Ansiedade, insônia, as implicações psicopatológicas no pós-pandemia e o uso de antidepressivo tricíclico como opção terapêutica

O transtorno de ansiedade generalizada, ou TAG, é de alta prevalência nos dias atuais.
Dentre as inúmeras queixas somáticas referidas pelos pacientes, o distúrbio do sono é
o principal sinal para busca por avaliação médica. Ensaios clínicos indicam que a
insônia constitui fator de risco para o aparecimento posterior de transtorno de
ansiedade. No contexto da pandemia do Covid-19, esta relação se aprofundou:
revisões sistemáticas já publicadas indicam que pacientes com Covid-19 referiram
ansiedade e/ou distúrbios do sono, sendo tais implicações psicopatológicas
reconhecidas como sintomas primários da fase pós-Covid-19 aguda.1,2,3,4,5,6


O tratamento do TAG é multifatorial e com diversas classes de medicamentos de
escolha: inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), inibidores seletivos da
recaptação de serotonina e noradrenalina (ISRN), inibidores da monoaminoxidase
(IMAO), tetracíclicos (ADTC) e tricíclicos (ADTs). Entre os tricíclicos, destaca-se o
cloridrato de nortriptilina.7,8


O cloridrato de nortriptilina, cuja marca de referência é o Pamelor®, age no sistema
nervoso central. Atua como inibidor da recaptação dos neurotransmissores serotonina
e norepinefrina, com efeito vasoconstritor.7,8


Um ensaio clínico randomizado avaliou a terapia por administração de cloridrato de
nortriptilina e por adoção de terapia metacognitiva (MCT) para ansiedade, depressão e
sofrimento psíquico. A randomização distribuiu pacientes em três grupos, estes
recebendo MCT, nortriptilina e controles. O ensaio conclui que a combinação de
psicoterapia metacognitiva com terapia farmacológica conservadora, por meio do uso
de cloridrato de nortriptilina, é eficaz no combate aos sintomas de ansiedade e de
sofrimento emocional, no acompanhamento de curto e de longo prazo.8

O cenário pós-pandêmico do Covid-19 indica novos índices de prevalência para
enfermidades como ansiedade e distúrbios do sono. Ensaio clínico randomizado indica
que pacientes com Covid-19 apresentam, em relação à população em geral, um
aumento substancial destes distúrbios em comparação com a prevalência
pré-pandêmica: 47% dos pacientes experimentam TAG e 34% dos pacientes
apresentam distúrbios do sono.9,10,11


Neste contexto, levando-se em consideração que o TAG geralmente é crônico e
frequentemente associado a sintomas depressivos – e possivelmente a comorbidades
relacionadas ao sono -, a farmacoterapia ideal pode ser baseada em um medicamento
que trate adequadamente essas disfunções. Antidepressivos, especialmente aqueles
com ação no sistema serotoninérgico e, possivelmente, noradrenérgicos, podem ser a
opção adequada: eles não apenas tratam a ansiedade, mas também tratam ou
previnem o desenvolvimento de depressão como uma comorbidade ao TAG.9,10,11


Referências


1 – Fochesatto Filho L, Barros E. Medicina Interna na Prática Clínica. Porto Alegre:
Artmed; 2013.
2 – Kapczinski F, dos Santos Souza JJSS, Batista Miralha da Cunha AABC, Schmitt RRS.
Antidepressants for generalised anxiety disorder (GAD). Cochrane Database of
Systematic Reviews 2003.
3 – K Rickels, R Downing, E Schweizer, H Hassman. Antidepressants for the treatment
of generalized anxiety disorder. A placebo-controlled comparison of imipramine,
trazodone, and diazepam. Arch Gen Psychiatry. 1993 Nov; 50(11): 884-95.
4 – Jaime M Monti. Insônia primária: diagnóstico diferencial e tratamento. Rev Bras
Psiquiatria. 2000; 22(1): 31-4.

5 – Mario Gennaro Mazza, Mariagrazia Palladini, Sara Poletti. Post-COVID-19 Depressive
Symptoms: Epidemiology, Pathophysiology, and Pharmacological Treatment. CNS
Drugs. 2022 Jun 21;1-22. doi: 10.1007/s40263-022-00931-3.
6 – Jiawen Deng, Fangwen Zhou, Wenteng Hou, Zachary Silver, Chi Yi Wong, Oswin
Chang, Emma Huang, Qi Kang Zuo. The prevalence of depression, anxiety, and sleep
disturbances in Covid-19 patients: a meta-analysis.
Epub 2020 Oct 2.
7 – ANVISA. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Consultas. Bulário Eletrônico.
Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/bulario/q/?nomeProduto=PAMELOR
Acesso em: 30 jun 2022.
8 – Batebi, S., Masjedi Arani, A., Jafari, M., Sadeghi, A., Saberi Isfeedvajani, M., &
Davazdah Emami, M.H. (2020). A randomized clinical trial of metacognitive therapy and
nortriptyline for anxiety, depression, and difficulties in emotion regulation of patients
with functional dyspepsia. Research in Psychotherapy: Psychopathology, Process and
Outcome, 23(2), 157-166. doi: 10.4081/ripppo.2020.448.
9 – R B Hidalgo, J R Davidson. Generalized anxiety disorder. An important clinical
concern. Med Clin North Am. 2001 May; 85(3): 691-710.
10 – Salari, N., A. Hosseinian-Far, R. Jalali, et al. 2020. Prevalence of stress, anxiety,
depression among the general population during the COVID-19 pandemic: a systematic
review and meta-analysis. Global Health 16: 57. 112.
11 – Lin, L.-Y., J. Wang, X.-Y. Ou-Yang, et al. 2020. The immediate impact of the 2019
novel coronavirus (COVID-19) outbreak on subjective sleep status. Sleep Med.

O uso dos tricíclicos na síndrome do intestino irritável [Vídeo]

A síndrome do intestino irritável é uma doença funcional, recorrente da interação do cérebro-intestino ocorrendo, pelo menos, 1x/semana por um período de 3 meses ou mais e sendo capaz de interferir na qualidade de vida das pessoas.

Existem diversos tratamentos da SII, entre eles os antidepressivos tricíclicos que apresentam eficácia no controle geral dos sintomas da SII, inibindo a recaptação da noradrenalina e serotonina, neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da dor e com uma melhora perceptível entre 4 e 12 semanas. Entre os tricíclicos utilizados para essa finalidade, o que apresenta melhor tolerabilidade sem afetar a eficácia é a nortriptilina.

Acesse a vídeo aula feita pelo Dr. Gerson Domingues, Prof. Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Ciências Médicas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e entenda mais sobre o assunto:

Cefaleia Pós-Covid 19 [Vídeo]

A cefaleia pode durar dias, impactando nas atividades diárias das pessoas e sendo a segunda doença que mais gera incapacidade no mundo. Com a pandemia, ocasionada pela Covid-19, grande parte das pessoas infectadas e pós infecção apresentaram a dor de cabeça como um dos sintomas.

Existem diversos medicamentos que são utilizados para o tratamento dessas dores, incluindo o uso de antidepressivos tricíclicos (TCA) como a nortriptilina, sendo um dos mais usados na profilaxia da migrânea.

 Acesse o vídeo abaixo e entenda mais sobre o assunto:

Transtornos mentais em pacientes pós-internação por Covid-19

Desde o início da pandemia, médicos e pesquisadores em todo o mundo vêm se perguntando se pacientes que estiveram internados por Covid-19 apresentam mais transtornos mentais após a alta e quais seriam esses transtornos. Os pacientes que estiveram em cuidados intensivos estariam mais propensos a transtornos mentais específicos ou a suas formas mais graves?

Essas questões foram debatidas em dois trabalhos independentes e que foram enviados aos editores de duas revistas médicas distintas: General Hospital Psychiatry e Intensive Care Medicine, ambos publicados em março deste ano.

Os estudos

No primeiro, são colocados, de forma resumida, os resultados de um estudo transversal realizado em um hospital em Cleveland (EUA) entre março e agosto de 2020. Nele, todos os pacientes que estiveram internados por Covid-19 no período descrito e que receberam alta posteriormente receberam uma mensagem recrutando para a participação no estudo, que consistia em acessar um link que direcionava os participantes para o preenchimento de escalas validadas para avaliação de 3 transtornos mentais: ansiedade (GAD-7), depressão (CES-D 10) e transtorno de estresse pós-traumático – vulgo, TEPT (PTSD-5).

No segundo trabalho, foram avaliados 47 pacientes que receberam alta após terem sido internados em unidades de cuidados intensivos (UTI ou CTI) devido à Covid-19 entre fevereiro e junho de 2020. Eles foram reavaliados cerca de um mês após a alta hospitalar e responderam a uma escala de avaliação de transtorno de estresse agudo (IES-R).

Resultados do primeiro trabalho

Inicialmente, vamos discutir os resultados do primeiro estudo, que avaliou quadros de ansiedade, depressão e TEPT. Dentre todos os pacientes que preencheram os critérios de recrutamento, todos receberam o convite para participar da pesquisa, mas apenas 19% responderam os questionários. Destes, 57% pontuaram para pelo menos um dos transtornos avaliados, sendo o mais comum o transtorno depressivo (42%), seguido por TEPT (34%) e finalmente os transtornos ansiosos (24%). Esses pacientes ainda foram divididos em dois grupos: pacientes que tinham história prévia de transtorno mental e os que não tinham história de transtorno mental antes da atual internação.

Na comparação entre eles, pôde-se observar que entre os que tinham história prévia de transtorno mental havia uma maior proporção de indivíduos pontuando para alguma forma de transtorno mental após a alta (78%) em relação aos que nunca tinham tido transtorno mental até então (42%). Mas, como os números indicam, não ter passado de transtorno mental não significa que esses indivíduos não fossem vulneráveis, encontrando-se o mesmo padrão já descrito: a depressão é o transtorno mais comum (37,2%), seguido por TEPT (23%) e transtornos ansiosos (11,2%).

Estes resultados não parecem ter sido influenciados pelo momento após a alta em que os questionários foram respondidos. Isso inclusive sugere a necessidade de seguir estes doentes por um maior período de tempo após a alta hospitalar, especialmente aqueles com história de transtorno mental.

Esses resultados parecem estar compatíveis com os achados de outros estudos de prevalência semelhantes e com o que foi observado nas pandemias anteriores (SARS e MERS). Contudo, tais análises devem ser contextualizadas: a taxa de resposta dos questionários foi baixa; é possível que os participantes justamente por apresentarem sintomas comportamentais ou psicológicos tenham optado por preencher os questionários; nem todos os pacientes poderiam estar internados por complicações da Covid-19, mas ter apresentado resultado positivo durante o período hospitalar; a forma como foi pesquisada a história patológica pregressa de transtornos mentais foi perguntando diretamente aos pacientes. Embora os autores não cheguem a mencionar isso, deve-se considerar que a amostra reflete a realidade daquela região, devendo-se ter cuidado na extrapolação de seus resultados.

Resultados do segundo trabalho

Já o segundo trabalho avaliado, publicado na Intensive Care Medicine, avaliou 47 pacientes que tiveram Covid-19 após a alta do CTI. Estes foram entrevistados cerca de um mês após a alta com a escala IES-R para avaliar a presença de transtorno agudo por estresse. No total, 40,4% dos avaliados preencheram critérios para o transtorno com o uso desta escala, sendo depois encaminhados para outros serviços onde poderiam ser melhor acompanhados e, se necessário, tratados.

Também foram avaliadas as manifestações clínicas e psíquicas que esses doentes apresentavam após a alta. Os sintomas clínicos mais comuns foram: astenia (97,8%), alterações no equilíbrio (19,2%), ageusia (19,2%), anosmia (10,6%), alterações auditivas (10,6%) e dispnéia (presente em 97,8% dos pacientes aos esforços moderados a graves, 27,7% aos esforços leves e 8,5% ao repouso).

Apesar de a presença de dispneia não ter sido diferente entre pacientes com ou sem o transtorno agudo por estresse, aqueles que pontuaram na escala para o transtorno referiram uma intensidade maior do quadro dispneico.

Ainda dentro do grupo com o transtorno, os sintomas característicos mais comuns foram os de caráter intrusivo, seguidos pelos evitativos e, por último, aqueles relacionados à hiperestimulação/reatividade, sem que houvesse diferenças nas características dos pacientes ou nas internações. No entanto, parece que os pacientes com o transtorno apresentavam um menor grau de hipóxia à admissão no CTI. Por estarem menos hipoxêmicos, poderiam também estar mais conscientes da experiência da internação, da sua condição de saúde e do que se passava com os demais pacientes internados – o que poderia justificar a relação com o transtorno.

Os pacientes também referiram outras queixas, sendo a mais comum o isolamento, por sua vez agravado pelas dificuldades de comunicação com a equipe de saúde e com os familiares. Muitos também relataram que suas memórias sobre o período não estavam muito claras, além de se queixarem de sentimentos de desrealização, pesadelos e até mesmo a crença de que se encontravam numa espécie de “falso hospital”.

Considerações sobre transtornos mentais pós-internação por Covid-19

Interessante notar que uma parte dos pacientes, independentemente de preencherem os critérios para o transtorno ou não, afirmaram que desejariam voltar ao local da internação, tanto para que isso ajudasse as suas memórias, como para poderem conhecer a equipe de saúde que cuidou deles.

Os resultados de ambos os trabalhos, mesmo com as devidas limitações, sugerem uma elevada prevalência de diferentes transtornos mentais em pacientes que estiveram internados por Covid-19. Dessa forma, esses pacientes deveriam ser seguidos e avaliados para a presença de transtornos mentais ao longo do seguimento após a alta. Isso parece ser ainda mais imperativo na população com história  pregressa de transtornos mentais.

Fonte

https://pebmed.com.br/transtornos-mentais-em-pacientes-pos-internacao-por-covid-19/

Autor(a)

Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referências Bibliográficas

  • Mongodi S, Salve G, Tavazzi G, Politi P, Mojoli F. High Prevalence of Acute Stress Disorder and Persisting Symptoms in ICU Survivors After COVID-19. intensive Care Medicine, March 2021. doi: https://doi.org/10.1007/s00134-021-06349-7
  • Wang PR, Oyem PC, Viguera AC. Prevalence of Psychiatric Morbidity Following Discharge After COVID-19 Hospitalization. General Hospital Psychiatry, March-April, 2021. doi: https://dx.doi.org/10.1016%2Fj.genhosppsych.2020.12.013

Dor Neuropática Pós-COVID

Segundo a International Association for the Study of Pain (IASP), a dor pode ser definida como: “Uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”. Pela definição já conseguimos perceber que além das questões fisiológicas e anatômicas ocasionadas pela dor, é um sintoma que afeta o bem-estar social e psicológico do indivíduo.

Devido ao isolamento social causado pela pandemia de COVID-19, alguns males como a sarcopenia, piora de dores crônicas pela falta de condições de ir a médicos, deixar de ir à fisioterapia e diminuição de procedimentos intervencionistas analgésicos, há uma piora geral da dor, sendo necessário uma abordagem mais aprofundada sobre o tema.

No vídeo abaixo, a Dra. Mariana Palladini, especialista em terapia da dor, discorre de maneira objetiva sobre Dor Neuropática Pós-COVID.

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Transtorno depressivo em adolescentes: tratar com antidepressivos, psicoterapia ou os dois?

Já é de conhecimento público a crescente prevalência do transtorno depressivo maior no mundo, o que inclui a população infanto-juvenil. Por isso, mais estudos sobre o tema dedicados a essa faixa etária tem sido elaborados. Neste mês de julho, o Lancet Psychiatry lançou uma metanálise avaliando os tratamentos para depressão na infância e adolescência.

A presença do transtorno nesse grupo pode se apresentar de forma bastante heterogênea, como agressividade, irritabilidade ou recusa em ir para a escola. Dessa forma, pode influenciar em diversos setores da vida dos jovens, como na sua socialização ou no seu desenvolvimento acadêmico. Também pode precipitar o desenvolvimento de comorbidades, como transtornos alimentares, tabagismo, abuso de substâncias, uso de substâncias ilícitas e ideação suicida, além de ser considerada como uma das principais causas de morte nesta população. Por consequência, viemos observando um aumento das indicações de psicoterapia e de prescrição de medicações.

Contudo, alguns trabalhos anteriores vêm questionando os reais benefícios da terapia disponível quando comparamos a depressão a outros transtornos mentais (como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade ou os transtornos ansiosos). Este estudo foi realizado com a intenção de esclarecer um pouco as melhores abordagens nestes casos.

Tratamento do transtorno depressivo em crianças e adolescentes

De início, os autores optaram por atualizar a pesquisa de seus dois trabalhos anteriores com estudos sobre a monoterapia com antidepressivos e psicoterapia. Para o tratamento combinado foram feitas pesquisas em diversas bases de dados (LiLACS, PubMed, Cochrane, etc) cujo foco foram ensaios clínicos randomizados, publicados até 01/01/2019. Foram avaliados estudos que comparavam qualquer intervenção (medicação, psicoterapia ou ambos) com alguma forma de controle ou qualquer outra intervenção ativa para o tratamento agudo de crianças e adolescentes até 18 anos com diagnóstico de transtorno depressivo maior, distimia ou outros transtornos depressivos especificados.

Além da pesquisa em bases eletrônicas também foram feitas pesquisas manuais de trabalhos publicados, não publicados, em andamento (mas registrados), jornais científicos importantes e conferências. Também fizeram contato com autores e com a indústria farmacêutica solicitando relatórios dos trabalhos originais ou material não publicado. Não houve restrição de língua. Apesar de ser um estudo financiado, os autores declararam que o financiador não teve qualquer influência em nenhuma etapa da produção do trabalho.

Foram incluídos antidepressivos autorizados e em dose terapêutica de diferentes classes: inibidores seletivos da recaptação de serotonina (sertralina, paroxetina, escitalopram, citalopram e fluoxetina), inibidores seletivos da recaptação de serotonina e noradrenalina (duloxetina, venlafaxina e desvenlafaxina), tricíclicos (nortriptilina, desipramina, imipramina, amitriptilina e clomipramina) e de outras classes (vilazodona, mirtazapina e nefazodona).

Além disso, foram usadas diferentes técnicas de psicoterapia (terapia cognitivo-comportamental, terapia comportamental, terapia de família, psicodinâmica, terapia de apoio, interpessoal, focada na resolução de problemas, dentre outras) em diferentes formatos e através de diferentes vias (presencial, através da internet, em grupo ou individual) e a combinação de ambos. O controle farmacológico sempre foi obtido através de placebo e o psicoterápico foi feito com listas de espera, placebo psicológico ou tratamento padrão.

Os estudos feitos apenas com antidepressivos em monoterapia eram ensaios clínicos duplo-cegos com grupo controle. Já aqueles que avaliavam a psicoterapia ou a combinação (medicação + terapia) os observadores foram mascarados ou os pacientes foram avaliados através de escalas.

Para reduzir a heterogeneidade foram excluídos os estudos com algumas características, como aqueles com amostras inferiores a 10 pacientes e duração inferior a 4 semanas. Também foram excluídos pacientes com transtorno bipolar, depressão psicótica, resistentes ao tratamento ou que não preenchessem os critérios para transtorno depressivo. Em compensação, foram aceitos pacientes com as seguintes comorbidades: transtornos ansiosos e TDAH.

Os desfechos primários avaliados foram eficácia e aceitação (avaliada por todas as medidas de descontinuação). Já o desfecho secundário foi suicidalidade (entendido como ideação ou comportamento suicida). Para todas as análises tentou-se avaliar os desfechos em torno de 8 semanas. Quando não disponíveis foram usadas informações entre quatro e 16 semanas, com preferência aos dados mais próximos da oitava semana.

Limitações

Dentre uma série de limitações descritas pelos autores, destacamos algumas. Primeiramente deve-se considerar que a qualidade da maioria dos estudos foi considerada baixa ou muito baixa. Além disso, alguns trabalhos não relataram adequadamente como se deu a alocação e a ocultação. Também ressaltam a impossibilidade de realização de se fazer estudos duplo-cego com psicoterapia.

Adicionalmente deve-se contar o efeito da exclusão dos estudos em que os pacientes apresentavam sintomas subclínicos de depressão (mesmo essa população representando uma parcela significativa de pacientes nos consultórios e hospitais); depressão psicótica ou pacientes cujo quadro era resistente ao tratamento. Estudos observacionais foram igualmente excluídos e deve-se considerar que há poucos trabalhos sobre prevenção e recaída da depressão na faixa etária em questão.

Um viés de marketing relacionado à indústria farmacêutica pode ter contribuído para diferentes desfechos num mesmo estudo, apesar de os autores terem adotado medidas para reduzir este viés. Apesar dos esforços para coletar material não-publicado, é possível que alguns trabalhos tenham ficado de fora. Os autores também encontraram dificuldade em quantificar alguns desfechos como a descontinuação por efeitos adversos de um fármaco e a presença de efeitos adversos associados à psicoterapia.

Finalmente, é importante considerar as características de cada fármaco, como a dose necessária para se obter uma resposta e a meia-vida de uma medicação, ou seja, fatores que interferem com a titulação das drogas e o tempo necessário para alcançar a dose terapêutica.

Para mais detalhes sobre este trabalho, acesse o artigo original. A referência para isso pode ser encontrada na bibliografia.

Resultados e Discussão

Foram incluídos 71 ensaios clínicos para análise neste trabalho, totalizando 9.510 pacientes. Os trabalhos foram publicados entre 1986 e 2018, tendo sido comparados 16 antidepressivos, sete formas de psicoterapia, cinco terapias combinadas e três controles psicológicos ou uso de placebo. Desses, 4.081 pacientes foram alocados no tratamento com antidepressivos, 1.575 foram alocados para psicoterapia, 553 para o tratamento combinado e 3.301 para controle psicológico ou com placebo.

A idade dos participantes variou entre três e 20 anos (2 estudos incluíram pacientes até 20 anos, mas foram incluídos porque a idade média dos participantes era inferior a 18 anos, assim como a maioria dos pacientes). Da amostra, 57,2% era composta por mulheres e a duração média do tratamento agudo foi de oito semanas. Os participantes foram distribuídos de forma randômica em três ou mais grupos em dez dos 71 estudos e em 41 estudos os pacientes selecionados eram tratados em regime ambulatorial.

A maioria dos trabalhos foram feitos na América do Norte, seguidos pela Europa, Ásia, Austrália, América do Sul, diferentes continentes ou em foram feitos em outras áreas ou não tiveram seu local especificado. Dos 9.510 participantes 75,5% tiveram transtorno depressivo maior com gravidade de moderada a grave, com valores documentados em algumas escalas (Children’s Depression Rating Scale, Children’s Depression Inventory e Beck Depression Inventory). Do total, 33,8% dos estudos foram financiados pela indústria farmacêutica. Foram colhidas informações não publicadas de 11 dos 71 artigos.

Risco de vieses: 45,1% do material foi avaliado com alto risco de vieses, 45,1% como moderado e 9,9% como baixo.

Em termos de eficácia, apenas a terapia combinada de fluoxetina com terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a fluoxetina em monoterapia foram mais eficazes do que o placebo e os controles psicológicos. A terapia combinada de fluoxetina + terapia cognitivo-comportamental (TCC) mostrou-se mais eficaz do que a TCC ou a terapia psicodinâmica isoladas. Já a psicoterapia interpessoal foi mais eficaz do que os controles psicológicos, mas com baixa confiança.

No entanto, o uso de nortriptilina e a lista de espera foram piores do que outras intervenções, mas a interpretação dos dados da nortriptilina pode ser limitada a algumas inconsistências encontradas na metodologia da análise. Em termos de aceitação, a nefazodona e a fluoxetina foram menos descontinuadas do que a sertralina, a desipramina e a imipramina.

A imipramina foi mais associada à descontinuação do que o placebo, a vilazodona, a desvenlafaxina e a combinação de fluoxetina + TCC. A venlafaxina foi associada a um aumento significativo de ideação e comportamento suicida quando comparada ao placebo e outras 10 intervenções (fluoxetina, citalopram, escitalopram, duloxetina, imipramina, desvenlafaxina, fluoxetina + TCC, terapia de família, TCC isolada e placebo + TCC).

Esses achados são bem diferentes daqueles encontrados na população adulta, onde todos os antidepressivos descritos possuem eficácia documentada maior que o placebo, assim como as psicoterapias são superiores aos controles psicológicos.

Os autores especulam que tais diferenças poderiam estar relacionadas à aspectos do neurodesenvolvimento (como alterações hormonais, especialmente no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal); o fato de haverem poucos estudos com pacientes mais jovens; as diferenças de métodos de estudo nessas duas populações (talvez crianças e adolescentes respondam mais ao placebo) e por fatores relacionados às técnicas de psicoterapia (que muitas vezes são adaptações de técnicas originalmente desenvolvidas para adultos).

É necessário relembrar que em 2004 a Food and Drug Administration (FDA) colocou um alerta nos antidepressivos sobre seu uso em crianças, pois alguns trabalhos teriam destacado que essas medicações poderiam aumentar a ideação e o comportamento suicida. Como já colocado encontrou-se que a venlafaxina parece estar associada a um aumento significativo do risco de comportamento e ideação suicida em crianças e adolescentes, o que seria consistente com achados anteriores. Isso também pode ter ocorrido em consequência a uma maior notificação de dados sobre a venlafaxina.

A despeito disso, os autores escrevem que duas bases de dados norte-americanas com informações de mais de 220 mil jovens com depressão entre 2004 e 2009 mostraram que a aparente associação entre o uso de antidepressivos e as tentativas de suicídio e autoinjúria diminuíram e não foram estatisticamente significativas. No entanto, ainda sugere-se que os médicos assistentes monitorem seus pacientes com cautela ao iniciarem uma medicação antidepressiva.

Autora:


Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referência bibliográfica:

  • Zhou X, et al. Comparative efficacy and acceptability of antidepressants, psychotherapies, and their combination for acute treatment of children and adolescents with depressive disorder: a systematic review and network meta-analysis. Lancet Psychiatry 2020; 7: 581–601.

Nortriptilina na depressão com ansiedade

Tratamento da depressão com ansiedade

Certas opções terapêuticas proporcionam vantagens em termos de perfil de efeitos colaterais, interações medicamentosas e sintomas decorrentes da descontinuação do uso.²

Para orientar a escolha do tratamento farmacológico, devemos considerar os seguintes aspectos: ¹¹

• Duração, curso e gravidade da depressão;
• Perfil de sintomas;
• Condições clínicas gerais;
• Outras condições psiquiátricas associadas;
• Resposta a tratamentos prévios;
• Medicações em uso e preferência do paciente;
• Tolerabilidade e os prováveis efeitos colaterais do fármaco indicado;
• Custo e facilidade do tratamento.

Uma escolha que deve ser lembrada é o antidepressivo tricíclico nortriptilina (amina secundária). É o metabólico ativo da amitriptilina resultante da primeira passagem hepática e metabolização dessa. Assim, perde grande parte dos efeitos colaterais anticolinérgicos, anti-histamínicos e alfa-adrenérgicos. É o tricíclico que provoca menos hipotensão postural. É o único dessa classe que possui uma janela terapêutica: as doses eficazes se situam entre 50 e 200 mg.

Aumento de dose acima de 150 a 200 mg não eleva o efeito terapêutico, apenas os efeitos colaterais. Tem uma meia-vida de 32 horas, em média, podendo ser utilizado como dose única ao dia. Muito bem tolerado nos idosos.¹², ¹³

A nortriptilina apresenta excelente resultado em quadros de depressão ansiosa: ¹⁴

• Melhora a qualidade do sono e do apetite.
• Reduz a agitação e a ansiedade.
• Reduz a depressão e a desesperança.
• Melhora a baixa energia, a pouca concentração e o desamparo.
• Melhora a diminuição da libido.
• Melhora os sintomas neurovegetativos.

Durante o tratamento com nortriptilina, os primeiros sintomas a melhorarem geralmente são: a má qualidade do sono e do apetite, seguido da redução da agitação, ansiedade, depressão e desesperança. 14 Outros sintomas também evoluem para melhora como baixa energia, pouca concentração, desamparo e diminuição da libido, por melhora global do quadro da depressão ansiosa. ¹⁴

Os sintomas neurovegetativos melhoraram mais com a nortriptilina do que com o escitalopram. ¹⁴ Também é uma boa indicação nos idosos, nos quais o tratamento farmacológico da depressão ansiosa é complicado pelo aumento da frequência de doenças médicas concomitantes e o uso de múltiplas drogas.

No estudo de Köhler-Forsberg et al.,¹¹ 811 adultos foram acompanhados por até 26 semanas após a troca de inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e nortriptilina, e a resposta foi medida com a escala de classificação de depressão de Montgomery-Åsberg (MADRS). Ambas as opções de troca resultaram em melhora significativa entre os indivíduos que trocaram por causa de não resposta ou efeitos colaterais.

Conclusão

A mudança de um ISRS para nortriptilina ou vice-versa após não resposta ou devido aos efeitos colaterais do primeiro antidepressivo pode ser uma abordagem viável para obter remissão entre pacientes com depressão ansiosa.

Vale destacar que muitas vezes o uso de um ISRS associado com a nortriptilina, por ela ser mais noradrenérgica, beneficia muito os pacientes. ¹⁴

Profa. Dra. Alexandrina Maria Augusto da Silva Meleiro
CRM-SP 36139 I RQE 51.805

Doutora em Medicina pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP);
Médica Psiquiatra pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP);
Vice-Presidente da Comissão de Atenção à Saúde Mental do Médico da ABP;
Diretora Científica da Associação Brasileira de Estudo e Prevenção de Suicídio (Abeps);
Vice-presidente do Conselho Científico da Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata).

Referências bibliográficas

¹Sadock BJ, Sadock VA. Kaplan & Sadock – Compêndio de Psiquiatria: Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 9ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2007.
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Nortriptilina em pacientes cardiopatas

Dr. Kalil Duailibi – CRM-SP 47.686
Professor de Psiquiatria da Universidade de Santo Amaro (UNISA), Presidente do Departamento Científico de Psiquiatria da Associação Paulista de Medicina (APM) e Editor da Versão Brasileira da Revista da Associação Psiquiátrica Americana (APA)

Nortriptilina: Indicações Terapêuticas

Artigo Médico

Dra. Kátia Regina Oddone Del Porto – CRM-SP: 75.450
Psiquiatra com Mestrado em Psiquiatria pela Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).