Lactobacillus rhamnosus GG – tudo que você precisa saber

O Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) é uma das cepas mais estudadas e utilizadas na prática clínica mundial, além de ser dos pioneiros dentre os probióticos, descoberto a partir do seu isolamento fecal pelos pesquisadores Gorbach and Goldin por volta de 1985 e patenteado em 19891.  Desde então, diversos trabalhos apontam para os benefícios do uso do LGG® em doenças gastrointestinais, como diarreia associada a antibiótico, dor abdominal funcional, diarreia do viajante, síndrome do intestino irritável e gastroenterites agudas. Diversos estudos apontam para possibilidades de uso do LGG em patologias extraintestinais, como doenças respiratórias, neurológicas e dermatológicas2.

  • Afinal, o que é o LGG®?

LGG® é uma bactéria anaeróbia facultativa Gram-positiva do filo Firmicutes tipicamente associado a outros Lactobacillus spp. e microorganismos compondo a microbiota intestinal. Não é patogênica e pode ser encontrada em outros sítios, em menor proporção, como no trato urinário.  Ele atua na regulação e síntese de citocinas anti-inflamatórias, na modulação de citocinas pró-inflamatórias, na recaptação de serotonina, produção de anticorpos e regulação da permeabilidade, vindo daí seu potencial como adjuvante terapêutico3.

  • LGG® na prática clínica

Diversas são as entidades clínicas nas quais o uso do LGG® pode ser aplicado como terapia adjuvante para manejo. Dentre elas, destacam-se as abaixo:

  • Disbiose: o LGG® é uma escolha acertada, dentre os probióticos, para auxílio no manejo da disbiose através da prevenção ou do tratamento, especialmente após o uso prolongado de antibióticos, que gera um desequilíbrio da composição da microbiota e uma distribuição alterada de bactérias no intestino através da produção de substâncias antimicrobianas e modulação do sistema imunológico4.
  • Diarreia aguda: LGG® foi associado a uma redução significativa na duração da diarreia em diversos ensaios clínicos randomizados. Uma vez que o principal fator de gravidade associado a diarreia aguda é a desidratação, o uso do LGG tem impacto extremamente relevante, sendo recomendado pela Organização Mundial de Gastroenterologia e pela Sociedade Europeia de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica, concomitantemente à terapia de reidratação oral 5.
  • Diarreia associada ao uso de antibióticos: Essa é uma condição frequente e que, para sua ocorrência, depende de fatores do hospedeiro, do antibiótico utilizado e do contexto epidemiológico. Esse padrão de diarreia pode ocorrer durante o uso do antibiótico ou até semanas após o término da utilização. Há benefícios claros do uso do LGG® para amenizar os episódios de diarreia associada ao uso de antibióticos em um subgrupo de pacientes, com precisa indicação6.
  • Dor abdominal funcional – Síndrome do intestino irritável (SII): Essa condição está relacionada a alterações na motilidade gastrointestinal, hipersensibilidade visceral, disfunção do eixo cérebro-intestino e também pode estar associada a certos fatores psicossociais. Outro fator que pode sobrepor é a presença de disbiose. Sendo assim, há benefícios do uso de LGG® em alguns pacientes com SII ou dor abdominal funcional como terapia adjuvante, melhorando a resposta ao tratamento instituído. A indicação e o uso devem ser baseados nos sintomas e na história natural da doença em cada paciente.  Pacientes com outras dores abdominais funcionais também podem se beneficiar dessa terapia adjuvante7.
  • Infecção por H. pylori: O tratamento da infecção pelo H. pylori é realizado através do uso de antibioticoterapia associada ao uso de inibidor de bomba de prótons por um período determinado. No entanto, novos estudos apontam para a utilização de probióticos, dentre eles o LGG®, como forma de potencializar o efeito dos antibióticos e reduzir os efeitos colaterais associados ao tratamento, alcançando um melhor resultado terapêutico além de manter o equilíbrio da microbiota gastrointestinal8.
  • LGG em prevenção de Infecções do Trato Respiratório:  Diversos estudos emergem sobre a utilidade do LGG® para agravos extraintestinais, com destaque para as doenças respiratórias. Há estudos que apontam para evidências significativas em relação ao uso do LGG® para a prevenção de otite média aguda e infecções do trato respiratório superior, além de reduzir o uso de antibióticos em crianças voltadas para as infecções respiratórias9. Além disso, recentemente, alguns trabalhos sugeriram benefício na infecção por covid-19.
  • Dermatite atópica: Ainda são poucas em evidências sobre o uso dos probióticos como terapia preventiva e para o tratamento da dermatite atópica. Há diversas linhas de estudos recentes que exploram a interação entre pele e intestino. Esses estudos avaliam a suplementação de probióticos e seu potencial de modulação da composição microbiana intestinal, seja através da prevenção a colonização de patógenos, modulação do metabolismo bacteriano ou restauração do equilíbrio imunológico, o que pode contribuir para a diminuição da inflamação e melhora da manifestação clínica na dermatite atópica10.

Regulação do uso do Lactobacilius rhamnosus GG pela ANVISA

Através da instrução normativa – in nº 76, de 5 de novembro de 2020, houve a regulamentação do uso do LGG® no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) com a finalidade de comprovar a segurança e os benefícios do seu uso11.

Mensagem final

As perspectivas do uso do LGG® em doenças gastrointestinais e extraintestinais como terapia adjuvante é promissora. Diversos estudos direcionam para a utilização individualizada dos probióticos. As doses, escolha da cepa e duração do tratamento ainda é um ponto de discussão em diversas patologias. De qualquer forma, o uso do LGG® na prática clínica vem sendo encorajado nos últimos anos, sendo esse um dos probióticos mais estudados no mundo e altamente seguro.

Referências:

1. Doron, S., Snydman, D. R., & Gorbach, S. L. (2005). Lactobacillus GG: bacteriology and clinical applications. Gastroenterology clinics of North America, 34(3), 483–ix.

2. Tan-Lim, C., Esteban-Ipac, N., Recto, M., Castor, M., Casis-Hao, R. J., & Nano, A. (2021). Comparative effectiveness of probiotic strains on the prevention of pediatric atopic dermatitis: A systematic review and network meta-analysis. Pediatric allergy and immunology : official publication of the European Society of Pediatric Allergy and Immunology, 32(6), 1255–1270.

3. Pace, F., Pace, M., & Quartarone, G. (2015). Probiotics in digestive diseases: focus on Lactobacillus GG. Minerva gastroenterologica e dietologica, 61(4), 273–292.

4. Panpetch, W., Visitchanakun, P., Saisorn, W., Sawatpanich, A., Chatthanathon, P., Somboonna, N., Tumwasorn, S., & Leelahavanichkul, A. (2021). Lactobacillus rhamnosus attenuates Thai chili extracts induced gut inflammation and dysbiosis despite capsaicin bactericidal effect against the probiotics, a possible toxicity of high dose capsaicin. PloS one, 16(12), e0261189.

5. Li, Y. T., Xu, H., Ye, J. Z., Wu, W. R., Shi, D., Fang, D. Q., Liu, Y., & Li, L. J. (2019). Efficacy of Lactobacillus rhamnosus GG in treatment of acute pediatric diarrhea: A systematic review with meta-analysis. World journal of gastroenterology, 25(33), 4999–5016.

6. Guo, Q., Goldenberg, J. Z., Humphrey, C., El Dib, R., & Johnston, B. C. (2019). Probiotics for the prevention of pediatric antibiotic-associated diarrhea. The Cochrane database of systematic reviews, 4(4), CD004827.

7. Horvath, A., Dziechciarz, P., & Szajewska, H. (2011). Meta-analysis: Lactobacillus rhamnosus GG for abdominal pain-related functional gastrointestinal disorders in childhood. Alimentary pharmacology & therapeutics, 33(12), 1302–1310.

8. Ji, J., & Yang, H. (2020). Using Probiotics as Supplementation for Helicobacter pylori Antibiotic Therapy. International journal of molecular sciences, 21(3), 1136.

9. Liu, S., Hu, P., Du, X., Zhou, T., & Pei, X. (2013). Lactobacillus rhamnosus GG supplementation for preventing respiratory infections in children: a meta-analysis of randomized, placebo-controlled trials. Indian pediatrics, 50(4), 377–381.

10. Fang, Z., Li, L., Zhang, H., Zhao, J., Lu, W., & Chen, W. (2021). Gut Microbiota, Probiotics, and Their Interactions in Prevention and Treatment of Atopic Dermatitis: A Review. Frontiers in immunology, 12, 720393.

11.https://www.in.gov.br/web/dou/-/instrucao-normativa-in-n-76-de-5-de-novembro-de-2020-287508490 – acessado em 06 de Maio de 2022.

Uso do LGG (Lactobacillus rhamnosus GG) na redução dos dias de diarreia [Vídeo]

Os probióticos têm sido sugeridos como opção terapêutica e preventiva para uma grande variedade de doenças infantis. Revisões recentes na literatura mostram efeitos benéficos no tratamento diarreia associada a antibióticos, entercolite necrosante em recém-nascidos muito abaixo do peso, doença celíaca, entre outros.

No vídeo de hoje, a pediatra Roberto Castro comenta o uso do LGG na redução da diarreia. Quer saber mais? Aperte o play e assista!

Autor(a):

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

Probióticos na dermatologia [Vídeo]

Neste vídeo, o Dr. Luiz Gameiro fala sobre o uso de probióticos na dermatologia.

Por acaso você já ouviu dizer que “somos”, em termos quantitativos, mais bactérias do que humanos?

Temos em nossos organismos cerca de 10 trilhões de células, mas temos mais de 100 milhões de microrganismos vivendo principalmente no trato gastrointestinal, sendo a grande maioria bactérias.

E qual é a interação destes microrganismos com o corpo humano?

Todo o revestimento da pele e das mucosas apresenta inúmeras bactérias, fungos e vírus vivendo em constante harmonia, e este equilíbrio é o que traz a saúde e a manutenção de um organismo saudável.

E qual a origem desses microrganismos?

Tudo começa ainda no período intrauterino, principalmente durante o parto, dependendo da modalidade escolhida.  Em partos cesárias, o contato das bactérias que esse bebê tem logo nos primeiros segundos de vida, é com as bactérias da pele, visto que a cabeça e o corpo do bebê tem contato com as bactérias da flora bacteriana cutânea, que é totalmente diferente da flora da mucosa do trato genital urinário e do trato gastrointestinal. Logo em seguida o neném tem contato com a pele da mãe e também com a amamentação natural exclusiva, fazendo com que os primeiros 1.000 dias de vida sejam essenciais para a modulação da microbiota intestinal e cutânea.

E como é a microbiota cutânea?

A pele em si é um órgão extenso e a colonização destes microrganismos dependem do hospedeiro, do ambiente em que ele vive, exposições previas (Exemplo: tipo de vacinação, uso de antibióticos), e tudo isso molda esse microbioma de forma a ele ser mais ou menos diverso.

As alterações dermatológicas como: urticárias, eczema atópico, dermatites variadas e infecções como a acne estão diretamente relacionadas à disbiose.

E qual a relação entre a microbiota do intestino e a dermatite atópica? (Eixo intestino-pele)

A dermatite atópica é uma das condições dermatológicas mais comuns nos consultórios, que ocorre através de pele seca, prurido, manchas eritematosas, liquenificadas e este desconforto que favorece não só infecções como também outras alergias como alergias alimentares. Essa suposta interligação entre intestino e pele é atribuída ao papel de modulação da resposta imunológica pela MI, o que pode auxiliar na prevenção e no tratamento de doenças de fundo alérgico e imunológico. 

O papel dos probióticos no tratamento da DA ainda não é completamente esclarecido, além do que a microbiota intestinal dos pacientes atópicos parece ser, de fato, diferente dos indivíduos não-alérgicos. Dentre os diversos probióticos avaliados no contexto da DA, o Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) é uma das cepas mais bem estudadas, com uma quantidade considerável de evidências correlacionando esses assuntos. 

Diante da possibilidade de prevenir o surgimento da DA e de melhorar seu controle clínico de forma segura, o uso de probióticos – sendo o LGG® um dos mais amplamente estudados – tem se mostrado útil no manejo da doença.

Assista o vídeo completo para entender todos os tópicos sobre o uso de probióticos na dermatologia.

Dr. Pergunta x Dr. Responde – Uso do probiótico na visão do especialista

Este material aborda a visão de duas especialistas, uma Gastroenterologista pediátrica e outra gastroenterologista, trazendo perguntas e respostas sobre o uso de probióticos.

O emprego de probióticos é essencial no tratamento das doenças digestivas, sejam infamatórias, metabólicas, funcionais ou neoplásicas. As cepas probióticas têm sido muito utilizadas não apenas com finalidades terapêuticas, mas também profiláticas.

O LGG (Lactobacillus rhamnosus GG) é a cepa probiótica com maior número de estudos controlados e randomizados, mostrando-se mais tolerante do que outros probióticos às condições adversas do trato digestivo.

O LGG atua por diferentes mecanismos, sendo capaz de aumentar a barreira epitelial, aderir à mucosa intestinal, excluir microrganismos patógenos, produzir substâncias antimicrobianas e modulas o sistema imunológico. Possui ação potencial em pacientes com diarreia aguda, colite pseudomembranosa, síndrome do intestino irritável, doenças inflamatórias, infecções respiratórias, dermatite atópica, doenças do trato urogenital e neoplasias.

Conclui-se que a única maneira de melhorar a disbiose é intervir na microbiota para torná-la mais saudável e simbiótica. Probióticos, probióticos, simbióticos e posbióticos tem sido utilizados para manipular a composição da microbioma e formulações especificas são uma importante parte da medicina de prevenção e também do tratamento de algumas doenças.

Baixe o PDF abaixo para acessar o material completo:

Autoras:

Gastroenterologista pediátrica

Profa. Dra. Cristina Targa Ferreira – CRM-RS: 12.788

  • Doutora em Gastroenterologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
  • Especialista em Gastroenterologia Pediátrica, em Endoscopia Pediátrica e em Hepatologia pela Associação Médica Brasileira e Sociedades Médicas Brasileiras;
  • Chefe do Serviço de Gastroenterologia Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio – Complexo Hospitalar Santa Casa;
  • Professora adjunta de Gastroenterologia Pediátrica da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre;
  • Presidente do Departamento de Gastroenterologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Gastroenterologista

Profa. Dra. Maria do Carmo Friche Passos – CRM-MG: 18.599

  • Professora associada da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais;
  • Pós-doutorado em Gastroenterologia pela Universidade de Harvard;
  • Coordenadora do Departamento de Eventos Científicos da Federação Brasileira de Gastroenterologia;
  • Vice-presidente do Núcleo Brasileiro para Estudo do H. pylori;

Ex-presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologista

Atopia: o que é e como os probióticos auxiliam no tratamento

A alergia é definida como uma resposta anormal do sistema imunológico a substâncias estranhas chamadas alérgenos e geralmente abrange alimentos, pólen, pele, lã, drogas, produtos químicos, animais, ácaros e assim por diante¹. A atopia (também conhecida como sensibilização alérgica) é marcada pela presença de anticorpos imunoglobulina E (IgE) específicos para alérgenos séricos ou por um teste cutâneo positivo para substâncias que podem induzir uma reação de hipersensibilidade. Em indivíduos sensibilizados, a exposição ao alérgeno por inalação, ingestão ou contato com a pele pode levar a doenças, como asma, rinite, dermatite atópica (DA), alergia alimentar (AA), febre do feno, urticária e anafilaxia sistêmica2,3. O desenvolvimento de manifestações atópicas é o resultado de uma predileção genética para produzir IgE específica após a exposição a alérgenos. Nesse processo, a apresentação do alérgeno processado pelas células apresentadoras de antígenos aos linfócitos T leva à ativação dos linfócitos B e subsequente produção de IgE específica4.

A prevalência de doenças alérgicas está aumentando em todo o planeta, representando um fardo significativo para a sociedade, tanto econômica quanto psicossocialmente5. As doenças alérgicas têm sido associadas a fatores genéticos e/ou ambientais, como o uso de antibióticos de forma inadvertida, dieta com alto teor de gorduras e baixo teor de fibras, que levam à disbiose intestinal precoce e são responsáveis pelo aumento da prevalência de alergia, especialmente nos países ocidentais6. Dados da literatura descrevem que, globalmente, mais de 30% das crianças são alérgicas, com até 10% delas apresentando asma e rinite alérgica e 5 a 7% com AA. O termo “epidemia de alergia” tem sido aplicado para enfatizar esse aumento³.

O eixo intestino-pele desempenha um papel no desenvolvimento de doenças alérgicas por meio da interação imunológica e do microbioma entre o sistema gastrointestinal e a pele. As microbiotas intestinal e cutânea também desempenham um papel fundamental nas vias imunológicas de ambos os sistemas implicadas na patogênese dos distúrbios alérgicos. Inclusive, as doenças alérgicas têm sido caracterizadas por redução da diversidade microbiana, incluindo menos lactobacilos e bifidobactérias, na microbiota neonatal, antes do aparecimento das doenças atópicas (a disbiose intestinal no início da vida foi identificada como um marcador potencial de DA, AA e doenças alérgica das vias aéreas)6,7.

Dados da literatura mostram um aumento do interesse em estratégias de manipulação da microbiota para restaurar o equilíbrio microbiano para a prevenção de doenças atópicas, por meio do uso de probióticos6. Probióticos são microrganismos vivos, que em quantidades adequadas, são potencialmente benéficos para a saúde ao modular a composição da microbiota intestinal, exercendo efeitos imunomoduladores sistêmicos em outros órgãos, além do intestino7

Abordagem clínica da atopia

O diagnóstico de alergias depende de uma história de sintomas de exposição a um alérgeno juntamente com a detecção de IgE específica que pode ser realizada de forma confiável por testes séricos específicos ou testes cutâneos, não sendo esses testes mandatórios para todas as alergias. Ademais, o diagnóstico preciso dos alérgenos responsáveis pela doença alérgica representa oportunidades para terapias específicas, como prevenção de alérgenos e imunoterapia².

Atualmente, pesquisas envolvendo o uso de probióticos no manejo das atopias têm sido realizadas. As interações entre os probióticos e o sistema imunológico podem ser benéficas para a prevenção e o tratamento de doenças alérgicas; no entanto, ainda faltam evidências para apoiar esta conclusão. Além disso, o advento da hipótese microbiana levantou novas preocupações sobre a associação entre as respostas imunes e a microbiota intestinal humana e o impacto dessa associação no desenvolvimento de doenças alérgicas8

Probióticos no tratamento da atopia

O efeito dos probióticos na prevenção e tratamento de alergias ocorre através de mecanismos que precisam ser mais bem compreendidos9. A hipótese do ambiente sugere que a exposição insuficiente ou aberrante a micróbios ambientais é uma das causas do desenvolvimento de alergias e suas doenças associadas10. A microbiota intestinal influencia o desenvolvimento da resposta imune e o equilíbrio de células Th1 / Th2 que, por sua vez, determinam o desenvolvimento da tolerância oral. As células imunes do tipo Th2 produzem interleucina 4 (IL-4), que é essencial para a diferenciação das células B em células produtoras de IgE, e IL-5, que é importante para a atividade de eosinófilos e linfócitos. A permeabilidade intestinal também é alterada, permitindo a absorção de macromoléculas antigênicas9.

Os microrganismos que compõem os probióticos são geralmente bactérias do ácido láctico, incluindo Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus bulgaricus, Lactobacillus casei, Lactobacillus plantarum e Lactobacillus rhamnosus. As espécies de Lactobacillus possuem várias propriedades importantes, como aderência eficiente às células epiteliais intestinais para reduzir ou prevenir a colonização de patógenos, crescimento competitivo e produção de metabólitos para inibir ou matar patógenos e não patógenos. No entanto, outras espécies bacterianas, como Bacillus, Bifidobacterium spp. e Propionibacterium spp também foram descritas como cepas probióticas em vários produtos comerciais10.

Evidências atuais não apoiam o uso rotineiro de probióticos como uma intervenção para prevenir qualquer forma de doença alérgica, com exceção da DA em bebês de alto risco. As cepas, as dosagens, o momento e a duração ideais da administração de probióticos permanecem desconhecidos. No entanto, a pesquisa nesta área está em andamento e espera-se que forneça melhores insights sobre como os probióticos podem contribuir para a prevenção ou tratamento de doenças atópicas5.

LGG® no tratamento da atopia

Uma revisão sistemática de 2007 da Cochrane incluiu seis estudos com um total de 2.080 bebês, avaliando os resultados do uso de probióticos em doenças alérgicas e / ou alergias alimentares. A revisão concluiu que todos os estudos que relataram benefícios significativos usaram suplementos probióticos contendo Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®), a cepa que mais tem sido estudada atualmente. Estudos recentes demonstraram que a suplementação com bactérias probióticas, como LGG®, é capaz de modular a microbiota intestinal que envolve a redução de bactérias patogênicas, incluindo colesterol, e, inversamente, um aumento no nível de bifidobactérias benéficas em neonatos com alergias11,12,13.

O LGG® foi relatado em um número limitado de estudos para melhorar certas respostas específicas de vacina14. Estudos randomizados demonstraram que quando o LGG® ou placebo foram dados a gestantes com histórico familiar sério de DA, rinite alérgica ou asma e depois em recém-nascidos durante os primeiros seis meses após o parto, a incidência de DA em crianças diminuiu em 50%, 44% e 36% em dois anos, quatro anos e sete anos, respectivamente13.  Com relação a AA à proteína do leite de vaca (APLV), uma metanálise recente  demonstrou, em uma análise de subgrupo, benefícios significativos da administração de LGG® na indução de tolerância e em efeito dependente da duração na indução de tolerância observado após, pelo menos, dois anos15.

Para Licciard e colaboradores, a suplementação materna de LGG® pode não ser benéfica em termos de melhoria da imunidade específica à vacina em bebês. No entanto, mais estudos clínicos são necessários. Como os efeitos imunológicos probióticos podem ser específicos da espécie / cepa, o uso potencial de bactérias probióticas para modular as respostas imunológicas infantis às vacinas não pode ser descartado14.

 Autora:

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

Referências bibliográficas: 

  1. Balta I, Butucel E, Mohylyuk V, et al. Novel Insights into the Role of Probiotics in Respiratory Infections, Allergies, Cancer, and Neurological Abnormalities. Diseases. 2021;9(3):60
  2. Douglass JA, O’Hehir RE. 1. Diagnosis, treatment and prevention of allergic disease: the basics. Med J Aust. 2006;185(4):228-233
  3. Lambrecht BN, Hammad H. The immunology of the allergy epidemic and the hygiene hypothesis. Nat Immunol. 2017;18(10):1076-1083
  4. de Wit J, Dalm V, Totté JE, et al. Atopic manifestations are underestimated clinical features in various primary immunodeficiency disease phenotypes [published online ahead of print, 2021 Nov 26]. J Investig Allergol Clin Immunol. 2021;0
  5. Wang HT, Anvari S, Anagnostou K. The Role of Probiotics in Preventing Allergic Disease. Children (Basel). 2019;6(2):24
  6. Sestito S, D’Auria E, Baldassarre ME, et al. The Role of Prebiotics and Probiotics in Prevention of Allergic Diseases in Infants. Front Pediatr. 2020;8:583946
  7. Suaini NHA, Siah KTH, Tham EH. Role of the gut-skin axis in IgE-mediated food allergy and atopic diseases. Curr Opin Gastroenterol. 2021;37(6):557-564
  8. Kim HJ, Kim HY, Lee SY, Seo JH, Lee E, Hong SJ. Clinical efficacy and mechanism of probiotics in allergic diseases. Korean J Pediatr. 2013;56(9):369-376
  9. Capurso L. Thirty Years of Lactobacillus rhamnosus GG: A Review. J Clin Gastroenterol. 2019;53 Suppl 1:S1-S41
  10. Tang RB, Chang JK, Chen HL. Can probiotics be used to treat allergic diseases?. J Chin Med Assoc. 2015;78(3):154-157
  11. Toh ZQ, Anzela A, Tang ML, Licciardi PV. Probiotic therapy as a novel approach for allergic disease. Front Pharmacol. 2012;3:171
  12. de Azevedo MS, Innocentin S, Dorella FA, et al. Immunotherapy of allergic diseases using probiotics or recombinant probiotics. J Appl Microbiol. 2013;115(2):319-333
  13. Eslami M, Bahar A, Keikha M, Karbalaei M, Kobyliak NM, Yousefi B. Probiotics function and modulation of the immune system in allergic diseases. Allergol Immunopathol (Madr). 2020;48(6):771-788
  14. Licciardi PV, Ismail IH, Balloch A, et al. Maternal Supplementation with LGG Reduces Vaccine-Specific Immune Responses in Infants at High-Risk of Developing Allergic Disease. Front Immunol. 2013;4:381
  15. Tan-Lim CSC, Esteban-Ipac NAR. Probiotics as treatment for food allergies among pediatric patients: a meta-analysis. World Allergy Organ J. 2018;11(1):25

Existe vantagem de probiótico multicepas x cepa única?

O número de publicações científicas sobre probióticos e seus efeitos têm crescido exponencialmente nos últimos anos.  Probióticos são microrganismos vivos que quando administrados em quantidades apropriadas oferecem benefícios à saúde do hospedeiro e,   segundo a literatura, têm efeitos benéficos nas diarreias e na  imunidade e dermatite atópica, por exemplo.

A diversidade de cepas probióticas disponíveis comercialmente ou para manipulação torna a escolha de um probiótico apropriado um desafio. Será que quanto mais cepas em uma mesma formulação, melhor seria a eficácia terapêutica? Ou será que as cepas podem competir entre si tornando a formulação inefetiva ou até levar a efeitos colaterais para o paciente?

A escolha do probiótico

Recente estudo sobre a eficácia de probióticos de cepa única versus misturas de múltiplas cepas teve como objetivo determinar se cepas únicas ou múltiplas são equivalentes ou mais eficazes.  Um total de 65 ensaios clínicos randomizados foram incluídos. Na maioria dos casos, misturas de múltiplas cepas não foram mais eficazes do que as cepas simples.

Deve-se dar atenção não só a especificidade das cepas, mas a relação com a eficácia probiótica na doença que queremos tratar. Uma revisão sistemática e meta-análise foi realizada sobre este tema, incluindo 28 estudos; e concluiu que os pesquisadores precisam reconhecer e relatar a importância dos resultados por cepas específicas de probióticos e pelo tipo de doença. Das cepas  com atuação isolada mais estudadas,  destaca-se o LGG que está indicado para diarreias agudas, por uso de antibióticos, associada ao Clostridium difficile e síndrome do Intestino irritável.

Outro problema a ser considerado na escolha de um probiótico, é se os probióticos podem demonstrar impacto adverso nos parâmetros nutricionais, metabólicos e imunológicos.  Dezenas de estudos clínicos  comprovaram que a  cepa LGG, alcançou o Qualified Presumption of Safety do Comitê Científico da European Food Safety Authority and Generally Recognized, assim como foi considerado seguro US Food and Drug Administration (FDA). No LGG,  os genes de resistência a antibióticos são distintos dos genes transferíveis e não possuem os plasmídeos que podem disseminar genes transferíveis de resistência.

Podemos concluir que é mito que quanto mais cepas melhor o probiótico. A  escolha de um probiótico apropriado é multifatorial,  devendo ser baseada, não apenas no número de cepas do produto, mas também na doença e no paciente que queremos tratar. Ensaios de eficácia baseados em evidências são cepas  específicos, não podendo ser extrapolados para outros produtos. Qualidade do laboratório que o produz e a formulação do produto são fundamentais para um bom probiótico.

Autora: Vera Lucia Angelo Andrade
Graduação em Medicina pela UFMG em 1989
Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek
Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia
Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein
Mestre e Doutora em Patologia pela UFMG
Responsável pelo Setor de Motilidade da Clínica SEDIG BH desde 1995
http://lattes.cnpq.br/0589625731703512

Referências bibliográficas:

EAP 2021: qual o papel dos probióticos na dermatite atópica?

Em palestra realizada no European Academy of Pediatrics Congress (EAP 2021), a Dra Zorica Zivkovic, pediatra e professora de pediatria do Children’s Hospital for Lung Diseases and Tuberculosis, Medical Center Dr. Dragisa Misovic, em Belgrado, Sérvia, falou sobre qual poderia ser o papel dos probióticos na dermatite atópica (DA) em crianças.

Dermatite atópica

A palestrante destacou que a DA é a desordem inflamatória cutânea mais comum na infância e afeta cerca de 20% dos bebês no início da vida, podendo preceder quadros de rinite e/ou asma. A maioria das crianças com DA apresenta história familiar de atopia. É de grande importância identificar aqueles bebês com alto risco de desenvolver alergias em um estágio inicial para definir estratégias de prevenção e modificação de doenças.

Evidentemente, a forma de intervenção precoce mais confortável e aplicável estaria no microbioma humano. O sistema imune inato de neonatos e lactentes representa o melhor alvo, especialmente através do sistema gastrointestinal. Portanto, segundo a Dra Zivkovic, nós devemos apoiá-lo e aprimorá-lo, desenvolvendo e/ou atualizando o conteúdo microbiano. Dessa forma, ela e sua equipe realizaram um estudo cujo objetivo foi avaliar o efeito da suplementação oral de LGG® (Lactobacillus rhamnosus GG) no desenvolvimento e na gravidade dos sintomas de DA durante um período de dois anos.

Probióticos e dermatite atópica

Foi realizado um estudo de observação controlada da vida real de 96 pacientes, sendo que 52 foram tratados com Lactobacillus rhamnosus combinado com vitamina D3 e zinco, enquanto os demais foram aconselhados a usar apenas tratamento sintomático. Todas as crianças foram encaminhadas para a clínica devido à condição atópica no início da vida e história familiar positiva de alto risco. No início do estudo, o índice Scoring Atopic Dermatitis (SCORAD) foi definido, bem como após 3 e 6 meses de tratamento, respectivamente.

O grupo ativo recebeu a cepa probiótica Lactobacillus rhamnosus 1×1010 cfu/g com 0,01 mg de vitamina D3 e 0,6 mg de zinco juntamente com o tratamento padrão para o período de 90 dias. O grupo controle recebeu apenas tratamento farmacológico padrão, que consistiu no uso de anti-histamínicos e hidratantes tópicos.

Os pacientes foram considerados elegíveis para a inclusão no grupo intervenção de acordo com os seguintes fatores: 1) manifestações clínicas de DA; 2) idade entre 6 meses e 3 anos; 3) história familiar positiva para doenças atópicas, sem uso de anti-histamínicos e de corticoides (sistêmicos e/ou locais) nos 14 dias prévios à inclusão no estudo.

Os resultados desse estudo mostraram que a formulação de Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) associada a suplementação de zinco e vitamina D3 em lactentes e na primeira infância reduziram a gravidade da DA segundo o sistema de pontuação SCORAD. Dessa forma, com base nesses achados, os pesquisadores recomendam fortemente, para a prática diária, a introdução de suplementação de probióticos, bem como vitamina D3 e zinco em bebês e crianças com DA e história familiar positiva desde o início da vida.

Para a Dra. Zivkovic, a introdução do probiótico LGG provou ser clinicamente eficaz na prevenção e tratamento da DA, podendo ser iniciado no primeiro dia de vida do bebê ou até mesmo no período pré-natal (conforme as manifestações clínicas) por um período de, pelo menos, três meses.

Fonte:  PEBMED –

https://pebmed.com.br/eap-2021-qual-o-papel-dos-probioticos-na-dermatite-atopica/

Autora: Roberta Esteves Vieira de Castro. Doutora em Medicina pela UERJ, mestre em Saúde Materno-Infantil pela UFF e pós-graduanda em neurointensivismo pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

Alergias e imunomodulação – benefícios dos probióticos

O trato gastrointestinal funciona como uma barreira contra antígenos de microrganismos e alimentos. A geração de regulação imunofisiológica no intestino depende do estabelecimento da microbiota. Intervenções terapêuticas baseadas no consumo de culturas de microrganismos vivos benéficos, que atuam como probióticos, foram introduzidas como forma de reequilibrar a resposta imunológica dada pelo hospedeiro, a qual tem um papel crítico na defesa do organismo contra infecções. Além disso, essa terapia tem papel como agente interferente em respostas alérgicas, geralmente manifestadas através de casos de dermatite atópica e de alergias alimentares.1

Entre os possíveis mecanismos de ação  da terapia probiótica está a promoção de uma barreira de defesa intestinal não imunológica, que inclui a normalização da permeabilidade intestinal. Outro possível mecanismo da terapia probiótica é a melhora da barreira imunológica do intestino, particularmente por meio das respostas da imunoglobulina A (IgA) intestinal e do alívio das respostas inflamatórias intestinais, que produzem um efeito estabilizador do intestino. Muitos efeitos probióticos são mediados por regulação imunológica, particularmente por meio do controle do equilíbrio de citocinas pró-inflamatórias e antiinflamatórias. Esses dados mostram que os probióticos podem ser usados ​​como ferramentas inovadoras para aliviar a inflamação intestinal, normalizar a disfunção da mucosa e diminuir as reações de hipersensibilidade.1,2

Efeitos regulatórios distintos foram detectados em indivíduos saudáveis ​​e em pacientes com doenças inflamatórias. Estes resultados sugerem que propriedades imunomoduladoras específicas de bactérias probióticas devem ser caracterizadas ao desenvolver aplicações clínicas, conforme necessidades individuais de cada perfil e considerando, portanto, os tipos de populações-alvo.2

Em um estudo duplo-cego, randomizado e controlado por placebo, a administração de probiótico pré-natal a mães que tinham pelo menos um parente de primeiro grau (ou parceiro) com eczema atópico, rinite alérgica ou asma, e contínua administração pós-natal por 6 meses para seus bebês resultou em dados concretos para determinar a influência do produto na prevenção primária de doenças atópicas. Eczema atópico recorrente crônico, que é o principal sinal de doença atópica nos primeiros anos de vida, foi avaliado. A frequência de eczema atópico no grupo probiótico foi metade da do grupo placebo, portanto, no contexto da imunomodulação, a administração de probiótico foi eficaz na prevenção da doença atópica precoce em crianças de alto risco.3

Os efeitos da administração de probióticos na resposta imune oral em adolescentes e adultos com tipos específicos de alergia, como ao pólen de bétula combinada com síndrome de alergia oral, foram avaliados em ensaio clínico internacional. Os resultados apontaram que probióticos têm efeitos imunoestimulantes na mucosa oral, vistos como níveis aumentados de imunoglobulina A (IgA) específica do alérgeno na saliva.4

 

A prevalência de doenças alérgicas em bebês, cujos pais e irmãos não têm alergia, é de aproximadamente 10% e chega a 20-30% naqueles com um parente de primeiro grau alérgico, segundo pesquisas científicas recentes. A microbiota intestinal pode modular as respostas imunológicas e inflamatórias sistêmicas e, assim, influenciar o desenvolvimento de sensibilização e alergia. Foi relatado que probióticos modulam as respostas imunológicas e sua suplementação foi proposta como uma intervenção preventiva. As recomendações sobre a suplementação de probióticos para a prevenção da alergia têm como objetivo embasar médicos e outros profissionais de saúde em suas decisões sobre o uso de probióticos na gravidez e durante a amamentação e, também, se devem ser administrados aos bebês.5

Referências

1 – Isolauri E, Sütas Y, Kankaanpää P, Arvilommi H, Salminen S. Probiotics: effects on immunity. American Journal of Clinical Nutr. 2001; 73(2 Suppl): 444S-50S.

2 – Kalliomäki M, Salminen S, Arvilommi H, Kero P, Koskinen P, Isolauri E. Probiotics in primary prevention of atopic disease: a randomised placebo-controlled trial. Lancet. 2001; 357(9262): 1076-9.

3 – Pelto L, Isolauri E, Lillus E, Nuutila J, Salminen S. Probiotic bacteria down-regulate the milk-induced inflammatory response in milkhypersensitive subjects but have an immunostimulatory effect in healthy subjects. Clin Exp Allergy. 1998; 28(12): 1474-9.

4 – Piirainen L, Haahtela S, Helin T, Korpela R, Haahtela T, Vaarala O. Effect of lactobacillus rhamnosus GG on rBet v1 and rMal d1 specific IgA in the saliva of patients with birch pollen allergy. Annals of Allergy, Asthma and Immunology. 2008; 100(4): 338-42.

5 – Fiocchi A, Pawankar R, Cuello-Garcia C, Ahn K, Al-Hammadi S, Agarwal A, et al. World Allergy Organization-McMaster University Guidelines for Allergic Disease Prevention (GLAD-P): Probiotics. World Allergy Organ J. 2015; 8(1): 4.

O uso do probiótico Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) na prevenção da dermatite atópica

Nas últimas décadas, diversos estudos foram realizados com objetivo de correlacionar a composição da microbiota intestinal (MI) com diversas enfermidades. Dentre as doenças hipoteticamente beneficiadas pelo uso de probióticos, destacam-se as doenças alérgicas, como a dermatite atópica (DA), uma doença crônica da pele que apresenta lesões com prurido intenso associada a um ressecamento importante, mais evidentes em regiões de flexura. Essa suposta interligação entre intestino e pele é atribuída ao papel de modulação da resposta imunológica pela MI, o que pode auxiliar na prevenção e no tratamento de doenças de fundo alérgico e imunológico.  

O papel dos próbióticos 

O papel dos probióticos no tratamento da DA ainda não é completamente esclarecido, além do que a microbiota intestinal dos pacientes atópicos parece ser, de fato, diferente dos indivíduos não-alérgicos. A ação de diversas cepas foi avaliada em uma série de pesquisas, ainda sem resultados amplamente reprodutíveis. Possíveis justificativas para essa falta de correlação incluem o desenho dos estudos, os probióticos avaliados, a posologia utilizada, a janela de oportunidade, os fatores que interferem na suplementação dos probióticos (fatores ambientais, idade do paciente, dieta realizada, a presença obesidade e outras comorbidades, e também a etnia), entre outros.  

Dentre os diversos probióticos avaliados no contexto da DA, o Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) é uma das cepas mais bem estudadas, com uma quantidade considerável de evidências correlacionando esses assuntos.  

Um estudo duplo-cego, controlado, envolvendo 62 gestantes com história familiar positiva para DA, foi realizado para avaliar a ação dos LGG® no desenvolvimento de DA em crianças cujas mães utilizaram o probiótico durante a gestação e a amamentação. Esse estudo demonstrou que filhos de mães que receberam LGG® nessa fase, apresentaram menor risco de desenvolver DA nos primeiros 2 anos de vida.  

Outro estudo duplo-cego randomizado, conduzido com 27 bebês entre 4 e 6 meses, diagnosticados com eczema atópico, demonstrou melhora clínica significativa após 2 meses de uso de LGG®. Vários outros estudos com LGG® corroboram os resultados descritos, sendo os achados mais promissores aqueles relacionados à prevenção da DA.  

O uso dos probióticos é seguro, com efeitos colaterais raros relacionados principalmente ao trato gastrointestinal, como constipação, flatulência, náuseas e soluços. O cuidado na prescrição dos probióticos deve ser maior em pacientes imunossuprimidos, uma vez que eles podem, teoricamente, apresentar risco de infecções potencialmente graves (sepse, endocardite, abscesso hepático) pelas bactérias que compõem as medicações. 

Diante da possibilidade de prevenir o surgimento da DA e de melhorar seu controle clínico de forma segura, o uso de probióticos – sendo o LGG® um dos mais amplamente estudados – tem se mostrado útil no manejo da doença. A prescrição deve ser individualizada para cada paciente. Além disso, novos estudos com um tempo maior de acompanhamento devem ser realizados, para avaliação prospectiva a longo prazo dos efeitos benéficos e, também, de potenciais efeitos colaterais.  

Autor(a): Gabriela Guimarães Moreira Balbi 

Graduada em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) • Pediatra pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) • Reumatologista pediatra pela Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM) 

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