Hábitos alimentares e distúrbios oportunistas na criança

O período de recesso de final de ano traz um novo quadro de risco à população pediátrica, em especial após um ano atípico caracterizado pela pandemia do Sars-CoV-2. Novas medidas fazem parte da rotina de todos, inclusive crianças, como o cumprimento de protocolos sanitários de distanciamento social, o uso de máscaras e o reforço de normas de higiene pessoal. Nesse contexto, as férias escolares promovem a flexibilização desses novos comportamentos, assim como interferem nos hábitos alimentares das crianças: a quebra da rotina tende a estimular o consumo exagerado de alimentos não saudáveis.1

A Sociedade Brasileira de Pediatria ressalta que o período da vida entre a gestação e os dois anos de idade da criança (primeiros 1000 dias) é crítico para a promoção do crescimento e do desenvolvimento do indivíduo devido à acentuada velocidade de multiplicação celular. É consenso que o aleitamento materno é a base da alimentação nesse período inicial, devendo ser oferecida de forma exclusiva nos primeiros seis meses de vida e mantida pelo menos até o segundo ano ou mais, sempre que possível.1

A introdução dos alimentos complementares, para os lactentes, deve conter cereais ou tubérculos, proteína vegetal ou leguminosas, proteína animal, hortaliças e não conter adição de sal. Assim, a nutrição adequada na infância é fundamental para o desenvolvimento completo, com o melhor estabelecimento dos sistemas nervoso, digestivo e imunológico.1

Nesse sentido, cabe aos pais ou responsáveis estarem atentos ao cumprimento dos hábitos alimentares saudáveis por parte das crianças no período de descanso das aulas. A dieta desbalanceada prejudica a manutenção do sistema imunológico e fornece margem para o desenvolvimento de doenças oportunistas, como as infecções gastrointestinais, virais e bacterianas. As intoxicações alimentares são comuns em momentos de quebra da rotina como as festas de final de ano ou viagens, e a diarreia infecciosa aguda é o distúrbio gastroenterológico mais frequente na idade pediátrica.2,3,4

A diarreia infecciosa aguda em crianças possui índices de prevalência consideráveis tanto em países de alta como de baixa renda, ela é a principal causa de desidratação na infância. A taxa de mortalidade, contudo, é maior em países em desenvolvimento: a estimativa é de que a diarreia aguda provoque dois milhões de mortes ao ano em crianças menores de 5 anos.5

Estudos realizados em países tropicais indicam que, durante o verão, as infecções diarreicas aumentam. O distúrbio segue um aspecto de sazonalidade. Por exemplo, os resultados clínicos mostram que episódios diarreicos aumentam em até oito vezes em bebês durante o verão. Além disso, o estado nutricional das crianças foi significativamente associado à incidência de diarreia.6

Além da responsabilidade dos pais e responsáveis quanto à garantia de todos os cuidados preventivos durante o período de verão e de recesso escolar, reitera-se a necessidade e a importância de que toda criança seja acompanhada pelo pediatra de modo sistemático. Aquelas que manifestam dificuldades alimentares ou estejam sendo submetidas à dieta vegetariana ou de outros tipos restritivos, por preferências familiares, necessitam ser acompanhadas pelo pediatra de modo ainda mais frequente para sua segurança.1

Referências

1 – Sociedade Brasileira de Pediatria. Posição da Sociedade Brasileira de Pediatria diante do Guia de Alimentação do Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/ALIMENTACAO_COMPLEMENTAR_MS.pdf./ Acesso em: 03 dez. 2020.

2 – Fewtrell M; Bronsky J, Campoy C, Domello M, Embleton N, Hojsak et al. Complementary Feeding: A Position Paper by the European Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition (ESPGHAN) Committee on Nutrition. JPGN 2017; 64: 119–132.

3 – Agostini C, Domellöf M. Infant Formulae: from ESPGAN recommendations towards ESPGHAN-coordinated Global Standards. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005; 41: 580-3.

4 – Kleinman RE, Greer F. Pediatric Nutrition Handbook. 7th ed., ed. Elk Grove, Village, IL: American Academy of Pediatrics; 2014.

5 – Nedeljko Radlović, Zoran Leković, Biljana Vuletić, Vladimir Radlović, Dušica Simić. Acute Diarrhea in Children. Srp Arh Celok Lek. Nov-Dec 2015; 143 (11-12): 755-62.

6 – William Checkley, Robert H Gilman, Robert E Black, Andres G Lescano, Lilia Cabrera, David N Taylor, Lawrence H Moulton. Effects of nutritional status on diarrhea in Peruvian children. J Pediatrics. 2002 Feb; 140 (2): 210-8.

Hábitos alimentares e distúrbios oportunistas no adulto

O recesso de final de ano modifica as atividades do cotidiano, rotina profissional, hábitos alimentares, entre outros. Durante o verão, a intoxicação alimentar é um problema de saúde comum e majoritariamente causado pela ingestão de água ou de alimentos contaminados por toxinas ou parasitas, como fungos, vírus e bactérias.1,2

Ao ingerir um alimento ou líquido contaminado, o paciente desenvolve inúmeros sintomas desconfortantes, que podem passar por náuseas, vômitos, febres e mal-estar, chegando em alguns casos até a desenvolver quadros mais graves, como a diarreia aguda infecciosa.1,2

A mudança na rotina está associada ao contexto de festas e viagens de final de ano e, assim, também tem relação direta com a adoção de uma dieta não composta pelas normas alimentares do dia a dia. Esta nova dieta geralmente contém alimentos processados e ultraprocessados, com grande quantidade de sal, açúcar e gorduras, além da ingestão, muitas vezes sem moderação, de bebidas alcoólicas.1,2,3

Nesse sentido, principalmente na época de recesso de final ano, é importante estar sempre atento à procedência daquilo que se ingere, evitando consumir alimentos crus, mal passados e verduras mal lavadas. Da mesma forma, é relevante que se procure manter hábitos alimentares saudáveis, com a ingestão de alimentos que garantam melhor nutrição ao organismo e, consequentemente, mais qualidade de vida.3

O desbalanço alimentar pode ser um fator prejudicial à manutenção do sistema imunológico. Nesse sentido, ele cria um ambiente propício ao acometimento de infecções comuns no período de verão. A diarreia infecciosa aguda tem várias causas: diarreia bacteriana com mecanismos invasivos ou toxigênicos, especialmente frequente em regiões quentes e em viajantes; diarreias virais, frequentes em crianças, mas também em adultos; e diarreia parasitária, menos frequente e geralmente estabelecida em áreas subtropicais. As principais preocupações envolvem o risco de complicações, essencialmente desidratação e desnutrição, sobretudo em pacientes vulneráveis, como idosos e indivíduos com imunossupressão para os quais a reidratação é urgente.4

O diagnóstico de diarreia requer avaliação clínica e histórico do paciente: análise de doenças subjacentes, gravidade dos sinais e sintomas, presença e extensão da desidratação e outros sintomas clínicos, bem como o histórico de viagens, hábitos alimentares e eventuais mudanças na rotina.4

As viagens no recesso de final de ano implicam a adaptação do indivíduo a um novo contexto, destacando as variações regionais. Essas mudanças abrangem as complexas interações ambiente-patógeno-hospedeiro, para os casos de doenças adquiridas a partir deste cenário.

Ensaios clínicos indicam que as influências ambientais e a dinâmica da população hospedeira, junto com a variabilidade climática, podem ter consequências diretas e indiretas importantes para o risco de infecção por doenças entéricas. A sazonalidade é uma característica definidora de muitas doenças infecciosas.4

Revisões sistemáticas de estudos anteriores exploraram os padrões globais de variação sazonal em doenças gastrointestinais. Ainda que muitos dados e informações já indiquem um padrão conforme a sazonalidade e hábitos de cada local, futuros estudos experimentais e observacionais devem considerar como os fatores ambientais (infecção, calor, poluição do ar etc.) ou outros gatilhos (hábitos alimentares, consumo de álcool, mudanças na rotina) promovem ou impedem tais doenças.5

Referências

1 – Pierre de Truchis, Anne de Truchis. Acute infectious diarrhea. Presse Medicale. 2007 Apr; 36 (4 Pt 2): 695-705.

2 – Federação Brasileira de Gastroenterologia. O Que é Má Digestão? Disponível em: http://fbg.org.br/Publicacoes/noticia/detalhe/1261./ Acesso em: 03 dez. 2020.

3 – Ministério da Saúde. Guia Alimentar para a População Brasileira. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf/. Acesso em: 03 dez. 2020.

4 – Aparna Lal, Simon Hales, Nigel French, Michael G Baker. Seasonality in human zoonotic enteric diseases: a systematic review. PLoS One. 2012; 7(4): e31883.

5 – A Fares. Global patterns of seasonal variation in gastrointestinal diseases. J Postgrad Medicine. Jul-Sep 2013; 59 (3): 203-7.

Ondansetrona na gestação: o uso é seguro?

O uso da internet traz rapidez, aproximação, facilidades, universalidade e praticidade na vida médica. Entretanto é um “universo novo”, onde qualquer um pode publicar qualquer opinião sobre qualquer assunto.

Somos inundados de informações novas a cada minuto, advindas dos mais diferentes setores. E nessa última semana, muitos colegas da obstetrícia receberam um comunicado sobre o aumento de risco fetal com uso de ondansetrona.

Essa droga, muito utilizada para vômitos incoercíveis em várias especialidades, também é comumente usada em obstetrícia em algumas fases da gestação para coibir vômitos que não melhoram com mudanças de hábitos alimentares ou outras medicações.

Em uma revisão da International Society of Pharmacovigilance (ISOP) considerou que o resultado de dois estudos recentes indicaram aumento do risco de malformações, em especial defeitos orofaciais. Esses estudos são:

  • Huybrechts et al: estudo de coorte retrospectivo de 88.467 mulheres expostas a ondansetrona no primeiro trimestre em comparação com 1.727.947 mulheres não expostas. Três casos para cada 10 mil foram identificados para mulheres expostas. Não foram observados casos de malformações cardíacas;
  • Zambelli et al: estudo retrospectivo caso-controle, realizado em 864.083 casais formados por mães e filhos, onde 76.330 receberam ondansetrona no primeiro trimestre. O risco de malformações cardíacas, principalmente septais, foi maior no grupo que recebeu ondansetrona no primeiro trimestre. Não se observou aumento de risco de defeitos orofaciais.

A partir daí temos, por outro lado, mais publicações que advogam o uso em situações que outras medicações tem falhado, como um recurso terapêutico:

  • Recomendações da UK Teratology Information Service e European Network of Teratology Information Services
  • Recomendações da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO);
  • Guia com informações sobre a classificação de risco e uso de medicamentos na gestação e lactação – Unicamp
  • Revisão sistemática sobre o risco de malformações a partir do uso de ondansetrona, pela revista Reproductive Toxicologist, concluindo que não estavam ligados;
  • Estudo publicado no site do Centers for Disease Control and Prevention mostrando que o uso do medicamento não aumenta risco fetal;
  • Estudo sobre a segurança da ondansetrona, publicado pela An International Journal of Obstetrics & Gynaecology (BJOG);
  • Intervenções para tratar náuseas e vômitos intensos durante a gravidez pelo Cochrane.

Com esse suporte na literatura acredito que o bom senso deva permanecer. Evitar drogas no primeiro trimestre sempre que possível é o ideal, mas a ondansetrona se mostra um recurso seguro para as exceções. Além dessas publicações, é importante lembrar que, no Brasil, temos o respaldo da FEBRASGO, que garante ser seguro seu uso.

Portanto, devemos sempre filtrar nossas origens das informações e pesar o risco x benefício para nossas pacientes.

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/uso-de-ondasentrona-na-gestacao-mais-uma-controversia-digital/

Autor: João Marcelo Coluna – Médico Ginecologista e Obstetra pela Universidade Estadual de Londrina, Mestre em Fisiopatologia pela Unoeste.

Referências bibliográficas:

Probióticos: o que o médico precisa saber

Probióticos são microrganismos vivos que usamos na prática clínica por seu potencial de causar efeitos benéficos à saúde. Apesar do uso frequente, poucos médicos conhecem bem o que são esses microrganismos e suas indicações, especialmente porque o estudo mais aprofundado da microbiota intestinal é algo relativamente recente na Medicina.

Se essas dúvidas também são suas e você gostaria de um resumo sobre probióticos e como eles funcionam, seu desejo é uma ordem!

O que são probióticos e para que servem?

Os probióticos podem ser encontrados em diversas formas farmacêuticas, incluindo alimentos derivados de leite e fermentados como iogurtes. Os germes contidos no fármaco podem ser variados, sendo os mais comuns as bactérias produtoras de ácido lático como Lactobacillus sp e Bifidobacterium sp e leveduras do gênero Saccharomyces (especialmente, S. boulardii).

O motivo principal para se prescrever um desses medicamentos é induzir adequação da microbiota intestinal para um perfil mais fisiológico e benéfico. Múltiplas pesquisas sobre esse tópico têm gerado evidência crescente de como os microrganismos habitantes do trato digestivo estão intimamente ligados à saúde global do indivíduo (até mesmo associados a estados de humor e outras alterações psicológicas). Além disso, várias doenças específicas do trato gastrointestinal são causadas ou favorecidas por desequilíbrios dessa microbiota.

Os efeitos variam de acordo com o agente usado, então os resultados não são os mesmos para qualquer fármaco ou forma farmacêutica usada. A eficácia também vai depender de outros fatores como a capacidade do microrganismo em sobreviver à acidez gástrica, aderir à mucosa intestinal e competir com os agentes patogênicos, além da segurança para uso humano e a estabilidade para armazenamento.

As formulações com mais de uma espécie são populares e, de fato, interessantes para a prescrição, já que o paciente pode ser colonizado apenas pela cepa “mais útil” naquele momento, facilitando o uso.

Mecanismo de ação e usos

O mecanismo de ação básico dos probióticos é a competição entre microrganismos benéficos e patogênicos. As bactérias e fungos administrados produzem agentes químicos que comprometem o crescimento dos demais: ácidos (lático, acético e propiônico), peróxidos, bacteriocinas, surfactantes, enzimas proteolítcas e outros exemplos.

Os agentes presentes nos medicamentos também competem com os patogênicos por espaço na mucosa gastrointestinal, aderindo ao epitélio de forma mais estável que os microrganismos indesejáveis.

Outro efeito dos probióticos é estimular o efeito de barreira que a mucosa intestinal exerce naturalmente. As bactérias e leveduras contidos nos fármacos estimulam a produção de mucinas (que têm efeito antibacteriano para os agentes patogênicos), além de reforçar as tight junctions que aderem os enterócitos e reduzir a permeabilidade do epitélio. Outra ação importante é o estímulo à ação imune, aumentando a capacidade fagocítica de leucócitos da mucosa e a produção local de imunoglobulinas (especialmente, IgA).

Vários usos vem sendo estudados, alguns com mais e outros com menos evidências.

Diarreia aguda: essa é a situação clínica com evidência mais sólida e eficácia comprovada para os probióticos (especialmente para rotavirus). Os efeitos observados são redução do tempo e da intensidade de diarreia. Algumas pesquisas experimentais (com grupos de intervenção e grupos de controle) mostraram redução em até 20% na duração da diarreia (com consequente redução na evolução para diarreia persistente) e redução da frequência de evacuações de 1-2/dia. Quem atende em pronto-atendimentos, atenção primária e zonas de baixo saneamento básico sabe que esses efeitos são suficientes para evitar desidratação grave e outras complicações. É importante notar que, no caso da diarreia, os probióticos eficazes foram apenas os contendo Lactobacillus e Bifidobacterium (Saccharomyces e Streptococcus, por exemplo, não geraram efeitos diferentes do placebo).

Diarreia induzida por antibióticos e Clostridium difficile: nesse caso, ao contrário, os probióticos mais eficazes são os contendo leveduras Saccharomyces (que produzem proteases inativadoras das toxinas A e B). Algumas meta-análises evidenciaram eficácia dos probióticos em prevenir a ocorrência da diarreia por antibióticos e tratar a infecção por C. difficile quando usados simultaneamente à antibioticoterapia. Outros estudos mostraram menor taxa de colonização por C. difficile em pacientes críticos com a administração de probióticos. O uso de medicamentos à base de Lactobacillus, nesse caso, não é eficaz, provavelmente, pelo efeito dos antibióticos sobre as próprias bactérias do preparado.

Síndrome do intestino irritável (SII): apesar de considerada uma doença funcional, existem teorias que explicam a SII através do supercrescimento bacteriano, principalmente de bactérias fermentadoras. Meta-análises recentes mostraram redução da dor abdominal em pacientes com SII em uso de probióticos, em comparação ao placebo. Nesse caso, os agentes mais eficazes foram Lactobacillus e Bifidobacterium. Porém, a maioria dos estudos não mostrou redução de outros sintomas como flatulência e distensão abdominal.

Doença inflamatória intestinal (DII): uma das teorias da patogênese das DII (retocolite ulcerativa – RU, doença de Crohn – DC, e ileíte terminal – IT) é a resposta inflamatória descompensada desencadeada pelo desbalanço da microbiota intestinal. Vários estudos têm mostrado a eficácia dos probióticos em, principalmente, reduzir a frequência de recidiva. Porém, em alguns deles, esses medicamentos foram capazes até de induzir a remissão (com ou sem associação à terapêutica convencional). Para a RU, as pesquisas mostraram bons resultados com algumas preparações contendo E. coli não patogênicas e associações de Lactobacillus, Bifidobacterium e Streptococcus; pacientes com DC responderam bem a Saccharomyces (porém a resposta não foi boa para formulações bacterianas); e pacientes com IT apresentaram melhor resposta com a associação Lactobacillus, Bifidobacterium e Streptococcus.

Alergias: nesse caso, a maioria das pesquisas é em relação a alergias na infância. Alguns estudos prospectivos administraram probióticos à base de Lactobacillus e Bifidobacterium para gestantes no fim da gravidez, continuando a administração nas crianças durante os primeiros 2 anos de vida. A incidência de alergias nas crianças do grupo de intervenção foi metade da observada no grupo controle, e o efeito se manteve mesmo após mais 4 anos de observação.

Outros usos: probióticos têm sido estudados também para doenças fora do trato gastrointestinal. Um bem estabelecido é para tratamento de candidíase vaginal recorrente. Muitas mulheres desenvolvem a vulvovaginite fúngica por desbalanço da microbiota vaginal normal (predominantemente composta por Lactobacillus) após uso de antimicrobianos, por exemplo. Nas pesquisas, o uso de supositórios vaginais contendo bactérias do gênero e até a ingestão regular de alimentos probióticos mostraram eficácia para tratamento e controle de recorrência dessa doença. Outros contextos têm sido estudados (como o tratamento de otites e outras infecções recorrentes de vias aéreas superiores), porém ainda com pouca evidência para apoiar o uso dos probióticos.

Dosagem

As dificuldades quanto à prescrição dos probióticos é justamente a inexistência de evidências sólidas quanto à posologia. É importante lembrar que os medicamentos contêm microrganismos vivos e que o armazenamento inadequado (seja no estoque, na farmácia, no hospital ou em casa) pode inviabilizar o uso.

Em geral, devem ser administrados, diariamente, alguns bilhões de unidades formadoras de colônia (UFC) para que o remédio exerça o efeito desejado. Para os lactobacilos, a dose diária recomendada é de 1-20 bilhões de UFC por dia, enquanto para Saccharomyces, de 250 – 500mg/dia.

Interações medicamentosas e efeitos adversos

A principal interação medicamentosa digna de nota é com antimicrobianos que, por atuar sobre os agentes contidos no medicamento, podem anular o efeito dos probióticos. O recomendado é separar o uso de probióticos e de antibióticos em pelo menos 2h. Os efeitos adversos mais comuns são distensão abdominal e flatulências no uso de preparados bacterianos e obstipação e polidipsia em preparados com Saccharomyces.

A maior preocupação é a possibilidade de infecções, considerando que estão sendo administrados microrganismos vivos. Existem relatos de casos na literatura, inclusive de quadros sépticos graves. Porém a incidência é extremamente baixa: menos que 1 em 1 milhão para preparações bacterianas e 1 a cada 5,6 milhões para os preparados de leveduras.

Os fatores de risco mais comuns para casos de bacteremia são estado crítico e terapia intensiva, uso de medicamentos imunossupressores e pacientes invadidos (sonda nasoenteral e catéter venoso central, principalmente). Nessas situações, os doentes estão suscetíveis a colonização e posterior infecção pelo ineficácia imunológica, além do fornecimento de superfícies inertes para adesão. No caso específico das sondas enterais e da jejunostomia, a via alternativa de administração forma um bypass que livra os microrganismos da ação do ácido gástrico, aumentando o número de agentes viáveis (o que pode favorecer infecções em pacientes já imunossuprimidos).

Outros fatores de risco menores são situações de quebra da barreira enteral (com hiperpermeabilidade de mucosa), doença cardíaca valvar (no caso do Lactobacillus) e administração concomitante de antibióticos de amplo espectro. Surpreendentemente, alguns componentes dos probióticos podem ser resistentes a alguns tipos de antibiótico, o que favoreceria o supercrescimento dos componentes do preparado. Além disso, a transmissão de mecanismos de resistência antimicrobiana das bactérias do medicamento para bactérias patogênicas também pode acontecer.

Conclusão

Probióticos têm tido cada vez mais abertura e oportunidades de uso dentro de várias áreas da Medicina e, aparentemente, realmente são drogas promissoras.

Porém, o uso difundido (inclusive sem prescrição médica) e a falta de rigor na execução de muitas pesquisas dificulta a geração de evidências de qualidade para diretrizes mais claras. Logo, são necessárias novos estudos na área para reafirmar a segurança e eficácia desses fármacos.

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/probioticos-o-que-o-medico-precisa-saber/

Autor: Carlos Henrique de Sousa Ribeiro da Silva – Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da UFU 

Referências bibliográficas:

  • WILLIAMS, Nancy Toedter. Probiotics. 2010. Am J Health Syst Pharm. 2010;67(6):449-458.

Crise de água no RJ: como manejar o paciente com diarreia na emergência?

As doenças diarreicas representam uma das cinco principais causas de morte em todo o mundo. Em tempos de crise de abastecimento de água no Rio de Janeiro, que apresenta sabor e odor alterados, a preocupação com esta patologia aumenta. A seguir, iremos revisar a abordagem da diarreia no contexto de emergência.

Diarreia

Vamos revisar alguns pontos importantes antes de prosseguirmos:

1) Diarreia é definida como a passagem de fezes amolecidas ou aquosas, geralmente pelo menos três vezes em um período de 24 horas.

2) Definição de acordo com duração dos sintomas:

  • Aguda: 14 dias ou menos de duração;
  • Diarreia persistente: mais de 14, mas menos de 30 dias de duração;
  • Crônica: mais de 30 dias de duração.

3) Diarreia invasiva, ou disenteria, é definida como diarreia com sangue ou muco visível, em contraste com a diarreia aquosa. A disenteria é comumente associada à febre e dor abdominal.

4) Etiologia: a maioria dos casos de diarreia aguda é causada por infecções e é autolimitada. As principais causas de diarreia infecciosa aguda incluem vírus (norovírus, rotavírus, adenovírus, astrovírus e outros), bactérias (Salmonella, Campylobacter, Shigella, Escherichia coli enterotoxigênica, Clostridioides [anteriormente Clostridium] difficile e outros) e protozoários (Cryptosporidium) Giardia, Cyclospora, Entamoeba e outros). Etiologias não infecciosas tornam-se mais comuns à medida que o curso da diarreia persiste e se torna crônico.

5) Em conjunto, a maioria dos casos de diarreia infecciosa aguda é provavelmente viral, como indicado pela observação de que as culturas de fezes são positivas em apenas 1,5 a 5,6% dos casos na maioria dos estudos. Entre aqueles com diarreia grave, no entanto, as causas bacterianas são responsáveis ​​pela maioria dos casos. Os protozoários são menos comumente identificados como agentes etiológicos da doença gastrointestinal aguda.

Avaliação do paciente com diarreia

1. História

A avaliação inicial de pacientes deve incluir uma história cuidadosa para determinar a duração dos sintomas, a frequência, as características das fezes e os sintomas associados. Além disso, deve-se tentar obter evidências de desidratação (por exemplo, urina amarela escura ou escassa, diminuição do turgor cutâneo, hipotensão ortostática).

Questionar sobre exposições em potencial, como histórico de alimentos, residência, exposição ocupacional, viagens recentes e remotas, animais de estimação e hobbies, também pode fornecer pistas adicionais de diagnóstico.

2. Exame físico

O exame se concentra na avaliação do status do volume e na identificação de complicações. A desidratação pode ser sugerida por membranas mucosas secas, turgor cutâneo diminuído, reduções posturais da pressão arterial e alteração sensorial.

O exame abdominal deve avaliar os achados que podem sugerir íleo ou peritonite, incluindo distensão abdominal, dor com percussão leve, rigidez abdominal ou dor à descompressão.

3. Exames laboratoriais

Os exames não são rotineiramente necessários para a maioria dos pacientes com diarreia aguda. Se houver depleção substancial de volume, um painel metabólico básico deve ser realizado para rastrear hipocalemia ou disfunção renal.

O hemograma completo não distingue de maneira confiável as etiologias bacterianas da diarreia, mas pode ser útil para sugerir doenças graves ou possíveis complicações. Uma contagem baixa de plaquetas pode suscitar preocupação pelo desenvolvimento da síndrome hemolítico-urêmica, e uma reação leucemoide é consistente com o diagnóstico de infecção por C. difficile.

Quando pedir hemoculturas?

As hemoculturas devem ser obtidas em pacientes com febre alta ou que pareçam sistemicamente doentes.

Quando pedir cultura de fezes?

A maioria dos pacientes não precisará deste tipo de exame, e adotaremos uma conduta expectante. No entanto, precisaremos estar atentos para pedir culturas de fezes na hora certa, ou seja, para pacientes com diarreia aguda adquirida na comunidade e as seguintes questões na apresentação:

  • Doença grave (diarreia aquosa abundante, sinais de hipovolemia, passagem de ≥6 fezes não formadas por 24 horas, dor abdominal intensa, necessidade de hospitalização);
  • Características de diarreia inflamatória (diarreia com sangue, fezes mucosas de pequeno volume, febre);
  • Características do hospedeiro de alto risco (por exemplo, idade ≥70 anos, doença cardíaca, condição imunocomprometida, doença inflamatória intestinal, gravidez);
  • Sintomas persistentes por mais de uma semana;
  • Preocupações com a saúde pública (por exemplo, doenças diarreicas em manipuladores de alimentos, profissionais de saúde e indivíduos em creches).

Quando pedir outros exames?

Testes de diagnóstico adicionais dependem dos recursos apresentados. A diarreia extremamente sanguinolenta justifica o teste da toxina Shiga (para identificar Escherichia coli produtora da toxina Shiga [STEC]) e leucócitos fecais ou lactoferrina, se disponível. Os testes para Clostridioides difficile devem ser realizados em casos de uso recente de antibióticos ou exposição a cuidados de saúde. O teste de parasitas não é necessário na maioria dos pacientes com diarreia aguda.

É útil, no entanto, em pacientes com diarreia persistente, em homens que fazem sexo com homens, em hospedeiros imunocomprometidos, durante um surto de transmissão pela água na comunidade (associado a Giardia e Cryptosporidium) ou em diarreia sanguinolenta com poucos ou nenhum leucócito fecal (associado a amebíase intestinal). Os testes parasitários incluem microscopia para óvulos e parasitas, além de testes antigênicos ou moleculares para organismos específicos.

Manejo dos pacientes com diarreia

A chave da terapia dos pacientes com diarreia é a reposição volêmica, preferencialmente por via oral, com soluções que contenham água, sal e açúcar. Adultos com hipovolemia grave devem receber inicialmente reposição de fluidos intravenosos.

Uma vez cheios, eles podem ser trocados para soluções de reidratação oral. A nutrição adequada durante um episódio de diarreia aguda também é importante.

Quando fazer antibióticos?

Para a maioria dos pacientes com diarreia adquirida na comunidade e não associada a viagens, recomenda-se não administrar rotineiramente a antibioticoterapia empírica, pois benefício da redução dos sintomas não supera as desvantagens (efeitos colaterais, promoção da resistência bacteriana, erradicação da flora normal) na maioria dos indivíduos com diarreia aguda, que geralmente dura pouco e é causada por vírus.

Sugere-se antibioticoterapia empírica para pacientes com doença grave, características sugestivas de infecção bacteriana invasiva (fezes com sangue ou mucoide) ou fatores do hospedeiro que aumentam o risco de complicações.

Mesmo que um patógeno bacteriano seja identificado, nem todos os pacientes necessitam de terapia antimicrobiana, e o Shiga toxin-producing Escherichia coli [STEC]) especificamente não deve ser tratado com antibióticos.

Outros medicamentos:

  1. Antiparasitários: devem ser usados somente para:
  • Amebíase, quando o tratamento de disenteria por Shigella sp fracassar, ou em casos em que se identificam nas fezes trofozoítos de Entamoeba histolytica englobando hemácias;
  • Giardíase, quando a diarreia durar 14 dias ou mais, se identificarem cistos ou trofozoítos nas fezes ou no aspirado intestinal.
  1. Zinco: deve ser administrado, uma vez ao dia, durante 10 a 14 dias: 20 mg/dia.
  2. Agentes antimotilidade: loperamida pode ser usada com cautela em pacientes nos quais a febre está ausente ou é de baixo grau e as fezes não têm sangue. Para pacientes com características clínicas sugestivas de disenteria (febre, fezes com sangue ou mucoide), sugere-se evitar agentes antimotilidade, a menos que antibióticos também sejam administrados devido a preocupações de prolongar a doença nessas infecções. Nestes pacientes, o salicilato de bismuto é uma alternativa. O racecadotril é outro agente antissecretor eficaz.
  3. Probióticos: Probióticos com bactérias benéficas que auxiliam na manutenção ou recolonização do intestino com flora não patogênica também podem ser usados como terapia alternativa. Demonstrou-se que o Lactobacillus GG diminui a duração da diarreia infecciosa infantil e Saccharomyces boulardii pode ser eficaz na diminuição da duração da infecção por C. difficile.

Fonte: PEBMED https://pebmed.com.br/crise-de-agua-no-rj-como-manejar-o-paciente-com-diarreia-na-emergencia/

Autora: Dayanna de Oliveira Quintanilha – Especialista em Clínica Médica pela UFF

Referências:

  • LaRocque R, Harris JB. Approach to the adult with acute diarrhea in resource-rich settings.https://www.uptodate.com/contents/approach-to-the-adult-with-acute-diarrhea-in-resource-rich-settings
  • http://www.saude.gov.br/saude-de-a-z/doencas-diarreicas-agudas
  • http://bvsms.saude.gov.br/bvs/cartazes/manejo_paciente_diarreia_cartaz.pdf
  • https://oglobo.globo.com/rio/crise-da-agua-ufrj-afirma-que-ha-uma-ameaca-real-seguranca-hidrica-da-regiao-metropolitana-do-rio-24191800

Principais Problemas Decorrentes do Desequilíbrio da Microbiota Intestinal na saúde do adulto

Importância da Microbiota Intestinal

A microbiota intestinal constitui a maior comunidade de microrganismos associada ao corpo humano, com um papel preponderante na homeostasia do organismo, e cuja modificação, pela redução da diversidade e/ou pela alteração da proporção de elementos específicos, parece estar associada a várias patologias.1

Um importante papel da microbiota intestinal relacionado com a manutenção do hospedeiro é a sua contribuição para o desenvolvimento de um sistema imune mais robusto e equipado com um leque de células e moléculas, que permitem maior capacidade para combater patógenos microbianos. Vários dados têm confirmado que a microbiota intestinal está envolvida em uma interação dinâmica com o sistema imune – inato e adaptativo – que afeta diferentes aspectos do seu desenvolvimento e função.2

Fatores que alteram a composição da microbiota intestinal

Existem vários fatores que influenciam a composição da microbiota intestinal. O desequilíbrio desta composição é chamado de disbiose. Dentre eles, podem-se indicar: a diarreia, que pode ser tanto causa como consequência da alteração da microbiota; o uso de antibióticos; a dieta alimentar inadequada; o consumo de bebidas alcoólicas; o fumo; o uso de agrotóxicos e metais pesados na agricultura que acabam contaminando alimentos e água que se bebe; o estresse pelo trabalho e algumas doenças crônicas, a saber: diabetes e doenças inflamatórias intestinais.3

É fundamental entender que, se houver uma supressão da microbiota normal, cria-se um local parcialmente vazio que tende a ser preenchido por microrganismos provenientes do ambiente ou de outras partes do corpo. Estes microrganismos comportam-se como oportunistas e podem tornar-se patógenos.4

Exemplos de intercorrências resultantes da disbiose

A presença da microbiota intestinal é importante quanto à resistência ou à suscetibilidade a uma série de doenças inflamatórias, dentre elas, a doença inflamatória intestinal. Da mesma forma, o balanço da microbiota pode estar relacionado a uma gama de doenças metabólicas, como obesidade e diabetes tipo II. Doenças cardíacas, neurológicas e dermatológicas – como a dermatite atópica – também podem apresentar relação com o balanço da microbiota do trato gastrointestinal. O estresse oxidativo, a indução de bacteriófagos e a secreção de toxinas bacterianas podem desencadear mudanças rápidas entre os grupos microbianos intestinais, resultando em disbiose.8

A diarreia infecciosa é a intercorrência mais usual em questões de desordens gastrointestinais. As espondiloartrites, por exemplo, representam um conjunto de doenças inflamatórias crônicas em que a ação de fatores ambientais – incluindo a microbiota – em indivíduos com determinada suscetibilidade genética será determinante para o seu desencadeamento e progressão ao longo do tempo.1,5,6,7

Especificamente sobre as diarreias, elas podem estar associadas a diversos fatores do ambiente, podem ser adquiridas a partir da ingestão de alimentos ou água contaminados com enteropatógenos bacterianos, por exemplo, causando a disbiose. A diarreia do viajante, cuja fonte é predominantemente comida contaminada, caracteriza-se por ser costumeiramente diagnosticada em pessoas que viajam para locais com tratamento de água deficiente. Ela afeta 20% a 50% dos viajantes que se deslocam para destinos tropicais e subtropicais. Náusea, vômito, cólica abdominal podem ocorrer com diferentes graus de severidade. As diarreias associadas a antibióticos, por sua vez, são relativas ao uso demasiado de medicamentos antibióticos, o que altera a composição microbiana do trato gastrointestinal. Uma complicação mais grave das diarreias associadas a antibióticos é a colite pseudomembranosa. 11, 12, 13

As doenças autoimunes têm sido foco no que se refere aos esforços, por parte da comunidade científica, para esclarecer o papel da microbiota no desenvolvimento dessas enfermidades. Estudos descrevem as perturbações da microbiota intestinal em modelos animais de doenças autoimunes, como diabetes tipo 1, esclerose múltipla, artrite reumatoide e lúpus eritematoso sistêmico. 9, 10

Recentemente, o aparecimento de diabetes tipo 1 aumentou rapidamente e se tornou um grande problema de saúde pública em todo o mundo. Vários fatores estão associados ao desenvolvimento de diabetes tipo 1, como dieta, genoma e microbiota intestinal. Evidências mostram que a composição bacteriana intestinal alterada (disbiose) está altamente associada à patogênese da disfunção da insulina, hormônio responsável pela captação de glicose do sangue para as células, e diabetes tipo 1. 9, 10

Bibliografia

  1. MOTA, Inês Barreiros; FARIA, Ana; PIMENTEL-SANTOS, Fernando M.; CALHAU, Conceição. Microbiota intestinal e espondiloartrites: o papel da dieta na terapêutica.
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  3. CHISSOCA, Antônio Ribeiro Chissululo. Influência da microbiota intestinal nas propriedades imunológicas de uma vacina recombinante. Antônio Ribeiro Chissululo Chissoca; orientador, Prof. Dr. Oscar Bruna Romero – Florianópolis, SC, 2016. 105 p.
  4. GIBSON, G. R.; ROBERFROID, M. B. Dietary modulation of the human colonic microbiota: introducing the concepts of prebiotics. Journal Nutrition, Bethesda, v. 125, n. 6, p. 1401-1412, 1995.
  5. DIBAISE, J.K. et al. Gut Microbiota and Its Possible Relationship with Obesity. Mayo Clin Proc, v. 83, n.4, p.460-469, 2012.
  6. ZHANG, Husen et al. Probiotics and virulent human rotavirus modulate the transplanted human gut microbiota in gnotobiotic pigs. Gut Pathog, v. 6, n. 1, p.1-7, set. 2014.
  7. DE VRESE, P.R.; MARTEAU. Probiotics and prebiotics: effects on diarrhea, J. Nutritional. v. 137, n.3, p. 8035 – 8115, 2007.
  8. WEISS, G Adrienne; HENNET, Thierry. Mechanisms and consequences of intestinal dysbiosis. 2017 Aug; 74(16): 2959-2977.
  9. OLIVEIRA, Gislane Lelis Vilela de; LEITE, Aline Zazeri; HIGUCHI,Bruna Stevanato; GONZAGA, Marina Ignácio; MARIANO, Vânia Sammartino. Disbiose intestinal e aplicações de probióticos em doenças autoimunes. Setembro de 2017; 152 (1): 1-12.
  10. Hui HanYuying Li; Jun Fang; Gang Liu; Jie Yin; Tiejun Li; Yulong Yin. Microbiota intestinal e diabetes tipo 1. 27 de março de 2018; 19 (4): 995.
  11. Oksanen PJ, Salminen S, Saxelin M, Hämäläinen P, Ihantola-Vormisto A, Muurasniemi-Isoviita L, et al. Prevention of travellers’ diarrhoea by Lactobacillus GG. Ann Med. 1990; 22 (1): 53-6.
  12. Hilton E, Kolakowski P, Singer C, Smith M. Efficacy of lactobacillus GG as a diarrheal preventive in travelers. J Travel Med. 1997; 4(1): 41-43.
  13. Guarner F, Khan AG, Garisch J, Eliakim R, Gangl A, Thomson A, et al. World Gastroenterology Organisation Global Guidelines: probiotics and prebiotics October 2011. J Clin Gastroenterol. 2012; 46 (6): 468-81.

Principais Problemas Decorrentes do Desequilíbrio da Microbiota Intestinal na saúde da criança

A microbiota, sua formação, variações e alterações

A microbiota humana é o conjunto de microrganismos que habitam as superfícies externas e internas do nosso corpo, tais como pele, mucosa oral e respiratória, ou o trato gastrointestinal (TGI) e geniturinário (TGU). Este conjunto de microrganismos é adquirido pelos recém-nascidos inicialmente no momento do parto. Entre os 18 e 24 meses se torna já semelhante à microbiota de um adulto. Uma das principais funções dessa microbiota é a estimulação do sistema imune, tornando-o apto a desenvolver suas funções de homeostase e defesa, através do amplo leque de células e moléculas que o compõe.1

Existem evidências de que variações na microbiota intestinal podem causar alterações no sistema imunológico, podendo constituir um ambiente que modula de forma negativa ou positiva a indução de uma resposta imune eficaz. O desequilíbrio da microbiota (disbiose) pode provocar não só dano tecidual, mas também anergia imune (a anergia é a inativação funcional das células linfocitárias do tipo T), inflamação intestinal crônica que, caso persistam, podem comprometer a resposta do hospedeiro aos antígenos.1

Microbiota materna e neonatal

A colonização inicial da microbiota humana se inicia ainda no período pré-natal, intraútero. Estudos recentes indicam a presença de microrganismos no líquido amniótico, membranas fetais, cordão umbilical, placenta e mecônio. Mas a sua consolidação se faz principalmente durante o nascimento, sobretudo através do parto normal, pela passagem do feto no canal vaginal e, também, por sua proximidade com as porções finais do sistema digestório materno.2,3,4,5.

De maneira geral, o impacto da saúde materna na microbiota neonatal ao nascimento ainda é um campo aberto para estudos. Segundo pesquisas, existe uma possível relação entre a disbiose da microbiota materna e neonatal com o diagnóstico de diabetes mellitus gestacional (DMG).  Estima-se que essa associação traga riscos potenciais de mudança microbiana para os neonatos.2

A diabetes mellitus gestacional (DMG) pode alterar a microbiota de mulheres grávidas e neonatos ao nascimento, o que claramente indica sobre outra forma de herança e destaca a importância de compreender a formação da microbiota no início da vida.2

Disbiose e impactos na saúde infantil

Em crianças, a regulação e o balanço da microbiota intestinal têm impactos tanto em funções gastrintestinais como na saúde imunológica. O equilíbrio garante a execução adequada de funções digestórias e a formação das defesas naturais, prevenindo portanto, doenças comuns na infância. A disbiose, então, tem relação clara com doenças infecciosas na infância. As diarreias e as infecções das vias aéreas superiores são exemplos comuns.3

A doença diarreica aguda (DDA) continua sendo a maior causa de mortalidade na infância no mundo inteiro. Sendo, na maioria das vezes, de caráter infeccioso (vírus, bactérias e parasitas), a DDA tem como base fisiopatológica a geração de processo inflamatório que culmina com alterações absortivas e que determina diarreia (três ou mais episódios em 24 horas), geralmente líquida, com ou sem febre e vômito.4

Muitas crianças, no mundo inteiro, sofrem com infecções das vias aéreas superiores (IVAS) a cada ano, sobretudo aquelas que estão em idade pré-escolar, quando o sistema imunológico ainda se encontra em desenvolvimento, principalmente se estiverem institucionalizadas, em creches ou berçários.5

Considerando crianças que apresentem infecções tanto do sistema digestório quanto do respiratório, é recomendada a adoção de um tratamento que vise restabelecer a composição e o equilíbrio da microbiota intestinal.6,7

Bibliografia

  1. CHISSOCA, Antônio Ribeiro Chissululo. Influência da microbiota intestinal nas propriedades imunológicas de uma vacina recombinante. Antônio Ribeiro Chissululo Chissoca; orientador, Prof. Dr. Oscar Bruna Romero – Florianópolis, SC, 2016. 105.
  2. WANG, Jingeng; ZHENG, Jiayong; SHI, Wenyu; DU, Nan; ZHANG, Yanming; JI, Peifeng; ZHANG, Fengyi; JIA, Zhen; WANG, Sim; ZHENG, Zhi; ZHANG; Hongping; ZHAO, Fangqing. Disbiose da microbiota materna e neonatal associada ao diabetes mellitus gestacional. Setembro de 2018; 67 (9): 1614-1625.
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  2. DOMINGUEZ-BELLO, MG; DE JESUS, Laboy KM; SHEN, N; COX, LM; AMIR, A; GONZALEZ, A. et al. Partial restoration of the microbiota of cesarean-born infants via vaginal microbial transfer. Nat Med. 2016; 22(3): 250-3.
  3. SEGERS, ME; LEBEER, S. Towards a better understanding of Lactobacillus rhamnosus GG – host interactions. Microb Cell Fact. 2014; 13 Suppl. 1: S7.
  4. ISOLAURI, E; JUNTUMEN, M; RAUTANEN, T; KOUVULA, T. A human Lactobacillus strain (Lactobacillus casei sp strain GG) promotes recovery from acute diarrhea in children. Pediatrics. 1991; 88(1): 90-7.
  5. HATAKKA, K; SAVILAHTI, E, MEURMAN, JH; POUSSA, T et al. Effect of long term consumption of probiotic milk on infections in children attending day care centres: Double blind, randomised trial. BMJ. 2001; 322(7298): 1327.
  6. HOJSAK, I; SNOVAK, N; ABDOVIC, S; SZAJEWSKA, H; MISAK, Z; KOLACEK, S. Lactobacillus GG in the prevention of gastrointestinal and respiratory tract infections in children who attend day care centers: a randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Clin Nutr. 2010; 29(3): 312-6.

A importância da microbiota na saúde da criança

A importância da microbiota na saúde infantil.

A comunidade microbiana intestinal é estabelecida tanto durante o período neonatal como no início da infância. No momento do nascimento, os microrganismos colonizam o tubo gastrointestinal do bebê, e entre os 18 e 24 meses de vida a microbiota da criança já se torna semelhante à de um adulto. Os recém-nascidos de parto normal, por sua vez, possuem uma microbiota semelhante à da mãe. Esse quadro se dá, sobretudo, devido à passagem do feto pelo canal vaginal. Recém-nascidos de cesariana não possuem essa mesma oportunidade de colonização, portanto, as probabilidades para desregulações e alergias podem ser maiores para estas crianças no futuro. 3-4

Mas, afinal, o que é microbiota?

O organismo é colonizado por milhões de bactérias distribuídas em centenas de espécies não patogênicas, com grande influência para a saúde. O intestino é o principal órgão de colonização destas bactérias; neste ambiente específico se forma a microbiota intestinal. Ela atua em diversas frentes e com diferentes funções: auxilia o metabolismo de fibras e toxinas, age no suporte às demandas de outros sistemas – como o imunológico, o nervoso e o próprio digestório – exercendo papel essencial na proteção de doenças. 4

O microbioma, por sua vez, é definido como o conjunto de micro-organismos e genes que colonizam todo um meio natural. O microbioma humano, por exemplo, diz respeito aos micro-organismos presentes em todo o corpo, para além do trato gastrointestinal, abrangendo também pele, cabelo, vias aéreas, trato urogenital e alguns órgãos e sistemas. 4

Como é a sua formação?

Antes mesmo do nascimento, caso o feto esteja em perfeitas condições de desenvolvimento (como dieta e temperatura adequadas, ambiente livre de patógenos e apresente tolerância imunológica) é possível identificar a presença de micro-organismos através da colonização do trato gastrointestinal. Ela ocorre, segundo alguns estudos recentes, quando o feto realiza a deglutição do líquido amniótico ainda intraútero. Neste momento, então, pode-se afirmar que a microbiota intestinal teve o seu início. 4-5

Após o nascimento, outros micro-organismos essenciais para uma vida saudável são introduzidos por meio da ingestão dos primeiros alimentos e, também, através do leite materno. O leite confere benefícios nutricionais essenciais à criança, ele é globalmente considerado o padrão-ouro para a alimentação infantil. Também, o leite materno garante benefícios não nutricionais explicados, sobretudo, pelos fenômenos epigenéticos.  Tais fenômenos são mecanismos moleculares envolvidos na interação entre fatores do ambiente e a expressão da informação contida no DNA. 1,5

A amamentação natural promove a maturação da microbiota saudável, destacando-se pela presença de lactobacilos e de carboidratos conhecidos como human milk oligosaccharides (HMOs), os quais auxiliam o crescimento e o desenvolvimento de bactérias não patogênicas. 5

A microbiota intestinal da mãe, portanto, é a principal fonte de bactérias que efetivamente colonizarão o trato gastrointestinal do recém-nascido e, assim, atuarão na promoção e no desenvolvimento do sistema imunológico. 1-5

Ressalta-se que algumas bactérias também podem ser transferidas de mãe para filho por meio do leite materno, são elas: Lactobacillus, Leuconostoc, Streptococcus, Enterococcus, Lactococcus e Weisella, bem como algumas espécies benéficas de Bifidobacterium. 5

A microbiota e o sistema imunológico

A principal função do sistema imunológico é defender o organismo contra patógenos invasores e outros agentes agressores, sendo eles infecciosos ou não. Em linhas gerais, ele atua também no reconhecimento de corpos, células e toxinas estranhas ao organismo, tal qual acontece na vigilância contra tumores. 5

Ainda intraútero, o sistema imunológico sofre uma espécie de hibernação de sua atividade (conhecida como downregulation) e passa a adquirir regularização após o nascimento e com o passar dos anos. Por essa razão – embora essa assertiva seja atualmente questionada – certos aspectos do sistema imunológico ainda não estão totalmente maduros nesse período, como por exemplo, a baixa concentração de anticorpos no recém-nascido (exceto da IgG, que é materna e transferida para o feto através da placenta). Existe, também, certo desequilíbrio na relação dos subtipos linfocitários, com discreto predomínio do subtipo Th2. 5

O leite materno é a melhor fonte de proteção ao recém-nascido contra enfermidades infecciosas, tendo grande influência sobre a composição da microbiota intestinal. A resposta microbiana intestinal leva à formação de anticorpos séricos contra bactérias patogênicas presentes no intestino, e estende essa proteção a outras mucosas e às glândulas exócrinas, como as salivares e as mamárias, durante a lactação. 3

Portanto, nessa fase, o sistema imunológico intestinal possui fundamental importância no amadurecimento global do sistema imunológico, criando uma barreira por meio da secreção de anticorpos (IgA), que inibem a colonização da mucosa por bactérias patógenas. Da mesma forma, utiliza mecanismos bioquímicos celulares, como a ativação de células específicas (T reguladoras) e a síntese de citocinas moderadoras (IL-10), que estão ligadas diretamente à tolerância oral. 5

Como manter a microbiota saudável?

Para um bom metabolismo materno e que ajude no crescimento e no desenvolvimento do bebê, é necessário que a mãe adote um estilo de vida que resulte em uma microbiota saudável para ambos. 5

Recomenda-se a adoção de hábitos saudáveis mesmo antes da gravidez. Indubitavelmente, esse comportamento otimiza a saúde da mãe ao passo que previne riscos durante a gravidez, quando ela acontecer. A microbiota intestinal da mãe influencia na formação do trato gastrointestinal do bebê, e pode ser modulada através de uma dieta adequada e suplementada com prebióticos e probióticos. Conforme supracitado, é durante o parto vaginal e durante a amamentação que a criança adquire uma série de bactérias provenientes da mãe. 2-5

Uma microbiota e um sistema imune equilibrados resultam em um indivíduo saudável. A microbiota não nasce pronta, ela se desenvolve ao longo do tempo. Sua formação precisa ocorrer de maneira robusta desde o período gestacional até o decorrer da infância, para que ao longo da vida não cause, eventualmente, desequilíbrio ao sistema imune e ao funcionamento intestinal (com a presença de inflamações e alergias). A adoção de hábitos saudáveis, como uma dieta adequada suplementada com prebióticos e probioticos, é um cuidado que, se mantido até a vida adulta, refletirá de maneira positiva os mecanismos dos processos digestórios. Haverá uma melhor absorção de nutrientes e um ótimo desenvolvimento da resposta imune, além da modulação do metabolismo e da prevenção de doenças. 4

Referências

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2 – (ANGÉLICA DOS SANTOS PERBELIN, CAMILA VIEIRA DA SILVA, ENERI VIEIRA DE SOUZA LEITE MELLO, LARISSA CARLA LAUER SCHNEIDER, 2019). O papel da microbiota como aliada no sistema imunológico. 2019. Disponível em: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/ArqMudi/article/view/51557/751375149170. Acesso em: 21 set. 2020.

3 – (DÉBORA BORGES DE OLIVEIRA SILVA, EDUARDO HENRIQUE MENDES REZENDE, GUILHERME DO VALE BESSA, KAMYLLA BORGES SANTOS, ALINE DE ARAUJO FREITAS, 2019) Desenvolvimento da microbiota do recém-nascido e sua relação com o tipo de parto. 2019. Revista Educação em Saúde. Disponível em: http://periodicos.unievangelica.edu.br/index.php/educacaoemsaude/article/view/3789/2633. Acesso em: 21 set. 2020.

4 – (LU ZHUANG, HAIHUA CHEN, SHENG ZHANG, JIAHUI ZHUANG, QIUPING LI, ZHICHUN FENG). Microbiota intestinal na infância e suas implicações na saúde infantil. 2019. US National Library of Medicine National Institutes of Health. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6522475/. Acesso em: 21 set. 2020.

5 – (INDRIO F, MARTINI S, FRANCAVILLA R, CORVAGLIA L, CRISTOFORI, MASTROLIA SA, et al.) Epigenetic matters: the link between early nutrition, microbiome, and long-term health development. Front Pediatr. 2017; 5: 178.

A importância da microbiota na saúde do adulto.

A formação da microbiota do indivíduo é iniciada ainda intraútero e sofre modificações até o fim da vida. Essas alterações se devem a fatores ambientais, variações de idade, dieta, estilo de vida, higiene, terapia com antibióticos, etc. 2

Há cada vez mais evidências da participação da microbiota na manutenção da saúde e de sua relação com afecções intestinais e extraintestinais. A idade é um dos principais fatores determinantes para a modificação da microbiota humana, uma vez que qualquer alteração em seu balanço pode levar tanto a inflamações como a disfunções metabólicas. 3

O que é microbiota?

Diferente do microbioma, que é definido como o conjunto de microrganismos (e carga genética) que colonizam todo um meio natural, a microbiota se caracteriza por microrganismos que colonizam um ambiente específico. No caso da microbiota humana, considerando o intestino, classificamos a microbiota intestinal. 2

A microbiota em adultos e a sua importância.

A microbiota exerce diversas funções no organismo humano, direta ou indiretamente. Uma das funções mais importantes é a protetora, impedindo o desenvolvimento de patógenos através da atuação das bactérias não patogênicas. Outra atividade importante é a sua participação como suporte em funções do metabolismo do organismo, sintetizando vitaminas e facilitando sua absorção, assim como a de outros nutrientes e oligoelementos (conjunto de elementos químicos inorgânicos que são necessários aos seres humanos em pequenas quantidades e que desempenham diversas funções metabólicas no organismo). Além disso, a microbiota também auxilia as atividades do processo digestivo, produzindo enzimas que facilitam a digestão de alimentos. Um exemplo é a lactose: a microbiota age na diminuição dos sintomas de intolerância do organismo para este carboidrato com o auxílio da bactéria do gênero Lactobacillus. 1-3

Quando o indivíduo possui uma microbiota saudável, ou seja, quando existe um equilíbrio entre as bactérias boas, as ruins e o sistema imunológico ocorre a eubiose.

Uma vez em eubiose, antígenos “bons” são reconhecidos, havendo resposta saudável da mucosa intestinal com manutenção da produção de IgA, de muco e de defensinas,  permanecendo funcionantes, também, os tight junctions intestinais. Essa cascata de atividades garante, assim, uma permeabilidade intestinal intacta. 3

Por outro lado, quando há o predomínio de bactérias patogênicas ou quando há perda da diversidade bacteriana, o organismo entra em um processo conhecido como disbiose. Esse desbalanço da microbiota faz com que a mucosa intestinal não atue mais como uma promotora de um organismo saudável, uma vez que ocorre a diminuição da produção de muco, de IgA (anticorpo) e de defensinas. Este quadro permite a passagem de antígenos bacterianos alimentares, produtos bacterianos e outros microrganismos em geral. Como consequência, as células do sistema imune são atraídas para a mucosa intestinal, ocorrendo liberação de várias citocinas pró-inflamatórias, causando uma espécie de cascata de inflamações. 3

O fator envelhecimento também pode desencadear uma série de modificações da microbiota e de sua imunomodulação, fazendo com que o idoso esteja propenso a ter uma característica pró-inflamatória e o surgimento de doenças degenerativas. 3

Esse processo também pode ocorrer de forma parecida em pessoas obesas, com maior risco de afecções benignas e malignas. 3

O desequilíbrio da microbiota intestinal

A disbiose tem sido um distúrbio cada vez mais considerado no diagnóstico de diversas doenças. Em suas principais causas estão relacionadas1:

  • ao uso indiscriminado de antibióticos, que matam não só as bactérias nocivas como também as benéficas;
  • ao uso abusivo de laxantes;
  • ao excesso de alimentos processados;
  • a exposição às toxinas ambientais;
  • ao câncer;
  • a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS);
  • as disfunções hepatopancreáticas;
  • ao estresse e
  • a diverticulose (pequenas bolsas que se projetam fora da parede do intestino grosso).

Qualquer fármaco, além dos antibióticos, pode modificar a microbiota, tais como inibidores da bomba de prótons, antidepressivos, quimioterápicos, diuréticos e etc.1

As pessoas que possuem dificuldades intestinais com frequência podem ser acometidas por esse distúrbio, como é o caso da síndrome do intestino irritável. Dependendo da gravidade do quadro, perdem-se as funções normais do cólon com os sintomas de diarreias constantes.1

Atualmente, são poucas as doenças que não estão atreladas à disbiose, confirmando a importância do bom funcionamento da microbiota intestinal. Ressalta-se que ela mesma sintetiza vitaminas, principalmente as do complexo B e, em casos de anormalidade, a hipovitaminose (falta de vitamina B) pode surgir.1

Como manter a microbiota saudável

A alimentação é um agente modulador da microbiota do hospedeiro via modificação genética. As bactérias ingeridas através da alimentação podem intercambiar material genético com as bactérias intestinais de cada indivíduo, e, consequentemente, mudar suas funções. As alterações alimentares afetam rapidamente a microbiota, podendo ser benéficas ou não e, por isso, uma dieta saudável é importante. 3

Os prebióticos, que são fibras conhecidas como carboidratos não digeríveis, também exercem uma função importante como nutrientes para as bactérias intestinais, promovendo o crescimento das cepas bacterianas específicas, ou seja, para cada bactéria existe um prebiótico ideal.3

Uma vez fermentados pelas bactérias intestinais, os prebióticos geram a produção de ácidos graxos de cadeia curta, como o propionato, o acetato, o lactato e, principalmente, o butirato. Esse último possui a função essencial de favorecer a absorção de água e eletrólitos; coordenando a motilidade intestinal, a capacidade retal e a diferenciação intestinal. Sendo assim, restabelece a permeabilidade intestinal e apresenta efeitos anti-inflamatórios. 3

Evidências também mostram que a suplementação com probióticos modulam positivamente a composição e a atividade microbiana intestinal, provocando efeitos benéficos consideráveis sobre a saúde, reestabelecendo o equilíbrio dos microrganismos desse ambiente.

Os probióticos apresentam em sua composição microrganismos vivos que promovem o bom funcionamento da microbiota. 1-3

O intestino pode ser um grande aliado da saúde adulta. Portanto, acumular bons hábitos é também fortalecer o sistema gastrointestinal e consequentemente, vive-se com maior qualidade de vida e menos disposição para doenças. 1-3

Referências:

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[ Jon A. Vanderhoof, MD ]

Desenvolvimento do Microbioma Intestinal nas crianças e implicações ao longo da vida

[ Profa. Dra. Cristina Targa ]

Interação entre microbioma intestinal e imunidade

[ Prof. Dr. Bruno Paes Barreto ]