao-sobre-distanciamento-social. Acesso em: 25 out. 2020.

2 – Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo. Últimas Notícias. Coronavírus. Disponível em: https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas-noticias/coronavirus-entenda-a-importancia-de-evitar-aglomeracoes/. Acesso em: 25 out. 2020.

3 – Federação Brasileira de Gastroenterologia. Gastroenterologistas e Covid-19. Disponível em: http://fbg.org.br/Publicacoes/noticia/detalhe/1347/. Acesso em: 25 out. 2020.

4 – Karla A. Lee, Heather M. Shaw, Veronique Bataille, Paul Nathan, Tim D. Spector. Role of the gut microbiome for cancer patients receiving immunotherapy: Dietary and treatment implications. European Journal of Cancer. Oct 2020. 149-155.

Doenças reumáticas autoimunes são mais comuns em mulheres miastênicas

Estudo revela que pacientes com Miastenia Gravis têm 6 vezes mais chances de desenvolver doenças autoimunes reumatológicas.

Aproximadamente 5% da população mundial é afetada por uma ou mais doenças autoimunes, sendo que a prevalência é mais alta em mulheres do que nos homens. Pacientes com um distúrbio autoimune têm maior risco de desenvolver um segundo transtorno, como é o caso da Miastenia Gravis (MG).

A MG é uma doença autoimune neuromuscular que afeta a junção muscular, causando fraqueza em diversos grupos musculares do corpo e dificultando – ou até impedindo – que a pessoa execute movimentos de forma voluntária. “Ela está diretamente associada a doenças reumáticas autoimunes incidentes, com risco maior de Artrite Reumatoide (AR), Síndrome de Sjogren primária (SSp) e Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES), entre outras comorbidades”, reforça o Dr. Eduardo Estephan, médico neurologista e diretor científico da Abrami (Associação Brasileira de Miastenia).

O estudo denominado Thymectomy in patients with myasthenia gravis increases the risk of autoimmune rheumatic diseases: a nationwide cohort study”, traduzido para o português como “A timectomia em pacientes com Miastenia Gravis aumenta o risco de doenças reumáticas autoimunes: um estudo de corte nacional” e publicado em janeiro de 2019 na Revista Rheumatology, da Oxford Academy, apontou que o risco de doenças reumáticas foi 6,34 vezes maior em pacientes com Miastenia Gravis se comparados a outros sem a comorbidade.

A pesquisa foi feita a partir da identificação de pessoas com Miastenia Gravis na base de dados “Registro de Doenças Catastróficas” de médicos de Taiwan, que foi comparada com todos os dados da população geral do National Health Insurance Research Database e segmentada por sexo, idade e data de índice. A amostra reuniu 6.478 pacientes com Miastenia Gravis (58,3% mulheres com idade entre 50 e 55 anos) e 25.912 sem Miastenia Gravis (58,3% mulheres com idade entre 50 e 52 anos). 

Os resultados mostraram que as mulheres miastênicas apresentaram risco significativamente maior de desenvolver Síndrome Sjogren primária (15,84%), Lúpus Eritematoso Sistêmico – LES (11,32%) e outros tipos de doenças reumáticas autoimunes (4,07%). Além disso, pacientes com Miastenia Gravis submetidos à timectomia (cirurgia para retirada do timo) apresentaram riscos ainda maior para essas doenças. 

Muito comum em miastênicos, a timectomia é uma cirurgia para a remoção do timo, glândula localizada entre os pulmões e à frente do coração. Se ele não funciona bem, aumenta o risco de infecções e de doenças autoimunes, como a MG. 

Cerca de 10% dos miastênicos têm tumor de timo (timoma) e esses pacientes produzem anticorpos para combater o tumor, que acabam também reconhecendo o receptor de acetilcolina erroneamente como um “invasor”. A cirurgia de timo, entretanto, também pode ser indicada para pacientes sem tumor. Segundo o especialista, “a cirurgia só é indicada para pacientes com diagnóstico positivo para os anticorpos, que têm a doença há poucos anos e com idade não muito avançada”.

Doenças Reumatológicas Autoimunes

Artrite Reumatoide (AR)

 Doença inflamatória crônica, autoimune, que afeta as membranas sinoviais (fina camada de tecido conjuntivo) das articulações – mãos, punhos, cotovelos, joelhos, tornozelos, pés, ombros e coluna cervical. Em pacientes geneticamente predispostos, pode afetar também os órgãos internos, como pulmões, coração e rins.  Sintomas como rigidez matinal (regredindo durante o dia) e inchaço nas juntas são comuns, sendo que progressão da doença está associada a deformidades e alterações das articulações, que podem comprometer os movimentos.

Mulheres entre 50 e 70 anos têm duas vezes mais chances de desenvolver a AR do que os homens da mesma faixa etária, embora possa se manifestar em qualquer idade e em ambos os sexos.

Síndrome de Sjogren primária (SSp)

Doença reumática autoimune caracterizada pela secura excessiva dos olhos, boca e outras membranas e mucosas. Considerada a mais frequente entre as doenças raras, a SSp afeta 2% da população mundial e tem duas formas de apresentação: a primária, que ocorre de forma isolada e sem nenhuma relação com outras inferminades do tecido conjuntivo, e a secundária, quando outras doenças reumatológicas se manifestam simultaneamente, como artrite reumatoide, lupus eritematoso sistêmico, vasculite e tireoidite de Hashimoto.

Entre os principais sintomas estão pele seca, dor nas articulações, secura vaginal, alergias, alterações no intestino, rim e pulmões, dormência ou formigamento nas mãos e pés e fadiga extrema.

Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES)

O lúpus é uma doença inflamatória autoimune desencadeada por um desequilíbrio no sistema imunológico, que pode se manifestar sob a forma cutânea (atinge apenas a pele) ou ser generalizado.

Fatores genéticos e ambientais estão envolvidos no aparecimento das crises de lúpus. Entre as causas externas estão exposição ao sol, uso de determinados medicamentos e ação de alguns vírus e bactérias. O estrógeno (hormônio sexual feminino) também está entre os fatores, o que pode justificar a prevalência maior nas mulheres em idade fértil.

 “Ainda não há estudos conclusivos para traduzir as opções terapêuticas clínicas para as doenças reumáticas associadas à Miastenia Gravis. A recomendação é procurar um neurologista, preferencialmente especializado em Miastenia que, com base na história de cada paciente e nos resultados de exames neurológicos e laboratoriais, poderá definir o tratamento mais adequado, além de identificar fatores determinantes à evolução da doença ao longo da vida”, finaliza o médico.

Informações para a imprensa 

VV4 PR – Comunicação e Estratégia

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Enxaqueca: qual o futuro da terapia e prevenção?

enxaqueca é um tipo de cefaleia primária que afeta principalmente mulheres (3:1) e anualmente custa bilhões de dólares para a economia mundial, estando listada entre as principais causas de incapacidade entre os trabalhadores.

O tratamento desse tipo de dor de cabeça é divido em drogas abortivas (para crises) como os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), agonistas da serotonina (triptanos), derivados do ergosterol (ergotaminas, de uso controverso) e drogas profiláticas (diminuição do número de crises) como betabloqueadores, bloqueadores do canal de cálcio, anticonvulsivantes e antidepressivos tricíclicos.

Há pouco mais de um mês, em setembro desse ano, tive o privilégio de participar do Congresso Internacional de Cefaléia (IHC), em Dublin. A chamada do evento era “Dawn of new headache treatments”, fazendo uma referência clara às novas drogas em estudo, para o tratamento das enxaquecas. Levando em consideração que o congresso acontece a cada dois anos e essas drogas começaram a surgir em 2018, o assunto realmente dominou as discussões.

Quais fármacos poderão agir na enxaqueca?

Os novos fármacos em voga agem sobre o calcitonin gene related peptide (CGRP).

O CGRP é uma molécula liberada no gânglio trigeminal e ocupa receptores na musculatura lisa da artéria dural, no próprio gânglio trigeminal, no tálamo, hipotálamo, amígdala, córtex e tronco cerebral, estando envolvida com estímulos nociceptivos e consequentemente com a vasodilatação enxaquecosa.

Apesar de os mecanismos exatos ainda serem desconhecidos, acredita-se que o extravasamento de plasma na dura-mater (região irrigada fora da barreira hemato-encefálica) seguido pela liberação de neurpeptídeos, como o CGRP e a substância P, extremamente envolvida com a transmissão da dor, sejam os responsáveis pela vasodilatação intacraniana e a resposta inflamatória que culmina na crise migranosa.

Portanto as novas terapias consistem em inibir o CGRP (anti-CGRP) ou bloquear o seu receptor (anti-CGRP receptor), inibindo assim, os impulsos durais dolorosos.

Leia também: Veja orientações da nova diretriz para tratamento da enxaqueca

“A ativação experimental de células do gânglio do trigêmeo acarreta na liberação de CGRP, inibido por agonistas serotoninérgicos de maneira dose-dependente, mostrando que o gânglio trigeminal pode ser um alvo ao antagonista de receptor de CGRP”. (Goadsby et. al., 2017).

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/enxaqueca-qual-o-futuro-da-terapia-e-prevencao/

Autor: Eduardo Nogueira

Residente de Clínica Médica no Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência de Santos • Membro da Sociedade Brasileira de Cefaleia • Membro da International Headache Society

Referências bibliográficas:

  • Scuteri D, Adornetto A, Rombolà L, Naturale MD, Morronr LA, Bagetta G, Tonin P, Corasaniti MT. New Trends in Migraine Pharmacology: Targeting Calcionin Gene-Related Peptide (CGRP) With Monoclonal Antibodies. frontiers in Pharmacology. Front Pharmacol. 2019; 10: 363. doi: 10.3389/phar.2019.00363.
  • Ashima M, Hansen JM, Do TP, Melo-Carrillo A, Burstein R, Maskowitz MA. Migraine and the trigeminovascular system – 40 years and counting. Lancet Neurol. 2019 Aug;18(8) 795-804. doi: 10.1016/S1474-4422(19)30185-1.
  • Goadsby PJ, Holland PR, Martins-Oliveira M, Hoffmann J, Schankin C, Akerman S. Pathophysiology of Migraine: A Disorder of Sensory Processing. Physiological Reviews. Physiol Rev. 2017 Apr; 97(2): 553-622. doi: 10.1152/physrev.00034.2015.

10 tópicos que os gastroenterologistas deveriam saber antes de indicar a cirurgia antirrefluxo

A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), caracterizada por pirose e regurgitação, é considerada uma das patologias digestivas de maior prevalência nos países ocidentais, acometendo cerca de 10-20% da população. Embora a primeira linha de tratamento consista no uso de inibidores de bomba de prótons (IBP), alguns pacientes podem se beneficiar da cirurgia antirrefluxo. Recentemente, Park e colaboradores elencaram 10 tópicos que todos os gastroenterologistas deveriam saber antes de considerar o procedimento cirúrgico:

1) A patogênese da DRGE envolve uma relação dinâmica entre o esfíncter esofagiano inferior e alterações de pressão que promovem o refluxo.

O refluxo acontece quando a pressão intragástrica supera aquela do esfíncter esofagiano inferior. Três mecanismos principais favorecem a gênese do refluxo: o relaxamento transitório do esfíncter esofagiano inferior, a presença de hérnia de hiato ou um esfíncter esofagiano inferior hipotônico.

2) A cirurgia antirrefluxo visa a aumentar a pressão basal do esfíncter esofagiano inferior, além de reduzir a frequência e magnitude do relaxamento transitório, minimizando, assim, o refluxo.

A fundoplicatura é a principal forma laparoscópica de cirurgia antirrefluxo, sendo descritas diversas técnicas (Ex: Nissen, Toupet, Dor, etc).

3) Os guidelines disponíveis para indicação de cirurgia antirrefluxo são limitados.

As principais diretrizes recomendam a realização de cirurgia para: (a) pacientes que desejam descontinuar o tratamento clínico; (b) pacientes sem aderência ao tratamento clínico; (c) pacientes que falharam ao tratamento clínico (sintomas persistentes, estenose péptica, esofagite refratária a terapia medicamentosa). No entanto, deve-se considerar no processo decisório que até 62% dos pacientes necessitam retomar o uso de IBP após 9 anos de cirurgia e que os pacientes que respondem melhor a cirurgia são aqueles que também respondem ao tratamento com IBP.

4) Uma avaliação pré-operatória ampla é fundamental para selecionar os pacientes mais adequados para cirurgia antirrefluxo, otimizando os resultados e reduzindo o risco de complicações.

Uma avaliação pré-operatória adequada vai alterar o diagnóstico ou modificar o plano cirúrgico em até 30% dos pacientes. A avaliação pré-operatória deve incluir a realização de endoscopia digestiva alta e manometria esofagiana para todos os pacientes. A pHmetria deve ser realizada nos pacientes sem evidência de esofagite erosiva, enquanto o esofagograma pode ser solicitado na suspeita de hérnia hiatal ou alterações anatômicas. 

Pacientes que não respondem a IBP devem ser submetidos a propedêutica para avaliar diagnósticos alternativos, especialmente as doenças funcionais e alterações de motilidade esofagiana.

5) A eficácia no longo prazo da cirurgia antirrefluxo é limitada e muitos pacientes necessitarão retomar o uso de IBP após períodos variados de tempo.

Cerca de 82% dos pacientes necessitarão de IBP após 15 anos de cirurgia. Esse fato deve ser ponderado junto ao paciente, especialmente junto àqueles que desejam suspender o uso de IBP.

6) A cirurgia antirrefluxo não tem impacto significativo na progressão do esôfago de Barrett para adenocarcinoma de esôfago. A ablação endoscópica de esôfago de Barrett com displasia ainda é recomendada.

A presença de esôfago de Barrett isoladamente não deve ser uma indicação para realização de procedimento cirúrgico. Metanálise recente demonstrou que a incidência de adenocarcinoma de esôfago em pacientes tratamentos clínica ou cirurgicamente foi semelhante [4,8 casos por 1000 pacientes-ano (IC95% 1,7–11,1) vs 6,5 casos por 1.000 pacientes-ano (IC95% 2,6–13,8), respectivamente].

7) Bypass gástrico em Y de Roux, laparoscópico, deve ser a cirurgia de primeira escolha em pacientes com obesidade mórbida e DRGE.

A obesidade é associada a um risco 2,5 vezes maior de DRGE. O bypass gástrico em Y de Roux reduz significativamente os sintomas de refluxo, esofagite e incidência de DRGE no pós-operatório.

8) A terapia medicamentosa é mais custo-efetiva em um período de 30 anos que a cirurgia antirrefluxo, desde que o custo da droga seja baixo.

No modelo americano, estima-se que seja vantajoso o uso de terapia medicamentosa se o custo do tratamento for de até 90 dólares mensais.

9) Complicações tardias da cirurgia antirrefluxo são comuns e os gastroenterologistas devem saber reconhecer e manejar.

A cirurgia antirrefluxo cursa com baixa mortalidade em 30 dias (<1%), enquanto a morbidade pós-operatória imediata é estimada em 4,7-17%. Complicações tardias incluem: disfagia de início tardio (3%–24%), pirose recorrente (62%), síndrome de bloating (85%) e diarreia (18%–33%).

10) Novos procedimentos endoscópicos e cirúrgicos antirrefluxo minimamente invasivos estão sendo desenvolvidos e parecem promissores.

São exemplos de novas tecnologias para tratamento de DRGE: LINX (Magnetic Sphincter Augmentation), Stretta (Mederi Therapeutics, Inc, Norwalk) e TIF (fundoplicatura transoral sem incisão).

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/10-topicos-que-os-gastroenterologistas-deveriam-saber-antes-de-indicar-a-cirurgia-antirrefluxo/

Autor: Guilherme Grossi Cançado – Gastroenterologista Mestre em Saúde do Adulto 

Referência bibliográfica:

  • Park S, et al. Ten things every gastroenterologist should know about antireflux surgery. Clin Gastroenterol Hepatol. 2020;18:1923–1929

Infecção por H. pylori e gastrite – como os probióticos podem ser seus aliados

A microbiota intestinal pode ser considerada um “órgão” crucial do corpo humano devido ao seu papel na manutenção do equilíbrio entre saúde e doença, com atuação direta na construção do sistema imunológico. O estômago e sua microbiota, por sua vez, podem ser considerados como dois “órgãos” diferentes que compartilham o mesmo local e se impactam mutuamente. Nesse sentido, os efeitos provenientes dessa relação determinam o estabelecimento da homeostase gástrica. A microbiota gástrica consiste principalmente em dois grupos gerais: bactérias-Hp (H. pylori) e não-Hp.7

O Helicobacter pylori consiste em infecção frequente no mundo inteiro, especialmente no Brasil, onde há quase 70% da população infectada. Todos os pacientes colonizados apresentam gastrite crônica ativa associada a essa bactéria, o que pode gerar, em determinada fração, sintomas dispépticos. O H. pylori ainda pode estar relacionado com outras doenças mais graves como doença ulcerosa gastroduodenal e mesmo câncer e linfoma gástricos.1,2

  1. pylori é conhecido por colonizar a mucosa gástrica, induzir inflamação e alterar a microbiota local, resultando em um espectro de doenças gástricas. Da mesma forma, mudanças na microbiota intestinal foram recentemente associadas a várias doenças metabólicas e inflamatórias, indicando um possível papel das alterações associadas ao H. pylori na microbiota intestinal na ruptura da barreira da mucosa desse aparelho.3

O adenocarcinoma gástrico é uma das principais causas de morte relacionada ao câncer em todo o mundo e a infecção por Helicobacter pylori é o mais forte fator de risco conhecido para essa doença. Embora o estômago já tenha sido considerado um ambiente estéril, agora é conhecido por abrigar muitas espécies de bactérias, levando a uma interação complexa entre H. pylori e outros residentes da microbiota gástrica. O ecossistema da microbiota diversa do estômago é diferente da boca e do esôfago, e também do intestino delgado e do intestino grosso. H. pylori, aparentemente, é o integrante mais importante da microbiota gástrica.4,7

Além do papel dos fatores de virulência do H. pylori, polimorfismos genéticos do hospedeiro e da dieta alimentar, agora está se tornando claro que componentes da microbiota gastrointestinal também podem influenciar a patogênese induzida pelo H. pylori.4

Os probióticos têm sido avaliados no tratamento do H. pylori com o intuito de reduzir efeitos adversos e aumentar índices de erradicação. Uma série de estudos clínicos demonstra que a suplementação com algumas cepas probióticas melhora a tolerabilidade do tratamento com antibióticos, reduzindo vários eventos adversos, incluindo diarreia.5,6,8 

Nesse quadro, o aumento da resistência aos antibióticos e a diminuição da adesão aos regimes terapêuticos levaram à diminuição da efetividade da terapia de erradicação. Os probióticos, com efeitos inibitórios diretos e indiretos sobre o H. pylori em modelos animais e ensaios clínicos, foram recentemente usados ​​como um tratamento complementar na terapia de erradicação do H. pylori.9

Referências

1 – Coelho LGV, Marinho JR, Genta R, Ribeiro LT, Passos MCF, Zaterka S, et al. IVTH Brazilian Consensus Conference on Helicobacter pylori infection. Arq Gastroenterol. 2018; 55(2): 97-121.

2 – Qureshi N, Li P, Gu Q. Probiotic therapy in Helicobacter pylori infection: a potential strategy against a serious pathogen? Appl Microbiol Biotechnol. 2019; 103(4): 1573-88.

3 – Nihar Ranjan Dash, Ghalia Khoder, Aml Mohamed Nada, Mohammad Tahseen Al Bataineh. Exploring the impact of Helicobacter pylori on gut microbiome composition. PLoS One. 2019 Jun 18; 14(6): e0218274.

4 – Lydia E Wroblewski, Richard M Peek Jr. Helicobacter pylori, Cancer, and the Gastric Microbiota. Advances in Experimental Medicine and Biology. 2016; 908: 393-408.

5 – Armuzzi A, Cremonini F, Bartolozzi F, Canducci F, Candelli M, Ojetti V, et al. The effect of oral administration of Lactobacillus GG on antibiotic-associated gastrointestinal side-effects during Helicobacter pylori eradication therapy. Aliment Pharmacol Ther. 2001; 15(2): 163-9.

6 – Cremonini F, Di Caro S, Covino M, Armuzzi A, Gabrielli M, Santarelli L, et al. Effect of different probiotic preparations on anti-helicobacter pylori therapy-related side effects: A parallel group, triple blind, placebo-controlled study. Am J Gastroenterology. 2002; 97(11): 2744-9.

7 – Teresa Alarcón, Laura Llorca, Guillermo Perez-Perez. Impact of the Microbiota and Gastric Disease Development by Helicobacter pylori. Curr Top Microbiol Immunology. 2017; 400: 253-275.

8 – Dolores Sgambato, Agnese Miranda, Lorenzo Romano, Marco Romano. Gut microbiota and gastric disease. Minerva Gastroenterol Dietol. 2017 Dec; 63(4): 345-354.

9 – Xin Yan Zhu, Fei Liu. Probiotics as an adjuvant treatment in Helicobacter pylori eradication therapy. Journal of Digestive Diseases. 2017 Apr; 18(4): 195-202.

Miastênicos têm mais chances de desenvolver outras doenças autoimunes

Estudos indicam que as doenças relacionadas à tireoide são as mais comuns entre os portadores de Miastenia Gravis

A Miastenia Gravis é uma doença autoimune causada por anticorpos que agem contra componentes da comunicação natural entre nervos e músculos – junção neuromuscular – e caracterizada por fraqueza muscular flutuante e fadiga de diferentes grupos musculares do corpo. Por ser uma doença rara e de difícil diagnóstico, a Miastenia Gravis é, geralmente, associada a outras doenças autoimunes, cujos sintomas, muitas vezes, podem se confundir.

“A doença autoimune se dá pelo mau funcionamento do sistema imunológico, onde o organismo produz anticorpos contra ele mesmo e ataca órgãos e tecidos do próprio corpo, como músculos, articulações, pele, células, nervos, pulmões, tireoide. Características clínicas, como fraqueza neuromuscular e sinais oculares causam confusão diagnóstica entre duas patologias”, explica o Dr. Eduardo Estephan, médico neurologista e diretor científico da Abrami (Associação Brasileira de Miastenia). 

Para termos uma ideia, a prevalência de Miastenia Gravis no mundo muda conforme a localização geográfica, sendo que a taxa de incidência anual varia de 0,25 a 20 por 1.000.000 de habitantes. O início da doença ocorre entre os 20-40 anos de idade e as mulheres representam 60% desse grupo. 

A doença da tireoide é a doença autoimune mais comum associada à Miastenia Gravis, com uma prevalência de 5 a 10%, enquanto a Miastenia Gravis está presente em 0,2% dos pacientes com doença autoimune da tireoide diagnosticada. 

Ainda de acordo com o especialista, as doenças autoimunes da tireoide são frequentemente acompanhadas por Miastenia Gravis de início precoce e tardio, sendo que a miastenia coexistindo com doenças autoimunes da tireoide segue um curso mais brando do que a Miastenia Gravis sozinha. 

Publicado na revista científica Brain and Behavior e reproduzido pela US National Library of Medicine, o estudo realizado por cientistas de Taiwan e denominado “Prevalence and impact of autoimmune thyroid disease on myasthenia gravis course”, – traduzido para o português como “Prevalência e Impacto de doenças autoimunes da tireoide no curso da Miastenia Gravis” – reuniu 343 pacientes consecutivos com Miastenia Gravis, entre 4 e 89 anos de idade, e mediu a prevalência de doenças autoimunes em um estudo transversal.  As concentrações de anticorpos antitireoideanos, ou seja, que atacam a tireoide foram medidas em todos os pacientes e os pesquisadores avaliaram o curso clínico da Miastenia Gravis, o tratamento e os seus resultados.  

A pesquisa mostrou que as doenças autoimunes da tireoide foram diagnosticadas em 26,8% dos pacientes com Miastenia Gravis, incluindo 4,4% com Doença de Graves (GD), 9% com tireoidite de Hashimoto (HT) e 13,4% apenas com anticorpos antitireoidianos. Os resultados concluem que a terapia imunossupressora foi necessária com menos frequência nos pacientes com Miastenia Gravis e Doenças Autoimunes da Tireoide, indicando indiretamente um curso mais leve das doenças. 

Esse mesmo estudo mostrou ainda uma maior prevalência de doenças pré-existentes da tireoide e uma maior probabilidade cumulativa dessas doenças após o diagnóstico de Miastenia Gravis do que na população em geral.

Doença de Graves x Tireoidite de Hashimoto

A Doença de Graves (DG) é uma doença da tireoide caracterizada pelo excesso de hormônios dessa glândula no corpo, causando hipertireoidismo. A DG acomete mais mulheres do que homens, principalmente entre os 20 e os 50 anos, apesar de poder surgir em qualquer idade. Em pacientes não miastênicos, a doença pode ser bem controlada com o uso de remédios, terapias com iodo radioativo ou com a cirurgia de tireoide. Entre os sintomas que se confundem com a Miastenia Gravis estão fraqueza muscular e alterações nos olhos, como olhos salientes, coceira, lacrimejo e visão dupla.

A tireoidite de Hashimoto tem como principal característica a inflamação da tireoide causada por um erro do sistema imunológico. Nesse caso, o organismo fabrica anticorpos contra as células da tireoide, provocando a destruição da glândula ou a redução da sua atividade, o que pode levar ao hipotireoidismo por carência na produção dos hormônios T3 e T4.  Cansaço, sonolência e reflexos mais vagarosos são alguns dos sintomas que podem se confundir com os da Miastenia Gravis, embora a maior incidência de doenças autoimunes da tireoide ligadas à Miastenia Gravis seja de Doença de Graves.

É importante ressaltar que a doença aguda e o uso de corticosteroides afetam a função tireoidiana, mas, ao mesmo tempo, os corticosteroides (cortisona) têm efeito positivo devido à sua função imunorregulatória.

“O tratamento de miastênicos com doenças autoimunes da tireoide associadas exige acompanhamento médico constante, de preferência, com um especialista em miastenia para avaliar as melhores combinações medicamentosas e a evolução do curso da doença. Esse acompanhamento permitirá um melhor equilíbrio entre as patologias e, consequentemente, mais qualidade de vida”, finaliza Estephan.

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Fatores que influenciam a formação da microbiota nos primeiros 1000 dias do bebê

A colonização do organismo por bactérias não patogênicas, conhecida como a formação da microbiota, é comprovadamente iniciada ainda no período pré-natal, na fase intraútero. A consolidação ocorre, sobretudo, durante o nascimento e nos meses iniciais de vida da criança. Essa colonização funciona como estímulo antigênico para o adequado desenvolvimento anatômico e funcional do sistema imunológico das mucosas, assim como às respostas adaptativas sistêmicas.1,2

Antes mesmo de realizar sua primeira respiração, o processo de colonização da microbiota intestinal já teve seu início logo após o nascimento do bebê. O processo de estabelecimento da microbiota, ao longo da infância, passa por dois grandes momentos de transição. O primeiro justamente após o nascimento, determinado pelo aleitamento materno exclusivo e o segundo a partir do início do desmame, com a introdução da alimentação sólida e quando a microbiota passa a assumir padrão semelhante ao da vida adulta.1,2

A ação do meio ambiente sobre o processo saúde/doença tem sido progressivamente explorada em estudos recentes e o papel da epigenética vai ao encontro a esta ação. Mecanismos epigenéticos são definidos como os processos que provocam alterações na expressão gênica, que são capazes de ser transmitidos por gerações, mas que não ocasionaram modificações na sequência do DNA. Nesse quadro, a produção de metabólitos oriundos da atividade microbiana, conforme o estabelecimento da microbiota no início do desenvolvimento de um organismo, pode culminar em modificações epigenéticas.3

Dentro do cenário dos primeiros 1000 dias de formação da microbiota (período que vai da concepção até o segundo ano de vida de uma criança), uma série de fatores pré e pós-natais, como nutrição materna e neonatal, exposição a poluentes, além da própria composição da microbiota contribuem para o estabelecimento de mudanças epigenéticas que podem não apenas modular a adaptação do indivíduo ao meio ambiente, mas também influenciar a saúde ao longo da vida. A colonização intestinal pós-natal, por sua vez determinada pela microbiota materna, tipo de parto, contato pele a pele precoce e dieta neonatal, levam a assinaturas epigenéticas específicas que podem afetar as propriedades de barreira da mucosa intestinal e seu papel protetor contra problemas posteriores, portanto, potencialmente predispondo ao desenvolvimento de doenças inflamatórias de início tardio.3

O período de maior atividade de imprinting epigenético sobre o DNA é justamente os primeiros 1000 dias. A microbiota intestinal vai sendo moldada, em número e na diversidade de microrganismos e, pode sofrer influência de diversos fatores, como o uso de antibióticos (pré ou pós-natal), condições socioculturais e geográficas e, sobretudo, fatores nutricionais (dieta, aleitamento infantil, uso de fórmulas infantis, vitaminas, prebióticos e probióticos).3

Algumas evidências sobre a programação epigenética pela microbiota intestinal podem ser interpretadas como base para uma hipótese, segundo a qual, modificações epigenéticas prejudiciais (e consequentemente o desenvolvimento de doenças) podem ser prevenidos pela modulação do contato microbiano no início da vida. A microbiota intestinal pode ser positivamente alterada por meio da administração prebiótica, probiótica e simbiótica, o que pode representar uma abordagem promissora para reequilibrar a homeostase dos sistemas imunológicos sistêmico e mucoso. A colonização intestinal microbiana, iniciada intra-útero, tem direta relação com a programação epigenética microbiana durante a vida fetal. Por meio de seu estudo, é possível conceber intervenções maternas para modificar o risco de doenças na prole, com implicações clínicas potencialmente úteis.3

Referências

1 – Tanaka M, Nakayama J. Development of the gut microbiota in infancy and its impact on health in later life. Allergol Int. 2017; 66 (4): 515-22.

2 – Rautava S, Ruuskanen O, Ouwehand A, Salminen S, Isolauri E. The hygiene hypothesis of atopic disease – an extended version. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2004; 38 (4): 378-88.

3 – Flavia Indrio, Silvia Martini, Ruggiero Francavilla, Luigi Corvaglia, Fernanda Cristofori, Salvatore Andrea Mastrolia, Josef Neu, Samuli Rautava, Giovanna Russo Spena, Francesco Raimondi, Giuseppe Loverro. Epigenetic Matters: The Link between Early Nutrition, Microbiome, and Long-term Health Development. Frontiers in Pediatrics. 2017 Aug 22; 5: 178.

Qual é a relação entre microbiota e sistema imunológico?

Existe uma relação recíproca entre microbiota e organismo humano: os microrganismos residentes do corpo têm um papel significativo na regulação da fisiologia de seus hospedeiros e na prevenção de infecções patogênicas, enquanto o sistema imune dos hospedeiros é importante na determinação da composição da microbiota¹.

Esse equilíbrio representa um desafio em especial para o intestino, visto que a microbiota desse órgão é separada do interior do hospedeiro por uma única camada de células epiteliais³. Cerca de 70% das células imunes de cada indivíduo se encontram nesse nicho. Desta forma, a microbiota intestinal, além do já reconhecido estado nutricional, desempenha um papel fundamental na maturação, desenvolvimento e regulação do sistema imunológico³.

As bactérias comensais do intestino são extremamente benéficas para a saúde humana, facilitando o metabolismo dos nutrientes e a resistência à colonização patogênica, promovendo a integridade das células epiteliais, além do claro desenvolvimento do sistema imunológico. Esta relação entre microbiota e sistema imune vai além do intestino, influenciando positivamente as respostas imunes a patógenos em órgãos extra-intestinais como pulmão e trato urinário4.

Desta forma, perturbações na estrutura, diversidade e quantidade das comunidades comensais intestinais, como a disbiose, têm relação causal com desenvolvimento de doenças imunomediadas e infecciosas5. Neste contexto, a microbiota intestinal passa a ser um alvo terapêutico provável na prevenção e tratamento de doenças infecciosas5.

Um desequilíbrio entre sistema imune e microbiota pode causar, por exemplo, a disbiose do trato vaginal, predispondo mulheres a desenvolverem infecções como a vaginose bacteriana e a candidíase vulvovaginal5.

Embora a terapia antimicrobiana seja geralmente eficaz, o uso repetitivo de antimicrobianos pode levar a uma alta recorrência da infecção e aumento da resistência microbiana aos medicamentos5. Assim, foi sugerido que a administração de probióticos é uma potencial estratégia para prevenir infecções vaginais5.

O uso de probióticos como terapêutica de patologias, além do trato gastrintestinal, decorre de publicações onde foi comprovada ativação linfocitária direta e estímulo da imunidade inata6. A exemplo desta ação, temos o Lactobacillus acidophilus LA14 promovendo uma resposta imunitária mais rápida com uma maior produção de imunoglobulina G em voluntários sadios após vacinação6.

Considerando que o estado nutricional do paciente e a microbiota intestinal têm um impacto dramático na imunidade intestinal e extraintestinal tanto na saúde quanto na doença, se entende que estes microrganismos comensais possuem uma importância, além do papel secundário definido até então, na suscetibilidade e progressão de doenças3.

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/qual-e-a-relacao-entre-microbiota-e-sistema-imunologico/

Autor: Filippo Pedrinola – Doutor em Endocrinologia e Metabologia pela FMUSP ⦁ Membro da OBESO e da SBEM ⦁ Referência no uso clínico de Probióticos

Referências bibliográficas:

  1. Lei YM, Nair L, Alegre ML. The interplay between the intestinal microbiota and the immune system. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2015 Feb;39(1):9-19. doi: 10.1016/j.clinre.2014.10.008. Epub 2014 Nov 11. Review. PubMed PMID: 25481240; PubMed Central PMCID: PMC4423786.
  2. Rescigno M. Intestinal microbiota and its effects on the immune system. Cell Microbiol. 2014 Jul;16(7):1004-13. doi: 10.1111/cmi.12301. Epub 2014 May 1. Review. PubMed PMID: 24720613.
  3. Palm NW, de Zoete MR, Flavell RA. Immune-microbiota interactions in health and disease. Clin Immunol. 2015 Aug;159(2):122-127. doi: 10.1016/j.clim.2015.05.014. Epub 2015 Jun 30. Review. PubMed PMID: 26141651; PubMed Central PMCID: PMC4943041.
  4. Hernández-Santos N, Klein BS. Through the Scope Darkly: The Gut Mycobiome Comes into Focus. Cell Host Microbe. 2017;22(6):728-729.
  5. Peterson CT, Sharma V, Elmén L, Peterson SN. Immune homeostasis, dysbiosis and therapeutic modulation of the gut microbiota. Clin Exp Immunol. 2015 Mar;179(3):363-77. doi: 10.1111/cei.12474.
  6. Belkaid Y, Hand TW. Role of the microbiota in immunity and inflammation. Cell. 2014 Mar 27;157(1):121-41. doi: 10.1016/j.cell.2014.03.011. Review. PubMed PMID: 24679531; PubMed Central PMCID: PMC4056765.
  7. Santos CM, Pires MC, Leão TL, Hernández ZP, Rodriguez ML, Martins AK, Miranda LS, Martins FS, Nicoli JR. Selection of Lactobacillus strains as potential probiotics for vaginitis treatment. Microbiology. 2016 Jul;162(7):1195-207. doi: 10.1099/mic.0.000302. Epub 2016 May 5. PubMed PMID: 27154285.