Tricíclicos e probióticos no tratamento da síndrome do intestino irritável 

A síndrome do intestino irritável é uma doença funcional, recorrente da interação do cérebro-intestino que pode causar dores abdominais recorrentes. Existem diversos tratamentos da SII, entre eles os antidepressivos tricíclicos e os probióticos.

Os Tricíclicos apresentam eficácia no controle geral dos sintomas, inibindo a recaptação da noradrenalina e serotonina, neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da dor e com uma melhora perceptível entre 4 e 12 semanas. Entre os tricíclicos utilizados para essa finalidade, o que apresenta melhor tolerabilidade sem afetar a eficácia é a nortriptilina.

Além disso, a SII é uma doença multifatorial, dentre eles, a alteração da microbiota e a disbiose. Sendo os probióticos recomendados para uma melhor modulação dessa microbiota e melhorando o processamento da conexão central e sistema nervoso entérico.

Acesse a vídeo aula feita pelo Dr. Gerson Domingues, Prof. Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Ciências Médicas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pela Dra. Maria do Carmo, Vice-presidente do Núcleo Br. para Estudo do H. pylori e ex-presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia e entenda mais sobre o assunto:

Déficit de Atenção e Dislexia. Como se relacionam e qual o tratamento utilizado?

As descrições que remontam para o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com
Hiperatividade) não são recentes, os critérios operacionais foram definidos com o
advento do DSM-III, em 1980. A avaliação do transtorno é eminentemente clínica,
envolvendo idade de início da doença, grau de comprometimento dos sintomas e
evolução ao longo do tempo. A 5ª versão do DSM, de 2013, estabeleceu os critérios
mais recentes, preconizando dezoito sintomas – nove de desatenção e nove de
hiperatividade e/ou impulsividade –, e considerando seis ou mais em um tempo
mínimo de seis meses. Somado a isto, o paciente deve apresentar um destes sintomas
antes dos 12 anos de idade, com prejuízo clinicamente significativo em seu contexto
social. Exames complementares são indicados para se estabelecer diagnóstico
diferencial.1


A dislexia é outro transtorno preconizado pelo DSM-V, definido como um padrão de
dificuldades de aprendizagem caracterizado por problemas no reconhecimento preciso
ou fluente de palavras, problemas de decodificação e dificuldades de ortografia. Assim
como o TDAH, a dislexia, de acordo com o compêndio norte-americano, independe de
fatores culturais ou conflitos psicológicos para seu estabelecimento.1,2


A relação de comorbidade entre TDAH e dislexia é frequente, com estimativas de
25-40% de comorbidade bidirecional. Estudos identificaram forte sobreposição
genética e cognitiva entre os distúrbios. Pacientes podem apresentar pior resultado
neuropsicológico, acadêmico e comportamental na vigência da associação destes
transtornos.2


Para TDAH, o tratamento envolve uma abordagem ampla e múltipla, com intervenções
psicossociais, psicoterapêuticas e psicofarmacológicas. Da mesma forma, o tratamento
para dislexia segue cuidado multiprofissional. Os medicamentos de primeira escolha
são os psicoestimulantes. Sob o aspecto farmacocinético e farmacodinâmico, eles
podem apresentar liberação imediata ou controlada. O Concerta® é uma formulação
de metilfenidato (MFD) que pertence à classe de medicamentos com liberação
prolongada como mecanismo de ação e está disponível no Brasil.2,3,4,5


O diagnóstico de dislexia como comorbidade ao TDAH pode ser um marcador para a
população pediátrica com déficits cognitivos mais graves. Nesse sentido, uma
meta-análise de estudos em adultos indicou sucesso terapêutico similar com doses
equivalentes àquelas em crianças e adolescentes. Além disso, o estudo indica uma
superioridade na eficácia de psicoestimulantes como o Concerta® frente a outras
classes, com tamanho de efeito estatisticamente superior.2,3,4,5


Pacientes diagnosticados com ambos os transtornos devem receber tratamento
concomitante, com intervenção farmacológica e não farmacológica. Psicoestimulantes
são comprovadamente eficazes para aliviar os sintomas de TDAH, sua segurança e
tolerabilidade apresentam resultados satisfatórios. A adoção da terapia com Concerta®
e outras medidas tem por objetivo a redução do comprometimento funcional
decorrente do TDAH e distúrbios associados, como a dislexia.5,6


Portanto, as formas de tratamento específicas para TDAH, como a administração de
psicoestimulantes como o Concerta®, e dislexia são necessárias como terapia de
escolha e devem ser adotadas em conjunto. O tratamento é individualizado e demanda
aderência e diligência para segurança da terapia clínica.5,6


Referências
1 – Polanczyk G, Silva de Lima M, Lessa Horta B, Biederman J, Rohde LA. The
Worldwide Prevalence of ADHD: A Systematic Review and Metaregression Analysis.
American Journal of Psychiatry. 2007 Jun; 164(6): 942-8.
2 – Stephen V Faraone, Jan Buitelaar. Comparing the efficacy of stimulants for ADHD in
children and adolescents using meta-analysis. Eur Child Adolesc Psychiatry. 2010 Apr;
19(4): 353-64.
3 – ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Consultas. Bulário Eletrônico.
Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/bulario/q/?nomeProduto=CONCERTA
Acesso em: 15 jul 2022.
4 – Souza Rodrigues T, Cintra da Silva SM. Medicalização, Dislexia e TDAH no Ensino
Superior. 2021.
5 – Eva Germanò, Antonella Gagliano, Paolo Curatolo. Comorbidity of ADHD and
Dyslexia. Dev Neuropsychol. 2010; 35(5): 475-93.
6 – S. Weibel. Practical considerations for the evaluation and management of Attention
Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD) in adults. Considérations pratiques pour
l’évaluation et la prise en charge du TDAH chez l’adulte. L’Encéphale. Volume 46, Issue
1, February 2020, Pages 30-40.

Ansiedade, insônia, as implicações psicopatológicas no pós-pandemia e o uso de antidepressivo tricíclico como opção terapêutica

O transtorno de ansiedade generalizada, ou TAG, é de alta prevalência nos dias atuais.
Dentre as inúmeras queixas somáticas referidas pelos pacientes, o distúrbio do sono é
o principal sinal para busca por avaliação médica. Ensaios clínicos indicam que a
insônia constitui fator de risco para o aparecimento posterior de transtorno de
ansiedade. No contexto da pandemia do Covid-19, esta relação se aprofundou:
revisões sistemáticas já publicadas indicam que pacientes com Covid-19 referiram
ansiedade e/ou distúrbios do sono, sendo tais implicações psicopatológicas
reconhecidas como sintomas primários da fase pós-Covid-19 aguda.1,2,3,4,5,6


O tratamento do TAG é multifatorial e com diversas classes de medicamentos de
escolha: inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), inibidores seletivos da
recaptação de serotonina e noradrenalina (ISRN), inibidores da monoaminoxidase
(IMAO), tetracíclicos (ADTC) e tricíclicos (ADTs). Entre os tricíclicos, destaca-se o
cloridrato de nortriptilina.7,8


O cloridrato de nortriptilina, cuja marca de referência é o Pamelor®, age no sistema
nervoso central. Atua como inibidor da recaptação dos neurotransmissores serotonina
e norepinefrina, com efeito vasoconstritor.7,8


Um ensaio clínico randomizado avaliou a terapia por administração de cloridrato de
nortriptilina e por adoção de terapia metacognitiva (MCT) para ansiedade, depressão e
sofrimento psíquico. A randomização distribuiu pacientes em três grupos, estes
recebendo MCT, nortriptilina e controles. O ensaio conclui que a combinação de
psicoterapia metacognitiva com terapia farmacológica conservadora, por meio do uso
de cloridrato de nortriptilina, é eficaz no combate aos sintomas de ansiedade e de
sofrimento emocional, no acompanhamento de curto e de longo prazo.8

O cenário pós-pandêmico do Covid-19 indica novos índices de prevalência para
enfermidades como ansiedade e distúrbios do sono. Ensaio clínico randomizado indica
que pacientes com Covid-19 apresentam, em relação à população em geral, um
aumento substancial destes distúrbios em comparação com a prevalência
pré-pandêmica: 47% dos pacientes experimentam TAG e 34% dos pacientes
apresentam distúrbios do sono.9,10,11


Neste contexto, levando-se em consideração que o TAG geralmente é crônico e
frequentemente associado a sintomas depressivos – e possivelmente a comorbidades
relacionadas ao sono -, a farmacoterapia ideal pode ser baseada em um medicamento
que trate adequadamente essas disfunções. Antidepressivos, especialmente aqueles
com ação no sistema serotoninérgico e, possivelmente, noradrenérgicos, podem ser a
opção adequada: eles não apenas tratam a ansiedade, mas também tratam ou
previnem o desenvolvimento de depressão como uma comorbidade ao TAG.9,10,11


Referências


1 – Fochesatto Filho L, Barros E. Medicina Interna na Prática Clínica. Porto Alegre:
Artmed; 2013.
2 – Kapczinski F, dos Santos Souza JJSS, Batista Miralha da Cunha AABC, Schmitt RRS.
Antidepressants for generalised anxiety disorder (GAD). Cochrane Database of
Systematic Reviews 2003.
3 – K Rickels, R Downing, E Schweizer, H Hassman. Antidepressants for the treatment
of generalized anxiety disorder. A placebo-controlled comparison of imipramine,
trazodone, and diazepam. Arch Gen Psychiatry. 1993 Nov; 50(11): 884-95.
4 – Jaime M Monti. Insônia primária: diagnóstico diferencial e tratamento. Rev Bras
Psiquiatria. 2000; 22(1): 31-4.

5 – Mario Gennaro Mazza, Mariagrazia Palladini, Sara Poletti. Post-COVID-19 Depressive
Symptoms: Epidemiology, Pathophysiology, and Pharmacological Treatment. CNS
Drugs. 2022 Jun 21;1-22. doi: 10.1007/s40263-022-00931-3.
6 – Jiawen Deng, Fangwen Zhou, Wenteng Hou, Zachary Silver, Chi Yi Wong, Oswin
Chang, Emma Huang, Qi Kang Zuo. The prevalence of depression, anxiety, and sleep
disturbances in Covid-19 patients: a meta-analysis.
Epub 2020 Oct 2.
7 – ANVISA. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Consultas. Bulário Eletrônico.
Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/bulario/q/?nomeProduto=PAMELOR
Acesso em: 30 jun 2022.
8 – Batebi, S., Masjedi Arani, A., Jafari, M., Sadeghi, A., Saberi Isfeedvajani, M., &
Davazdah Emami, M.H. (2020). A randomized clinical trial of metacognitive therapy and
nortriptyline for anxiety, depression, and difficulties in emotion regulation of patients
with functional dyspepsia. Research in Psychotherapy: Psychopathology, Process and
Outcome, 23(2), 157-166. doi: 10.4081/ripppo.2020.448.
9 – R B Hidalgo, J R Davidson. Generalized anxiety disorder. An important clinical
concern. Med Clin North Am. 2001 May; 85(3): 691-710.
10 – Salari, N., A. Hosseinian-Far, R. Jalali, et al. 2020. Prevalence of stress, anxiety,
depression among the general population during the COVID-19 pandemic: a systematic
review and meta-analysis. Global Health 16: 57. 112.
11 – Lin, L.-Y., J. Wang, X.-Y. Ou-Yang, et al. 2020. The immediate impact of the 2019
novel coronavirus (COVID-19) outbreak on subjective sleep status. Sleep Med.

O uso dos tricíclicos na síndrome do intestino irritável [Vídeo]

A síndrome do intestino irritável é uma doença funcional, recorrente da interação do cérebro-intestino ocorrendo, pelo menos, 1x/semana por um período de 3 meses ou mais e sendo capaz de interferir na qualidade de vida das pessoas.

Existem diversos tratamentos da SII, entre eles os antidepressivos tricíclicos que apresentam eficácia no controle geral dos sintomas da SII, inibindo a recaptação da noradrenalina e serotonina, neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da dor e com uma melhora perceptível entre 4 e 12 semanas. Entre os tricíclicos utilizados para essa finalidade, o que apresenta melhor tolerabilidade sem afetar a eficácia é a nortriptilina.

Acesse a vídeo aula feita pelo Dr. Gerson Domingues, Prof. Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Ciências Médicas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e entenda mais sobre o assunto:

Cefaleia Pós-Covid 19 [Vídeo]

A cefaleia pode durar dias, impactando nas atividades diárias das pessoas e sendo a segunda doença que mais gera incapacidade no mundo. Com a pandemia, ocasionada pela Covid-19, grande parte das pessoas infectadas e pós infecção apresentaram a dor de cabeça como um dos sintomas.

Existem diversos medicamentos que são utilizados para o tratamento dessas dores, incluindo o uso de antidepressivos tricíclicos (TCA) como a nortriptilina, sendo um dos mais usados na profilaxia da migrânea.

 Acesse o vídeo abaixo e entenda mais sobre o assunto:

Ideação suicida entre médicos: burnout ou depressão?

O nono mês do ano é marcado por projetos destinados à conscientização e discussão saudável sobre o suicídio e suas implicações, o “setembro amarelo”. Desta vez, vamos discutir os principais pontos de um artigo publicado no JAMA em dezembro de 2020 e que procurou avaliar a relação entre ideação suicida e erros médicos com a síndrome de burnout e a depressão.

Alguns trabalhos mostram um risco aumentado de ideação suicida entre médicos, com taxas variando entre os anos de formação e de atividade profissional. Várias condições podem estar relacionadas a esse achado, como problemas nas relações interpessoais, uso de substâncias, sentimentos de culpa, tendência a comportamentos autodestrutivos, depressão e problemas ocupacionais. Este último ponto envolve um subgrupo de fatores que merecem destaque, como assédio no local de trabalho, a ausência de figuras de referência durante a formação pós-graduada, o grande volume de trabalho, a escolha por certas especialidades, etc. Não à toa os autores ressaltam que a síndrome de burnout vem alcançando níveis epidêmicos entre os médicos.

Contudo, há ainda uma discussão entre os estudiosos se a síndrome de burnout e a depressão fariam parte de um mesmo construto ou se seriam diagnósticos independentes. Neste trabalho, os autores citam uma metanálise e estudos psicométricos que sugerem tratar-se de entidades distintas, o que também foi encontrado por eles.

Estudo sobre burnout e depressão

Dessa forma, realizaram um estudo transversal entre novembro de 2018 e fevereiro de 2019 com médicos selecionados randomicamente nos registros da American Medical Association Physician Masterfile. De todos os médicos convidados a participar do estudo, apenas 11,4% o fizeram, sendo que 1.354 participantes foram incluídos nas análises. Foi oferecido um incentivo financeiro para que esses médicos preenchessem um inquérito eletrônico composto por: consentimento para a participação na pesquisa, três subescalas para avaliar burnout, uma escala para avaliar depressão, um instrumento com quatro itens para avaliar erros médicos e sua frequência e uma pergunta sobre a presença de pensamentos suicidas nos últimos 12 meses.

A amostra selecionada era composta majoritariamente por homens, indivíduos de etnia branca, com menos de 45 anos, que não trabalhavam nos cuidados de saúde primários e estavam atuando na prática clínica.

Resultados

Dos 1.354 avaliados, 5,5% informaram ter tido pensamentos suicidas nos 12 meses anteriores. Antes de se ajustar para o transtorno depressivo maior, havia sido encontrada uma correlação entre burnout e ideação suicida. Contudo, essa associação não se manteve após o ajuste para depressão. Isso, inclusive, é consistente com a descrição da Organização Mundial de Saúde (OMS) para a síndrome de burnout, na qual essa síndrome é entendida como ligada a questões ocupacionais; diferentemente dos transtornos mentais, que apresentam alterações em múltiplos domínios. Entretanto, foi encontrada uma correlação entre burnout e erros médicos relatados pelos próprios participantes. Essa associação com os erros médicos não ocorreu com a depressão.

A depressão propriamente dita correlacionou-se com a ideação suicida, mesmo após o ajuste para burnout. Isso se mostra consistente com o que é descrito pela literatura médica.

Dessa forma, é possível que associações anteriores entre burnout e ideação suicida sejam, na verdade, ou um fator de confundimento quando há depressão comórbida; ou fruto de uma associação indireta entre as duas condições; ou tenha ocorrido pela ausência de ajuste para depressão nas análises; ou os instrumentos usados nas pesquisas prévias não possuíam as características apropriadas.

É importante lembrar que a depressão é uma doença responsável por um grande impacto na vida dos pacientes, tornando necessária a avaliação médica e o tratamento correto – seja na forma de psicoterapia ou associada ao uso de psicofármacos e outras terapias biológicas. Já o burnout se relaciona às questões ocupacionais e, no caso dos médicos, pode afetar o atendimento dos pacientes ou, como sugerem os resultados deste trabalho, se relacionar a uma maior quantidade de erros médicos. A melhor forma de abordá-lo seria através de estratégias ocupacionais.

Considerações

Esses resultados devem ser interpretados à luz de limitações inerentes aos trabalhos científicos: estudos transversais não conseguem delimitar relações de causalidade; as questões referentes à seleção da amostra limitam a generalização dos resultados e a presença do viés de participação, uma vez que foram utilizadas escalas respondidas pelos mesmos.

Caso você ou alguém que você conhece tenha tido pensamentos que envolvam o conteúdo de suicídio, não deixe de procurar ajuda profissional.

Para mais informações sobre depressão e síndrome de burnout, acesse o Whitebook.

Fonte: https://pebmed.com.br/ideacao-suicida-entre-medicos-burnout-ou-depressao/

Autor(a): Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referências bibliográficas:

  • Menon NK, Shanafelt TD, Sinsky CA, et al. Association of Physician Burnout With Suicidal Ideation and Medical Errors. JAMA Netw Open. 2020;3(12):e2028780. doi: 10.1001/jamanetworkopen.2020.28780

Transtornos mentais em pacientes pós-internação por Covid-19

Desde o início da pandemia, médicos e pesquisadores em todo o mundo vêm se perguntando se pacientes que estiveram internados por Covid-19 apresentam mais transtornos mentais após a alta e quais seriam esses transtornos. Os pacientes que estiveram em cuidados intensivos estariam mais propensos a transtornos mentais específicos ou a suas formas mais graves?

Essas questões foram debatidas em dois trabalhos independentes e que foram enviados aos editores de duas revistas médicas distintas: General Hospital Psychiatry e Intensive Care Medicine, ambos publicados em março deste ano.

Os estudos

No primeiro, são colocados, de forma resumida, os resultados de um estudo transversal realizado em um hospital em Cleveland (EUA) entre março e agosto de 2020. Nele, todos os pacientes que estiveram internados por Covid-19 no período descrito e que receberam alta posteriormente receberam uma mensagem recrutando para a participação no estudo, que consistia em acessar um link que direcionava os participantes para o preenchimento de escalas validadas para avaliação de 3 transtornos mentais: ansiedade (GAD-7), depressão (CES-D 10) e transtorno de estresse pós-traumático – vulgo, TEPT (PTSD-5).

No segundo trabalho, foram avaliados 47 pacientes que receberam alta após terem sido internados em unidades de cuidados intensivos (UTI ou CTI) devido à Covid-19 entre fevereiro e junho de 2020. Eles foram reavaliados cerca de um mês após a alta hospitalar e responderam a uma escala de avaliação de transtorno de estresse agudo (IES-R).

Resultados do primeiro trabalho

Inicialmente, vamos discutir os resultados do primeiro estudo, que avaliou quadros de ansiedade, depressão e TEPT. Dentre todos os pacientes que preencheram os critérios de recrutamento, todos receberam o convite para participar da pesquisa, mas apenas 19% responderam os questionários. Destes, 57% pontuaram para pelo menos um dos transtornos avaliados, sendo o mais comum o transtorno depressivo (42%), seguido por TEPT (34%) e finalmente os transtornos ansiosos (24%). Esses pacientes ainda foram divididos em dois grupos: pacientes que tinham história prévia de transtorno mental e os que não tinham história de transtorno mental antes da atual internação.

Na comparação entre eles, pôde-se observar que entre os que tinham história prévia de transtorno mental havia uma maior proporção de indivíduos pontuando para alguma forma de transtorno mental após a alta (78%) em relação aos que nunca tinham tido transtorno mental até então (42%). Mas, como os números indicam, não ter passado de transtorno mental não significa que esses indivíduos não fossem vulneráveis, encontrando-se o mesmo padrão já descrito: a depressão é o transtorno mais comum (37,2%), seguido por TEPT (23%) e transtornos ansiosos (11,2%).

Estes resultados não parecem ter sido influenciados pelo momento após a alta em que os questionários foram respondidos. Isso inclusive sugere a necessidade de seguir estes doentes por um maior período de tempo após a alta hospitalar, especialmente aqueles com história de transtorno mental.

Esses resultados parecem estar compatíveis com os achados de outros estudos de prevalência semelhantes e com o que foi observado nas pandemias anteriores (SARS e MERS). Contudo, tais análises devem ser contextualizadas: a taxa de resposta dos questionários foi baixa; é possível que os participantes justamente por apresentarem sintomas comportamentais ou psicológicos tenham optado por preencher os questionários; nem todos os pacientes poderiam estar internados por complicações da Covid-19, mas ter apresentado resultado positivo durante o período hospitalar; a forma como foi pesquisada a história patológica pregressa de transtornos mentais foi perguntando diretamente aos pacientes. Embora os autores não cheguem a mencionar isso, deve-se considerar que a amostra reflete a realidade daquela região, devendo-se ter cuidado na extrapolação de seus resultados.

Resultados do segundo trabalho

Já o segundo trabalho avaliado, publicado na Intensive Care Medicine, avaliou 47 pacientes que tiveram Covid-19 após a alta do CTI. Estes foram entrevistados cerca de um mês após a alta com a escala IES-R para avaliar a presença de transtorno agudo por estresse. No total, 40,4% dos avaliados preencheram critérios para o transtorno com o uso desta escala, sendo depois encaminhados para outros serviços onde poderiam ser melhor acompanhados e, se necessário, tratados.

Também foram avaliadas as manifestações clínicas e psíquicas que esses doentes apresentavam após a alta. Os sintomas clínicos mais comuns foram: astenia (97,8%), alterações no equilíbrio (19,2%), ageusia (19,2%), anosmia (10,6%), alterações auditivas (10,6%) e dispnéia (presente em 97,8% dos pacientes aos esforços moderados a graves, 27,7% aos esforços leves e 8,5% ao repouso).

Apesar de a presença de dispneia não ter sido diferente entre pacientes com ou sem o transtorno agudo por estresse, aqueles que pontuaram na escala para o transtorno referiram uma intensidade maior do quadro dispneico.

Ainda dentro do grupo com o transtorno, os sintomas característicos mais comuns foram os de caráter intrusivo, seguidos pelos evitativos e, por último, aqueles relacionados à hiperestimulação/reatividade, sem que houvesse diferenças nas características dos pacientes ou nas internações. No entanto, parece que os pacientes com o transtorno apresentavam um menor grau de hipóxia à admissão no CTI. Por estarem menos hipoxêmicos, poderiam também estar mais conscientes da experiência da internação, da sua condição de saúde e do que se passava com os demais pacientes internados – o que poderia justificar a relação com o transtorno.

Os pacientes também referiram outras queixas, sendo a mais comum o isolamento, por sua vez agravado pelas dificuldades de comunicação com a equipe de saúde e com os familiares. Muitos também relataram que suas memórias sobre o período não estavam muito claras, além de se queixarem de sentimentos de desrealização, pesadelos e até mesmo a crença de que se encontravam numa espécie de “falso hospital”.

Considerações sobre transtornos mentais pós-internação por Covid-19

Interessante notar que uma parte dos pacientes, independentemente de preencherem os critérios para o transtorno ou não, afirmaram que desejariam voltar ao local da internação, tanto para que isso ajudasse as suas memórias, como para poderem conhecer a equipe de saúde que cuidou deles.

Os resultados de ambos os trabalhos, mesmo com as devidas limitações, sugerem uma elevada prevalência de diferentes transtornos mentais em pacientes que estiveram internados por Covid-19. Dessa forma, esses pacientes deveriam ser seguidos e avaliados para a presença de transtornos mentais ao longo do seguimento após a alta. Isso parece ser ainda mais imperativo na população com história  pregressa de transtornos mentais.

Fonte

https://pebmed.com.br/transtornos-mentais-em-pacientes-pos-internacao-por-covid-19/

Autor(a)

Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referências Bibliográficas

  • Mongodi S, Salve G, Tavazzi G, Politi P, Mojoli F. High Prevalence of Acute Stress Disorder and Persisting Symptoms in ICU Survivors After COVID-19. intensive Care Medicine, March 2021. doi: https://doi.org/10.1007/s00134-021-06349-7
  • Wang PR, Oyem PC, Viguera AC. Prevalence of Psychiatric Morbidity Following Discharge After COVID-19 Hospitalization. General Hospital Psychiatry, March-April, 2021. doi: https://dx.doi.org/10.1016%2Fj.genhosppsych.2020.12.013

Transtornos mentais em pacientes pós-internação por Covid-19

Desde o início da pandemia, médicos e pesquisadores em todo o mundo vêm se perguntando se pacientes que estiveram internados por Covid-19 apresentam mais transtornos mentais após a alta e quais seriam esses transtornos. Os pacientes que estiveram em cuidados intensivos estariam mais propensos a transtornos mentais específicos ou a suas formas mais graves?

Essas questões foram debatidas em dois trabalhos independentes e que foram enviados aos editores de duas revistas médicas distintas: General Hospital Psychiatry e Intensive Care Medicine, ambos publicados em março deste ano.

Os estudos

No primeiro, são colocados, de forma resumida, os resultados de um estudo transversal realizado em um hospital em Cleveland (EUA) entre março e agosto de 2020. Nele, todos os pacientes que estiveram internados por Covid-19 no período descrito e que receberam alta posteriormente receberam uma mensagem recrutando para a participação no estudo, que consistia em acessar um link que direcionava os participantes para o preenchimento de escalas validadas para avaliação de 3 transtornos mentais: ansiedade (GAD-7), depressão (CES-D 10) e transtorno de estresse pós-traumático – vulgo, TEPT (PTSD-5).

No segundo trabalho, foram avaliados 47 pacientes que receberam alta após terem sido internados em unidades de cuidados intensivos (UTI ou CTI) devido à Covid-19 entre fevereiro e junho de 2020. Eles foram reavaliados cerca de um mês após a alta hospitalar e responderam a uma escala de avaliação de transtorno de estresse agudo (IES-R).

Resultados do primeiro trabalho

Inicialmente, vamos discutir os resultados do primeiro estudo, que avaliou quadros de ansiedade, depressão e TEPT. Dentre todos os pacientes que preencheram os critérios de recrutamento, todos receberam o convite para participar da pesquisa, mas apenas 19% responderam os questionários. Destes, 57% pontuaram para pelo menos um dos transtornos avaliados, sendo o mais comum o transtorno depressivo (42%), seguido por TEPT (34%) e finalmente os transtornos ansiosos (24%). Esses pacientes ainda foram divididos em dois grupos: pacientes que tinham história prévia de transtorno mental e os que não tinham história de transtorno mental antes da atual internação.

Na comparação entre eles, pôde-se observar que entre os que tinham história prévia de transtorno mental havia uma maior proporção de indivíduos pontuando para alguma forma de transtorno mental após a alta (78%) em relação aos que nunca tinham tido transtorno mental até então (42%). Mas, como os números indicam, não ter passado de transtorno mental não significa que esses indivíduos não fossem vulneráveis, encontrando-se o mesmo padrão já descrito: a depressão é o transtorno mais comum (37,2%), seguido por TEPT (23%) e transtornos ansiosos (11,2%).

Estes resultados não parecem ter sido influenciados pelo momento após a alta em que os questionários foram respondidos. Isso inclusive sugere a necessidade de seguir estes doentes por um maior período de tempo após a alta hospitalar, especialmente aqueles com história de transtorno mental.

Esses resultados parecem estar compatíveis com os achados de outros estudos de prevalência semelhantes e com o que foi observado nas pandemias anteriores (SARS e MERS). Contudo, tais análises devem ser contextualizadas: a taxa de resposta dos questionários foi baixa; é possível que os participantes justamente por apresentarem sintomas comportamentais ou psicológicos tenham optado por preencher os questionários; nem todos os pacientes poderiam estar internados por complicações da Covid-19, mas ter apresentado resultado positivo durante o período hospitalar; a forma como foi pesquisada a história patológica pregressa de transtornos mentais foi perguntando diretamente aos pacientes. Embora os autores não cheguem a mencionar isso, deve-se considerar que a amostra reflete a realidade daquela região, devendo-se ter cuidado na extrapolação de seus resultados.

Resultados do segundo trabalho

Já o segundo trabalho avaliado, publicado na Intensive Care Medicine, avaliou 47 pacientes que tiveram Covid-19 após a alta do CTI. Estes foram entrevistados cerca de um mês após a alta com a escala IES-R para avaliar a presença de transtorno agudo por estresse. No total, 40,4% dos avaliados preencheram critérios para o transtorno com o uso desta escala, sendo depois encaminhados para outros serviços onde poderiam ser melhor acompanhados e, se necessário, tratados.

Também foram avaliadas as manifestações clínicas e psíquicas que esses doentes apresentavam após a alta. Os sintomas clínicos mais comuns foram: astenia (97,8%), alterações no equilíbrio (19,2%), ageusia (19,2%), anosmia (10,6%), alterações auditivas (10,6%) e dispnéia (presente em 97,8% dos pacientes aos esforços moderados a graves, 27,7% aos esforços leves e 8,5% ao repouso).

Apesar de a presença de dispneia não ter sido diferente entre pacientes com ou sem o transtorno agudo por estresse, aqueles que pontuaram na escala para o transtorno referiram uma intensidade maior do quadro dispneico.

Ainda dentro do grupo com o transtorno, os sintomas característicos mais comuns foram os de caráter intrusivo, seguidos pelos evitativos e, por último, aqueles relacionados à hiperestimulação/reatividade, sem que houvesse diferenças nas características dos pacientes ou nas internações. No entanto, parece que os pacientes com o transtorno apresentavam um menor grau de hipóxia à admissão no CTI. Por estarem menos hipoxêmicos, poderiam também estar mais conscientes da experiência da internação, da sua condição de saúde e do que se passava com os demais pacientes internados – o que poderia justificar a relação com o transtorno.

Os pacientes também referiram outras queixas, sendo a mais comum o isolamento, por sua vez agravado pelas dificuldades de comunicação com a equipe de saúde e com os familiares. Muitos também relataram que suas memórias sobre o período não estavam muito claras, além de se queixarem de sentimentos de desrealização, pesadelos e até mesmo a crença de que se encontravam numa espécie de “falso hospital”.

Considerações sobre transtornos mentais pós-internação por Covid-19

Interessante notar que uma parte dos pacientes, independentemente de preencherem os critérios para o transtorno ou não, afirmaram que desejariam voltar ao local da internação, tanto para que isso ajudasse as suas memórias, como para poderem conhecer a equipe de saúde que cuidou deles.

Os resultados de ambos os trabalhos, mesmo com as devidas limitações, sugerem uma elevada prevalência de diferentes transtornos mentais em pacientes que estiveram internados por Covid-19. Dessa forma, esses pacientes deveriam ser seguidos e avaliados para a presença de transtornos mentais ao longo do seguimento após a alta. Isso parece ser ainda mais imperativo na população com história  pregressa de transtornos mentais.

Fonte: https://pebmed.com.br/transtornos-mentais-em-pacientes-pos-internacao-por-covid-19/

Autor(a): Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referência Bibliográfica:

Mongodi S, Salve G, Tavazzi G, Politi P, Mojoli F. High Prevalence of Acute Stress Disorder and Persisting Symptoms in ICU Survivors After COVID-19. intensive Care Medicine, March 2021. doi: https://doi.org/10.1007/s00134-021-06349-7

Wang PR, Oyem PC, Viguera AC. Prevalence of Psychiatric Morbidity Following Discharge After COVID-19 Hospitalization. General Hospital Psychiatry, March-April, 2021. doi: https://dx.doi.org/10.1016%2Fj.genhosppsych.2020.12.013

Dor Neuropática Pós-COVID

Segundo a International Association for the Study of Pain (IASP), a dor pode ser definida como: “Uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”. Pela definição já conseguimos perceber que além das questões fisiológicas e anatômicas ocasionadas pela dor, é um sintoma que afeta o bem-estar social e psicológico do indivíduo.

Devido ao isolamento social causado pela pandemia de COVID-19, alguns males como a sarcopenia, piora de dores crônicas pela falta de condições de ir a médicos, deixar de ir à fisioterapia e diminuição de procedimentos intervencionistas analgésicos, há uma piora geral da dor, sendo necessário uma abordagem mais aprofundada sobre o tema.

No vídeo abaixo, a Dra. Mariana Palladini, especialista em terapia da dor, discorre de maneira objetiva sobre Dor Neuropática Pós-COVID.

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“Brain fog”, disbiose e probióticos: o que há de novo?

Os distúrbios psiquiátricos encontram-se entre as principais causas de atendimento médico e podem levar a incapacidade laboral e a piora da qualidade de vida dos pacientes. A depressão e a ansiedade merecem destaque no rol destes distúrbios, e nem sempre o diagnóstico das mesmas é fácil. Acreditamos que o Brain fog precisa ser incluído nesta linha de raciocínio diagnóstico. É fundamental alargar o horizonte para novas abordagens diagnósticas e terapêuticas, sendo está uma área promissora para estudos médicos.

O que é Brain fog?

Não é uma doença propriamente em si, mas um sintoma de outras condições patológicas médicas. É caracterizado como uma disfunção cognitiva em que podem estar presentes: alterações de memória, falta de clareza mental, distração fácil e/ou diminuição da capacidade de concentração. Mas quais seriam as suas causas? Estresse crônico, má qualidade de sono, alterações hormonais como na menopausa, andropausa ou gravidez, hábito ou deficiência alimentar; como deficiência de vitamina B12, medicamentos, intoxicações e/ou condições patológicas, tais como diabetes, anemia e depressão; podem estar etiopatogenicamente implicadas. O diagnóstico de síndrome da fadiga crônica, uma doença altamente debilitante com queixas clínicas heterogêneas também precisa ser considerado.

Relação com outras doenças

A relação do Brain fog e da síndrome da fadiga crônica com a disbiose da microbiota intestinal já foram aventadas, podendo estar relacionadas a alterações da relação bidirecional eixo cérebro-intestino. A importância que o Sistema Nervoso Entérico, uma complexa rede neuronal do sistema nervoso periférico e autonômico, precisa ser destacada. O microbioma intestinal, as células imunitárias, aliados à estrutura neuronal entérica possuem a capacidade de modular o Sistema Nervoso Central e estão alterados na disbiose. Podemos concluir que a esta interação inclui vias neurais, humorais e imunológicas e o papel da microbiota é de extrema relevância. Vários estudos mostram que uma comunicação alterada entre a microbiota e o eixo cérebro-intestino, pode estar relacionada a doenças tais como distúrbios neuropsiquiátricos, ansiedade, depressão e até autismo. É sabido que na disbiose há uma alteração do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, níveis alterados de triptofano, ácidos graxos de cadeia curta, e que pode influenciar o funcionamento intestinal.

A disbiose pode também contribuir para perpetuar esta disfunção/inflamação, prejudicando ainda mais a comunicação cérebro-intestino. O papel das tight junctions na manutenção da eubiose intestinal também precisa ser destacado, uma vez que as mesmas mantêm a integridade do epitélio intestinal regulando a passagem de íons, solutos e água. Por se tratarem de barreira semipermeável bloqueiam a livre difusão de proteínas, lipídeos e de produtos patogênicos. Alguns estudos demonstraram que a permeabilidade intestinal alterada pode levar a distúrbios inflamatórios crônicos e hipoteticamente permitir que o Brain fog se manifeste. Nestes casos pode-se pesquisar o supercrescimento bacteriano do Intestino delgado através do teste do hidrogênio expirado. Caso presente deverá ser tratado com antibióticos e a resposta clínica será avaliada. Alguns autores incluem no tratamento o uso de probióticos.

Probióticos

Segundo a Food and Agriculture Organization e World Health Organization, os mesmos são definidos como microrganismos vivos que, se em quantidade adequada, conferem benefício para a saúde. Há anos vários estudos já demostraram que os probióticos podem desempenhar um papel importante em várias áreas da medicina, como dermatologia, pediatria e gastrenterologia, por exemplo. Por outra lado, o estudo de sua atuação nos distúrbios psiquiátricos é bem mais recente, surgindo o conceito de psicobióticos. Os mesmos são definidos como probióticos que em tese possuem um papel benéfico e poderiam influenciar positivamente a saúde mental.

Psicobióticos no combate à depressão

Logan & Katzman em 2005, foram pioneiros a propor a eficácia do uso de psicobióticos como terapia adjuvante na depressão. Segundo os mesmos, estes probióticos apresentariam ação sistêmica atenuando citocinas inflamatórias e estimulando centros cerebrais que participam do processamento da informação neural. Estes centros levam a respostas autonômicas, neuroendócrinas e comportamentais.

Autores investigaram o efeito dos probióticos em indivíduos com diagnóstico de Transtorno Depressivo Maior, utilizando a ferramenta de Avaliação do Grau Depressivo. Foi constatada a diminuição desta pontuação no grupo que utilizou os probióticos em relação ao grupo controle. As cepas as mais citadas como benéficas na melhora dos sintomas depressivos e cognitivos foram Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei, Lactobacillus helveticus, Bifidobacterium lactis, Bifidobacterium longum e Bifidobacterium bifidum em concentrações entre 108 e 1010UFC/dia, com efeitos mensuráveis a partir da quarta semana de suplementação. Estes resultados devem ser avaliados com ressalva devido a multifatoriedade fisiopatológica da depressão e por variáveis de difícil controle na análise dos grupos de estudo. Destacam-se a baixa qualidade metodológica de alguns estudos, uma vez que vários têm um grupo heterogêneo ou com poucos indivíduos incluídos e as cepas usadas variaram entre os estudos.

Brain Fog na pandemia

Neste momento de pandemia, o número de pacientes que têm procurado os serviços de saúde com depressão, ansiedade ou sinais sugestivos de Brain fog tem crescido muito. Considerando também que a prevalência de transtornos depressivos no Brasil atinge 6% da população e que até 40% dos pacientes que utilizam antidepressivos não respondem como esperado ao tratamento ou uso de terapias adjuvantes como psicobióticos surge como interessante opção. Não há na literatura estudos sobre a atuação dos psicobióticos no Brain fog, mas a suplementação de pacientes com culturas probióticas desponta como uma possibilidade terapêutica e o seu uso futuro parece bastante promissor.

Fonte: https://pebmed.com.br/brain-fog-disbiose-e-probioticos-o-que-ha-de-novo/

Autor(a): Vera Lucia Angelo Andrade

Graduação em Medicina pela UFMG em 1989 • Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek • Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia • Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein • Mestre e Doutora em Patologia pela UFMG • Responsável pelo Setor de Motilidade da Clínica SEDIG BH desde 1995 • http://lattes.cnpq.br/0589625731703512

Referências bibliográficas: 

  • M Hornig. Can the light of immunometabolism cut through “brain fog”? The Journal of Clinical Investigation, 2020; 1102-1103. doi: 10.1172/JCI134985
  • Logan AC, Katzman M. Major depressive disorder: Probiotics may be an adjuvant therapy. Med Hypotheses. 2005 [cited 2018 Sept 14];64(3):533-8. doi: 1016/j.mehy.2004.08.019
  • Moraes ALF, Bueno RGAL, Fuentes-Rojas M, Antunes AEC. Suplementações com probióticos e depressão: estratégia terapêutica? Rev Ciênc Med. 2019;28(1):31-47
  • Silvestre C. O diálogo entre o cérebro e o intestino – Qual o papel dos probióticos?. Trabalho Final de Mestrado Integrado em Medicina . Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Clínica Universitária de Psiquiatria. 2015. Disponível em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/26287/1/CarinaRFSilvestre.pdf. (Acesso 06/11/20)
  • World Health Organization. Depression and other common mental disorders: Global health estimates. Geneva: WHO; 2017.