Antipsicóticos Típicos vs Atípicos, quando usar cada um?

Introduzido em 1958, o haloperidol é utilizado para tratamento farmacológico das psicoses _ especialmente a esquizofrenia. O haloperidol mostrou menos riscos de hipotensão postural e mais ação sobre os sintomas da patologia em relação à clorpromazina, que foi o primeiro neuroléptico sintetizado e marcou o início da era dos antipsicóticos. Os antipsicóticos lançados posteriormente, chamados de atípicos, caracterizam-se por produzir menos sintomas extrapiramidais, em doses clinicamente eficazes.

Os atípicos podem trazer benefícios e ter ação mais efetiva sobre os sintomas negativos, como apatia-abulia e embotamento afetivo. Já os típicos são vistos com uma melhor eficácia em sintomas positivos, como alucinações e delírios.

Antipsicóticos típicos induzem mais taxa de efeitos extrapiramidais. Já os atípicos associam-se a mais risco de indução à síndrome metabólica e condições associadas, como diabetes mellitus.

O Haloperidol foi considerado um antipsicótico prototípico desde sua introdução até o advento dos antipsicóticos atípicos. Estudos mostram que apesar de risco de eventos adversos, em baixas doses, pode ser usado em pacientes com boa tolerabilidade, com menor desenvolvimento de efeitos extrapiramidais e a elevação da prolactina.

Doença celíaca e transtorno do espectro autista: existe relação?

A doença celíaca (DC) é uma doença de caráter autoimune induzida pela ingestão do glúten, uma proteína alimentar, que gera uma resposta inflamatória em pacientes geneticamente suscetíveis. Essa resposta é caracterizada por uma inflamação no intestino delgado com infiltração celular e consequente atrofia vilositária, resultando nos sintomas de disabsorção. Diversas comorbidades podem estar associadas à DC, como diabetes mellitus tipo I, deficiência de IgA e tireoidites autoimunes, mas um fato que chamou a atenção é a possibilidade da relação entre doença celíaca e o transtorno do espectro autista (TEA). O primeiro relato de caso que trouxe a presença simultânea de doença celíaca e transtorno do espectro autista foi descrito em 1960 em uma coorte de cerca de 65 crianças com diagnóstico de TEA. Desde então tem-se tentado encontrar uma possível relação entre essas duas condições.

Estudos recentes evidenciaram que os pacientes com DC têm uma maior possibilidade de apresentarem transtornos psiquiátricos de forma geral, como ansiedade, depressão e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Nos pacientes com TEA, é observada uma maior prevalência de sintomas do trato gastrointestinal (TGI), como constipação, diarreia e dor abdominal. Por essa linha de pensamento, alguns relatos de caso afirmam que pacientes com TEA tiveram melhora dos sintomas do TGI após a instituição de uma dieta sem glúten.

Qual mecanismo dessa relação entre DC e TEA?

Pesquisas iniciais trouxeram a hipótese da relação entre excesso de opioides e TEA após, em 1979, um pesquisador observar o comportamento de animais em uso dessas medicações e associar a semelhança de comportamento aos das crianças com TEA. A partir de então, surgiu a hipótese de que níveis excessivos de peptídeos opioides endógenos e/ou exógenos podem dificultar a neurotransmissão e o neurodesenvolvimento no sistema nervoso central (SNC), causando desordens que podem se assemelhar ao TEA. Essa hipótese levou à proposta de uma possível associação entre doença celíaca e transtorno do espectro autista, já que os peptídeos opioides podem ser produzidos pela hidrólise de proteínas alimentares, incluindo glúten e caseína.

De forma geral, a barreira hematoencefálica diminui a possibilidade da entrada dos opioides no SNC, porém, por alterações genéticas, essa barreira pode estar mais permeável, favorecendo a maior concentração destes no SNC. Outro ponto a se considerar é o aumento da permeabilidade da mucosa intestinal nos pacientes com DC, fazendo com que os níveis de opioides no sangue sejam mais elevados, consequentemente estando mais disponíveis para atingir o SNC.

Recentemente o Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition (JPGN) lançou uma revisão sistemática sobre a relação entre DC e TEA, avaliando estudos nos bancos de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) e Excerpta Medica dataBASE (EMBASE), pesquisando por estudos que relataram simultaneamente DC e TEA entre janeiro de 1946 e outubro de 2020. Os resultados obtidos foram os seguintes:

  • Um total de 298 trabalhos foram identificados e, desses, apenas 17 atenderam aos critérios de elegibilidade, trazendo simultaneamente a avaliação de DC e TEA.
  • DC em pacientes com TEA:
    • De treze estudos, nove não relataram nenhum caso de DC em suas respectivas amostras de pacientes com TEA (representada por 572 pacientes);
    • Quatro estudos relataram a presença de DC na amostra TEA (representando 21 casos de DC em 735 pacientes com TEA);
    • Calderoni et al. relataram uma prevalência de DC de aproximadamente 2,6% (intervalo de confiança de 95% [IC 95%]: 1,0-4,2) em crianças com TEA, sendo essa significativamente maior do que a prevalência na população geograficamente correspondente (P 1⁄4 0,013);
    • Badalyan e Schwartz observaram uma prevalência de DC de 4,3% em uma pesquisa que incluiu 211 crianças com síndrome de Asperger ou algum transtorno de comportamento não especificado e 1,3% em 79 crianças com TEA, respectivamente. Esses achados não foram estatisticamente significativos;
    • No geral, 21 casos de DC foram identificados em uma amostra de 1.307 pacientes com TEA (1,61%).
  • TEA em pacientes com DC:
    • Seis estudos (incluindo 2 discutidos anteriormente) investigaram casos de TEA em uma amostra de pacientes com DC;
    • Um estudo não relatou nenhum caso de TEA no grupo DC (representado por 120 pacientes);
    • Os demais cinco estudos relataram a presença de TEA em amostras de DC (representando 210 casos de TEA em 38.426 pacientes com DC);
    • Zelnik et al. encontraram 1 caso de TEA entre uma coorte de 111 pacientes enquanto Mazzone et al. observaram 2 casos em uma amostra de 100 crianças;
    • Butwicka et al. e Ludvigsson et al. (identificaram diagnósticos de TEA antes e após o diagnóstico de DC na população sueca. Ambos estes estudos relataram odds ratios não significativos. No entanto, descreveram um aumento do risco de TEA após o diagnóstico de DC com razão de risco de 1,5 (IC 95%: 1,2-1,8) e 1,39 (IC 95%: 1,13-1,71), respectivamente.

Discussão e conclusão

Os estudos presentes não conseguem sustentar a hipótese da relação direta de TEA e DC, sem evidências significativas para tal. A revisão sistemática em questão foi a primeira a tentar encontrar essa relação, no entanto, suas limitações podem ser atribuídas, principalmente, à heterogeneidade substancial entre os estudos em relação ao modelo do estudo, faixa etária, distribuição por sexo, critérios de diagnóstico e fatores geográficos.

É importante levarmos em consideração que o estabelecimento de uma relação entre TEA e DC é um desafio, tanto para o diagnóstico correto do TEA, baseado em sinais e sintomas subjetivos, quanto para o diagnóstico da DC na população pediátrica, que requer testes sorológicos e/ou análises de biópsia associados a presença dos sintomas compatíveis. Sendo assim, mais pesquisas são necessárias para confirmar claramente uma associação entre doença celíaca e transtorno do espectro autista.

Fonte: https://pebmed.com.br/doenca-celiaca-e-transtorno-do-espectro-autista-existe-relacao/

Autor(a): Jôbert Neves

Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) ⦁ Residência Médica em Pediatria Geral e Puericultura pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP) ⦁ Formação em Alimentação Complementar Integrativa e Baby-Led Weaning (BLW) – Instituto BeLive ⦁ Especialização em curso – Gastroenterologia Pediátrica pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP)

Referências Bibliográficas:

Quan J et al. Association Between Celiac Disease and Autism Spectrum Disorder: A Systematic Review. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2021;72(5):704-711. doi: 10.1097/mpg.0000000000003051

Dor Neuropática Pós-COVID

Segundo a International Association for the Study of Pain (IASP), a dor pode ser definida como: “Uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”. Pela definição já conseguimos perceber que além das questões fisiológicas e anatômicas ocasionadas pela dor, é um sintoma que afeta o bem-estar social e psicológico do indivíduo.

Devido ao isolamento social causado pela pandemia de COVID-19, alguns males como a sarcopenia, piora de dores crônicas pela falta de condições de ir a médicos, deixar de ir à fisioterapia e diminuição de procedimentos intervencionistas analgésicos, há uma piora geral da dor, sendo necessário uma abordagem mais aprofundada sobre o tema.

No vídeo abaixo, a Dra. Mariana Palladini, especialista em terapia da dor, discorre de maneira objetiva sobre Dor Neuropática Pós-COVID.

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Uso de probióticos na TDAH

O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é um transtorno do neurodesenvolvimento comum caracterizado por desatenção, impulsividade e hiperatividade. A etiologia do transtorno é multifatorial, com foco principal em fatores genéticos. No entanto, pesquisas recentes mostram o envolvimento de mudanças e desequilíbrios na microbiota intestinal com TDAH. As evidências da influência da microbiota intestinal no desenvolvimento do cérebro e na neurogênese são claras.1

Uma comunicação bidirecional entre o intestino e o cérebro (eixo intestino-cérebro) é reconhecida como fator de modulação imunológica do organismo, com a microbiota intestinal vista como um regulador chave dessa conversa cruzada. Atualmente, um conjunto de evidências pré-clínicas e, em menor extensão, epidemiológicas apoia a noção de que as interações hospedeiro-microrganismo desempenham um papel fundamental no desenvolvimento e na função do sistema nervoso central (cérebro) e na etiologia dos distúrbios do neurodesenvolvimento.1,2

Eventos no desenvolvimento do organismo e mudanças nos estilos de vida tradicionais são conhecidos por impactar a composição e função da microbiota intestinal e, portanto, podem aumentar o risco de acometimento por distúrbios do neurodesenvolvimento. O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é hoje o diagnóstico do neurodesenvolvimento mais prevalente.2

Apesar de muitos anos de pesquisa, a etiologia do TDAH não é clara e seu diagnóstico e tratamento ainda são desafiadores. Diferentes fatores relatados como associados ao risco de desenvolver TDAH e/ou vinculados a diferentes manifestações deste distúrbio também foram associados a mudanças na composição da microbiota intestinal, sugerindo uma ligação entre a microbiota e o transtorno. Evidências de estudos preliminares em humanos também sugerem que os componentes da dieta que modulam a microbiota intestinal podem influenciar o desenvolvimento ou os sintomas do TDAH, embora mais estudos sejam necessários para confirmar essa hipótese.2

A identificação de biomarcadores de neurodegeneração e o desenvolvimento de novos tratamentos, como o uso de probióticos, são alguns dos benefícios potenciais que podem derivar da pesquisa sobre o eixo intestino-cérebro em doenças neurológicas. A administração dos probióticos Lactobacillus sp. e Bifidobacterium sp., por exemplo, pode melhorar a constipação em pacientes neurológicos, mas não afeta outros sintomas da doença.2,3

Apesar dos avanços recentes acerca da compreensão do eixo intestino-cérebro, são necessários mais dados para avaliar se o conhecimento adquirido até o momento pode ser útil no ambiente clínico. Considerando a influência da microbiota intestinal em vários fatores de risco modificáveis ​​de doença cerebrovascular e sua influência nas complicações pós-AVC, em teoria muitos benefícios poderiam derivar do direcionamento à microbiota intestinal. Mais dados são necessários, contudo, para abordar a viabilidade de direcionar à microbiota intestinal o tratamento de pacientes neurológicos, a partir do uso de probióticos.3

Ensaios clínicos destacam o fato de que a suplementação com probióticos é suficiente para induzir efeitos consideráveis ​​em pelo menos três níveis de tratamento médico, a saber: a microbiota, a neuroquímica e o comportamento, sendo necessário mais dados experimentais para conectar esses domínios de maneira causal. Uma compreensão mais profunda desses mecanismos de comunicação será crucialmente importante para o desenvolvimento de qualquer estratégia terapêutica baseada na microbiota para doenças psiquiátricas.4

Uma pesquisa clínica recente, publicada em 2020, avaliou pacientes com TDAH que receberam o probiótico Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) ou placebo, em um estudo controlado, randomizado, duplo-cego. Os pacientes que receberam LGG® tiveram melhores escores de qualidade de vida, comparado aos que receberam placebo.5

Referências

1 – Anna Kalenik, Karolina Kardaś, Anna Rahnama, Katarzyna Sirojć, Tomasz Wolańczyk. Gut microbiota and probiotic therapy in ADHD: A review of current knowledge. Prog. Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2021 Feb 6; 110: 110277.

2 – María Carmen Cenit, Isabel Campillo Nuevo, Pilar Codoñer-Franch, Timothy G. Dinan, Yolanda Sanz. Gut microbiota and attention deficit hyperactivity disorder: new perspectives for a challenging condition. Eur Child Adolesc Psychiatry. 2017 Sep; 26(9): 1081-1092.

3 – Barbosa, Pedro Melo. Barbosa, Egberto Reis. The Gut Brain-Axis in Neurological Diseases. Int. J. Cardiovasc. Sci. Vol.33. Rio de Janeiro. Sept./Oct. 2020. Epub Aug 07, 2020.

4 – Luca BorrelliSerena AcetoClaudio AgnisolaSofia De PaoloLudovico DipinetoRoman M. StillingTimothy G. DinanJohn F. CryanLucia F. MennaAlessandro Fioretti. Probiotic modulation of the microbiota-gut-brain axis and behaviour in zebrafish. Scientific Reports. Nature. July, 15 2016.

5- Kumperscak HG, Gricar A, Ülen I, Micetic-Turk D. A Pilot Randomized Control Trial With the Probiotic Strain Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) in ADHD: Children and Adolescents Report Better Health-Related Quality of Life. Front Psychiatry. 2020 Mar 17;11:181.

Qual a relação do autismo e excesso de peso na infância?

O transtorno do espectro autista (TEA) é um conjunto de situações heterogêneas relacionadas ao neurodesenvolvimento, que se caracteriza por um prejuízo precoce nas habilidades sociais, comunicação social e comportamentos restritos e repetitivos.

Em todo o mundo, a prevalência de TEA é de aproximadamente 1% (em escolares, no Brasil, é de quase 0,3%). No entanto, há relatos de um aumento consistente e significativo nessa prevalência. Isso pode ser explicado pelos avanços nos critérios diagnósticos e pela maior identificação e conscientização desse transtorno.

Autismo e excesso de peso

Pacientes pediátricos que apresentam TEA possuem, presumivelmente, um maior risco de evoluírem com obesidade e doenças metabólicas relacionadas ao excesso de peso. Esse risco pode ser justificado pela ocorrência de comportamentos restritivos e repetitivos em pacientes com TEA, o que pode comprometer o desenvolvimento de habilidades motoras e os níveis de aptidão física.

Sendo assim, com o objetivo de avaliar o estado de crescimento e o desenvolvimento físico de crianças e adolescentes brasileiros entre quatro e 15 anos de idade com TEA, Toscano e colaboradores realizaram o estudo “Crescimento e massa corporal em crianças brasileiras com transtornos do espectro autista: um estudo longitudinal misto”, publicado recentemente no Jornal de Pediatria.

Os autores avaliaram se a variação nos padrões de crescimento e na massa corporal desses pacientes foi influenciada pelo uso de medicamentos psicotrópicos. Foram incluídas 120 crianças com idades entre 3,6 e 12,1 anos no início do estudo (média = 7,2 anos, DP = 2,3 anos) diagnosticadas com TEA. Essas crianças foram avaliadas em três ocasiões repetidas em um período de quatro anos. Os autores consideraram a estatura, a massa corporal e o índice de massa corporal (IMC). Foi utilizado um modelo multinível bayesiano para descrever os padrões de crescimento individual.

Resultados

Toscano e colaboradores descreveram os seguintes resultados:

O crescimento em estatura foi comparável ao percentil 50 específico para a idade para os dados de referência do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (Centers for Disease Control and Prevention – CDC) até cerca de oito anos. Entretanto, os autores notaram que houve uma diminuição considerável na taxa de crescimento depois dos oito anos, atingindo o percentil 5 específico para a idade aos 15 anos de idade;

Em média, tanto os valores de massa corporal quanto de IMC foram maiores comparativamente ao percentil 95 específico para a idade até aos oito anos da referência brasileira e do CDC. No entanto, foram abaixo do percentil 50 específico para a idade aos 15 anos de idade;

Houve uma influência aparente do uso psicotrópicos sobre o do peso.

O estudo apresenta limitações. Uma delas é que foram considerados apenas meninos com TEA, porque a amostra disponível de meninas foi bastante limitada. De acordo com os autores, o “menor número de meninas com TEA na amostra é compatível com a maior prevalência de TEA em meninos geralmente relatada”. Outra limitação consiste no fato de terem sido usadas referências americanas por não haver referência de crescimento na população brasileira.

Toscano e colaboradores (2019) concluíram que os meninos brasileiros com TEA entre quatro e 15 anos parecem ter retardo do crescimento na estatura após os oito a nove anos, o que, possivelmente, compromete o crescimento púbere.

Os autores observaram uma prevalência elevada de sobrepeso e obesidade na primeira infância, apesar de uma tendência de diminuição significativa na massa corporal e no IMC ter sido aparente quando as crianças com TEA entraram na puberdade.

Fonte: https://pebmed.com.br/qual-a-relacao-do-autismo-e-excesso-de-peso-na-infancia/

Autor(a): Roberta Esteves Vieira de Castro. Doutora em Medicina pela UERJ, mestre em Saúde Materno-Infantil pela UFF e pós-graduanda em neurointensivismo pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

Referências Bibliográficas:

  • Toscano CV, Ferreira JP, Gaspar JM, Carvalho HM. Growth and weight status of Brazilian children with autism spectrum disorders: A mixed longitudinal study. J Pediatr (Rio J). 2019;95:705-12.

Caso Clínico TDAH

Um dos transtornos mais comuns na infância, o déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) afeta o desenvolvimento da criança, tanto em casa quanto na escola, além de ter impacto social, emocional e cognitivo. O TDAH pode prevalecer até a idade adulta – entre 3,4% e 4,4% dos pacientes.

Atualmente, as diretrizes pedem que uma correta avaliação seja feita, para que o tratamento seja adequado e o paciente responda corretamente a ele. A recomendação é que seja feita uma abordagem multimodal, em que a escolha da medicação é influenciada por diversos fatores. Mas medicações com ação prolongada costumam ser mais utilizadas, por permitir administração apenas uma vez ao dia, tornando o tratamento mais privativo.

O metilfenidato (MPH) é o psicotrópico mais utilizado na psiquiatria infantil. Sua rápida absorção pelo sistema nervoso central reduz as manifestações clínicas do TDAH, tanto as mais evidentes quanto as menos evidentes. O MPH é recomendado como terapia de primeira linha em muitos países.

Cada paciente tem resposta e necessidades únicas com relação ao MPH. Por isso, é preciso uma abordagem personalizada no tratamento do TDAH. Cada formulação do MPH tem seu próprio perfil e diferenças com relação ao modo de administração. Cada dose é individualizada de acordo com o paciente. O aumento da dose pode ser em intervalo de uma semana, quando necessário.

Assim, o tratamento com MPH, com todas as suas formulações, concede benefícios para os pacientes com TDAH. A medicação ajuda com os principais sintomas e mantém essa melhora, inclusive os relacionados ao desempenho, domínio de atenção e funcionamento executivo. Além disso, o MPH ajuda no controle sintomático durante todo o dia do paciente.

Leia a separata completa clicando no documento abaixo:

7 Lições Para Uma Gestão Hospitalar Eficiente

O setor mais impactado pela pandemia do novo coronavírus foi o de saúde, tanto no Brasil quanto no mundo. Isso porque, além do pouco conhecimento sobre a doença, a grande demanda por leitos impactou consideravelmente a gestão hospitalar.

Neste sentido, apenas com o planejamento estratégico e uma rápida adaptação é possível superar esse obstáculo e melhorar a condição de saúde dos pacientes. Neste artigo, conheça algumas lições para tornar a gestão hospitalar mais eficiente.

1) A humanização como ferramenta de gestão hospitalar

A gestão hospitalar deve prever e proporcionar um conjunto de valores éticos e humanos, qualidade de vida e humanização. Isso porque, o principal papel dessas instituições de saúde é cuidar de vidas.

No entanto, diante do cenário de pandemia que se instalou no ano de 2020, foi preciso abandonar todo o planejamento e instaurar o gerenciamento de crise. Mesmo nessas circunstâncias, é preciso primar pela humanização.

Em primeiro lugar, pensar em atendimento humanizado é pensar em resgatar o respeito à vida. Uma das principais responsabilidades da administração hospitalar é abordar a forma como um paciente deve ser atendido, considerando que ele está em um momento difícil.

Além de beneficiar a imagem da instituição e dos profissionais que nela estão, essa atitude proporciona um alívio necessário para os pacientes e seus familiares, restaurando, mesmo que em parte, a qualidade de vida.

Isso porque, a finalidade da humanização é lidar com a fragilidade humana, oferecendo consolo, afeto e esperança nos momentos de maior vulnerabilidade de todos os envolvidos, seja o usuário ou o familiar.

Assim, se você deseja melhorar este aspecto no seu gerenciamento hospitalar, lembre-se que será necessário integrar o relacionamento pessoal, interpessoal e institucional. Nesse sentido, ele pode ser aplicado nas seguintes situações:

  • relação com o paciente: o foco do atendimento deve ser o paciente, identificando suas queixas e necessidades de forma humanitária;
  • ambiente acolhedor: o hospital precisa ter um ambiente agradável e confortável tanto para os pacientes quanto para os profissionais;
  • comunicação: a comunicação deve ser ágil, segura e eficiente.

2) Melhor aproveitamento dos recursos

Uma das principais dificuldades enfrentadas pelas organizações de saúde pública no Brasil é a escassez de recursos básicos. Com a pandemia da Covid-19, essa situação foi agravada, gerando uma série de problemas também na saúde complementar.

Por isso, uma gestão eficiente deve priorizar o melhor aproveitamento dos recursos. O primeiro passo para isso é educar os colaboradores sobre o uso eficiente dos insumos, principalmente aqueles que podem ser reutilizados.

Além disso, deve-se evitar o desperdício, pois todos os materiais têm um custo e são obtidos através de investimentos das operadoras de saúde ou do Governo. Porém, se a utilização do insumo não for devidamente comprovada, não haverá reembolso.

Ademais, para que o controle de estoque seja eficiente, todo recurso usado deve ser reposto. Para isso, é necessário registrar toda entrada e saída de suprimentos. Assim, sempre que for possível, a compra será realizada.

3) Use a tecnologia a seu favor

As tecnologias de informação (TI) surgem como um importante recurso para tornar mais eficiente a gestão hospitalar. Ao disponibilizar ferramentas integradas, é possível aprimorar e organizar os processos hospitalares.

Com isso, será possível gerar dados confiáveis que contribuirão para uma tomada de decisões mais assertiva. Dessa forma, a tecnologia dá o suporte necessário para você conseguir manter o planejamento, mesmo em tempos de crise.

Mesmo antes da pandemia do novo coronavírus, um sistema de gestão era considerado crucial para a tomada de decisões. Agora, com o cenário caótico dos hospitais, se tornou ainda mais essencial, pois as ações precisam ser executadas em um menor espaço de tempo.

Outrossim, a tecnologia também ajuda a organizar os dados, reduzir a ocorrência de erros, melhorar o desempenho e o faturamento hospitalar. Com isso, é possível profissionalizar a administração, de modo que o planejamento da gestão de crise seja mais efetivo.

4) Tenha processos flexíveis

Tradicionalmente, a gestão de instituições de saúde é marcada por uma grande burocracia, tanto na relação com fornecedores quanto com os pacientes. Esse problema é ainda maior na saúde pública.

No entanto, um bom gestor precisa ter flexibilidade para lidar com todas as partes envolvidas, principalmente porque a atuação na área de saúde envolve aspectos emocionais, o que exige não só a capacidade analítica, mas também inteligência emocional.

Assim, ao ter uma gestão hospitalar flexível, você estará preparado para contornar momentos delicados, sem muita rigidez. Além disso, essa flexibilidade é essencial para as instituições que desejam humanizar o seu atendimento.

5) Atenção à experiência do paciente

Atentar-se à experiência do paciente é uma ação necessária no dia-a-dia de uma organização de saúde. Porém, neste período de crise sanitária, esse cuidado precisa ser redobrado, pois os pacientes estão ainda mais fragilizados.

Contudo, não confunda experiência com satisfação. Enquanto esta refere-se à expectativa do paciente, a experiência diz respeito aos fatos. Ou seja, tudo o que o indivíduo vivenciar durante o atendimento médico irá influenciar a sua experiência.

O primeiro passo para fazer com que ela seja positiva é oferecer atendimento humanizado. Ao procurar um hospital, as pessoas estão passando por alguma dificuldade. Por isso, elas precisam ser tratadas com empatia e respeito.

6) Padronização de processos

Independente da área de atuação, a padronização de processos é uma prática que deve ser seguida por todas as empresas. Porém, para que esse padrão seja alcançado, os processos precisam ser bem definidos.

Na gestão hospitalar, essa padronização é obtida a partir da definição e distribuição das tarefas entre colaboradores e gestores. Ao estabelecer as funções de cada pessoa, os processos serão conduzidos com mais agilidade.

Em consequência disso, o hospital passa a funcionar como uma engrenagem perfeita, entregando bons resultados aos usuários. Além disso, caso haja a substituição de um profissional, a padronização fará com que nenhum processo seja afetado.

7) Feedbacks e mensuração de resultados

Uma parte muito importante da gestão hospitalar é a avaliação dos pacientes. A melhor forma de conhecer a eficiência e a qualidade dos serviços oferecidos é perguntando a quem, de fato, os utiliza.

Neste sentido, você pode implementar as pesquisas de satisfação. Assim, sempre ao fim de um atendimento, o usuário poderá informar o quão satisfeito está com o trabalho dos profissionais, a estrutura disponibilizada, entre outros.

Outrossim, você também precisa criar e mensurar indicadores de desempenho. Com eles, será possível avaliar a performance do hospital e também obter insights valiosos sobre redução de custos e qualidade dos serviços.

Enfim, ter uma gestão hospitalar eficiente é fundamental para oferecer o melhor atendimento possível ao público. Porém, em tempos de pandemia, alcançar esse objetivo é um grande desafio.

Por isso, considere nossas dicas e implemente-as na instituição. A gestão hospitalar é uma tarefa complexa e delicada. Portanto, invista no planejamento e em tecnologias, organize os recursos disponíveis e promova a humanização do atendimento.

Como ajudar crianças com TEA e TDAH no período de confinamento?


A pandemia trouxe mudanças bruscas de rotina, diferentes padrões de trabalho, carga horária estendida de home office, filhos em casa em tempo integral e muitas novas tarefas e hábitos que tem afetado diferentes faixas etárias, principalmente no aspecto emocional.

Com as crianças não é diferente, suas atividades da escola foram interrompidas, atividades de lazer tornaram-se bem restritas e até tiveram que se adaptar ao novo método de aulas online. O acometimento é ainda mais intenso naquelas crianças com problemas de desenvolvimento, como transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) e transtorno do espectro autista (TEA).

Confinamento e crianças com TDAH e TEA

Com o intuito de orientar e ajudar, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) publicou um documento que reuni respostas a alguns questionamentos comuns dos pais durante esse período. É muito importante que os médicos e profissionais de saúde saibam responder essas perguntas.

1. Como distrair meu filho(a) em casa e ajudá-lo(a) a passar o tempo?

Com esse maior contato familiar, devem ser incentivadas atividades que possam conciliar o tempo e necessidades das crianças e que possam estimular a curiosidade e a criatividade (esconde-esconde, quebra-cabeças, desenhos, atividades manuais…). Também são indicadas atividades como assistir TV em família e a leitura conjunta de livros adequados a faixa etária.

É de suma importância que se tente manter uma rotina alimentar saudável e que tenha objetivos diários definidos, para reduzir a ansiedade e o estresse que o período traz.

2. Devo criar novas regras e/ou limites dentro de casa?

Regras são fundamentais para a educação, porém em tempos de pandemia devemos adaptar as regras com as mudanças da rotina das crianças. Uma dica seria utilizar imagens com objetivos a serem alcançados naquele dia, como por exemplo: um desenho mostrando uma escova de dente, uma criança tomando banho ou uma família na hora da refeição. Sem esquecer de parabenizar a criança após um objetivo alcançado, caracterizando um reforço positivo.

Atenção especial ao abuso do tempo de telas. O ideal é planejar o tempo de tela na programação diária e o uso de um temporizador visual facilita o controle do tempo pela própria criança. Um exemplo é Time Timer, que é um aplicativo que mostra uma seção vermelha decrescente à medida que o tempo acaba. Outra dica legal que a SBP recomenda é o planejamento do tempo de tela antes de atividades preferidas, porque desligar antes do lanche é mais fácil do que antes de uma atividade acadêmica.

3. O que fazer quando meu filho(a) não quiser mais ficar em casa?

Esse momento acontecerá e a sugestão é aguardar horários com menor movimento, para sair ao ar livre, caminhar, mas sempre seguindo as normas de segurança.

4. O que fazer para não prejudicar os ganhos que meu filho(a) teve nas terapias até o momento?

Importante manter o contato com os terapeutas, para que eles possam auxiliar com dicas de tarefas em casa ou até mesmo promover sessões online. Lembrando que não devemos esperar respostas imediatas, já que é um momento bem difícil para todos.

5. Como devo proceder em casos de urgência ou dúvidas em relação às medicações?

Em caso de urgência/emergência tente contato com o médico assistente, do contrário, procure uma Unidade Básica de Saúde, Unidade de Pronto Atendimento ou Hospital mais próximo. Não altere ou suspenda doses por conta própria.

6. Mudanças comportamentais poderão acontecer nesse período? Como proceder?

Crianças com TEA geralmente tem dificuldades em expressar verbalmente sentimentos como ansiedade, medo, desconforto com a nova rotina e ainda mais em compreender o motivo dessa mudança de rotina. Os pais devem estar atentos a mudanças no padrão de sono, alteração do apetite, irritabilidade e/ou aumento de agitação, aumento de comportamentos repetitivos e preocupação excessiva ou ruminação.

Entrar em contato com o médico assistente e equipe multidisciplinar caso essas mudanças forem notadas para melhores orientações.

7. Como cuidar dos cuidadores nesse tempo de incertezas?

Neste momento, os pais se viram isolados, impotentes e com medo de adoecer ou perder a vida. Fora a questão da saúde, ainda há um cenário econômico e profissional duvidoso e os pais tiveram que lidar prontamente com as tarefas domésticas, com o cuidado de parentes idosos e o trabalho em casa.

Para tentar conseguir se manter emocionalmente bem para cuidar das crianças, a sugestão é não sentir-se culpado, acolher seu sentimento e conscientizar-se que está dando o seu melhor.

Uma sugestão é deixar de lado as preocupações que não podem ser respondidas ou resolvidas agora, como: O que vai acontecer com o ano letivo? Quanto tempo a quarentena vai durar? Quais serão os efeitos da quarentena no meu futuro?

Compartilhar as dúvidas e inseguranças com a rede de apoio também é fundamental!

Fonte: https://pebmed.com.br/como-ajudar-criancas-com-tea-e-tdah-no-periodo-de-confinamento/

Autor(a): Clara Madureira

Graduada em Medicina pela Universidade do Grande Rio ⦁ Residência Médica em Pediatria pelo Hospital Municipal Salgado Filho ⦁ Instagram: @draclaramadureira

Referência Bibliográfica: 

“Brain fog”, disbiose e probióticos: o que há de novo?

Os distúrbios psiquiátricos encontram-se entre as principais causas de atendimento médico e podem levar a incapacidade laboral e a piora da qualidade de vida dos pacientes. A depressão e a ansiedade merecem destaque no rol destes distúrbios, e nem sempre o diagnóstico das mesmas é fácil. Acreditamos que o Brain fog precisa ser incluído nesta linha de raciocínio diagnóstico. É fundamental alargar o horizonte para novas abordagens diagnósticas e terapêuticas, sendo está uma área promissora para estudos médicos.

O que é Brain fog?

Não é uma doença propriamente em si, mas um sintoma de outras condições patológicas médicas. É caracterizado como uma disfunção cognitiva em que podem estar presentes: alterações de memória, falta de clareza mental, distração fácil e/ou diminuição da capacidade de concentração. Mas quais seriam as suas causas? Estresse crônico, má qualidade de sono, alterações hormonais como na menopausa, andropausa ou gravidez, hábito ou deficiência alimentar; como deficiência de vitamina B12, medicamentos, intoxicações e/ou condições patológicas, tais como diabetes, anemia e depressão; podem estar etiopatogenicamente implicadas. O diagnóstico de síndrome da fadiga crônica, uma doença altamente debilitante com queixas clínicas heterogêneas também precisa ser considerado.

Relação com outras doenças

A relação do Brain fog e da síndrome da fadiga crônica com a disbiose da microbiota intestinal já foram aventadas, podendo estar relacionadas a alterações da relação bidirecional eixo cérebro-intestino. A importância que o Sistema Nervoso Entérico, uma complexa rede neuronal do sistema nervoso periférico e autonômico, precisa ser destacada. O microbioma intestinal, as células imunitárias, aliados à estrutura neuronal entérica possuem a capacidade de modular o Sistema Nervoso Central e estão alterados na disbiose. Podemos concluir que a esta interação inclui vias neurais, humorais e imunológicas e o papel da microbiota é de extrema relevância. Vários estudos mostram que uma comunicação alterada entre a microbiota e o eixo cérebro-intestino, pode estar relacionada a doenças tais como distúrbios neuropsiquiátricos, ansiedade, depressão e até autismo. É sabido que na disbiose há uma alteração do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, níveis alterados de triptofano, ácidos graxos de cadeia curta, e que pode influenciar o funcionamento intestinal.

A disbiose pode também contribuir para perpetuar esta disfunção/inflamação, prejudicando ainda mais a comunicação cérebro-intestino. O papel das tight junctions na manutenção da eubiose intestinal também precisa ser destacado, uma vez que as mesmas mantêm a integridade do epitélio intestinal regulando a passagem de íons, solutos e água. Por se tratarem de barreira semipermeável bloqueiam a livre difusão de proteínas, lipídeos e de produtos patogênicos. Alguns estudos demonstraram que a permeabilidade intestinal alterada pode levar a distúrbios inflamatórios crônicos e hipoteticamente permitir que o Brain fog se manifeste. Nestes casos pode-se pesquisar o supercrescimento bacteriano do Intestino delgado através do teste do hidrogênio expirado. Caso presente deverá ser tratado com antibióticos e a resposta clínica será avaliada. Alguns autores incluem no tratamento o uso de probióticos.

Probióticos

Segundo a Food and Agriculture Organization e World Health Organization, os mesmos são definidos como microrganismos vivos que, se em quantidade adequada, conferem benefício para a saúde. Há anos vários estudos já demostraram que os probióticos podem desempenhar um papel importante em várias áreas da medicina, como dermatologia, pediatria e gastrenterologia, por exemplo. Por outra lado, o estudo de sua atuação nos distúrbios psiquiátricos é bem mais recente, surgindo o conceito de psicobióticos. Os mesmos são definidos como probióticos que em tese possuem um papel benéfico e poderiam influenciar positivamente a saúde mental.

Psicobióticos no combate à depressão

Logan & Katzman em 2005, foram pioneiros a propor a eficácia do uso de psicobióticos como terapia adjuvante na depressão. Segundo os mesmos, estes probióticos apresentariam ação sistêmica atenuando citocinas inflamatórias e estimulando centros cerebrais que participam do processamento da informação neural. Estes centros levam a respostas autonômicas, neuroendócrinas e comportamentais.

Autores investigaram o efeito dos probióticos em indivíduos com diagnóstico de Transtorno Depressivo Maior, utilizando a ferramenta de Avaliação do Grau Depressivo. Foi constatada a diminuição desta pontuação no grupo que utilizou os probióticos em relação ao grupo controle. As cepas as mais citadas como benéficas na melhora dos sintomas depressivos e cognitivos foram Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus casei, Lactobacillus helveticus, Bifidobacterium lactis, Bifidobacterium longum e Bifidobacterium bifidum em concentrações entre 108 e 1010UFC/dia, com efeitos mensuráveis a partir da quarta semana de suplementação. Estes resultados devem ser avaliados com ressalva devido a multifatoriedade fisiopatológica da depressão e por variáveis de difícil controle na análise dos grupos de estudo. Destacam-se a baixa qualidade metodológica de alguns estudos, uma vez que vários têm um grupo heterogêneo ou com poucos indivíduos incluídos e as cepas usadas variaram entre os estudos.

Brain Fog na pandemia

Neste momento de pandemia, o número de pacientes que têm procurado os serviços de saúde com depressão, ansiedade ou sinais sugestivos de Brain fog tem crescido muito. Considerando também que a prevalência de transtornos depressivos no Brasil atinge 6% da população e que até 40% dos pacientes que utilizam antidepressivos não respondem como esperado ao tratamento ou uso de terapias adjuvantes como psicobióticos surge como interessante opção. Não há na literatura estudos sobre a atuação dos psicobióticos no Brain fog, mas a suplementação de pacientes com culturas probióticas desponta como uma possibilidade terapêutica e o seu uso futuro parece bastante promissor.

Fonte: https://pebmed.com.br/brain-fog-disbiose-e-probioticos-o-que-ha-de-novo/

Autor(a): Vera Lucia Angelo Andrade

Graduação em Medicina pela UFMG em 1989 • Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek • Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia • Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein • Mestre e Doutora em Patologia pela UFMG • Responsável pelo Setor de Motilidade da Clínica SEDIG BH desde 1995 • http://lattes.cnpq.br/0589625731703512

Referências bibliográficas: 

  • M Hornig. Can the light of immunometabolism cut through “brain fog”? The Journal of Clinical Investigation, 2020; 1102-1103. doi: 10.1172/JCI134985
  • Logan AC, Katzman M. Major depressive disorder: Probiotics may be an adjuvant therapy. Med Hypotheses. 2005 [cited 2018 Sept 14];64(3):533-8. doi: 1016/j.mehy.2004.08.019
  • Moraes ALF, Bueno RGAL, Fuentes-Rojas M, Antunes AEC. Suplementações com probióticos e depressão: estratégia terapêutica? Rev Ciênc Med. 2019;28(1):31-47
  • Silvestre C. O diálogo entre o cérebro e o intestino – Qual o papel dos probióticos?. Trabalho Final de Mestrado Integrado em Medicina . Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa – Clínica Universitária de Psiquiatria. 2015. Disponível em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/26287/1/CarinaRFSilvestre.pdf. (Acesso 06/11/20)
  • World Health Organization. Depression and other common mental disorders: Global health estimates. Geneva: WHO; 2017.

Transtorno depressivo em adolescentes: tratar com antidepressivos, psicoterapia ou os dois?

Já é de conhecimento público a crescente prevalência do transtorno depressivo maior no mundo, o que inclui a população infanto-juvenil. Por isso, mais estudos sobre o tema dedicados a essa faixa etária tem sido elaborados. Neste mês de julho, o Lancet Psychiatry lançou uma metanálise avaliando os tratamentos para depressão na infância e adolescência.

A presença do transtorno nesse grupo pode se apresentar de forma bastante heterogênea, como agressividade, irritabilidade ou recusa em ir para a escola. Dessa forma, pode influenciar em diversos setores da vida dos jovens, como na sua socialização ou no seu desenvolvimento acadêmico. Também pode precipitar o desenvolvimento de comorbidades, como transtornos alimentares, tabagismo, abuso de substâncias, uso de substâncias ilícitas e ideação suicida, além de ser considerada como uma das principais causas de morte nesta população. Por consequência, viemos observando um aumento das indicações de psicoterapia e de prescrição de medicações.

Contudo, alguns trabalhos anteriores vêm questionando os reais benefícios da terapia disponível quando comparamos a depressão a outros transtornos mentais (como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade ou os transtornos ansiosos). Este estudo foi realizado com a intenção de esclarecer um pouco as melhores abordagens nestes casos.

Tratamento do transtorno depressivo em crianças e adolescentes

De início, os autores optaram por atualizar a pesquisa de seus dois trabalhos anteriores com estudos sobre a monoterapia com antidepressivos e psicoterapia. Para o tratamento combinado foram feitas pesquisas em diversas bases de dados (LiLACS, PubMed, Cochrane, etc) cujo foco foram ensaios clínicos randomizados, publicados até 01/01/2019. Foram avaliados estudos que comparavam qualquer intervenção (medicação, psicoterapia ou ambos) com alguma forma de controle ou qualquer outra intervenção ativa para o tratamento agudo de crianças e adolescentes até 18 anos com diagnóstico de transtorno depressivo maior, distimia ou outros transtornos depressivos especificados.

Além da pesquisa em bases eletrônicas também foram feitas pesquisas manuais de trabalhos publicados, não publicados, em andamento (mas registrados), jornais científicos importantes e conferências. Também fizeram contato com autores e com a indústria farmacêutica solicitando relatórios dos trabalhos originais ou material não publicado. Não houve restrição de língua. Apesar de ser um estudo financiado, os autores declararam que o financiador não teve qualquer influência em nenhuma etapa da produção do trabalho.

Foram incluídos antidepressivos autorizados e em dose terapêutica de diferentes classes: inibidores seletivos da recaptação de serotonina (sertralina, paroxetina, escitalopram, citalopram e fluoxetina), inibidores seletivos da recaptação de serotonina e noradrenalina (duloxetina, venlafaxina e desvenlafaxina), tricíclicos (nortriptilina, desipramina, imipramina, amitriptilina e clomipramina) e de outras classes (vilazodona, mirtazapina e nefazodona).

Além disso, foram usadas diferentes técnicas de psicoterapia (terapia cognitivo-comportamental, terapia comportamental, terapia de família, psicodinâmica, terapia de apoio, interpessoal, focada na resolução de problemas, dentre outras) em diferentes formatos e através de diferentes vias (presencial, através da internet, em grupo ou individual) e a combinação de ambos. O controle farmacológico sempre foi obtido através de placebo e o psicoterápico foi feito com listas de espera, placebo psicológico ou tratamento padrão.

Os estudos feitos apenas com antidepressivos em monoterapia eram ensaios clínicos duplo-cegos com grupo controle. Já aqueles que avaliavam a psicoterapia ou a combinação (medicação + terapia) os observadores foram mascarados ou os pacientes foram avaliados através de escalas.

Para reduzir a heterogeneidade foram excluídos os estudos com algumas características, como aqueles com amostras inferiores a 10 pacientes e duração inferior a 4 semanas. Também foram excluídos pacientes com transtorno bipolar, depressão psicótica, resistentes ao tratamento ou que não preenchessem os critérios para transtorno depressivo. Em compensação, foram aceitos pacientes com as seguintes comorbidades: transtornos ansiosos e TDAH.

Os desfechos primários avaliados foram eficácia e aceitação (avaliada por todas as medidas de descontinuação). Já o desfecho secundário foi suicidalidade (entendido como ideação ou comportamento suicida). Para todas as análises tentou-se avaliar os desfechos em torno de 8 semanas. Quando não disponíveis foram usadas informações entre quatro e 16 semanas, com preferência aos dados mais próximos da oitava semana.

Limitações

Dentre uma série de limitações descritas pelos autores, destacamos algumas. Primeiramente deve-se considerar que a qualidade da maioria dos estudos foi considerada baixa ou muito baixa. Além disso, alguns trabalhos não relataram adequadamente como se deu a alocação e a ocultação. Também ressaltam a impossibilidade de realização de se fazer estudos duplo-cego com psicoterapia.

Adicionalmente deve-se contar o efeito da exclusão dos estudos em que os pacientes apresentavam sintomas subclínicos de depressão (mesmo essa população representando uma parcela significativa de pacientes nos consultórios e hospitais); depressão psicótica ou pacientes cujo quadro era resistente ao tratamento. Estudos observacionais foram igualmente excluídos e deve-se considerar que há poucos trabalhos sobre prevenção e recaída da depressão na faixa etária em questão.

Um viés de marketing relacionado à indústria farmacêutica pode ter contribuído para diferentes desfechos num mesmo estudo, apesar de os autores terem adotado medidas para reduzir este viés. Apesar dos esforços para coletar material não-publicado, é possível que alguns trabalhos tenham ficado de fora. Os autores também encontraram dificuldade em quantificar alguns desfechos como a descontinuação por efeitos adversos de um fármaco e a presença de efeitos adversos associados à psicoterapia.

Finalmente, é importante considerar as características de cada fármaco, como a dose necessária para se obter uma resposta e a meia-vida de uma medicação, ou seja, fatores que interferem com a titulação das drogas e o tempo necessário para alcançar a dose terapêutica.

Para mais detalhes sobre este trabalho, acesse o artigo original. A referência para isso pode ser encontrada na bibliografia.

Resultados e Discussão

Foram incluídos 71 ensaios clínicos para análise neste trabalho, totalizando 9.510 pacientes. Os trabalhos foram publicados entre 1986 e 2018, tendo sido comparados 16 antidepressivos, sete formas de psicoterapia, cinco terapias combinadas e três controles psicológicos ou uso de placebo. Desses, 4.081 pacientes foram alocados no tratamento com antidepressivos, 1.575 foram alocados para psicoterapia, 553 para o tratamento combinado e 3.301 para controle psicológico ou com placebo.

A idade dos participantes variou entre três e 20 anos (2 estudos incluíram pacientes até 20 anos, mas foram incluídos porque a idade média dos participantes era inferior a 18 anos, assim como a maioria dos pacientes). Da amostra, 57,2% era composta por mulheres e a duração média do tratamento agudo foi de oito semanas. Os participantes foram distribuídos de forma randômica em três ou mais grupos em dez dos 71 estudos e em 41 estudos os pacientes selecionados eram tratados em regime ambulatorial.

A maioria dos trabalhos foram feitos na América do Norte, seguidos pela Europa, Ásia, Austrália, América do Sul, diferentes continentes ou em foram feitos em outras áreas ou não tiveram seu local especificado. Dos 9.510 participantes 75,5% tiveram transtorno depressivo maior com gravidade de moderada a grave, com valores documentados em algumas escalas (Children’s Depression Rating Scale, Children’s Depression Inventory e Beck Depression Inventory). Do total, 33,8% dos estudos foram financiados pela indústria farmacêutica. Foram colhidas informações não publicadas de 11 dos 71 artigos.

Risco de vieses: 45,1% do material foi avaliado com alto risco de vieses, 45,1% como moderado e 9,9% como baixo.

Em termos de eficácia, apenas a terapia combinada de fluoxetina com terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a fluoxetina em monoterapia foram mais eficazes do que o placebo e os controles psicológicos. A terapia combinada de fluoxetina + terapia cognitivo-comportamental (TCC) mostrou-se mais eficaz do que a TCC ou a terapia psicodinâmica isoladas. Já a psicoterapia interpessoal foi mais eficaz do que os controles psicológicos, mas com baixa confiança.

No entanto, o uso de nortriptilina e a lista de espera foram piores do que outras intervenções, mas a interpretação dos dados da nortriptilina pode ser limitada a algumas inconsistências encontradas na metodologia da análise. Em termos de aceitação, a nefazodona e a fluoxetina foram menos descontinuadas do que a sertralina, a desipramina e a imipramina.

A imipramina foi mais associada à descontinuação do que o placebo, a vilazodona, a desvenlafaxina e a combinação de fluoxetina + TCC. A venlafaxina foi associada a um aumento significativo de ideação e comportamento suicida quando comparada ao placebo e outras 10 intervenções (fluoxetina, citalopram, escitalopram, duloxetina, imipramina, desvenlafaxina, fluoxetina + TCC, terapia de família, TCC isolada e placebo + TCC).

Esses achados são bem diferentes daqueles encontrados na população adulta, onde todos os antidepressivos descritos possuem eficácia documentada maior que o placebo, assim como as psicoterapias são superiores aos controles psicológicos.

Os autores especulam que tais diferenças poderiam estar relacionadas à aspectos do neurodesenvolvimento (como alterações hormonais, especialmente no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal); o fato de haverem poucos estudos com pacientes mais jovens; as diferenças de métodos de estudo nessas duas populações (talvez crianças e adolescentes respondam mais ao placebo) e por fatores relacionados às técnicas de psicoterapia (que muitas vezes são adaptações de técnicas originalmente desenvolvidas para adultos).

É necessário relembrar que em 2004 a Food and Drug Administration (FDA) colocou um alerta nos antidepressivos sobre seu uso em crianças, pois alguns trabalhos teriam destacado que essas medicações poderiam aumentar a ideação e o comportamento suicida. Como já colocado encontrou-se que a venlafaxina parece estar associada a um aumento significativo do risco de comportamento e ideação suicida em crianças e adolescentes, o que seria consistente com achados anteriores. Isso também pode ter ocorrido em consequência a uma maior notificação de dados sobre a venlafaxina.

A despeito disso, os autores escrevem que duas bases de dados norte-americanas com informações de mais de 220 mil jovens com depressão entre 2004 e 2009 mostraram que a aparente associação entre o uso de antidepressivos e as tentativas de suicídio e autoinjúria diminuíram e não foram estatisticamente significativas. No entanto, ainda sugere-se que os médicos assistentes monitorem seus pacientes com cautela ao iniciarem uma medicação antidepressiva.

Autora:


Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referência bibliográfica:

  • Zhou X, et al. Comparative efficacy and acceptability of antidepressants, psychotherapies, and their combination for acute treatment of children and adolescents with depressive disorder: a systematic review and network meta-analysis. Lancet Psychiatry 2020; 7: 581–601.