Tricíclicos e probióticos no tratamento da síndrome do intestino irritável 

A síndrome do intestino irritável é uma doença funcional, recorrente da interação do cérebro-intestino que pode causar dores abdominais recorrentes. Existem diversos tratamentos da SII, entre eles os antidepressivos tricíclicos e os probióticos.

Os Tricíclicos apresentam eficácia no controle geral dos sintomas, inibindo a recaptação da noradrenalina e serotonina, neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da dor e com uma melhora perceptível entre 4 e 12 semanas. Entre os tricíclicos utilizados para essa finalidade, o que apresenta melhor tolerabilidade sem afetar a eficácia é a nortriptilina.

Além disso, a SII é uma doença multifatorial, dentre eles, a alteração da microbiota e a disbiose. Sendo os probióticos recomendados para uma melhor modulação dessa microbiota e melhorando o processamento da conexão central e sistema nervoso entérico.

Acesse a vídeo aula feita pelo Dr. Gerson Domingues, Prof. Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Ciências Médicas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pela Dra. Maria do Carmo, Vice-presidente do Núcleo Br. para Estudo do H. pylori e ex-presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia e entenda mais sobre o assunto:

Diarreia associada ao uso de antibióticos

Vera Lúcia Ângelo Andrade

Graduação em Medicina pela UFMG em 1989 • Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek • Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia • Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein • Mestre e Doutora em Ciências com concentração em Patologia pela UFMG • Professora convidada do curso de pós graduação em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo e da Escola Brasileira de Osteopatia Belo Horizonte, Minas Gerais • Responsável pelo Setor de Motilidade da Clínica NUVEM BH http://lattes.cnpq.br/0589625731703512

O uso de antibióticos está associado a uma variedade de efeitos colaterais, sendo mais comuns aqueles relacionados ao trato gastrointestinal,  como náuseas e diarreia1.  Epidemiologicamente, um terço dos pacientes que usam antibiótico apresentarão diarreia durante o tratamento2. A diarreia associada a antibióticos geralmente surge quando esta medicação leva à disbiose intestinal induzida, alterando a diversidade e o número de bactérias no intestino1. Essas mudanças podem afetar a capacidade da microbiota residente de resistir à invasão de microrganismos patogênicos ou levar ao supercrescimento bacteriano do intestino delgado1.

A Figura a seguir ilustra como o uso de antibióticos pode levar a disbiose causando infecção pelo Clostridioides difficile2. 

Os fatores de risco para diarreia secundária a uso de antibióticos são idade (prematuros, menores de 6 e maiores de 65 anos), uso prolongado de antibiótico, tempo prolongado de utilização da medicação, hospitalização, imunodeficiência, entre outros. Destaca-se que independentemente da via de administração, oral ou venosa, os antibióticos poderão levar a diarreia2. Os antibióticos com maior risco de causarem diarreia na prática clínica são os de amplo espectro e destacam-se: amoxicilina (com e sem clavulanato), azitromicina, cefalosporinas, carbapenêmicos e clindamicina1,2. Segundo a literatura, a infecção por C. difficile responde por cerca de 10% a 20% dos casos de diarreia por uso de antibióticos2. O diagnóstico baseia-se na história clínica que incluiu uso recente de antibióticos. Na maioria dos casos não são necessários exames complementares. No entanto, na suspeita de infecção por C. difficile recomenda-se a realização da glutamato desidrogenase, seguida da pesquisa de toxinas A e B por ELISA e/ou o PCR em tempo real, também conhecido como teste de amplificação de ácidos nucléicos (nucleic acid amplification test – NAAT).

O tratamento da diarreia associada a antibióticos é um desafio, em especial em grupos de risco. Diversos estudos demonstraram a eficácia de probióticos na diarreia aguda e diarreia associada a antibióticos. Probióticos são microrganismos vivos que quando administrados em quantidades apropriadas oferecem benefícios à saúde do hospedeiro, segundo a Organização Mundial de Gastroenterologia e são regulados pela Food and Drug Administration desde 2007. Os probióticos mais estudados são: Lactobacillus rhamnosus GG e Saccharomyces boulardii, os quais podem encurtar a duração e sintomas da diarreia associada a antibióticos.

Na prevenção da diarreia por antibióticos os probióticos são indicados rotineiramente, tanto em crianças, quanto em adultos.3,4 Importantes diretrizes internacionais, como a diretriz do grupo de trabalho da Sociedade Europeia de Gastroenterologia Pediátrica – ESPGHAN e da Organização Mundial de Gastroenterologia, concluíram que o L. rhamnosus GG ou S. boulardii apresentam elevado grau de recomendação na prevenção da diarreia por antibióticos, sugerindo o uso adjuvante dos mesmos durante todo tratamento com antibióticos2,6.

Referências

  1. Agamennone, V., Krul, C.A.M., Rijkers, G. et al. A practical guide for probiotics applied to the case of antibiotic-associated diarrhea in The Netherlands. BMC Gastroenterol. 2018;18(1):103
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  3. Boggio Marzet C, et al. Approach to probiotics in pediatrics: the role of Lactobacillus rhamnosus GG. Arch Argent Pediatr. 2022;120(1):e1-e7.
  4. Hempel S, Newberry SJ, Maher AR, Wang Z, Miles JN, Shanman R, Johnsen B, Shekelle PG. Probiotics for the prevention and treatment of antibiotic-associated diarrhea: a systematic review and meta-analysis. JAMA. 2012;307(18):1959-69.
  5. Szajewska H, Canani RB, Guarino A, Hojsak I, Indrio F, Kolacek S, et al. Probiotics for the prevention of antibiotic-associated diarrhea in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;62(3):495-506.
  6. Guarner F, et al. WGO Practice Guideline. Probiotics and Prebiotics. World Gastroenterology Organisation, 2017; 1-35

Lactobacillus rhamnosus GG – tudo que você precisa saber

O Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) é uma das cepas mais estudadas e utilizadas na prática clínica mundial, além de ser dos pioneiros dentre os probióticos, descoberto a partir do seu isolamento fecal pelos pesquisadores Gorbach and Goldin por volta de 1985 e patenteado em 19891.  Desde então, diversos trabalhos apontam para os benefícios do uso do LGG® em doenças gastrointestinais, como diarreia associada a antibiótico, dor abdominal funcional, diarreia do viajante, síndrome do intestino irritável e gastroenterites agudas. Diversos estudos apontam para possibilidades de uso do LGG em patologias extraintestinais, como doenças respiratórias, neurológicas e dermatológicas2.

  • Afinal, o que é o LGG®?

LGG® é uma bactéria anaeróbia facultativa Gram-positiva do filo Firmicutes tipicamente associado a outros Lactobacillus spp. e microorganismos compondo a microbiota intestinal. Não é patogênica e pode ser encontrada em outros sítios, em menor proporção, como no trato urinário.  Ele atua na regulação e síntese de citocinas anti-inflamatórias, na modulação de citocinas pró-inflamatórias, na recaptação de serotonina, produção de anticorpos e regulação da permeabilidade, vindo daí seu potencial como adjuvante terapêutico3.

  • LGG® na prática clínica

Diversas são as entidades clínicas nas quais o uso do LGG® pode ser aplicado como terapia adjuvante para manejo. Dentre elas, destacam-se as abaixo:

  • Disbiose: o LGG® é uma escolha acertada, dentre os probióticos, para auxílio no manejo da disbiose através da prevenção ou do tratamento, especialmente após o uso prolongado de antibióticos, que gera um desequilíbrio da composição da microbiota e uma distribuição alterada de bactérias no intestino através da produção de substâncias antimicrobianas e modulação do sistema imunológico4.
  • Diarreia aguda: LGG® foi associado a uma redução significativa na duração da diarreia em diversos ensaios clínicos randomizados. Uma vez que o principal fator de gravidade associado a diarreia aguda é a desidratação, o uso do LGG tem impacto extremamente relevante, sendo recomendado pela Organização Mundial de Gastroenterologia e pela Sociedade Europeia de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica, concomitantemente à terapia de reidratação oral 5.
  • Diarreia associada ao uso de antibióticos: Essa é uma condição frequente e que, para sua ocorrência, depende de fatores do hospedeiro, do antibiótico utilizado e do contexto epidemiológico. Esse padrão de diarreia pode ocorrer durante o uso do antibiótico ou até semanas após o término da utilização. Há benefícios claros do uso do LGG® para amenizar os episódios de diarreia associada ao uso de antibióticos em um subgrupo de pacientes, com precisa indicação6.
  • Dor abdominal funcional – Síndrome do intestino irritável (SII): Essa condição está relacionada a alterações na motilidade gastrointestinal, hipersensibilidade visceral, disfunção do eixo cérebro-intestino e também pode estar associada a certos fatores psicossociais. Outro fator que pode sobrepor é a presença de disbiose. Sendo assim, há benefícios do uso de LGG® em alguns pacientes com SII ou dor abdominal funcional como terapia adjuvante, melhorando a resposta ao tratamento instituído. A indicação e o uso devem ser baseados nos sintomas e na história natural da doença em cada paciente.  Pacientes com outras dores abdominais funcionais também podem se beneficiar dessa terapia adjuvante7.
  • Infecção por H. pylori: O tratamento da infecção pelo H. pylori é realizado através do uso de antibioticoterapia associada ao uso de inibidor de bomba de prótons por um período determinado. No entanto, novos estudos apontam para a utilização de probióticos, dentre eles o LGG®, como forma de potencializar o efeito dos antibióticos e reduzir os efeitos colaterais associados ao tratamento, alcançando um melhor resultado terapêutico além de manter o equilíbrio da microbiota gastrointestinal8.
  • LGG em prevenção de Infecções do Trato Respiratório:  Diversos estudos emergem sobre a utilidade do LGG® para agravos extraintestinais, com destaque para as doenças respiratórias. Há estudos que apontam para evidências significativas em relação ao uso do LGG® para a prevenção de otite média aguda e infecções do trato respiratório superior, além de reduzir o uso de antibióticos em crianças voltadas para as infecções respiratórias9. Além disso, recentemente, alguns trabalhos sugeriram benefício na infecção por covid-19.
  • Dermatite atópica: Ainda são poucas em evidências sobre o uso dos probióticos como terapia preventiva e para o tratamento da dermatite atópica. Há diversas linhas de estudos recentes que exploram a interação entre pele e intestino. Esses estudos avaliam a suplementação de probióticos e seu potencial de modulação da composição microbiana intestinal, seja através da prevenção a colonização de patógenos, modulação do metabolismo bacteriano ou restauração do equilíbrio imunológico, o que pode contribuir para a diminuição da inflamação e melhora da manifestação clínica na dermatite atópica10.

Regulação do uso do Lactobacilius rhamnosus GG pela ANVISA

Através da instrução normativa – in nº 76, de 5 de novembro de 2020, houve a regulamentação do uso do LGG® no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) com a finalidade de comprovar a segurança e os benefícios do seu uso11.

Mensagem final

As perspectivas do uso do LGG® em doenças gastrointestinais e extraintestinais como terapia adjuvante é promissora. Diversos estudos direcionam para a utilização individualizada dos probióticos. As doses, escolha da cepa e duração do tratamento ainda é um ponto de discussão em diversas patologias. De qualquer forma, o uso do LGG® na prática clínica vem sendo encorajado nos últimos anos, sendo esse um dos probióticos mais estudados no mundo e altamente seguro.

Referências:

1. Doron, S., Snydman, D. R., & Gorbach, S. L. (2005). Lactobacillus GG: bacteriology and clinical applications. Gastroenterology clinics of North America, 34(3), 483–ix.

2. Tan-Lim, C., Esteban-Ipac, N., Recto, M., Castor, M., Casis-Hao, R. J., & Nano, A. (2021). Comparative effectiveness of probiotic strains on the prevention of pediatric atopic dermatitis: A systematic review and network meta-analysis. Pediatric allergy and immunology : official publication of the European Society of Pediatric Allergy and Immunology, 32(6), 1255–1270.

3. Pace, F., Pace, M., & Quartarone, G. (2015). Probiotics in digestive diseases: focus on Lactobacillus GG. Minerva gastroenterologica e dietologica, 61(4), 273–292.

4. Panpetch, W., Visitchanakun, P., Saisorn, W., Sawatpanich, A., Chatthanathon, P., Somboonna, N., Tumwasorn, S., & Leelahavanichkul, A. (2021). Lactobacillus rhamnosus attenuates Thai chili extracts induced gut inflammation and dysbiosis despite capsaicin bactericidal effect against the probiotics, a possible toxicity of high dose capsaicin. PloS one, 16(12), e0261189.

5. Li, Y. T., Xu, H., Ye, J. Z., Wu, W. R., Shi, D., Fang, D. Q., Liu, Y., & Li, L. J. (2019). Efficacy of Lactobacillus rhamnosus GG in treatment of acute pediatric diarrhea: A systematic review with meta-analysis. World journal of gastroenterology, 25(33), 4999–5016.

6. Guo, Q., Goldenberg, J. Z., Humphrey, C., El Dib, R., & Johnston, B. C. (2019). Probiotics for the prevention of pediatric antibiotic-associated diarrhea. The Cochrane database of systematic reviews, 4(4), CD004827.

7. Horvath, A., Dziechciarz, P., & Szajewska, H. (2011). Meta-analysis: Lactobacillus rhamnosus GG for abdominal pain-related functional gastrointestinal disorders in childhood. Alimentary pharmacology & therapeutics, 33(12), 1302–1310.

8. Ji, J., & Yang, H. (2020). Using Probiotics as Supplementation for Helicobacter pylori Antibiotic Therapy. International journal of molecular sciences, 21(3), 1136.

9. Liu, S., Hu, P., Du, X., Zhou, T., & Pei, X. (2013). Lactobacillus rhamnosus GG supplementation for preventing respiratory infections in children: a meta-analysis of randomized, placebo-controlled trials. Indian pediatrics, 50(4), 377–381.

10. Fang, Z., Li, L., Zhang, H., Zhao, J., Lu, W., & Chen, W. (2021). Gut Microbiota, Probiotics, and Their Interactions in Prevention and Treatment of Atopic Dermatitis: A Review. Frontiers in immunology, 12, 720393.

11.https://www.in.gov.br/web/dou/-/instrucao-normativa-in-n-76-de-5-de-novembro-de-2020-287508490 – acessado em 06 de Maio de 2022.

Uso do LGG (Lactobacillus rhamnosus GG) na redução dos dias de diarreia [Vídeo]

Os probióticos têm sido sugeridos como opção terapêutica e preventiva para uma grande variedade de doenças infantis. Revisões recentes na literatura mostram efeitos benéficos no tratamento diarreia associada a antibióticos, entercolite necrosante em recém-nascidos muito abaixo do peso, doença celíaca, entre outros.

No vídeo de hoje, a pediatra Roberto Castro comenta o uso do LGG na redução da diarreia. Quer saber mais? Aperte o play e assista!

Autor(a):

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

Dr. Pergunta x Dr. Responde – Uso do probiótico na visão do especialista

Este material aborda a visão de duas especialistas, uma Gastroenterologista pediátrica e outra gastroenterologista, trazendo perguntas e respostas sobre o uso de probióticos.

O emprego de probióticos é essencial no tratamento das doenças digestivas, sejam infamatórias, metabólicas, funcionais ou neoplásicas. As cepas probióticas têm sido muito utilizadas não apenas com finalidades terapêuticas, mas também profiláticas.

O LGG (Lactobacillus rhamnosus GG) é a cepa probiótica com maior número de estudos controlados e randomizados, mostrando-se mais tolerante do que outros probióticos às condições adversas do trato digestivo.

O LGG atua por diferentes mecanismos, sendo capaz de aumentar a barreira epitelial, aderir à mucosa intestinal, excluir microrganismos patógenos, produzir substâncias antimicrobianas e modulas o sistema imunológico. Possui ação potencial em pacientes com diarreia aguda, colite pseudomembranosa, síndrome do intestino irritável, doenças inflamatórias, infecções respiratórias, dermatite atópica, doenças do trato urogenital e neoplasias.

Conclui-se que a única maneira de melhorar a disbiose é intervir na microbiota para torná-la mais saudável e simbiótica. Probióticos, probióticos, simbióticos e posbióticos tem sido utilizados para manipular a composição da microbioma e formulações especificas são uma importante parte da medicina de prevenção e também do tratamento de algumas doenças.

Baixe o PDF abaixo para acessar o material completo:

Autoras:

Gastroenterologista pediátrica

Profa. Dra. Cristina Targa Ferreira – CRM-RS: 12.788

  • Doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
  • Especialista em Gastroenterologia Pediátrica, em Endoscopia Pediátrica e em Hepatologia pela Associação Médica Brasileira e Sociedades Médicas Brasileiras;
  • Chefe do Serviço de Gastroenterologia Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio – Complexo Hospitalar Santa Casa;
  • Professora adjunta de Gastroenterologia Pediátrica da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre;
  • Presidente do Departamento de Gastroenterologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Gastroenterologista

Profa. Dra. Maria do Carmo Friche Passos – CRM-MG: 18.599

  • Professora associada da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais;
  • Pós-doutorado em Gastroenterologia pela Universidade de Harvard;
  • Coordenadora do Departamento de Eventos Científicos da Federação Brasileira de Gastroenterologia;
  • Vice-presidente do Núcleo Brasileiro para Estudo do H. pylori;

Ex-presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologista

Por que o LGG na diarreia aguda? [Vídeo]

A diarreia aguda tem uma duração inferior a duas semanas e que em uma maioria dos casos está associada a etiologia infecciosa, ou seja, as gastroenterites agudas.

Assista o vídeo onde abordamos o papel do probiótico LGG nessa patologia.

Autor: Dr. Guilherme Grossi Cançado.

Residência médica em Clínica Médica e Gastroenterologia pelo HC-UFMG ⦁ Mestrado em saúde do adulto com ênfase em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da UFMG ⦁ Chefe da Gastrohepatologia do Hospital da Polícia Militar de Minas Gerais ⦁ Preceptor de hepatologia e clínica médica do HC-UFMG ⦁ Conteudista do Whitebook – área de Gastroenterologia e Hepatologia ⦁ Membro da AASLD, SBH, GEDIIB.

Probióticos Como Adjuvantes na Aquisição da Tolerância à APLV

Roberta Esteves Vieira de Castro, MD, MSc, PhD

O que é APLV?

APLV é a sigla para “alergia à proteína do leite de vaca” e pode ser considerada como um termo genérico para diferentes condições clínicas com sintomas, fisiopatologia e tratamento distintos1 iniciados após a introdução de leite de vaca na dieta2. Consiste em uma reação adversa a uma ou mais proteínas do leite de vaca, geralmente caseínas ou β-lactoglobulina do soro de leite, mediada por um ou mais mecanismos imunológicos3.

Em geral, a APLV se manifesta como uma variedade de manifestações clínicas que comumente se desenvolvem em bebês e podem regredir por volta dos 6 anos de idade4. É uma das alergias alimentares mais comuns na infância, com uma prevalência de 2–3% (dependendo da localização geográfica)5 e que vem crescendo globalmente ao longo dos últimos anos6. No Brasil, há poucos dados epidemiológicos. Em um estudo realizado em 2010 e que incluiu 9.478 pacientes avaliados por 30 gastroenterologistas pediátricos nas cinco regiões do país em um período de 40 dias, foi descrita uma prevalência de APLV suspeita em 5,4% da população estudada (513/9,478) sendo que a incidência encontrada foi de 2,2% (211/9,478)3,7.

A APLV é classificada em três tipos: mediada por imunoglobulina E (IgE), não mediada por IgE ou mista (mediada e não mediada por IgE). Na APLV mediada por IgE, ocorre por uma resposta imunomediada exacerbada a uma ou mais proteínas do leite de vaca. A exposição subsequente à (s) proteína (s) induz a reticulação de anticorpos IgE e a liberação de histaminas e outros mediadores imunológicos de mastócitos, que podem dar origem a quadros imediatos de urticária e angioedema. Essas reações mediadas por IgE são caracterizadas por manifestações alérgicas que ocorrem em uma a duas horas após a ingestão do alérgeno. Os sintomas não-IgE se manifestam dentro de horas a dias. Como as manifestações clínicas da APLV não mediada por IgE são uma reminiscência de outras manifestações alérgicas e não alérgicas na infância, diagnósticos tardios e errôneos são comuns. Nesse caso, o diagnóstico é baseado na história clínica, sintomas e exame físico, e confirmado pela remoção e reintrodução de leite de vaca na dieta1,2. A APLV se mantém, mais provavelmente, em doença mediada por IgE e quando existe uma sensibilização intensa, com níveis mais altos de IgE ou reações aos testes cutâneos fortemente positivas, inúmeras sensibilizações alimentares e alergia respiratória simultânea, como rinite e asma6

É importante destacar que a APLV deve ser diferenciada da intolerância ao leite, situação em que um mecanismo não imunológico está envolvido. Exemplos incluem a intolerância à lactose e a aversão ao leite ou intolerância psicológica. A intolerância à lactose não envolve o sistema imunológico, mas a deficiência de uma enzima para digerir a lactose. Assim, o diagnóstico de intolerância à lactose não envolve quaisquer parâmetros imunológicos, enquanto a doença relacionada ao sistema imunológico envolve marcadores imunológicos relevantes1

As manifestações alérgicas de APLV incluem urticária, angioedema, dor abdominal, vômitos, cólica, diarreia, sangue e/ou muco nas fezes, constipação intestinal ou congestão nasal. Algumas crianças apresentam dermatite atópica (DA) que não melhora com o tratamento, sendo que o eczema de início precoce resistente ao tratamento também pode ser uma apresentação de APLV, assim como a anafilaxia2.

A APLV se resolve de forma espontânea na maioria dos pacientes pediátricos. Entretanto, a indução da tolerância oral pode ser uma alternativa terapêutica em casos de alergia persistente, principalmente quando existe risco de ingestão acidental com reações graves subsequentes6. Dessa forma, a APLV pode ser uma imensa fonte de estresse parental e familiar devido a uma dieta com restrição de leite e pode levar a uma deficiência nutricional subsequente se não for tratada adequadamente4.

O que são probióticos e quais seus efeitos no tratamento de alergias?

Probióticos são definidos como microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem um benefício à saúde do hospedeiro8. Os probióticos modulam a estrutura e função da microbiota intestinal e interagem com os enterócitos através da diminuição da permeabilidade intestinal, aumentando a espessura do muco, estimulando a imunoglobulina A (IgA) secretora e produzindo defensina. Ademais, podem modular a resposta da citocina por células imunes e ajudar na prevenção de alergias9,10

Os probióticos foram implicados com sucesso na prevenção de algumas alergias, incluindo a prevenção da DA. A terapia probiótica também tem demonstrado desfechos positivos no tratamento da rinite e da DA, reduzindo a gravidade dos sintomas. Diferentes cepas de Lactobacillus spp. são conhecidas por desempenhar um papel importante na mediação da resposta imune devido ao aparecimento de estruturas supressoras de DNA específicas envolvidas na estimulação da imunidade10. Por exemplo, um recente estudo multicêntrico, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo que incluiu bebês com até dois anos de idade com DA e APLV concluiu que a administração de uma preparação probiótica contendo uma mistura de cepas de Lactobacillus rhamnosus ŁOCK 0900, Lactobacillus rhamnosus ŁOCK 0908 e Lactobacillus casei ŁOCK 0918 é segura e induz efeitos benéficos, especialmente em pacientes sensibilizados com alérgenos. Nesse estudo, a suplementação da dieta dos bebês com a preparação probiótica por três meses resultou em uma melhora significativa na gravidade dos sintomas de DA avaliada com o uso do índice SCORAD11

Em relação ao tratamento de alergias alimentares, os resultados são contraditórios e dependem do tipo específico de cepa probiótica e da duração do tratamento10

Probióticos no tratamento da APLV

Em 2018, no último Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) descrevem que há poucas evidências que suportem o uso de probióticos na prevenção ou no tratamento da alergia alimentar. Uma revisão sistemática realizada em 2019 demonstrou que as evidências atuais sobre os efeitos dos probióticos no manejo da APLV são limitadas e de baixa qualidade3,6,12,13

Entretanto, há estudos que apontam que a microbiota intestinal de bebês e crianças com APLV pode apresentar desequilíbrios9. Em crianças com sensibilização alimentar, o aumento da relação Enterobacteriaceae / Bacteroidaceae e uma diminuição da abundância de Ruminococcaceae foram descritos na literatura, sugerindo que a disbiose intestinal precoce contribui para o desenvolvimento subsequente de alergia alimentar. Com base nessa premissa, os probióticos têm ganhado grande atenção nos últimos anos como uma opção preventiva e terapêutica para essa condição, atuando como moduladores imunológicos que estimulam respostas mediadas por linfócitos T-helper 1 (Th1). As bactérias mais comumente usadas como probióticos pertencem às espécies Lactobacillus e Bifidobacterium. O  momento e a duração do tratamento com probióticos, as cepas probióticas ideais e os fatores que podem alterar sua ação na microbiota intestinal ainda não estão esclarecidos. Antes de propor cepas probióticas específicas para uso clínico, seria necessário explorar a capacidade dessas cepas de atingir o lúmen intestinal e modificar a microbiota intestinal do hospedeiro. Esse é um dos motivos pelos quais recomendações unívocas sobre probióticos ainda não foram elaboradas para a alergia alimentar, como a APLV14

Lactobacillus rhamnosus GG no tratamento da APLV em bebês

O pesquisador Roberto Berni Canani e sua equipe de Nápoles e Trieste, na Itália, têm demonstrado, em estudos clínicos, que bebês com APLV alimentados com fórmula contendo caseína extensivamente hidrolisada (FCEH) suplementada com a espécie bacteriana probiótica Lactobacillus rhamnosus GG (LGG), desenvolvem tolerância em taxas mais altas do que aqueles tratados com fórmula não probiótica. Inclusive, em estudo controlado randomizado que foi realizado em uma população bem característica de crianças com APLV mediada por IgE, os pesquisadores mostraram que o uso de FCEH associada a LGG é superior a FCEH isolada para a prevenção de manifestações alérgicas durante um período de 36 meses15.

Em estudos recentes, o LGG demonstrou ter potencial para afetar reações imunológicas e prevenir e tratar a inflamação alérgica. O LGG  coloniza o sistema intestinal e pode ser isolado nas fezes e seu efeito profilático e terapêutico do LGG foi demonstrado em bebês com doenças atópicas, especialmente a DA suscetível à APLV. Atualmente, o LGG tem sido usado em investigações clínicas em bebês prematuros e a termo nas doses entre 108 e 1010 unidades formadoras de colônias [UFC]16.

Referências

  1. Zepeda-Ortega B, Goh A, Xepapadaki P, Sprikkelman A, Nicolaou N, Hernandez REH, Latiff AHA, Yat MT, Diab M, Hussaini BA, Setiabudiawan B, Kudla U, van Neerven RJJ, Muhardi L, Warner JO. Strategies and Future Opportunities for the Prevention, Diagnosis, and Management of Cow Milk Allergy. Front Immunol. 2021 Jun 10;12:608372
  2. Martins R, Connolly MP, Minshall E. Cost-effectiveness Analysis of Hypoallergenic Milk Formulas for the Management of Cow’s Milk Protein Allergy in the United Kingdom. J Health Econ Outcomes Res. 2021 Aug 6;8(2):14-25
  3. Castro, REV (2019). Probióticos para alergia à proteína do leite de vaca: revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados. [publicação online]; 2019 [acesso em 08 de outubro de 2021]. Disponível em: https://pebmed.com.br/probioticos-para-alergia-a-proteina-do-leite-de-vaca-revisao-sistematica-de-ensaios-clinicos-randomizados/ 
  4. Edwards CW, Younus MA. Cow Milk Allergy. 2021 Jun 29. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan–. PMID: 31194400
  5. D’Auria E, Salvatore S, Acunzo M, Peroni D, Pendezza E, Di Profio E, Fiore G, Zuccotti GV, Verduci E. Hydrolysed Formulas in the Management of Cow’s Milk Allergy: New Insights, Pitfalls and Tips. Nutrients. 2021 Aug 12;13(8):2762
  6. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 – Parte 2 – Diagnóstico, tratamento e prevenção. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):39-82
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  9. Yang Y, Li X, Yang Y, Shoaie S, Zhang C, Ji B, Wei Y. Advances in the Relationships Between Cow’s Milk Protein Allergy and Gut Microbiota in Infants. Front Microbiol. 2021 Aug 16;12:716667
  10. Balta I, Butucel E, Mohylyuk V, Criste A, Dezmirean DS, Stef L, Pet I, Corcionivoschi N. Novel Insights into the Role of Probiotics in Respiratory Infections, Allergies, Cancer, and Neurological Abnormalities. Diseases. 2021 Sep 2;9(3):60
  11. Cukrowska B, Ceregra A, Maciorkowska E, Surowska B, Zegadło-Mylik MA, Konopka E, Trojanowska I, Zakrzewska M, Bierła JB, Zakrzewski M, Kanarek E, Motyl I. The Effectiveness of Probiotic Lactobacillus rhamnosus and Lactobacillus casei Strains in Children with Atopic Dermatitis and Cow’s Milk Protein Allergy: A Multicenter, Randomized, Double Blind, Placebo Controlled Study. Nutrients. 2021 Apr 1;13(4):1169
  12. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 – Parte 1 – Etiopatogenia, clínica e diagnóstico. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):7-38
  13. Qamer S, Deshmukh M, Patole S. Probiotics for cow’s milk protein allergy: a systematic review of randomized controlled trials. Eur J Pediatr. 2019 Aug;178(8):1139-1149
  14. Mennini M, Reddel S, Del Chierico F, Gardini S, Quagliariello A, Vernocchi P, Valluzzi RL, Fierro V, Riccardi C, Napolitano T, Fiocchi AG, Putignani L. Gut Microbiota Profile in Children with IgE-Mediated Cow’s Milk Allergy and Cow’s Milk Sensitization and Probiotic Intestinal Persistence Evaluation. Int J Mol Sci. 2021 Feb 6;22(4):1649. doi: 10.3390/ijms22041649
  15. Berni Canani R, Di Costanzo M, Bedogni G, Amoroso A, Cosenza L, Di Scala C, Granata V, Nocerino R. Extensively hydrolyzed casein formula containing Lactobacillus rhamnosus GG reduces the occurrence of other allergic manifestations in children with cow’s milk allergy: 3-year randomized controlled trial. J Allergy Clin Immunol. 2017 Jun;139(6):1906-1913.e4
  16. Basturk A, Isik İ, Atalay A, Yılmaz A. Investigation of the Efficacy of Lactobacillus rhamnosus GG in Infants With Cow’s Milk Protein Allergy: a Randomised Double-Blind Placebo-Controlled Trial. Probiotics Antimicrob Proteins. 2020 Mar;12(1):138-143

Como escolher a CEPA probiótica ideal para a manutenção da saúde gastrointestinal?

O termo probiótico é originado do grego e significa “para a vida” ou “em prol da vida”. Segundo a Organização Mundial da Saúde são microrganismos vivos que quando administrados em quantidades adequadas determinam benefícios à saúde do hospedeiro. Os microrganismos devem estar vivos desde a produção até a utilização, o gênero e cepa devem ter sido identificados laboratorialmente e devem ser comprovadamente eficazes em humanos, além de resistirem ao ácido e bile no tubo digestório, por exemplo.  

A suplementação de microrganismos benéficos pode ser uma ferramenta para manutenção e restauração do equilíbrio intestinal. Entretanto, qual cepa indicar? Algumas reflexões precisam ser realizadas para responder a estas questões.  

O que é cepa probiótica? 

A cepa do probiótico é identificada por um laboratório, catalogada pelo gênero, espécie e linhagem.  A importância de se definir uma cepa é que os estudos não são intercambiáveis, ou seja, só são válidos para a cepa e concentração pesquisada. 

Quais são os probióticos mais usados na Gastroenterologia? 

Há vários exemplos de probióticos e entre eles citam-se os Lactobacillus (L. rhamnosusL. reuteriL. casei), Bifidobacterium (B. lactisB. bifidumB.  infantis e B. animalis) e Saccharomyces.   

Kefir, Kombucha, leite fermentados e similares podem ser considerados probióticos? 

Não podemos afirmar que Kefir ou Kombucha sejam realmente probióticos, uma vez que apresentam grande diversidade de produção, e poucos estudos de efetividade e/ou rastreabilidade de cepas. Por outro lado, os leites fermentados, podem ser considerados probióticos por conterem o Lactobacillus casei variedade Shirota em quantidade mensuráveis, capaz de atravessar os sucos digestivos e chegar vivo e em grande quantidade aos intestinos. 

Qual cepa devo escolher e qual dose devo usar? 

Quando procuramos na internet, nos deparamos com diversos produtos probióticos “naturais”, manipulados ou comerciais, e aí surge um grande questionamento: qual devemos escolher? Como saber como cada formulação irá agir em nosso organismo?  

O primeiro passo para uma prescrição adequada é conhecer o motivo do uso do probiótico. Um mesmo probiótico pode ser útil para diarreia aguda, constipação, cólica do lactente, modulação do eixo cérebro-intestino e, também, tratar dermatite atópica? A resposta com certeza é não; isso não seria um probiótico, mas sim uma panaceia.  

O Consenso Asiático-Pacífico sobre uso de probióticos propõe que a escolha da cepa de probiótico deva se basear no tipo de doença do trato gastrointestinal e local de residência do paciente, conforme tabela abaixo. 

Resumidamente, na América Latina, incluindo o Brasil: o uso do Saccharomyces boulardii e Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) foram fortemente recomendados como adjuvantes à terapia de reidratação oral para gastroenterite. Lactobacillus reuteri também pode ser considerado. Os probióticos podem ainda ser prescritos para a prevenção da diarreia associada a antibióticos (L. rhamnosus GG (LGG®) ou S. boulardii); Diarreia induzida por Clostridium difficile (S.boulardii); diarreia nosocomial (L. rhamnosus GG (LGG®)) e na cólica infantil (L. reuteri).  

Segundo o IV Consenso Brasileiro da Infecção por Helicobacter pylori os probióticos não estão indicados de rotina no tratamento adjuvante desta bactéria. Entretanto, estudos com a cepa LGG® sugerem que os probióticos na terapia tríplice para o H. pylori podem ser importantes para evitar a diarreia associada aos antibióticos. Em um segundo momento, precisamos conhecer com segurança o laboratório que produz a cepa e a existência de estudos prévios avaliando sua efetividade em humanos.  

Por isso, a manipulação indiscriminada, apesar de geralmente ter um menor custo, pode não ser adequada. Além disso, é importante destacar que combinações não testadas de microrganismos podem impactar na eficácia do probiótico. Finalmente, é fundamental saber que a dose a ser prescrita deve ser aquela validada cientificamente, a qual pode variar de 1 a 110 bilhões de unidades formadoras de colônias/dose. Ressalte-se também que quantidade não está diretamente relacionada com a efetividade. Algumas cepas têm resultados em níveis mais baixos, enquanto outras exigem maiores quantidades.  

Concluímos que não há uma cepa ideal para todas as condições patológicas do trato gastrointestinal,  por tanto devem-se priorizar cepas com grande número de evidências científicas pelo mundo, como por exemplo o LGG®.  

Autor(a): Vera Lucia Angelo Andrade 

Graduação em Medicina pela UFMG em 1989 • Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek • Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia • Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein • Mestre e Doutora em Patologia pela UFMG • Responsável pelo Setor de Motilidade da Clínica SEDIG BH desde 1995 • http://lattes.cnpq.br/0589625731703512 

Referências bibliográficas:  

  • Cameron D, Hock QS, Kadim M, Mohan N, Ryoo E, Sandhu B, Yamashiro Y, Jie C, Hoekstra H, Guarino A. Probiotics for gastrointestinal disorders: proposed recommendations for children of the Asia-Pacific region. World J Gastroenterol. 2017; 23(45):7952-7964. 
  • Su GL, Ko CW, Bercik P, Falck-Ytter Y, Sultan S, Weizman AV, Morgan RL. AGA Clinical practice guidelines on the role of probiotics in the management of gastrointestinal disorders. Gastroenterology. 2020;159(2):697-705 
  • Documento de Consenso sobre la microbiota y el uso de probióticos/prebióticos en patologías neurológicas y psiquiátricas. https://www.sen.es/pdf/2021/Consenso_Microbiota_2021.pdf. Acessado em maio de 2021 
  • Wang Y, Jiang Y, Deng Y, Yi C, Wang Y, Ding M, Liu J, Jin X, Shen L, He Y, Wu X, Chen X, Sun C, Zheng M, Zhang R, Ye H, An H, Wong A. Probiotic supplements: hope or hype? Front Microbiol. 2020 Feb 28;11:160.  
  • Coelho LGV, Marinho JR, Genta R, Ribeiro LT, Passos MDCF, Zaterka S, Assumpção PP, Barbosa AJA, Barbuti R, Braga LL, Breyer H, Carvalhaes A, Chinzon D, Cury M, Domingues G, Jorge JL, Maguilnik I, Marinho FP, Moraes-Filho JP, Parente JML, Paula-E-Silva CM, Pedrazzoli-Júnior J, Ramos AFP, Seidler H, Spinelli JN, Zir JV. IVth Brazilian Consensus Conference on Helicobacter pylori infection. Arq Gastroenterol. 2018; 55(2):97-121. 

Qual é o papel dos probióticos na diarreia por antibióticos?

Um assunto recorrente entre os pediatras é a diarreia causada pelo uso de antibióticos, por este motivo em setembro de 2018 a Sociedade Brasileira de Pediatria divulgou um conteúdo sobre o tema.

Sabemos que o uso do antibiótico causa um desequilíbrio da microbiota intestinal e por consequência cerca de 30% dos pacientes em antibioticoterapia apresentarão diarreia em algum momento do tratamento ou até oito semanas após seu término. A via de administração, seja via oral ou intravenosa, não interfere neste processo, sendo ambas capazes de levar à diarreia. Os antimicrobianos mais associados a esta patologia são: amoxicilina, associada ou não a clavulanato, cefalosporinas e clindamicina.

Podemos salientar alguns fatores de risco como menores de seis anos e maiores de 65 anos, prematuridade, uso prolongado do antimicrobiano, maior tempo de hospitalização, imunodeficiência e episódios prévios de diarreia por antibiótico.

A grande importância deste tema se deve ao fato de que o Clostridium difficile é o agente causador em cerca de 10 a 20% dos casos e também o responsável pela maioria das complicações graves relacionadas.

Diante destes fatos, o uso de probióticos durante a antibioticoterapia poderia ser uma forma de evitar a ocorrência da diarreia. A Sociedade Europeia de Gastroenterologia Pediatria publicou recentemente uma revisão que recomenda o uso do Lactobacillus rhamnosus GG (LGG) e o Saccharomyces boulardii para evitar a diarreia por antibióticos, e mais especificamente o uso de Saccharomyces boulardii para prevenir a diarreia por Clostridium difficiles.

No Brasil, o Lactobacillus rhamnosus ainda não é comercializado, o que dificulta seu uso rotineiro pelo pediatra.
Portanto, o uso dos probióticos mencionados acima seria benéfico para prevenir a diarreia causada pelos antibióticos, sendo recomendado seu uso a partir do início do tratamento até o fim da sua administração.

Fonte: PEBMED – https://pebmed.com.br/qual-o-papel-dos-probioticos-na-diarreia-por-antibioticos/

Autora: Carolina Monteiro

Formada em Medicina pela UNIGRANRIO ⦁ Pediatra pelo Hospital Municipal Salgado Filho ⦁ Neonatologista pelo Hospital Federal de Bonsucesso ⦁ Telefone do consultório: (21) 38021656

Alguns impactos da Covid-19 sob a perspectiva gastrointestinal

A promoção e a proteção da saúde são os pilares para que o organismo tenha condições de se desenvolver e de atravessar problemas graves sem sequelas, como no caso de uma pandemia viral. A adoção de hábitos saudáveis regulares contribui para a manutenção da qualidade de vida e para a prevenção de doenças em geral. Dado o período de quarentena, seguir uma rotina de estudos e/ou trabalho em casa, com planejamento que envolva disciplina de horários – tanto para as atividades como para o descanso –, com a adoção de uma alimentação balanceada atua preventivamente no bom funcionamento do organismo, no que diz respeito ao fortalecimento dos sistemas como o respiratório, gastrointestinal e imunológico.1

A organização dos horários e o estabelecimento de uma rotina são essenciais para uma maior produção no ambiente do lar, o “home office”. A adoção de uma lista de tarefas com prazos para cumprimento de atividades, por exemplo, auxilia no que se refere à eficácia do estudo e do trabalho em casa.2,3

Hábitos alimentares saudáveis, da mesma forma, contribuem preventivamente para a melhora da qualidade de vida e para o fortalecimento dos sistemas do organismo. Em tempos de pandemia, é preciso manter a disciplina e respeitar o intervalo regrado entre as refeições, além da escolha de alimentos balanceados que são consumidos diariamente.6 

O sistema gastrointestinal, em linhas gerais, é responsável pela absorção de nutrientes, mas também atua em funções imunológicas. Nesse quadro, o seguimento dos comportamentos citados atua no fortalecimento da microbiota intestinal e mantém adequadamente sua essencial atividade metabólica.6 

Da perspectiva específica da saúde gastrointestinal, a microbiota se estabelece desde cedo na vida, e a sua composição é influenciada por diversos fatores, como a alimentação que adotamos. A microbiota intestinal e os componentes da dieta alimentar exercem funções elementares no funcionamento do sistema imunológico: as células da mucosa intestinal constituem a maior porcentagem de células imunes do organismo. A má nutrição e a deficiência alimentar podem perturbar a homeostase intestinal, agravando doenças inflamatórias intestinais em indivíduos suscetíveis, como nos casos daqueles infectados pelo SARS-CoV-2.6

A ciência já oferece alguns dados embasados sobre os aspectos gastrointestinais em pacientes infectados pelo SARS-CoV-2. Estudos de metanálise e dados de pacientes destacam prevalência de manifestações gastrointestinais e eliminação de fezes contaminadas por vírus. O sintoma inicial da infecção pode ser diarreia, a qual é muitas vezes acompanhada de manifestações respiratórias altas.  Em determinados casos, entretanto, a diarreia pode preceder os outros sintomas e, nesses casos, a doença pode apresentar sintomas gastrintestinais que antecedem os respiratórios. Os sintomas predominantes da SARS-CoV-2 são respiratórios, mas manifestações gastrointestinais também podem ocorrer e eventualmente não serem lembradas.4,5

Trabalho recentemente publicado na revista Radiology destaca aspectos intestinais nesses pacientes. Foram realizados exames de imagem como ultrassonografias, tomografias computadorizadas e ressonância magnética. Os achados encontrados incluíram, no sistema gastrointestinal, espessamentos e indicações de isquemia como pneumatose e presença de gás no sistema portal. 4,5 

Segundo os investigadores, as anormalidades de COVID-19 foram mais comuns nos pacientes mais graves, na UTI. Também ressaltaram que a prevenção da transmissão fecal-oral do COVID-19 é, portanto, crucial.4,5

As bactérias comensais que habitam o intestino exercem funções críticas na digestão de alimentos. Em casos de alimentação desbalanceada, por exemplo, a disbiose gerada pode ser corrigida e a composição da microbiota restaurada através da introdução de bactérias probióticas capazes de devolver o equilíbrio homeostático das funções imunológicas do intestino, e até de exercer atividades anti-inflamatórias em várias doenças tais como alergias, doenças inflamatórias crônicas do intestino e, principalmente, diarreias, epidemiologicamente classificadas como os principais desequilíbrios do sistema gastrointestinal.6

Bactérias probióticas foram estudadas para que se analisasse sua capacidade de influenciar a resposta imune inata das células epiteliais intestinais. Esses estudos mostram que a estimulação de vias de sinalização específicas entre as bactérias probióticas e as células do epitélio intestinal pode ajudar a explicar as propriedades benéficas destes probióticos frente ao fortalecimento e à atuação consistente do sistema imunológico.7

Referências

1 – Ministério da Saúde. Guia Alimentar da População Brasileira. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf. Acesso em: 10 out. 2020.

2 – Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Ergonomia. Disponível em: https://www.ufms.br/especialista-da-dicas-de-ergonomia-em-home-office/. Acesso em: 10 out. 2020.

3 – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Dispo Dicas de ergonomia proporcionam conforto e saúde no home Office. Disponível em: https://www.pucrs.br/blog/dicas-de-ergonomia-proporcionam-conforto-e-saude-no-home-office/. Acesso em: 10 out. 2020.

4 – FBG – Federação Brasileira de Gastroenterologia. Serviço Especial Covid-19. Edição 8. Disponível em: http://fbg.org.br/Publicacoes/noticia/detalhe/1336/. Acesso em: 21 out. 2020.

5 – FBG – Federação Brasileira de Gastroenterologia. Serviço Especial Covid-19. Edição 7. Disponível em:  http://fbg.org.br/Publicacoes/Noticia/detalhe/1333/. Acesso em: 21 out. 2020.

6 – FBG – Federação Brasileira de Gastroenterologia. O Intestino e o Sistema Imune. Disponível em: https://sbi.org.br/2019/04/29/o-intestino-e-o-sistema-imune/. Acesso em: 21 out. 2020.

7 – María G Vizoso PintoManuel Rodriguez GómezStephanie SeifertBernhard WatzlWilhelm H HolzapfelCharles M A P Franz. International Journal of Food Microbiol. Lactobacilli stimulate the innate immune response and modulate the TLR expression of HT29 intestinal epithelial cells in vitro. 2009 Jul 31; 133 (1-2): 86-93