Por que o LGG na diarreia aguda? [Vídeo]

A diarreia aguda tem uma duração inferior a duas semanas e que em uma maioria dos casos está associada a etiologia infecciosa, ou seja, as gastroenterites agudas.

Assista o vídeo onde abordamos o papel do probiótico LGG nessa patologia.

Autor: Dr. Guilherme Grossi Cançado.

Residência médica em Clínica Médica e Gastroenterologia pelo HC-UFMG ⦁ Mestrado em saúde do adulto com ênfase em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da UFMG ⦁ Chefe da Gastrohepatologia do Hospital da Polícia Militar de Minas Gerais ⦁ Preceptor de hepatologia e clínica médica do HC-UFMG ⦁ Conteudista do Whitebook – área de Gastroenterologia e Hepatologia ⦁ Membro da AASLD, SBH, GEDIIB.

Probióticos Como Adjuvantes na Aquisição da Tolerância à APLV

Roberta Esteves Vieira de Castro, MD, MSc, PhD

O que é APLV?

APLV é a sigla para “alergia à proteína do leite de vaca” e pode ser considerada como um termo genérico para diferentes condições clínicas com sintomas, fisiopatologia e tratamento distintos1 iniciados após a introdução de leite de vaca na dieta2. Consiste em uma reação adversa a uma ou mais proteínas do leite de vaca, geralmente caseínas ou β-lactoglobulina do soro de leite, mediada por um ou mais mecanismos imunológicos3.

Em geral, a APLV se manifesta como uma variedade de manifestações clínicas que comumente se desenvolvem em bebês e podem regredir por volta dos 6 anos de idade4. É uma das alergias alimentares mais comuns na infância, com uma prevalência de 2–3% (dependendo da localização geográfica)5 e que vem crescendo globalmente ao longo dos últimos anos6. No Brasil, há poucos dados epidemiológicos. Em um estudo realizado em 2010 e que incluiu 9.478 pacientes avaliados por 30 gastroenterologistas pediátricos nas cinco regiões do país em um período de 40 dias, foi descrita uma prevalência de APLV suspeita em 5,4% da população estudada (513/9,478) sendo que a incidência encontrada foi de 2,2% (211/9,478)3,7.

A APLV é classificada em três tipos: mediada por imunoglobulina E (IgE), não mediada por IgE ou mista (mediada e não mediada por IgE). Na APLV mediada por IgE, ocorre por uma resposta imunomediada exacerbada a uma ou mais proteínas do leite de vaca. A exposição subsequente à (s) proteína (s) induz a reticulação de anticorpos IgE e a liberação de histaminas e outros mediadores imunológicos de mastócitos, que podem dar origem a quadros imediatos de urticária e angioedema. Essas reações mediadas por IgE são caracterizadas por manifestações alérgicas que ocorrem em uma a duas horas após a ingestão do alérgeno. Os sintomas não-IgE se manifestam dentro de horas a dias. Como as manifestações clínicas da APLV não mediada por IgE são uma reminiscência de outras manifestações alérgicas e não alérgicas na infância, diagnósticos tardios e errôneos são comuns. Nesse caso, o diagnóstico é baseado na história clínica, sintomas e exame físico, e confirmado pela remoção e reintrodução de leite de vaca na dieta1,2. A APLV se mantém, mais provavelmente, em doença mediada por IgE e quando existe uma sensibilização intensa, com níveis mais altos de IgE ou reações aos testes cutâneos fortemente positivas, inúmeras sensibilizações alimentares e alergia respiratória simultânea, como rinite e asma6

É importante destacar que a APLV deve ser diferenciada da intolerância ao leite, situação em que um mecanismo não imunológico está envolvido. Exemplos incluem a intolerância à lactose e a aversão ao leite ou intolerância psicológica. A intolerância à lactose não envolve o sistema imunológico, mas a deficiência de uma enzima para digerir a lactose. Assim, o diagnóstico de intolerância à lactose não envolve quaisquer parâmetros imunológicos, enquanto a doença relacionada ao sistema imunológico envolve marcadores imunológicos relevantes1

As manifestações alérgicas de APLV incluem urticária, angioedema, dor abdominal, vômitos, cólica, diarreia, sangue e/ou muco nas fezes, constipação intestinal ou congestão nasal. Algumas crianças apresentam dermatite atópica (DA) que não melhora com o tratamento, sendo que o eczema de início precoce resistente ao tratamento também pode ser uma apresentação de APLV, assim como a anafilaxia2.

A APLV se resolve de forma espontânea na maioria dos pacientes pediátricos. Entretanto, a indução da tolerância oral pode ser uma alternativa terapêutica em casos de alergia persistente, principalmente quando existe risco de ingestão acidental com reações graves subsequentes6. Dessa forma, a APLV pode ser uma imensa fonte de estresse parental e familiar devido a uma dieta com restrição de leite e pode levar a uma deficiência nutricional subsequente se não for tratada adequadamente4.

O que são probióticos e quais seus efeitos no tratamento de alergias?

Probióticos são definidos como microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem um benefício à saúde do hospedeiro8. Os probióticos modulam a estrutura e função da microbiota intestinal e interagem com os enterócitos através da diminuição da permeabilidade intestinal, aumentando a espessura do muco, estimulando a imunoglobulina A (IgA) secretora e produzindo defensina. Ademais, podem modular a resposta da citocina por células imunes e ajudar na prevenção de alergias9,10

Os probióticos foram implicados com sucesso na prevenção de algumas alergias, incluindo a prevenção da DA. A terapia probiótica também tem demonstrado desfechos positivos no tratamento da rinite e da DA, reduzindo a gravidade dos sintomas. Diferentes cepas de Lactobacillus spp. são conhecidas por desempenhar um papel importante na mediação da resposta imune devido ao aparecimento de estruturas supressoras de DNA específicas envolvidas na estimulação da imunidade10. Por exemplo, um recente estudo multicêntrico, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo que incluiu bebês com até dois anos de idade com DA e APLV concluiu que a administração de uma preparação probiótica contendo uma mistura de cepas de Lactobacillus rhamnosus ŁOCK 0900, Lactobacillus rhamnosus ŁOCK 0908 e Lactobacillus casei ŁOCK 0918 é segura e induz efeitos benéficos, especialmente em pacientes sensibilizados com alérgenos. Nesse estudo, a suplementação da dieta dos bebês com a preparação probiótica por três meses resultou em uma melhora significativa na gravidade dos sintomas de DA avaliada com o uso do índice SCORAD11

Em relação ao tratamento de alergias alimentares, os resultados são contraditórios e dependem do tipo específico de cepa probiótica e da duração do tratamento10

Probióticos no tratamento da APLV

Em 2018, no último Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) descrevem que há poucas evidências que suportem o uso de probióticos na prevenção ou no tratamento da alergia alimentar. Uma revisão sistemática realizada em 2019 demonstrou que as evidências atuais sobre os efeitos dos probióticos no manejo da APLV são limitadas e de baixa qualidade3,6,12,13

Entretanto, há estudos que apontam que a microbiota intestinal de bebês e crianças com APLV pode apresentar desequilíbrios9. Em crianças com sensibilização alimentar, o aumento da relação Enterobacteriaceae / Bacteroidaceae e uma diminuição da abundância de Ruminococcaceae foram descritos na literatura, sugerindo que a disbiose intestinal precoce contribui para o desenvolvimento subsequente de alergia alimentar. Com base nessa premissa, os probióticos têm ganhado grande atenção nos últimos anos como uma opção preventiva e terapêutica para essa condição, atuando como moduladores imunológicos que estimulam respostas mediadas por linfócitos T-helper 1 (Th1). As bactérias mais comumente usadas como probióticos pertencem às espécies Lactobacillus e Bifidobacterium. O  momento e a duração do tratamento com probióticos, as cepas probióticas ideais e os fatores que podem alterar sua ação na microbiota intestinal ainda não estão esclarecidos. Antes de propor cepas probióticas específicas para uso clínico, seria necessário explorar a capacidade dessas cepas de atingir o lúmen intestinal e modificar a microbiota intestinal do hospedeiro. Esse é um dos motivos pelos quais recomendações unívocas sobre probióticos ainda não foram elaboradas para a alergia alimentar, como a APLV14

Lactobacillus rhamnosus GG no tratamento da APLV em bebês

O pesquisador Roberto Berni Canani e sua equipe de Nápoles e Trieste, na Itália, têm demonstrado, em estudos clínicos, que bebês com APLV alimentados com fórmula contendo caseína extensivamente hidrolisada (FCEH) suplementada com a espécie bacteriana probiótica Lactobacillus rhamnosus GG (LGG), desenvolvem tolerância em taxas mais altas do que aqueles tratados com fórmula não probiótica. Inclusive, em estudo controlado randomizado que foi realizado em uma população bem característica de crianças com APLV mediada por IgE, os pesquisadores mostraram que o uso de FCEH associada a LGG é superior a FCEH isolada para a prevenção de manifestações alérgicas durante um período de 36 meses15.

Em estudos recentes, o LGG demonstrou ter potencial para afetar reações imunológicas e prevenir e tratar a inflamação alérgica. O LGG  coloniza o sistema intestinal e pode ser isolado nas fezes e seu efeito profilático e terapêutico do LGG foi demonstrado em bebês com doenças atópicas, especialmente a DA suscetível à APLV. Atualmente, o LGG tem sido usado em investigações clínicas em bebês prematuros e a termo nas doses entre 108 e 1010 unidades formadoras de colônias [UFC]16.

Referências

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  2. Martins R, Connolly MP, Minshall E. Cost-effectiveness Analysis of Hypoallergenic Milk Formulas for the Management of Cow’s Milk Protein Allergy in the United Kingdom. J Health Econ Outcomes Res. 2021 Aug 6;8(2):14-25
  3. Castro, REV (2019). Probióticos para alergia à proteína do leite de vaca: revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados. [publicação online]; 2019 [acesso em 08 de outubro de 2021]. Disponível em: https://pebmed.com.br/probioticos-para-alergia-a-proteina-do-leite-de-vaca-revisao-sistematica-de-ensaios-clinicos-randomizados/ 
  4. Edwards CW, Younus MA. Cow Milk Allergy. 2021 Jun 29. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan–. PMID: 31194400
  5. D’Auria E, Salvatore S, Acunzo M, Peroni D, Pendezza E, Di Profio E, Fiore G, Zuccotti GV, Verduci E. Hydrolysed Formulas in the Management of Cow’s Milk Allergy: New Insights, Pitfalls and Tips. Nutrients. 2021 Aug 12;13(8):2762
  6. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 – Parte 2 – Diagnóstico, tratamento e prevenção. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):39-82
  7. Vieira MC, Morais MB, Spolidoro JV, Toporovski MS, Cardoso AL, Araujo GT, Nudelman V, Fonseca MC. A survey on clinical presentation and nutritional status of infants with suspected cow’ milk allergy. BMC Pediatr. 2010 Apr 23;10:25
  8. Hill C, Guarner F, Reid G, Gibson GR, Merenstein DJ, Pot B, Morelli L, Canani RB, Flint HJ, Salminen S, Calder PC, Sanders ME. Expert consensus document. The International Scientific Association for Probiotics and Prebiotics consensus statement on the scope and appropriate use of the term probiotic. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2014 Aug;11(8):506-14
  9. Yang Y, Li X, Yang Y, Shoaie S, Zhang C, Ji B, Wei Y. Advances in the Relationships Between Cow’s Milk Protein Allergy and Gut Microbiota in Infants. Front Microbiol. 2021 Aug 16;12:716667
  10. Balta I, Butucel E, Mohylyuk V, Criste A, Dezmirean DS, Stef L, Pet I, Corcionivoschi N. Novel Insights into the Role of Probiotics in Respiratory Infections, Allergies, Cancer, and Neurological Abnormalities. Diseases. 2021 Sep 2;9(3):60
  11. Cukrowska B, Ceregra A, Maciorkowska E, Surowska B, Zegadło-Mylik MA, Konopka E, Trojanowska I, Zakrzewska M, Bierła JB, Zakrzewski M, Kanarek E, Motyl I. The Effectiveness of Probiotic Lactobacillus rhamnosus and Lactobacillus casei Strains in Children with Atopic Dermatitis and Cow’s Milk Protein Allergy: A Multicenter, Randomized, Double Blind, Placebo Controlled Study. Nutrients. 2021 Apr 1;13(4):1169
  12. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 – Parte 1 – Etiopatogenia, clínica e diagnóstico. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):7-38
  13. Qamer S, Deshmukh M, Patole S. Probiotics for cow’s milk protein allergy: a systematic review of randomized controlled trials. Eur J Pediatr. 2019 Aug;178(8):1139-1149
  14. Mennini M, Reddel S, Del Chierico F, Gardini S, Quagliariello A, Vernocchi P, Valluzzi RL, Fierro V, Riccardi C, Napolitano T, Fiocchi AG, Putignani L. Gut Microbiota Profile in Children with IgE-Mediated Cow’s Milk Allergy and Cow’s Milk Sensitization and Probiotic Intestinal Persistence Evaluation. Int J Mol Sci. 2021 Feb 6;22(4):1649. doi: 10.3390/ijms22041649
  15. Berni Canani R, Di Costanzo M, Bedogni G, Amoroso A, Cosenza L, Di Scala C, Granata V, Nocerino R. Extensively hydrolyzed casein formula containing Lactobacillus rhamnosus GG reduces the occurrence of other allergic manifestations in children with cow’s milk allergy: 3-year randomized controlled trial. J Allergy Clin Immunol. 2017 Jun;139(6):1906-1913.e4
  16. Basturk A, Isik İ, Atalay A, Yılmaz A. Investigation of the Efficacy of Lactobacillus rhamnosus GG in Infants With Cow’s Milk Protein Allergy: a Randomised Double-Blind Placebo-Controlled Trial. Probiotics Antimicrob Proteins. 2020 Mar;12(1):138-143

IM/ACP 2021: como fazer o manejo ambulatorial da dor crônica?

Começou o Internal Medicine Meeting da American College of Physicians (IM/ACP 2021), um dos maiores encontros de Medicina Interna da atualidade. Estamos juntos realizando a cobertura do evento, que devido às limitações da pandemia, está em formato virtual.

Neste post, vamos revisar estratégias ambulatoriais de abordagem à dor crônica, com base na palestra realizada por Michael Ashburn, professor de Anestesia e Terapia Intensiva da University of Pensylvania.

Que intervenções não opioides têm mostrado redução de dor crônica?

O primeiro ponto abordado pelo palestrante, foi que o tratamento da dor crônica passa por várias esferas de abordagem, incluindo depressão, ansiedade, distúrbio do sono, questões familiares, limitações físicas. Vale também considerar que boa parte das pessoas que têm dor crônica apresentam estados anormais de dor (dor neuropática e dor miofascial). Neste contexto, deve-se focar no paciente e na sua experiência de sofrimento. Pensar apenas em nociceptores não trará os melhores impactos em pacientes que apresentam uma dor complexa.

É importante que sejam rastreadas e tratadas situações como: depressão, catastrofização da dor e ansiedade. Foram sugeridos respectivamente as seguintes escalas: PHQ-9, Pain Catastrophizing Scale e GAD-7 para rastreio. O efeito do tratamento dessas questões não é pequeno. O palestrante citou redução da dor em 45% quando tratada a depressão, 33% com o tratamento da catastrofização da dor e 12% com tratamento de ansiedade.

Há evidências de que a terapia cognitiva-comportamental tem valor para condições de dor crônica, ela inclui abordagem educacional sobre dor crônica, higiene do sono, pensamentos inapropriados e prevenção de recaídas. A frequência sugerida é de seis a oito sessões individuais ou em grupo. Além disso, citou efeitos positivos com a prática de mindfullness.

Os exercícios também foram ressaltados com uma opção de terapia. Modalidades passivas ajudam, porém acabam tendo efeito mais curto. O desafio é fazer com que o paciente esteja engajado em atividade física em sua rotina.

Quando decidir pelo uso temporário de opioides?

Para responder esta questão, o Dr Michael Ashburn trouxe alguns conceitos importantes para dor aguda:

  • O tratamento apropriado da dor é importante, porém carrega risco significativo de malefícios.
  • As expectativas do paciente e do prescritor são um ponto crítico.
  • O tratamento multimodal deve ser um ponto central (anestésicos locais, analgésicos não opioides, opioides em uso curto).
  • Opioides devem ser usados com muito cuidado e atenção, de preferência com uma data de término bem documentada. Não facilite a transição entre uso agudo e uso crônico de opioides.

Opioides para dor crônica: menos é mais

  • O efeito dos opioides é modesto, com média de alívio não sendo maior que 40%.
  • Opioides podem ser prejudiciais aos pacientes.
  • Devem ser administrados no contexto de cuidado integrado.
  • Deve-se avaliar os riscos cuidadosamente antes de prescrever: risco de abuso/dependência; risco de comprometimento respiratório (distúrbio respiratório associado ao sono, patologias respiratórias, outras medicações depressoras do sistema respiratório); risco de falência de tratamento (dor generalizada, cefaleia crônica diária); risco específico de cada medicação (metadona).

Mensagem prática

  • No tratamento da dor crônica deve-se avaliar várias esferas, incluindo depressão, ansiedade, distúrbio do sono, questões familiares, limitações físicas. O foco deve ser no paciente e na sua experiência de sofrimento, não apenas em nociceptores.
  • O tratamento multimodal deve ser um ponto central (anestésicos locais, analgésicos não opioides, opioides em uso curto).
  • Opioides devem ser usados com muito cuidado e atenção, de preferência com uma data de término bem documentada.

Fonte

https://pebmed.com.br/im-acp-2021-como-fazer-o-manejo-ambulatorial-da-dor-cronica/

Autor(a)

Dayanna de Oliveira Quintanilha

Editora associada do Portal PEBMED ⦁ Especialista em Clínica Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Graduação em Medicina pela UFF ⦁ Contato: dayquintan@hotmail.com ⦁ Instagram: @dayquintan

Referência Bibliográfica

  • Michael Ashburn, MD MPH MBA. Palestra Managing Chronic Pain in the Outpatient Setting – ACP meeting 2021.

Probiótico LGG na síndrome do intestino irritável

As doenças funcionais do tubo digestivo se caracterizam por alterações do eixo cérebro-intestinal e disbiose. Entre elas, a síndrome do intestino irritável (SII) é a mais estudada, devido a sua alta prevalência e acentuado prejuízo da qualidade de vida.

O LGG® também tem sido estudado nessa situação clínica e parece ser capaz de diminuir a intensidade da dor abdominal, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

Assista o vídeo para entender mais sobre o assunto:

Distúrbios de dor abdominal funcional: O que são e como abordar clinicamente?

Roberta Esteves Vieira de Castro, MD, MSc, PhD

Introdução

As doenças funcionais gastrointestinais (FGIDs) englobam um grupo de desordens caracterizadas por sintomas relacionados ao comprometimento de órgãos do trato gastrointestinal, sem que haja evidências clínicas ou laboratoriais de uma doença orgânica,  isto é, são condições crônicas recorrentes que não são explicadas por etiologias fisiológicas, estruturais ou biomédicas subjacentes2,3,4. Portanto, ocorrem na ausência de uma causa anatômica, inflamatória ou relacionada a dano tecidual5. Dentre elas destacam-se os distúrbios de dor abdominal funcional (DDAF), que são comumente encontrados na infância, afetando, globalmente, até 25% de lactentes e crianças. Dada sua etiologia biopsicossocial envolvendo interações complexas dentro do eixo intestino-cérebro, os DDAF são referidos como “distúrbios da interação intestino-cérebro”. Atualmente, inclusive, o eixo intestino-cérebro tem sido precisamente referido como o “eixo microbiota-intestino-cérebro”, refletindo uma extraordinária expansão da compreensão da magnitude, complexidade, papel e interações das populações microbianas hospedadas dentro do lúmen do trato gastrointestinal (TGI)1.

Os DDAF são frequentemente caracterizados pela presença de hiperalgesia visceral e aumento da percepção central de estímulos viscerais, o que parece ocorrer como o resultado final de fatores psicossociais sensibilizantes e fatores clínicos sobrepostos a predisposição genética e a eventos do início da vida. O início da vida inclui todos os estágios da infância e da adolescência, onde ocorre crescimento, além do desenvolvimento estrutural e funcional dos órgãos, embora a vulnerabilidade do eixo microbiota-intestino-cérebro pareça ser maior durante o período perinatal e nos primeiros anos de vida1.

Assim como em pacientes adultos, os DDAF em pediatria são subclassificados por meio dos critérios de Roma IV em outras condições clinicamente distintas: síndrome do intestino irritável (SII), dispepsia funcional (DF), enxaqueca abdominal e dor abdominal funcional não especificada de outra forma (DAF-NEOF)1.

O objetivo do presente artigo é fornecer uma visão geral e atualizada dos DDAF em pediatria, com foco no uso de probióticos para o tratamento, tema atual e que gera muitas dúvidas entre pacientes, famílias e profissionais de saúde.

Epidemiologia

Os DDAF são extremamente comuns em pacientes pediátricos atendidos por gastroenterologistas1. Dados da literatura mostram que as taxas de prevalência podem variar de 0,3 a 19% em crianças em idade escolar na Europa e nos Estados Unidos7, chegando a ser responsáveis por mais de 50% de todas as consultas clínicas de gastroenterologia pediátrica (GP)8. Em metanálise, Korterink e colaboradores descreveram que, em geral, a prevalência combinada encontrada para DDAF é de 13,5%, sendo que a prevalência relatada variou amplamente, de 1,6 a 41,2%7. No Brasil, Alves e colaboradores relataram que a dor abdominal funcional (DAF) correspondeu a 70% dos casos de dor abdominal crônica (DAC) atendidos em um ambulatório universitário de GP no período de janeiro de 2009 a outubro de 20149.

Quanto à subclassificação dos DDAF, a prevalência da SII em pacientes pediátricos pode variar de 1,2 a 45%10,11. Em relação à DF, uma prevalência de 3 a 27% é descrita em pediatria, sendo que 12 a 16% das crianças encaminhadas para clínicas de cuidados terciários nos Estados Unidos apresentam a condição12. Já a prevalência de enxaqueca abdominal infantil é em torno de 9,3%13. No entanto, embora os DDAF sejam indubitavelmente prevalentes em crianças, os estudos epidemiológicos têm sido dificultados devido à falta de parâmetros diagnósticos adequados. O desenvolvimento de critérios diagnósticos e a subclassificação do original “dor abdominal recorrente em crianças” só se tornaram disponíveis a partir de 2005, com o advento dos critérios de Roma II. Desde então, as duas outras versões dos critérios de Roma tiveram mudanças substanciais, agravando o problema de elucidar e comparar dados de prevalência de diferentes estudos. Um fator limitante que impede a comparabilidade dos dados em todo o mundo é o uso de diferentes ferramentas de avaliação. Cerca de 80% dos estudos publicados que aplicaram os critérios de Roma III usaram o “questionário sobre sintomas gastrointestinais (GI) pediátricos dos critérios de Roma III” para avaliação. Todavia, pesquisas divulgadas que aplicaram os critérios de Roma I ou II usaram uma grande variedade de outros instrumentos1.

A elevada prevalência mundial e seu impacto substancial no bem-estar dos pacientes pediátricos justificam o investimento de recursos e campanhas educacionais direcionadas à prevenção e tratamento, com atenção especial aos distúrbios psicológicos e à redução do estresse7.

Fatores de risco

Dados da literatura mostram que o sexo feminino está associado a uma maior prevalência de DDAF. Este predomínio em meninas tem sido relatado em todos os continentes. Supõe-se que os níveis de hormônios sexuais possam desempenhar um papel, o que é corroborado por observações de que pacientes na pré-menopausa apresentam exacerbação de dor abdominal durante a menstruação. Os hormônios ovarianos podem modular o processo de percepção da dor visceral e a suscetibilidade ao estresse. Embora as crianças mais novas não tenham atingido a maturidade sexual, isso também pode se aplicar aos adolescentes. Outra razão pode ser o fato de que o sexo feminino tem uma maior predisposição para relatar experiências somáticas, como dor. A predominância de meninas também foi descrita em outras queixas funcionais, como constipação funcional e cefaleia. Outros dados mostram que distúrbios psicológicos, estresse e eventos traumáticos aumentam a prevalência de DDAF, mas os estudos não têm mostrado associação com a idade nem com o status socioeconômico7. Ademais, a ingestão de baixo teor de fibras é relatada como um fator de risco para dores abdominais recorrentes em crianças15. Por fim, uma história familiar de DDAF de um modo geral, principalmente de SII, foi relatada como um relevante fator de risco epidemiológico1.

Fisiopatologia

O desenvolvimento de DAC é um processo complexo que parece resultar da interrupção da integridade funcional e/ou, de uma forma mais sutil, da integridade estrutural de um ou mais elementos do eixo microbiota-intestino-cérebro. Há muito tempo, o modelo biopsicossocial é reconhecido nesse contexto. Esse modelo defende que os sintomas surgem por meio de várias vias que incluem fatores biológicos (como genética, dismotilidade, hipersensibilidade visceral, inflamação, distúrbios do sono e disbiose), fatores psicológicos (como ansiedade, depressão, baixa autoestima, hospitalização recente e enfrentamento disfuncional) e fatores sociais (como dificuldades de relacionamento com pais, colegas ou professores, bullying e abuso infantil) que interagem uns com os outros. De acordo com o modelo supracitado, todos esses fatores podem contribuir para o início ou persistência da dor, assim como para a gravidade e a frequência dos sintomas contínuos. Embora o protótipo permaneça relevante, ele continua a evoluir, reconhecendo uma complexidade muito maior nessa fisiopatologia. Os fatores biológicos são atualmente divididos em três sistemas principais (neurológico, imunológico e endocrinológico) que se comunicam prontamente entre si e também com o sistema psicológico. É provável que existam outros fatores compostos de sistemas influentes e interagentes. Acredita-se, portanto, que uma melhor compreensão dessas condições aumentará a complexidade da triagem e da avaliação, mas também fornecerá opções de tratamento mais personalizadas, dada a combinação de contribuintes que possam estar subjacentes à apresentação de cada paciente1,5,6. Em suma, os componentes cruciais desse modelo são os conceitos de hipersensibilidade visceral e hipervigilância central, embora a importância relativa de cada um desses componentes não seja clara e possa variar entre os indivíduos. O papel da genética em relação aos fatores ambientais não é conclusivo e, embora ambos os elementos pareçam ser fundamentais, nenhum dos fatores parece suficiente por si só para contribuir para o desenvolvimento de DDAF1.

Embora a causa exata não seja identificada, considera-se que a sinalização nervosa cerebral ou alterações químicas intestinais podem tornar o intestino mais sensível a fatores que normalmente não causam dor, como distensão gasosa, por exemplo. Por causa dessa mudança na função intestinal associada a esse tipo de dor, é frequentemente referida como DAF13. Dada a associação entre a composição da microbiota intestinal precoce e doenças crônicas na infância, acredita-se que os distúrbios na colonização intestinal também possam desempenhar um papel na etiologia e patogênese dos distúrbios GI funcionais na infância16, além da presença de alergia à proteína do leite de vaca (APLV)10. Estima-se que a microbiota humana seja composta por mais de 1 x 1014 células bacterianas, dez vezes o número de células humanas. A maioria da microbiota humana vive dentro do TGI, e vária evidência indicam que nossos micróbios intestinais realizam as seguintes funções: aumentam a função de barreira intestinal; inibem a ligação do patógeno, ligando-se ao epitélio do intestino delgado e grosso e produzindo substâncias que inibem o crescimento de outros organismos patogênicos; modulam a resposta inflamatória intestinal pela modulação do lúmen GI em direção a um estado antiinflamatório; reduzem a hipersensibilidade visceral associada tanto à inflamação quanto ao estresse psicológico, e alteram da fermentação do cólon, convertendo carboidratos não digeridos em ácidos graxos de cadeia curta, melhorando a função intestinal17.

Há relatos também de uma associação de doenças infecciosas, em especial as gastroenterites agudas, de etiologia bacteriana (por Shigella, por exemplo) com o desenvolvimento de SII, sendo indagada a correlação com o rotavírus. A infecção pode ocasionar inflamação, modificação da microbiota e aumento da permeabilidade intestinal. Apesar da resolução da inflamação aguda, pode haver alterações persistentes no aparelho neuromuscular intestinal5,18.

Manifestações clínicas

Como discutimos acima, a sintomatologia dos DDAF é o resultado de uma infinidade de fatores, incluindo hipersensibilidade visceral, alteração da motilidade intestinal, disbiose microbiana, alteração da função imunológica da mucosa e desregulação da função intestinal pelo sistema nervoso central3.

Usualmente, a dor funcional é periumbilical ou epigástrica, dificilmente ocorrendo irradiação. Os episódios de dor podem perdurar por minutos a horas, sendo alternados por intervalos de bem-estar. Uma característica é a ocorrência durante o período diurno e podem ser tão intensos a ponto de ocasionar choro e o paciente precisar interromper as atividades do cotidiano. Podem também ser relatados sintomas  neurovegetativos, tais como sudorese, palidez, náuseas e vômitos5.

Síndrome do intestino irritável (SII)

É definida pela presença de dor abdominal associada a alteração dos hábitos intestinais, que incluem mudança na frequência, na consistência e no formato das fezes, com esforço ou urgência para defecar, tenesmo, presença de muco e distensão abdominal3,5,19.

Dispepsia funcional (DF)

Os sintomas dispépticos incluem dor epigástrica, azia, plenitude gástrica pós-prandial, saciedade precoce, náuseas, vômitos, eructações e queimação epigástrica20.

Enxaqueca abdominal

Caracteriza-se pela presença de episódios paroxísticos de dor periumbilical moderada a grave, mal localizada, na linha média ou abdominal difusa com duração igual ou superior a uma hora. Os episódios são separados por semanas a meses e há um padrão e sintomas estereotipados em cada paciente. A dor é forte o suficiente para interferir nas atividades diárias normais. A dor abdominal geralmente está associada a outros sintomas, como cefaleia, palidez, anorexia, náusea, vômito e fotofobia. Após avaliação médica adequada, os sintomas não podem ser atribuídos a nenhuma outra condição clínica. Na maioria das vezes, há uma história familiar de enxaqueca e há uma forte propensão a evoluir para cefaleias por enxaqueca na idade adulta21.

Dor abdominal funcional não especificada de outra forma (DAF-NEOF)

Quando a DAC não se encaixa nas demais situações descritas, deve-se considerar a presença de DAF-NEOF5.

Diagnóstico

A avaliação da DAC é um grande desafio diagnóstico. Na primeira etapa da abordagem, o pediatra deve se atentar para a  investigação de quadros de etiologia orgânica. O diagnóstico é baseado em anamnese (principalmente) e exame físico detalhados. A solicitação de exames complementares deve ser criteriosa5,22.

Anamnese

Deve ser focada no reconhecimento de sinais e sintomas de alerta para doença orgânica5 – Quadro 1.

Quadro 1: Anamnese em um paciente com DAC

Dados da anamneseQuestionamentos
Características da dorLocalização, intensidade, frequência, periodicidade, relação com alimentação, dor noturna, interferência com as atividades habituais
Sintomas gastrintestinais associadosPirose, saciedade precoce, plenitude gástrica pós-prandial, náuseas, vômitos, diarreia, constipação, tenesmo, sangramentos digestivos, icterícia
Sinais/sintomas de outros sistemasSintomas urinários, cefaleia, sonolência depois das crises de dor, artralgias/artrites, tosse crônica, asma, respiração bucal
Sinais de comprometimento orgânicoPerda de peso, retardo no crescimento, retardo puberal, palidez cutâneo-mucosa, febre
Antecedentes pessoaisInfecção viral recente, trauma abdominal, intervenção cirúrgica prévia Perfil psicológico e comportamental da criança Conhecimento de situações que geram ansiedade
História alimentarConsumo de leite e produtos lácteos, sucos naturais e artificiais, bebidas gaseificadas, balas, chicletes e alimentos irritantes gástricos (alimentos industrializados, condimentos picantes) Avaliar o conteúdo de fibra na dieta
Medicamentos em uso ou utilizadosAntibióticos, anti-inflamatórios, corticosteroides
História familiarParentes com doenças do TGI ou de outro sistema e que evolua com dor abdominal, enxaqueca, manifestações alérgicas, tuberculose e/ou quadros depressivos
Sinais e sintomas de alerta para doença orgânicaHistória familiar de DII, doença celíaca ou doença péptica; dor persistente em quadrante superior ou inferior direito; disfagia; odinofagia; vômitos persistentes; sangramento gastrointestinal; diarreia noturna; artrite; febre inexplicada

Legenda: DAC – dor abdominal crônica; DII – doença inflamatória intestinal; TGI – trato gastrointestinal.

Fonte: Adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria, 20195.

Os DDAF são agrupados de acordo com o perfil de sintomas, que difere com base na localização do TGI (por exemplo, DF versus SII) ou com base em semelhanças com outras condições, como enxaqueca1 – Quadro 2.

Quadro 2: Critérios de Roma IV para DDAF em crianças e adolescentes

DDAFDefinição
DFPlenitude pós-prandialSaciedade precoceDor epigástrica ou queimação não associada à defecação Dentro da DF, há dois subtipos: Síndrome de dificuldade pós-prandial: inclui o desconforto da plenitude pós-prandial ou saciedade precoce que impede o término da refeição regular. Os critérios de suporte englobam a presença de distensão abdominal superior, náusea pós-prandial ou eructações excessivasSíndrome de dor epigástrica: compreende todos os seguintes sintomas – dor ou queimação em epigástrio, grave o suficiente para interferir com as atividades. A dor não pode ser generalizada, nem se localizar em outra parte do abdome ou tórax e não é aliviada pela evacuação ou pela eliminação de flatos. Os critérios que sustentam o diagnóstico podem incluir:Dor tipo queimação, mas sem o componente retroesternalDor frequentemente induzida ou aliviada pela ingestão de uma refeição, mas pode ocorrer durante o jejum
SIIDor abdominal associada a, pelo menos, um dos seguintes:Relacionado à defecaçãoUma mudança na frequência das fezesUma mudança na forma das fezesEm crianças constipadas, a dor não deve resolver com a resolução da constipação
Enxaqueca abdominalPelo menos 2 episódios de todos os seguintes, cumpridos por, pelo menos, 6 meses: Episódios paroxísticos de dor abdominal intensa, aguda periumbilical, na linha média ou difusa com duração de, pelo menos, 1 hora Episódios separados por semanas a mesesA dor é incapacitante e interfere nas atividades normaisPadrão estereotipado e sintomas no paciente individualA dor está associada a 2 ou mais dos seguintes:AnorexiaNáuseaVômito(s)CefaleiaFotofobiaPalidez
DAF-NEOFDor abdominal episódica ou contínua que não ocorre durante eventos fisiológicos (como alimentação e menstruação, por exemplo)Critérios insuficientes para a SII, DF ou enxaqueca abdominalDepois de uma avaliação adequada, a dor abdominal não pode ser plenamente explicada por outra condição clínica

Legenda: DAF-NEOF – dor abdominal funcional não especificada de outra forma; DDAF – distúrbios de dor abdominal funcional; DF – dispepsia funcional; SII – síndrome do intestino irritável.

Nota: Exceto para dispepsia funcional, os sintomas devem ocorrer, pelo menos, 4 vezes por mês durante 2 meses. Para todos os DDAF, depois de avaliação apropriada, a dor abdominal não pode ser totalmente explicada por outra condição clínica.

Fonte: Adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria, 2019; Friesen et al., 20215,6.

Exame físico

O exame do abdome deve ser minucioso, com atenção para a localização da dor, avaliação de fígado, baço e loja renal, além da presença de massas5. Durante a avaliação abdominal, é importante observar se a distração leva à resolução da dor, um sinal que indica a presença de DDAF. O teste de Carnett (avaliação da sensibilidade abdominal) muitas vezes é útil para diferenciar a síndrome da dor da parede abdominal da dor intra-abdominal originada na víscera1.

Exame perianal e toque retal precisam ser efetuados. Ademais, o pediatra deve enfatizar a avaliação do peso, estatura, velocidade de crescimento e estágio puberal. Manifestações clínicas de alerta incluem: doença perianal, perda ponderal involuntária, desaceleração do crescimento linear e atraso da puberdade5.

Exames complementares

Exames laboratoriais

Exames laboratoriais básicos devem ser solicitados, incluindo hemograma completo, urina tipo 1, urocultura e exame parasitológico de fezes. Uma investigação laboratorial mais abrangente pode ser necessária, de acordo com a história clínica do paciente, como velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína-C-reativa (PCR), função tireoidiana, amilase, lipase, calprotectina fecal e sorologia para doença celíaca. Apesar de ainda controversa, a realização de rotina de sorologia para doença celíaca é proposta pelo critério de Roma IV, mais atualizado5,18.

Exames de imagem

Com relação a exames de imagem de rotina, como ultrassonografia (USG), por exemplo, não há indicação se o paciente não apresentar evidências clínicas de causa orgânica5. Uma menção especial deve ser feita ao papel da endoscopia digestiva alta (EDA), por se tratar de um exame caro e controverso em termos de sua necessidade e valor no contexto dos DDAF. A EDA é geralmente realizada para identificar a patologia ou descartar uma doença orgânica, ela  pode evidenciar inflamação histológica (esofagite, gastrite, duodenite) e/ou a presença de Helicobacter pylori presente em 23 a 93% dos pacientes, porém o significado clínico desses achados não está bem estabelecido. Para Friesen e colaboradores, o papel da EDA pode estar mudando de uma “busca por doenças” para uma “busca por colaboradores biológicos” dentro do modelo biopsicossocial, particularmente a presença de eosinófilos e mastócitos (ambos parecem ter relação com a DF, enquanto somente os mastócitos parecem colaborar com a patogênese da SII)6.

Em síntese, as evidências atuais, embora limitadas defendem que exames diagnósticos iniciais sejam mínimos na suspeita de DDAF, devendo ser reservados para pacientes com sinais e sintomas de alarme e na presença de queixas específicas. Avaliação adicional também deve ser considerada para pacientes que não respondem ao tratamento, procurando não apenas doenças menos comuns, como colelitíase ou anomalias renais por meio de USG, mas também potenciais contribuintes biológicos, como, por exemplo, eosinófilos e mastócitos através de EDA6,18.

Tratamento

Uma sólida relação paciente-médico, uma comunicação eficaz e a instrução adequada do paciente e de sua família desde o início constituem o cerne do tratamento bem-sucedido dos DDAF. O pediatra deve dedicar bastante tempo da consulta para explicar o diagnóstico aos cuidadores de cada paciente individualmente, discutindo sobre o modelo biopsicossocial, projetando um plano de tratamento e garantindo expectativas realistas, tanto de prognóstico quanto de desfechos1.

 Infelizmente, o manejo dos DDAF é limitado por vários fatores. A natureza biopsicossocial do transtorno dificulta a abordagem, pois cada criança tem um conjunto único de fatores fisiopatológicos e responde de maneira diferente a terapias distintas. Ademais, as evidências científicas em pacientes pediátricos ainda são insuficientes e muitas sugestões de tratamento são, portanto, baseadas em estudos envolvendo adultos (sabe-se, de antemão, que as crianças não respondem da mesma forma que os adultos em incontáveis situações). Por fim, diversos tratamentos eficazes incluem abordagens comportamentais, como modificações de dieta e intervenções psicológicas, e não estão prontamente disponíveis devido à escassez de profissionais de saúde aliados, bem como à falta de cobertura de profissionais por muitos planos de saúde. Com o crescente reconhecimento do papel da microbiota intestinal, uma série de intervenções direcionadas à ela (incluindo uma dieta pobre emoligossacarídeos fermentáveis, dissacarídeos, monossacarídeos e polióis [fermentable oligosaccharides, disaccharides, monosaccharides, and polyols – FODMAP], prebióticos e probióticos), além de intervenções psicológicas e determinados medicamentos estão cada vez mais sendo estudados ​​para o manejo dos DDAF1.

Dieta

Atualmente, o papel da dieta em pacientes com DDAF tem despertado muito interesse em pesquisas científicas e na prática clínica. Mais de 90% dos jovens com DDAF identificam, pelo menos, um alimento que associam ao agravamento dos sintomas GI. Em comparação com controles saudáveis, os pacientes com DDAF evitam alimentos e implementam estratégias de dieta com mais frequência. Embora as reações alimentares adversas possam estar relacionadas a alergias, má absorção ou antecipação de sintomas, também tem havido interesse nos efeitos de componentes dietéticos específicos que interagem no eixo intestino-cérebro6. Na DF, por exemplo, determinados alimentos, como cafeína, picantes e gordurosos, tendem a piorar os sintomas e devem ser evitados5.

Enquanto as evidências de estudos em adultos sugerem que os FODMAP podem ser desencadeadores de sintomas nos DDAF, as evidências em pediatria são muito escassas. No entanto, uma dieta com baixos níveis de FODMAP é comumente prescrita para SII em adultos e crianças, apesar da evidência limitada de sua eficácia. A justificativa para essas restrições dietéticas é baseada na suposição de que uma diminuição na carga de carboidratos fermentáveis ​​de cadeia curta evita o efeito osmótico dos FODMAP, resultando em uma diminuição no volume de água do intestino delgado, limitando a fermentação exagerada de FODMAP pela microbiota do cólon e produção de gás associada, que podem aliviar a DAC. Os FODMAP são mal absorvidos em pessoas saudáveis, bem como em pacientes com DDAF. Todavia, uma alta ingestão de FODMAP está associada a sintomas GI apenas na população com DDAF, o que é explicado pela presença de hipersensibilidade visceral e motilidade intestinal alterada23.  No entanto a sua aplicação deve ser individualizada, evitando grandes restrições e com posterior tentativa de reintrodução do alimento suspenso de forma progressiva.

No que concerne a adoção de dietas com baixo teor de  lactose, uma série de estudos que fizeram uma comparação desse tipo de regime com uma alimentação com lactose em crianças com DDAF mostrou que, na maioria dos casos, uma dieta com baixo teor de lactose não foi útil, mesmo em crianças com um teste de hidrogênio expirado positivo17.

Com relação a dietas gluten-free, é difícil distinguir diferenças claras entre a exclusão de glúten e a melhora dos sintomas relacionados apenas a distúrbios funcionais. Atualmente, em pacientes pediátricos, a dieta sem glúten precisa ser precisamente indicada por um médico e acompanhada de perto por um profissional de saúde, pois pode levar a outras deficiências nutricionais. Nesse contexto,  é pertinente ressaltar a  importância  da sensibilidade não celíaca ao glúten (SGNC), uma condição clínica nova, com pouco conhecimento sobre sua fisiopatologia, mas que tem levantado discussões sobre as restrições dietéticas do glúten em paciente com sintomas que simulam a doença celíaca, porém com componentes histológicos e sorológicos negativos, esse grupo de pacientes se beneficiam de uma dieta gluten-free e seus sintomas podem ser inicialmente entendidos como DDAF. Portanto, mais pesquisas são necessárias para delinear melhor a prevalência e os mecanismos da sensibilidade ao glúten/trigo e seu significado antes de recomendar a restrição ao glúten em crianças com DDAF24.

Considerando que o baixo teor de fibras na dieta é um fator de risco para dores abdominais recorrentes em crianças, Shulman e colaboradores observaram, em estudo randomizado, que a fibra psyllium reduziu o número de episódios de dor abdominal em crianças com SII, independente de fatores psicológicos, não alterando a produção de hidrogênio ou metano na respiração, permeabilidade intestinal ou composição do microbioma15,25.

Suplementação de prebióticos

Os prebióticos podem modificar a microbiota intestinal e, presumivelmente, a resposta aos componentes dietéticos absorvidos de forma incompleta1. Em 2018, um estudo conduzido por Huaman e colaboradores, apesar de ter utilizado uma amostra pequena, observou que a diminuição dos sintomas produzidos por uma dieta baixa em FODMAP em pacientes com DDAF desapareceu logo após a interrupção da dieta. Em contraste, a administração de suplemento prebiótico contendo β-galactooligossacarídeo enriqueceu a microbiota e a diminuição dos sintomas persistiu por duas semanas, concluindo que o tratamento intermitente com prebióticos pode representar uma vantagem sobre as restrições dietéticas para pacientes com sintomas intestinais funcionais26.

Suplementação de probióticos

Os probióticos constituem microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem um benefício à saúde do hospedeiro, sendo eficazes contra várias condições patológicas. Esses microrganismos incluem espécies de bacilos de ácido láctico (como Lactobacillus e Bifidobacterium), espécies de Escherichia coli não patogênicas (por exemplo, E. coli cepa Nissle 1917), Clostridium butyricumi, Streptococcus salivarius e Saccharomyces boulardi (espécies de leveduras não infecciosas). Bactérias geneticamente modificadas têm características imunomoduladoras, como estimular a produção de interleucina-10 e do fator trifólio, que têm efeitos benéficos no sistema imunológico4,27.

Atualmente, a suplementação de probióticos tem sida considerada uma opção terapêutica potencialmente benéfica, segura e agradável para crianças com DDAF, sendo associada significativamente ao alívio da dor4, especialmente naquelas com suspeita de SII ou quando os sintomas foram desencadeados após um episódio de gastroenterite ou posteriormente a um curso de antibióticos17.

Lactobacillus rhamnosus GG (LGG)

O Lactobacillus rhamnosus GG (LGG), ATCC 53103 foi originalmente isolado de amostras fecais de um adulto humano saudável em 1983 por Sherwood Gorbach e Barry Goldwin (as iniciais dos sobrenomes [GG] deram origem ao nome do lactobacilo). Foi identificada como uma cepa probiótica potencial por causa de sua resistência a ambientes ácidos e biliares, além de boas características de crescimento e capacidade de adesão à camada epitelial intestinal. Desde então, tem sido uma das cepas probióticas mais amplamente estudadas, usada em uma variedade de produtos probióticos disponíveis comercialmente. Os efeitos benéficos desta cepa têm sido estudados extensivamente em ensaios clínicos e estudos de intervenção em humanos. Diversos impactos positivos sobre a saúde com o uso de LGG estão bem documentados na literatura, incluindo a prevenção e o tratamento de infecções GI (aliviando a diarreia por rotavírus, por exemplo) e do trato urinário, a estimulação de respostas imunológicas ou a prevenção determinadas alergias, como a dermatite atópica. Além disso, o LGG parece ser seguro e eficaz no prolongamento da remissão em pacientes com colite ulcerativa28,29.

Com relação à DDAF, um ensaio randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, de grupo paralelo foi conduzido no sul da Itália entre 2004 e 2008 e concluiu que o LGG reduziu significativamente a frequência e a gravidade da dor abdominal em crianças com SII30. Já uma meta-análise publicada em 2011 mostrou que o uso de LGG aumentou a proporção de respondentes ao tratamento (definido como ausência de dor ou diminuição da intensidade da dor) em crianças com distúrbios GI funcionais, particularmente em crianças com SII. Além disso, o LGG reduziu a frequência e a intensidade da dor, particularmente também entre crianças com SII31. Mais recentemente, Wegh e colaboradores conduziram uma revisão sistemática cuja conclusão foi de que existem evidências insuficientes para o uso de probióticos em DDAF, mas somente o LGG parece reduzir a frequência e a intensidade da dor abdominal, porém apenas em crianças com SII2.

Portanto, apesar de limitadas, as evidências atuais são encorajadoras para o emprego de LGG na dose de 3 × 109 a 1 x 1010 unidades formadoras de colônias (UFC; em inglês, colony forming unit, CFU) por dia. A maioria dos estudos tem avaliado a utilização do LGG duas vezes ao dia durante um período de quatro a oito semanas3,32.

Abordagem psicológica

O objetivo das intervenções psicológicas é reconhecer e reverter o estresse físico e psicológico, primordiais no desencadeamento, exacerbação ou persistência da dor e, dessa forma, auxiliar no controle álgico e da ansiedade da criança. Opções incluem a terapia cognitivo comportamental (TCC) (que, inclusive, tem sido relatadas como das mais efetivas), hipnoterapia e exercícios físicos, como ioga1,5,18.

Medicamentos

Faltam evidências que suportem a eficácia dos tratamentos farmacológicos em crianças com DDAF. Além disso, a qualidade da evidência é geralmente fraca nos estudos existentes, com apenas alguns ensaios clínicos randomizados avaliando a segurança e eficácia dos medicamentos mais comumente usados. A ausência de dados conclusivos para apoiar tratamentos baseados em evidências científicas e a falta de medicamentos aprovados para o manejo dos DDAF em crianças desafiam os pediatras na prática clínica diária1.

Na verdade, o tratamento farmacológico tem o objetivo de aliviar a sintomatologia em casos não responsivos às medidas supracitadas. Em situações específicas, como na presença de distensão pós prandial, gases intestinais, contrações intestinais ou refluxo gastroesofágico, medicamentos antirrefluxo ou antiespasmódicos podem ser úteis. Dessa forma, é essencial que haja cautela à interpretação dos resultados aparentemente satisfatórios de algumas pesquisas clínicas, pelo aspecto flutuante da dor, que evolui com períodos de melhora espontânea, além de possível efeito placebo que possa justificar a melhora dos sintomas18.

Medicamentos que têm sido estudados para o manejo dos DDAF incluem: antiespasmódicos (como óleo de menta, trimebutina, mebeverine e drotaverine), antibióticos de baixa absorção (como rifaximina B e cotrimoxazol), antidepressivos (tricíclicos, como amitriptilina e inibidores seletivos de recaptação de serotonina, como o citalopram), anti-histamínicos (como ciproheptadina), bloqueadores do canal de cálcio (como flunarizina) e agentes antirrefluxo (como a famotidina)1,17.

Prognóstico

A gravidade e a frequência dos sintomas GI têm impactos diferentes no estado funcional de diferentes grupos de pacientes. As medidas de qualidade de vida relacionada à saúde relatadas pelo paciente devem fornecer informações sobre o impacto diferencial das DDAF no estado funcional de crianças e adolescentes, incluindo aspectos físicos, emocionais, comportamentais, sociais e cognitivos. Um dos grandes objetivos do tratamento da FAPD é a melhora da qualidade de vida, evitando ausências escolares e em tarefas domésticas além da não participação em esportes ou outras atividades1.

Considerações finais

Em pediatria, muitas vezes a DAC é um enorme desafio diagnóstico e, frequentemente, sua etiologia é funcional. A compreensão do modelo biopsicossocial auxilia não somente no tratamento, mas também na prevenção de novas crises álgicas. Em geral, há necessidade de uma abordagem multifatorial, incluindo avaliações dietéticas e controle de fatores psicológicos, sendo necessário um intenso esforço para educação de pais, cuidadores e do próprio paciente. Existe uma urgência na condução de inúmeras pesquisas para entendimento dos DDAF e desenvolvimento de estratégias terapêuticas com significância estatística. O uso de probióticos, em especial o LGG, parece ser extremamente promissor.

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Transtornos mentais em pacientes pós-internação por Covid-19

Desde o início da pandemia, médicos e pesquisadores em todo o mundo vêm se perguntando se pacientes que estiveram internados por Covid-19 apresentam mais transtornos mentais após a alta e quais seriam esses transtornos. Os pacientes que estiveram em cuidados intensivos estariam mais propensos a transtornos mentais específicos ou a suas formas mais graves?

Essas questões foram debatidas em dois trabalhos independentes e que foram enviados aos editores de duas revistas médicas distintas: General Hospital Psychiatry e Intensive Care Medicine, ambos publicados em março deste ano.

Os estudos

No primeiro, são colocados, de forma resumida, os resultados de um estudo transversal realizado em um hospital em Cleveland (EUA) entre março e agosto de 2020. Nele, todos os pacientes que estiveram internados por Covid-19 no período descrito e que receberam alta posteriormente receberam uma mensagem recrutando para a participação no estudo, que consistia em acessar um link que direcionava os participantes para o preenchimento de escalas validadas para avaliação de 3 transtornos mentais: ansiedade (GAD-7), depressão (CES-D 10) e transtorno de estresse pós-traumático – vulgo, TEPT (PTSD-5).

No segundo trabalho, foram avaliados 47 pacientes que receberam alta após terem sido internados em unidades de cuidados intensivos (UTI ou CTI) devido à Covid-19 entre fevereiro e junho de 2020. Eles foram reavaliados cerca de um mês após a alta hospitalar e responderam a uma escala de avaliação de transtorno de estresse agudo (IES-R).

Resultados do primeiro trabalho

Inicialmente, vamos discutir os resultados do primeiro estudo, que avaliou quadros de ansiedade, depressão e TEPT. Dentre todos os pacientes que preencheram os critérios de recrutamento, todos receberam o convite para participar da pesquisa, mas apenas 19% responderam os questionários. Destes, 57% pontuaram para pelo menos um dos transtornos avaliados, sendo o mais comum o transtorno depressivo (42%), seguido por TEPT (34%) e finalmente os transtornos ansiosos (24%). Esses pacientes ainda foram divididos em dois grupos: pacientes que tinham história prévia de transtorno mental e os que não tinham história de transtorno mental antes da atual internação.

Na comparação entre eles, pôde-se observar que entre os que tinham história prévia de transtorno mental havia uma maior proporção de indivíduos pontuando para alguma forma de transtorno mental após a alta (78%) em relação aos que nunca tinham tido transtorno mental até então (42%). Mas, como os números indicam, não ter passado de transtorno mental não significa que esses indivíduos não fossem vulneráveis, encontrando-se o mesmo padrão já descrito: a depressão é o transtorno mais comum (37,2%), seguido por TEPT (23%) e transtornos ansiosos (11,2%).

Estes resultados não parecem ter sido influenciados pelo momento após a alta em que os questionários foram respondidos. Isso inclusive sugere a necessidade de seguir estes doentes por um maior período de tempo após a alta hospitalar, especialmente aqueles com história de transtorno mental.

Esses resultados parecem estar compatíveis com os achados de outros estudos de prevalência semelhantes e com o que foi observado nas pandemias anteriores (SARS e MERS). Contudo, tais análises devem ser contextualizadas: a taxa de resposta dos questionários foi baixa; é possível que os participantes justamente por apresentarem sintomas comportamentais ou psicológicos tenham optado por preencher os questionários; nem todos os pacientes poderiam estar internados por complicações da Covid-19, mas ter apresentado resultado positivo durante o período hospitalar; a forma como foi pesquisada a história patológica pregressa de transtornos mentais foi perguntando diretamente aos pacientes. Embora os autores não cheguem a mencionar isso, deve-se considerar que a amostra reflete a realidade daquela região, devendo-se ter cuidado na extrapolação de seus resultados.

Resultados do segundo trabalho

Já o segundo trabalho avaliado, publicado na Intensive Care Medicine, avaliou 47 pacientes que tiveram Covid-19 após a alta do CTI. Estes foram entrevistados cerca de um mês após a alta com a escala IES-R para avaliar a presença de transtorno agudo por estresse. No total, 40,4% dos avaliados preencheram critérios para o transtorno com o uso desta escala, sendo depois encaminhados para outros serviços onde poderiam ser melhor acompanhados e, se necessário, tratados.

Também foram avaliadas as manifestações clínicas e psíquicas que esses doentes apresentavam após a alta. Os sintomas clínicos mais comuns foram: astenia (97,8%), alterações no equilíbrio (19,2%), ageusia (19,2%), anosmia (10,6%), alterações auditivas (10,6%) e dispnéia (presente em 97,8% dos pacientes aos esforços moderados a graves, 27,7% aos esforços leves e 8,5% ao repouso).

Apesar de a presença de dispneia não ter sido diferente entre pacientes com ou sem o transtorno agudo por estresse, aqueles que pontuaram na escala para o transtorno referiram uma intensidade maior do quadro dispneico.

Ainda dentro do grupo com o transtorno, os sintomas característicos mais comuns foram os de caráter intrusivo, seguidos pelos evitativos e, por último, aqueles relacionados à hiperestimulação/reatividade, sem que houvesse diferenças nas características dos pacientes ou nas internações. No entanto, parece que os pacientes com o transtorno apresentavam um menor grau de hipóxia à admissão no CTI. Por estarem menos hipoxêmicos, poderiam também estar mais conscientes da experiência da internação, da sua condição de saúde e do que se passava com os demais pacientes internados – o que poderia justificar a relação com o transtorno.

Os pacientes também referiram outras queixas, sendo a mais comum o isolamento, por sua vez agravado pelas dificuldades de comunicação com a equipe de saúde e com os familiares. Muitos também relataram que suas memórias sobre o período não estavam muito claras, além de se queixarem de sentimentos de desrealização, pesadelos e até mesmo a crença de que se encontravam numa espécie de “falso hospital”.

Considerações sobre transtornos mentais pós-internação por Covid-19

Interessante notar que uma parte dos pacientes, independentemente de preencherem os critérios para o transtorno ou não, afirmaram que desejariam voltar ao local da internação, tanto para que isso ajudasse as suas memórias, como para poderem conhecer a equipe de saúde que cuidou deles.

Os resultados de ambos os trabalhos, mesmo com as devidas limitações, sugerem uma elevada prevalência de diferentes transtornos mentais em pacientes que estiveram internados por Covid-19. Dessa forma, esses pacientes deveriam ser seguidos e avaliados para a presença de transtornos mentais ao longo do seguimento após a alta. Isso parece ser ainda mais imperativo na população com história  pregressa de transtornos mentais.

Fonte

https://pebmed.com.br/transtornos-mentais-em-pacientes-pos-internacao-por-covid-19/

Autor(a)

Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referências Bibliográficas

  • Mongodi S, Salve G, Tavazzi G, Politi P, Mojoli F. High Prevalence of Acute Stress Disorder and Persisting Symptoms in ICU Survivors After COVID-19. intensive Care Medicine, March 2021. doi: https://doi.org/10.1007/s00134-021-06349-7
  • Wang PR, Oyem PC, Viguera AC. Prevalence of Psychiatric Morbidity Following Discharge After COVID-19 Hospitalization. General Hospital Psychiatry, March-April, 2021. doi: https://dx.doi.org/10.1016%2Fj.genhosppsych.2020.12.013

Um quarto das crianças com autismo não são diagnosticados

Um quarto das crianças com menos de oito anos de idade com transtorno do espectro do autismo (TEA) não estão sendo diagnosticadas. A maioria delas é negra ou hispânica. Esses são os achados do recente estudo “Disparities in Documented Diagnoses of Autism Spectrum Disorder Based on Demographic, Individual, and Service Factors” de Wiggins e colaboradores (2019) publicado na revista Autism Research.

Dados sobre autismo

Os objetivos desse estudo foram:

Relatar quantas crianças preencheram a definição de vigilância do TEA, mas não tinham diagnóstico clínico nos registros de saúde ou educação;

Avaliar diferenças nos fatores demográficos, individuais e de serviço entre crianças com e sem diagnóstico documentado de TEA.

A população de vigilância seguindo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – DSM-5) incluiu crianças de oito anos que tiveram registros de saúde e/ou educação revisados para TEA em 11 locais financiados pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) como parte da Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network (ADDM) 2014 (ciclo de 2015 –2018).

A Rede ADDM é um programa de vigilância que rastreia a prevalência e as características de crianças de oito anos com TEA em várias comunidades dos Estados Unidos.

A vigilância do TEA foi realizada em áreas selecionadas do Arizona, Arkansas, Carolina do Norte, Colorado, Geórgia, Maryland, Minnesota, Missouri, Nova Jersey, Tennessee e Wisconsin. As crianças foram definidas como portadoras de TEA se déficits sociais e comportamentais suficientes e/ou um diagnóstico de TEA fossem observados nos registros de saúde e/ou educação.

Os pesquisadores analisaram a educação e os prontuários médicos de 266.000 crianças com oito anos de idade em 2014, buscando determinar quantas daquelas que apresentavam sintomas do distúrbio não tinham diagnóstico clínico ou não estavam recebendo serviços.

Resultados

Entre 4.498 crianças identificadas, 1.135 (25%) tinham indicadores de TEA sem ter um diagnóstico. Destes, 81,4% eram do sexo masculino e 25% tinham deficiência intelectual conhecida (23,8% tinham dados cognitivos ausentes).

A distribuição racial e étnica da amostra foi de 51,0% de brancos não hispânicos, 23,9% de negros não hispânicos, 16,1% de hispânicos, 7,4% de outras raças não hispânicas e 1,6% de dados de raça e etnia ausentes. Um total de 3.363 (74,8%) apresentou diagnóstico clínico documentado de TEA e 1.135 (25,2%) apresentaram déficits sociais e comportamentais exclusivos de um diagnóstico de TEA documentado em registros de serviço. Das 1.135 crianças sem diagnóstico de TEA documentado, 628 (55%) não eram conhecidas por receber serviços de TEA em escolas públicas.

Os pesquisadores encontraram o seguintes fatores associados a não ter um diagnóstico clínico de TEA: raça não-branca, ausência de deficiência intelectual, idade mais avançada na primeira preocupação com o desenvolvimento, idade mais avançada na primeira avaliação do desenvolvimento, elegibilidade para educação especial diferente da TEA e necessidade de menos apoios.

Os resultados do estudo de Wiggins e colaboradores (2019) destacam a importância de reduzir as disparidades no diagnóstico de crianças com características de TEA, para que intervenções apropriadas possam ser promovidas nas comunidades.

Fonte:

https://pebmed.com.br/um-quarto-das-criancas-com-autismo-nao-sao-diagnosticados/

Autor(a):

Roberta Esteves Vieira de Castro. Doutora em Medicina pela UERJ, mestre em Saúde Materno-Infantil pela UFF e pós-graduanda em neurointensivismo pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

Referência Bibliográfica:

  • WIGGINS, L. D. et al. Disparities in Documented Diagnoses of Autism Spectrum Disorder Based on Demographic, Individual, and Service Factors. Autism Research, 2019 DOI: 10.1002/aur.2255

Relação da disbiose e autismo [podcast]

Neste episódio, produzido pela Cellera Farma em parceria com a PEBMED, Dolores Henriques e Paula Hartmann conversam sobre o que há na literatura sobre a relação entre sintomas clínicos nos pacientes com TEA e a disbiose.

Jogos no computador ajudam a memória de crianças hiperativas?

Um ensaio clínico randomizado e controlado, publicado no jornal Pediatrics, não encontrou benefícios no treinamento computadorizado da memória de trabalho em comparação ao ensino normal na primeira série, mesmo em crianças com distúrbios comportamentais ou de aprendizagem.

Com o objetivo de melhorar a memória de trabalho como forma de aumentar a atenção, o comportamento e os resultados acadêmicos associados, muitas crianças estão sendo matriculadas em programas computadorizados de treinamento de memória de trabalho em casa, na escola e em ambientes clínicos. Existem evidências, relativamente consistentes, de estudos da alta qualidade de benefícios de curto prazo após o treinamento de crianças em risco de baixa memória de trabalho em grupos clínicos, incluindo crianças com transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), bem como crianças com baixa memória de trabalho e grupos não clínicos. No entanto, os autores de alguns estudos observaram benefícios insignificantes de curto prazo para a memória de trabalho em crianças com TDAH e crianças nascidas extremamente prematuras, provavelmente devido a limitações metodológicas.

Metodologia do estudo com as crianças

Neste estudo, o objetivo dos pesquisadores foi avaliar se a resposta ao programa Cogmed Working Memory Training diferia para crianças com baixo quociente de inteligência (QI) e TDAH elevado, sintomas emocionais e comportamentais, necessidades especiais de saúde ou por sexo. O Cogmed é um programa desenvolvido por neurocientistas e psicólogos cognitivos do Instituto Karolinska, em Estocolmo, Suécia. Consiste em uma intervenção, baseada em software, que envolve diferentes tarefas visuoespaciais e verbais que desafiam sistematicamente a capacidade de memória operacional durante um período de treinamento de cinco a dez semanas. Os exercícios são realizados em um computador ou tablet, na conveniência da casa do usuário, escola ou clínica designada. O treinamento é monitorado online e pode ser visualizado pelo usuário e posteriormente monitorado e analisado por um coach.

Foram usados dados do Memory Maestros, um ensaio clínico randomizado controlado, com base na população do programa Cogmed que utilizava o programa na escola (n = 226), em comparação com o ensino normal (n = 226) em crianças da 1ª série (idade média de 6,9 anos; desvio-padrão [DP] 0,4), com pouca memória de trabalho. O Cogmed compreendia de 20 a 25 sessões, de 45 minutos de duração, ao longo de cinco a sete semanas. As crianças concluíram os subtestes da Avaliação Automatizada da Memória de Trabalho (Automated Working Memory Assessment) para mensurar a mudança na memória de trabalho, desde o início até seis meses pós-randomização.

Resultados

Após o treinamento, melhores escores padrão de memória de trabalho (>1 DP) da linha de base até 6 meses foram observados em aproximadamente um terço das crianças, com mais da metade mantendo escores estáveis (dentro de 1 DP). No entanto, resultados semelhantes foram observados para crianças que receberam ensino normal. Nenhuma das características estudadas previu melhora da memória de trabalho em resposta à intervenção. O efeito diferencial do Cogmed em relação ao ensino usual, foi evidente para crianças com hiperatividade e/ou desatenção elevadas, que eram menos propensas a apresentar melhora da memória operacional visuoespacial, mas não para os outros subgrupos estudados.

Conclusões

O estudo forneceu evidências de que o programa Cogmed não ajudou subgrupos específicos de crianças com baixa memória de trabalho a melhorá-la em curto prazo e, de fato, aquelas com hiperatividade e/ou desatenção elevadas são menos propensas a mostrar significado clínico de melhoria com o treinamento. Segundo os pesquisadores, isso amplia as principais conclusões do estudo Memory Maestros de que o programa Cogmed, quando aplicado a crianças identificadas com baixa memória de trabalho, após a triagem da população, não tem benefícios em longo prazo para o desempenho acadêmico e comportamento desatento. Para crianças com baixa memória de trabalho, a taxa de melhora no desempenho da memória operacional, durante o período de 6 meses, foi semelhante naqueles que foram tirados da classe para participar do Cogmed e para as crianças que permaneceram na classe para continuar com o ensino normal. Juntos, esses resultados questionam os benefícios persistentes do programa Cogmed para melhorar clinicamente a memória de trabalho.

De acordo com Jenny Radesky, editora associada do NEJM Journal Watch, quando os pais perguntam se vale a pena gastar tempo ou dinheiro em jogos de computador de “treinamento cerebral” para tratar o TDAH, os pediatras podem aconselhar os pais que as evidências não suportam melhorias em longo prazo. Além disso, os benefícios de curto prazo geralmente envolvem testes de memória de trabalho baseados em computador, não comportamentos cotidianos relacionados com isso. Portanto, pode ser melhor investir tempo em terapia cognitivo-comportamental, grupos de habilidades sociais e outras atividades estruturadas nas quais as crianças possam praticar essas habilidades com mais naturalidade. Para a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o pediatra exerce um papel de protagonista importantíssimo ao orientar hábitos de vida saudáveis, atividade física, esportes, alimentação, imunização, e socialização adequados, além de estímulo para o desenvolvimento potencial de todas as crianças e adolescentes, chamando atenção para os riscos da dependência não apenas digital, mas de drogas e álcool, do comportamento sexual, do autocuidado e também da autoestima.

Fonte:

https://pebmed.com.br/jogos-no-computador-ajudam-na-memoria-de-criancas-hiperativas/

Autor(a):

Roberta Esteves Vieira de Castro.

Doutora em Medicina pela UERJ, mestre em Saúde Materno-Infantil pela UFF e pós-graduanda em neurointensivismo pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

Referências Bibliográficas:

Diarreia associada ao uso de antibióticos – Quando usar o probiótico

Cerca de 30% dos pacientes em uso de antibióticos apresentam diarreia durante ou até 8 semanas após o tratamento. A prevenção deste quadro pode ser feita através do uso de probióticos como o Lactobacillus rhamnosus GG (LGG) e Saccharomyces boulardii.

Assista o vídeo para entender mais sobre o assunto: