A fraqueza muscular, característica da doença, pode reduzir a mobilidade, mas não necessariamente ser um impedimento para dirigir ou usar transporte público.
A Miastenia Gravis é uma doença autoimune e rara, que tem entre os principais sintomas a fraqueza muscular e a fadiga. Isso acontece porque afeta a transmissão neuromuscular, ou seja, há uma súbita interrupção da comunicação natural entre nervos e músculos, dificultando ou até impedindo que a pessoa execute movimentos de forma voluntária. Porém, com a doença estabilizada, os miastênicos podem dirigir, usar transportes públicos e andar de avião.
“Dirigir é possível sim, desde que cada pessoa respeite os seus limites e não dirija se estiver se sentindo mal ou sem condições naquele momento. Para os condutores de automóveis, a recomendação é optar por carros com direção hidráulica e câmbio automático. Em alguns casos, porém, é necessário que os carros sejam adaptados de acordo com a necessidade de cada um, sendo que essa avaliação é realizada pelo médico”, diz o Dr. Eduardo Estephan, médico neurologista e diretor científico da Abrami (Associação Brasileira de Miastenia).
Por isso, vale estar por dentro de algumas peculiaridades para quem pretende solicitar a CNH (carteira nacional de habilitação) especial, principalmente, pelo desconhecimento sobre a flutuação dos sintomas da Miastenia Gravis. Nem sempre os miastênicos apresentam fraqueza muscular incapacitante e isso faz toda a diferença na hora de conquistar esse direito.
“Quando a pessoa carrega peso ou faz muitas atividades que exigem esforço físico no mesmo dia, a fraqueza muscular se manifesta mais fortemente e é preciso descansar para se restabelecer. Nesse caso, dirigir não é uma boa ideia, pois é preciso usar as pernas e os braços, mesmo com carro automático. Portanto, cada pessoa precisa conhecer os seus próprios limites para não correr riscos”, explica Andrea Amarante de Oliveira, presidente da Abrami (Associação Brasileira de Miastenia).
Qual é a diferença entre a CNH comum e a especial?
A carteira de habilitação especial dedicada ao público descreve as adaptações ou necessidades do condutor e concede alguns benefícios. Para consegui-la, a pessoa tem que passar por uma junta médica que irá examinar a extensão de sua deficiência e, para ser válida, a perícia deve ser marcada em uma clínica credenciada ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Se aprovado pelos médicos, o candidato deve realizar as aulas teóricas, o exame de legislação e as aulas práticas, assim como qualquer outro aspirante a motorista.
No exame prático, o carro em que o candidato fará a prova é vistoriado por um perito do Detran. Se ele estiver adaptado às necessidades do motorista, o teste é realizado normalmente. O candidato também poderá usar o seu próprio veículo para realizar o exame de direção e, caso não tenha, deverá realizar a prova num carro da autoescola. Quando aprovado, o campo das observações na CNH Especial será preenchido com a letra correspondente à adaptação necessária a ele. Geralmente, pessoas com miastenia, após passarem pela avaliação do perito do Detran, têm que dirigir carro com transmissão automática e direção hidráulica obrigatoriamente.
Parece um trâmite simples, mas na realidade não é tão simples assim. Segundo relatos de pessoas com miastenia que já passaram por esse processo, é preciso ter atenção para que o laudo dado pelo médico antes mesmo do processo começar seja bem preenchido, pois a interpretação do perito pode resultar em um pedido negado. “A paresia (perda parcial da motricidade), decorrente da miastenia, é o que enquadra o condutor como deficiente físico e concede o direito da CNH especial. Dependendo do grau de paresia que o médico colocar no laudo, mesmo que seja um sintoma flutuante (que se manifesta de vez em quando), o médico do órgão competente (Detran) que fará a avaliação pode considerar que aquela pessoa não está apta a dirigir. Isso acontece também em casos onde o miastênico apresenta ptose (pálpebra caída) – mesmo a moderada, que não compromete totalmente a visão, pode ser avaliada como incapacitante, resultando em um pedido indeferido pelo médico”, esclarece Andrea.
O desconhecimento da doença, em geral, pode acarretar em solicitações negadas aos miastênicos e, por isso, vale prestar muita atenção na hora de preencher dados em formulários e responder as perguntas, sejam relacionadas à CNH especial ou a outras situações. “Muitas autoescolas, por exemplo, não têm conhecimento sobre a miastenia e, geralmente, fazem o encaminhamento para uma autoescola especializada, sem necessidade, gerando custos muito maiores para fazer as aulas em um carro adaptado e conseguir a habilitação especial. O valor da renovação da carteira especial, por exemplo, é quatro vezes maior que o da CNH comum”, reforça Andrea.
Outro detalhe importante é o uso da carteira de habilitação especial para casos específicos, como o rodízio, por exemplo. Na cidade de São Paulo, o rodízio de carros é determinado pelo número da placa e os condutores com CNH especial podem solicitar isenção. Nesse caso, a liberação do rodízio é do carro, então se outra pessoa estiver dirigindo, a pessoa que tem a isenção não precisa estar junto, em caso de fiscalização. Já para o uso de vagas para deficiente, a credencial vale para a pessoa e não para o carro, ou seja, se outro condutor estiver dirigindo, mesmo que o carro seja adaptado, a pessoa com esse direito precisa esta junto.
Facilitadores de mobilidade
Usar o transporte público, como ônibus, trem ou metrô, é um desafio para miastênicos e pessoas com deficiência em geral. Isso acontece porque a frota de ônibus adaptados é pequena, inclusive em grandes metrópoles, como São Paulo, e pela falta de acessibilidade nos trens e metrôs, como rampas e elevadores próximos à plataforma e aos locais de embarque e desembarque. Em outros estados ou cidades menores, os meios de locomoção mais utilizados são as vans e motos, dificultando ainda mais a mobilidade.
De acordo com Andrea, mesmo para pessoas com a doença compensada, há dificuldade para entrar e sair dos ônibus devido à altura da escada e à falta de apoio para se segurar. Mas o problema não para por aí: na hora de levantar para descer do ônibus, com o veículo ainda em movimento, é preciso cuidado para não cair, pois o movimento das pernas tanto para sentar quanto para levantar exige cuidado. “O apoio de uma bengala pode facilitar e dar a firmeza necessária para se movimentar até o assento, que geralmente fica próximo da entrada, e as alças que servem para apoio, tanto nos ônibus quanto nos metrôs, também são facilitadores importantes para manter o corpo equilibrado”.
Muitas vezes, pessoas com a doença compensada que usam os assentos especiais em transportes públicos são mal vistas por não terem uma deficiência aparente. A vergonha e o medo de um julgamento errôneo, muitas vezes, fazem com que os miastênicos desistam de pegar um ônibus, trem ou metrô. Para que não se sintam intimidadas ou deixem de usufruir de seus direitos, a Abrami criou uma carteirinha, que pode ser utilizada por todos os miastênicos, independentemente de serem associados à entidade. “Nela estão todos os dados necessários para a identificação da pessoa, o que é muito importante em casos de emergência, além da cópia do laudo médico com a descrição da doença e da lista de medicamentos que não são recomendados para aquela pessoa, já que a doença exige uma série de restrições importantes de serem relatadas”, explica Andrea.
Para tornar essa iniciativa viável para todos, a Cellera Farma investiu em um aplicativo para que a carteirinha seja digital. Para solicitá-la basta baixar o app e preencher um cadastro com todas as informações necessárias. “O aplicativo facilita muito e dá segurança para as pessoas com miastenia, tanto para inclusão e usufruto de seus direitos, quanto para avisar a empresa em caso de falta de um medicamento bastante utilizado pelas pessoas com Miastenia Gravis, em algum ponto de venda. Dessa forma, a empresa consegue ter mais agilidade na reposição ou mesmo avisar em quais locais é possível encontrar a medicação naquele momento”, finaliza Andrea.
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