Transtornos mentais em pacientes pós-internação por Covid-19

Desde o início da pandemia, médicos e pesquisadores em todo o mundo vêm se perguntando se pacientes que estiveram internados por Covid-19 apresentam mais transtornos mentais após a alta e quais seriam esses transtornos. Os pacientes que estiveram em cuidados intensivos estariam mais propensos a transtornos mentais específicos ou a suas formas mais graves?

Essas questões foram debatidas em dois trabalhos independentes e que foram enviados aos editores de duas revistas médicas distintas: General Hospital Psychiatry e Intensive Care Medicine, ambos publicados em março deste ano.

Os estudos

No primeiro, são colocados, de forma resumida, os resultados de um estudo transversal realizado em um hospital em Cleveland (EUA) entre março e agosto de 2020. Nele, todos os pacientes que estiveram internados por Covid-19 no período descrito e que receberam alta posteriormente receberam uma mensagem recrutando para a participação no estudo, que consistia em acessar um link que direcionava os participantes para o preenchimento de escalas validadas para avaliação de 3 transtornos mentais: ansiedade (GAD-7), depressão (CES-D 10) e transtorno de estresse pós-traumático – vulgo, TEPT (PTSD-5).

No segundo trabalho, foram avaliados 47 pacientes que receberam alta após terem sido internados em unidades de cuidados intensivos (UTI ou CTI) devido à Covid-19 entre fevereiro e junho de 2020. Eles foram reavaliados cerca de um mês após a alta hospitalar e responderam a uma escala de avaliação de transtorno de estresse agudo (IES-R).

Resultados do primeiro trabalho

Inicialmente, vamos discutir os resultados do primeiro estudo, que avaliou quadros de ansiedade, depressão e TEPT. Dentre todos os pacientes que preencheram os critérios de recrutamento, todos receberam o convite para participar da pesquisa, mas apenas 19% responderam os questionários. Destes, 57% pontuaram para pelo menos um dos transtornos avaliados, sendo o mais comum o transtorno depressivo (42%), seguido por TEPT (34%) e finalmente os transtornos ansiosos (24%). Esses pacientes ainda foram divididos em dois grupos: pacientes que tinham história prévia de transtorno mental e os que não tinham história de transtorno mental antes da atual internação.

Na comparação entre eles, pôde-se observar que entre os que tinham história prévia de transtorno mental havia uma maior proporção de indivíduos pontuando para alguma forma de transtorno mental após a alta (78%) em relação aos que nunca tinham tido transtorno mental até então (42%). Mas, como os números indicam, não ter passado de transtorno mental não significa que esses indivíduos não fossem vulneráveis, encontrando-se o mesmo padrão já descrito: a depressão é o transtorno mais comum (37,2%), seguido por TEPT (23%) e transtornos ansiosos (11,2%).

Estes resultados não parecem ter sido influenciados pelo momento após a alta em que os questionários foram respondidos. Isso inclusive sugere a necessidade de seguir estes doentes por um maior período de tempo após a alta hospitalar, especialmente aqueles com história de transtorno mental.

Esses resultados parecem estar compatíveis com os achados de outros estudos de prevalência semelhantes e com o que foi observado nas pandemias anteriores (SARS e MERS). Contudo, tais análises devem ser contextualizadas: a taxa de resposta dos questionários foi baixa; é possível que os participantes justamente por apresentarem sintomas comportamentais ou psicológicos tenham optado por preencher os questionários; nem todos os pacientes poderiam estar internados por complicações da Covid-19, mas ter apresentado resultado positivo durante o período hospitalar; a forma como foi pesquisada a história patológica pregressa de transtornos mentais foi perguntando diretamente aos pacientes. Embora os autores não cheguem a mencionar isso, deve-se considerar que a amostra reflete a realidade daquela região, devendo-se ter cuidado na extrapolação de seus resultados.

Resultados do segundo trabalho

Já o segundo trabalho avaliado, publicado na Intensive Care Medicine, avaliou 47 pacientes que tiveram Covid-19 após a alta do CTI. Estes foram entrevistados cerca de um mês após a alta com a escala IES-R para avaliar a presença de transtorno agudo por estresse. No total, 40,4% dos avaliados preencheram critérios para o transtorno com o uso desta escala, sendo depois encaminhados para outros serviços onde poderiam ser melhor acompanhados e, se necessário, tratados.

Também foram avaliadas as manifestações clínicas e psíquicas que esses doentes apresentavam após a alta. Os sintomas clínicos mais comuns foram: astenia (97,8%), alterações no equilíbrio (19,2%), ageusia (19,2%), anosmia (10,6%), alterações auditivas (10,6%) e dispnéia (presente em 97,8% dos pacientes aos esforços moderados a graves, 27,7% aos esforços leves e 8,5% ao repouso).

Apesar de a presença de dispneia não ter sido diferente entre pacientes com ou sem o transtorno agudo por estresse, aqueles que pontuaram na escala para o transtorno referiram uma intensidade maior do quadro dispneico.

Ainda dentro do grupo com o transtorno, os sintomas característicos mais comuns foram os de caráter intrusivo, seguidos pelos evitativos e, por último, aqueles relacionados à hiperestimulação/reatividade, sem que houvesse diferenças nas características dos pacientes ou nas internações. No entanto, parece que os pacientes com o transtorno apresentavam um menor grau de hipóxia à admissão no CTI. Por estarem menos hipoxêmicos, poderiam também estar mais conscientes da experiência da internação, da sua condição de saúde e do que se passava com os demais pacientes internados – o que poderia justificar a relação com o transtorno.

Os pacientes também referiram outras queixas, sendo a mais comum o isolamento, por sua vez agravado pelas dificuldades de comunicação com a equipe de saúde e com os familiares. Muitos também relataram que suas memórias sobre o período não estavam muito claras, além de se queixarem de sentimentos de desrealização, pesadelos e até mesmo a crença de que se encontravam numa espécie de “falso hospital”.

Considerações sobre transtornos mentais pós-internação por Covid-19

Interessante notar que uma parte dos pacientes, independentemente de preencherem os critérios para o transtorno ou não, afirmaram que desejariam voltar ao local da internação, tanto para que isso ajudasse as suas memórias, como para poderem conhecer a equipe de saúde que cuidou deles.

Os resultados de ambos os trabalhos, mesmo com as devidas limitações, sugerem uma elevada prevalência de diferentes transtornos mentais em pacientes que estiveram internados por Covid-19. Dessa forma, esses pacientes deveriam ser seguidos e avaliados para a presença de transtornos mentais ao longo do seguimento após a alta. Isso parece ser ainda mais imperativo na população com história  pregressa de transtornos mentais.

Fonte: https://pebmed.com.br/transtornos-mentais-em-pacientes-pos-internacao-por-covid-19/

Autor(a): Paula Benevenuto Hartmann

Médica pela Universidade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Psiquiatra pelo Hospital Universitário Antônio Pedro/UFF ⦁ Mestranda em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Referência Bibliográfica:

Mongodi S, Salve G, Tavazzi G, Politi P, Mojoli F. High Prevalence of Acute Stress Disorder and Persisting Symptoms in ICU Survivors After COVID-19. intensive Care Medicine, March 2021. doi: https://doi.org/10.1007/s00134-021-06349-7

Wang PR, Oyem PC, Viguera AC. Prevalence of Psychiatric Morbidity Following Discharge After COVID-19 Hospitalization. General Hospital Psychiatry, March-April, 2021. doi: https://dx.doi.org/10.1016%2Fj.genhosppsych.2020.12.013

Probióticos: LGG® no incremento da resposta às vacinas

Há décadas, muitos pesquisadores têm demonstrado interesse sobre os benefícios do uso de pré e probióticos no tratamento e prevenção de doenças. Os probióticos consistem em microrganismos vivos da microbiota comensal humana, com baixa ou nenhuma patogenicidade, que, quando administrados na quantidade adequada, determinam benefícios à saúde humana (Alvarez-Olmos & Oberhelman, 2001; Capurso, 2019). Dentre os microrganismos mais utilizados destacam-se aqueles pertencentes à espécie Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®, ATCC 53013, DSM 33156).

Microrganismos dessa espécie são capazes de sobreviver no suco gástrico e na bile, e aderem a enterócitos com formação de biofilme (Capurso, 2019). Diversos estudos, incluindo ensaios clínicos, têm evidenciado o potencial terapêutico e protetor da terapia probiótica, especialmente a cepa LGG®, no manejo da diarreia do viajante, da diarreia associada ao uso de antibióticos, nas doenças inflamatórias intestinais, e em pacientes pediátricos, como no tratamento das rotaviroses e na prevenção de alergias alimentares (Alvarez-Olmos & Oberhelman, 2001;  Salminen & Arvilommi, 2001; Lebeer et al. 2007; Ahmadi, Alizadeh-Navaei & Rezai, 2015; Capurso, 2019).

O intestino constitui uma enorme interface ambiental, sensível a estímulos externos, o qual abriga mais da metade das células imunologicamente ativas do organismo. Por outro lado, estima-se que o ser humano possua cerca de 1,27 vezes mais células microbianas que humanas (Sender, 2016). Dessa forma, as bactérias comensais do trato gastrointestinal, as quais incluem lactobacilos, exercem permanente interação com o sistema imune, contribuindo para a homeostase e adequada defesa do organismo. A exposição contínua a antígenos no lúmen intestinal induz a tolerância imunológica, com possível deleção clonal, anergia ou supressão da resposta via citocinas IL-10 ou TGF-β. Por outro lado, o constante estímulo gastrointestinal leva à produção de imunoglobulinas, linfócitos T de memória (CD45RO) e células T-helper tipo 1 (Th-1) e tipo 2 (Th-2) (Segers & Lebeer, 2014), as quais são importantes no equilíbrio da resposta imune.

Probióticos aumentam a resposta imune

Dado o efeito imunomodulador da microbiota, uma das estratégias para aumentar a resposta imunológica a vacinas contra vírus e bactérias mais estudada atualmente é o uso de probióticos. Kaila et al. (1992) descreveram significativo incremento na resposta sorológica a rotavírus, através da produção de IgM e IgA, durante os estágios de diarreia dentre os pacientes que foram tratados com LGG®.

Voluntários saudáveis vacinados com vacina oral contra Salmonella typhi, associada à febre tifoide, que receberam probióticos contendo L. acidophilus e Bifidobacterium spp. por 3 semanas, apresentaram maiores níveis de IgA sérica à S. typhi Ty21a em comparação com o grupo controle (Lin-Amster et al., 1994). Adicionalmente, os probióticos parecem favorecer também a imunidade inata por estímulo ao sistema complemento, à atividade fagocítica de macrófagos contra diversas bactérias intracelulares e a produção de citocinas como IFN-γ, IL-12 e IL-18, favorecendo a translocação de células imunes em mucosas. Estudos de meta-análises também indicam a redução de risco de infecções respiratórias em vias aéreas superiores de crianças > 1 ano nos grupos em uso diário de probióticos (Liu et al. 2013, Capurso, 2019). Outros efeitos imunológicos associados ao LGG® incluem:

  • Aumento da expressão de receptores toll-like (TLRs) em todos os tipos celulares; 
  • Aumento da expressão dos receptores associados à apresentação de antígenos HLA-DR em macrófagos e monócitos;
  • Modulação da função de células dendríticas e outros.

            Considerando a segurança para o paciente já comprovada na literatura científica, o uso de probióticos como adjuvante à imunização por vacinas convencionais já tem sido sugerido por alguns autores (Capurso, 2019). De fato, Davidson e colaboradores demonstraram benefício da administração de Lactobacillus GG nas taxas de soro conversão contra o sorotipo H3N2 da vacina de vírus vivo atenuado trivalente contra Influenza (Davidson et al, 2011). Mais recentemente, discute-se também o uso dos probióticos como vetores vivos para a imunização oral de forma a estimular a imunidade em mucosas, incluindo contra a Covid-19 (Taghinezhad-S et al, 2021).  Essas e outras evidências sobre os efeitos benéficos diretos ou indiretos do LGG® sobre a promoção da resposta imune vacinal tem se acumulado nos últimos anos.

Referências bibliográficas:

1. Ahmadi E, Alizadeh-Navaei R, Rezai MS. Efficacy of probiotic use in acute rotavirus diarrhea in children: A systematic review and meta-analysis. Caspian J Intern Med. 2015;6(4):187-95.

2. Alvarez-Olmos MI, Oberhelman RA. Probiotic agents and infectious diseases: a modern perspective on a traditional therapy. Clin Infect Dis. 2001;32(11):1567-76.

3. Capurso L. Thirty Years of Lactobacillus rhamnosus GG: A Review. J Clin Gastroenterol. 2019;53 Suppl 1:S1-S41.

4. Davidson LE, Fiorino AM, Snydman DR, Hibberd PL. Lactobacillus GG as an immune adjuvant for live-attenuated influenza vaccine in healthy adults: a randomized double-blind placebo-controlled trial. Eur J Clin Nutr. 2011;65(4):501-507.

5. Kaila M, Isolauri E, Soppi E, Virtanen E, Laine S, Arvilommi H. Enhancement of the circulating antibody secreting cell response in human diarrhea by a human lactobacillus strain. Pediatr Res 1992; 32:141–4.

6. Lebeer S, Verhoeven TL, Perea Vélez M, Vanderleyden J, De Keersmaecker SC. Impact of environmental and genetic factors on biofilm formation by the probiotic strain Lactobacillus rhamnosus GG. Appl Environ Microbiol. 2007; 73(21):6768-75.

7. Lin-Amster H, Rochat F, Saudan KY, et al. Modulation of a specific humoral immune response and changes in intestinal flora mediated through fermented milk intake. FEMS Immunol Med Microbiol 1994; 10:55–64.

8. Liu S, Hu P, Du X, Zhou T, Pei X. Lactobacillus rhamnosus GG supplementation for preventing respiratory infections in children: a meta-analysis of randomized, placebo-controlled trials. Indian Pediatr. 2013;50(4):377-81.

9. Segers ME, Lebeer S. Towards a better understanding of Lactobacillus rhamnosus GG-host interactions. Microb Cell Fact. 2014 Aug 29;13 Suppl 1(Suppl 1):S7. doi: 10.1186/1475-2859-13-S1-S7.

10. Sender R, Fuchs S, Milo R. Revised Estimates for the Number of Human and Bacteria Cells in the Body. PLoS Biol. 2016 Aug 19;14(8):e1002533. doi: 10.1371/journal.pbio.1002533.

11.Taghinezhad-S S, Mohseni AH, Bermúdez-Humarán LG, et al. Probiotic-based vaccines may provide effective protection against COVID-19 acute respiratory disease. Vaccines. 2021;9(5):466.

Observação: A empresa Chr. Hansen é a produtora da cepa Lactobacillus rhamnosus GG, que segundo a nomenclatura atual agora passa a se chamar Lacticaseibacillus rhamnosus GG ([ATCC 53103] ATCC – American Type Culture Collection). Em 2019, a Chr. Hansen depositou a cepa na DSMZ – Deutsche Sammlung von Mikroorganismen und Zellkulturen (Coleção Alemã de Microrganismos e Culturas Celulares)  sob o número DSM 33156

https://www.dsmz.de/dsmz

http://lactobacillus.ualberta.ca/

https://era.library.ualberta.ca/items/b4736051-ee09-49ec-8146-8f05975db42c

https://www.chr-hansen.com/en/human-health-and-probiotics/our-probiotic-strains/lactobacillus-rhamnosus-gg-trademark-lgg

Novo exame para identificar miastenia gravis é incorporado ao SUS

Foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) o exame de dosagem de anticorpo antirreceptor de acetilcolina (anti-AChR), hormônio que realiza a comunicação entre os neurônios para o diagnóstico de miastenia gravis. O relatório de recomendação do exame foi validado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).

Antes da incorporação, a detecção da enfermidade era realizada apenas com base no histórico do paciente, de acordo com os sinais e sintomas apresentados. Os médicos especialistas também podem solicitar um exame de eletroneuromiografia (ENMG), que avalia a presença de lesões que afetam os nervos e os músculos, além do exame de estimulação nervosa repetitiva (ENR).

Os estudos para o exame de dosagem de anticorpo antirreceptor de acetilcolina, coletado em amostras de sangue, indicam a sua capacidade de diagnosticar a doença através da identificação e da quantificação de anticorpos que se ligam ao receptor da acetilcolina, mesmo quando encontradas em quantidades muito pequenas no organismo.

As análises também permitiram saber quais pessoas possuem a enfermidade, quando comparado ao exame de estimulação nervosa repetitiva.

Mais sobre miastenia gravis

Doença neuromuscular, caracterizada pela súbita interrupção da comunicação natural entre nervos e músculos, a miastenia causa fraqueza muscular e dificulta (em alguns casos, até atrapalha) que o paciente execute movimentos de forma voluntária.

Pouco conhecida, de difícil diagnóstico e sem cura, ela se manifesta de formas diferentes, sendo que a mais conhecida é a miastenia gravis. “Trata-se de uma doença autoimune manifestada quando o sistema imunológico ataca erroneamente a mesma junção do nervo com o músculo, que nasceu saudável. Por isso, a maior parte dos casos atinge a faixa etária entre 30 e 60 anos, com maior prevalência em mulheres”, explica o médico neurologista Eduardo Estephan, diretor científico da Associação Brasileira de Miastenia (Abrami).

A miastenia gravis tem como principais sintomas a fraqueza nos músculos dos braços e das pernas, fadiga extrema, pálpebras caídas, visão dupla, dificuldade para falar, mastigar e engolir.

“Os sintomas são facilmente confundidos com outras patologias, como esclerose múltipla e esclerose lateral amiotrófica (ELA) e até mesmo os pacientes costumam ter dificuldades em descrever os episódios que experimentam em alguns momentos do dia”, esclarece o especialista.

Segundo Eduardo Estephan, o ideal é que o diagnóstico seja realizado por um neurologista, preferencialmente com experiência em miastenia. “Cerca de 10% dos miastênicos podem ser tratados somente com remédios que combatem apenas os sintomas da enfermidade. No Brasil, só existe um medicamento eficaz com evidência científica, a piridostigmina, que aumenta a quantidade de acetilcolina na junção entre o nervo e o músculo”, pontua o neurologista.

Vale lembrar que a miastenia gravis deve ser tratada com corticoides e imunossupressores, sendo que a retirada do timo (timectomia) costuma ser bem-sucedida em muitos casos.

Fonte: https://pebmed.com.br/novo-exame-para-identificar-miastenia-gravis-e-incorporado-ao-sus/

Autor(a): Redação PEBMED

Referências Bibliográficas:

Saúde aprova novo exame para identificar doença neuromuscular. Portal Ministério da Saúde. https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/saude-aprova-novo-exame-para-identificar-doenca-neuromuscular

Relatório de Recomendação: Procedimento. Exame de dosagem de anticorpo anti-receptor de acetilcolina para diagnóstico da Miastenia Gravis. Nº 598. Março 2021. Conitec. Brasília, DF. http://conitec.gov.br/images/Relatorios/2021/20210422_Relatorio_598_antiach_miastenia_gravis_.pdf

Você sabe identificar o que é uma enxaqueca vestibular?

A enxaqueca vestibular é um termo usado para descrever vertigem episódica ou sintomas vestibulares atribuídos à enxaqueca. Embora essa associação tenha sido observada desde 1873, ela permanece uma entidade mal definida e compreendida. Alguns fatores que têm dificultado o estudo desta condição são as manifestações clínicas que variam e se sobrepõem a outros distúrbios vestibulares, a compreensão limitada da fisiopatologia subjacente da enxaqueca e a falta de marcadores biológicos ou testes específicos.

A maioria dos pacientes apresentam cefaleia do tipo enxaqueca e sintomas vestibulares episódicos sem outros sintomas neurológicos. Isso distingue a enxaqueca vestibular da enxaqueca com aura do tronco cerebral, na qual pelo menos dois sintomas da circulação posterior são necessários.

Uma história de enxaqueca geralmente precede o desenvolvimento da enxaqueca vestibular, muitas vezes por vários anos. Os principais sintomas clínicos são:

  • Vertigem não provocada– Os pacientes geralmente descrevem episódios de vertigem que podem ser internos (uma falsa sensação de movimento do próprio corpo) ou externos (uma falsa sensação de que o ambiente está girando) e frequentemente agravada por mudanças de posição.
  • Enxaqueca– Um ou mais sintomas de enxaqueca (fotofobia, fonofobia e/ou aura visual) frequentemente ocorrem durante os episódios de vertigem. Embora a vertigem possa ocorrer com ou sem cefaleia, as enxaquecas estão presentes em 50 a 94% das crises vestibulares. Dentro de um episódio, a vertigem pode ocorrer durante ou imediatamente antes da cefaleia.
  • Sintomas auditivos– A fonofobia ocorre em dois terços dos pacientes.  Os sintomas de zumbido bilateral ou unilateral, plenitude e deficiência auditiva subjetiva podem fazer parte do quadro. Desta forma, sua presença não diferencia imediatamente a doença de Meniére da enxaqueca vestibular.

Características da enxaqueca vestibular

Quanto às características principais de um episódio de enxaqueca vestibular, merecem destaque:

  • Duração– É variável, onde a vertigem aguda pode durar horas, mas a intolerância ao movimento e a instabilidade podem persistir por um dia ou mais. É raro os sintomas persistirem por mais de 72 horas.
  • Frequência- Os episódios podem ocorrer várias vezes ao dia; mais comumente, eles são relatados algumas vezes a cada ano.
  • Gatilhos– Os gatilhos (privação de sono, certos alimentos, estresse etc.) parecem desempenhar um papel semelhante na enxaqueca vestibular, assim como em outras formas de enxaqueca. Gatilhos visuais e de movimento também são descritos.

Sem um achado de exame ou teste diagnóstico específico, a enxaqueca vestibular é um diagnóstico clínico.

Os critérios da Classificação Internacional de Distúrbios de Cefaleia (ICHD-3) para enxaqueca vestibular são:

  • Uma história atual ou passada de enxaqueca (com ou sem aura)
  • Pelo menos cinco episódios atendendo aos dois critérios a seguir:
    • Sintomas vestibulares de intensidade moderada ou grave, com duração de 5 minutos a 72 horas, e
    • Pelo menos 50% dos episódios associados a pelo menos um dos três critérios de enxaqueca:
    • Cefaleia com pelo menos duas das seguintes características (unilateral, pulsante, intensidade moderada ou grave, que piora com a atividade)
    • Fotofobia e fonofobia
    • Aura visual
  • Se os sintomas não são mais bem explicados por outro diagnóstico

Na prática clínica, os pacientes com episódios espontâneos recorrentes de vertigem preenchem mais frequentemente os critérios para enxaqueca vestibular provável do que para enxaqueca vestibular definitiva. Diante de um diagnóstico provável, é importante considerar o tratamento de qualquer outro distúrbio vestibular coexistente ou sobreposto e reavaliar o diagnóstico, se o paciente não responder ao tratamento ou se as características clínicas mudarem.

Fonte: https://pebmed.com.br/voce-sabe-identificar-o-que-e-uma-enxaqueca-vestibular/

Autor(a):

Felipe Resende Nobrega

Residência Médica em Neurologia (UNIRIO) • Mestre em Neurologia (UNIRIO) • Professor de Clínica Médica da UNESA

Referências Bibliográficas:

  • Lempert T, Brevern, MV. Vestibular Migraine. Neurol Clin. 2019 Nov;37(4): 695-706.
  • Headache Classification Committee of the International Headache Society (IHS) The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition. Cephalalgia 2018; 38:1.
  • Formeister EJ, Rizk HG, Kohn MA, Sharon JD. The Epidemiology of Vestibular Migraine: A Population-based Survey Study. OtolNeurotol 2018; 39:1037.
  • Winnick A, Sadeghpour S, Otero-Millan J, et al. Errors of Upright Perception in Patients With Vestibular Migraine. Front Neurol 2018; 9:892.
  • Huang TC, Wang SJ, Kheradmand A. Vestibular migraine: An update on current understanding and future directions. Cephalalgia 2020; 40:107.

Atividade física é fundamental para Miastenia Gravis, desde que a doença esteja compensada

Se para um miastênico em crise o repouso é fundamental para a sua plena recuperação, o paciente que está com a Miastenia Gravis compensada, a atividade física é muito importante para atuar como coadjuvante no tratamento. Isso porque além de manter o bem-estar físico e emocional, ela pode ser fundamental para fortalecer a musculatura e melhorar o desempenho nas atividades diárias como caminhar, sentar, levantar, elevar os braços, e até para subir e descer escadas. Mas saiba que nem sempre os exercícios físicos foram vistos como um aliado no tratamento.

Durante muito tempo, mais precisamente entre a década de 2000 e 2010, a recomendação para o paciente miastênico era não praticar nenhuma atividade física. “Essa instrução, aliás, fazia parte do tratamento: quanto mais repouso o paciente fizesse, melhor ele ficava”, lembra Eduardo Estephan, médico neurologista, especialista em Doenças Neuromusculares dos Hospital das Clínicas (FMUSP), do Hospital Santa Marcelina e diretor científico da Associação Brasileira de Miastenia (ABRAMI).

Exercícios como recomendação médica

De acordo com o especialista, de lá para cá vários estudos têm mostrado o contrário, que pacientes que fazem atividade física conseguem ganhar mais funcionalidade nas atividades de esforço durante o dia. Dessa forma, os exercícios passaram a ser recomendados como parte do tratamento, e não mais o repouso.  “É claro que para poder indicar atividade física, o paciente precisa estar compensado. Lembrando sempre que quem toma essa decisão é o médico neurologista, que acompanha o paciente”, aconselha.

Sobre as práticas esportivas disponíveis também é preciso ir além de quais as modalidades o paciente pode se adaptar melhor. Como benefício à saúde do paciente portador de Miastenia Gravis, o médico neurologista recomenda as atividades físicas aeróbicas, como caminhada, corrida, bike. “Mas ela pode estar associada com modalidades anaeróbicas, caso da musculação, do alongamento, da ioga”, indica. Para não deixar o paciente sofrer com a fadiga muscular, o médico recomenda que é importante que ele consiga tolerar bem os exercícios, mas nunca sem deixá-lo com fadiga. E isso vale tanto para uma caminhada, uma corrida, como um treino de musculação ou até uma aula de pilates. “É importante que o paciente seja acompanhado por um profissional competente, de preferência que tenha conhecimentos sobre a doença para aumentar a carga e a intensidade devagar, para nunca induzir à exaustão do paciente”, afirma.

Exemplo de superação

Para quem sempre foi ativo, praticava várias modalidades esportivas, de jiu-jitsu a skate, passando pelos campeonatos de patins, além da musculação e da corrida, ouvir o diagnóstico de miastenia, pode causar medo e sensação de frustração.

Foi o que aconteceu com o instrumentador cirúrgico e motorista de aplicativo Josadac Vasconcelos Marques, 37 anos, de Manaus, no Amazonas. “Até receber o diagnóstico eu acreditava que aquele cansaço constante era do trabalho como motorista”, recorda-se. “Algumas vezes, puxar o freio de mão com as duas mãos era difícil. A fraqueza nos braços era uma constante ao final do dia. Isso sem contar a diplopia (visão dupla), que era frequente e foi o principal sintoma que me levou ao neurologista, que deu o diagnóstico”, conta Josadac.

Mas embora tenha sentido o diagnóstico da doença como um banho de água fria, acreditando que não seria mais capaz de fazer tudo o que sempre gostara, com a ajuda da namorada, a professora  de educação física Lucilene de Castro Batalha, ele conseguiu usar a memória muscular a seu favor.  Por ter sido sempre muito ativo, a personal trainer foi pesquisar a doença e passou a investir em exercícios funcionais e de musculação, com pouca carga e repetições para ajudá-lo no fortalecimento muscular e no seu bem-estar. “Quando ele descobriu a doença, estava melhorando o seu desempenho na corrida e tinha como meta fazer uma maratona (42km e 195 metros). Era o sonho dele. Então, quando o neurologista o liberou para fazer exercícios, montei uma planilha onde priorizava os treinos de musculação, intercalando com os de corrida”, lembra-se. Juntamente com os treinos, Josadac passou a fazer suplementação para melhorar o rendimento físico e evitar a fadiga. Com muita dedicação e foco, ele conseguiu completar a sua primeira maratona. “Tive vontade de desistir, pois foi uma prova de muita resistência, mas vendo as pessoas me incentivarem, meu pai me inspirando a cada quilômetro alcançado, e revendo o que já havia passado para chegar até ali, tudo isso me fortaleceu para completar a prova”, recorda-se, emocionado. E de fato, a inspiração, o foco e o desejo de superação fez com que além da participação na maratona, Josadac fizesse depois outra prova de resistência: os 19km da Volta da Pampulha, em 2019.

Claro que o instrumentador declara que tem momentos de altos e baixos, dias que a fadiga o impede de fazer atividades do dia a dia. Mas como a atividade física é constante em sua vida, ele logo se recupera.

Todo miastênico pode praticar exercícios?

Vendo o desempenho do atleta amador Josadac Marques, a pergunta que logo se faz é: todos os miastênicos podem fazer atividade física? Segundo os especialistas, não dá para afirmar, afinal, o profissional especializado que acompanha o paciente é quem deve avaliar o seu quadro para recomendar ou não a prática.

A segunda pergunta que vem à cabeça de um portador da doença é: todas as modalidades esportivas estão liberadas para o portador da doença? Também é preciso avaliar caso a caso, identificar o grau da Miastenia Gravis, se ela está bem compensada, e investigar se o paciente já fez alguma prática antes do diagnóstico ou não. Afinal, não dá para sair de uma condição de sedentário para atleta profissional.

Começar a praticar alguma modalidade esportiva, desde de que a doença esteja sob controle, pode ser um caminho para ter mais qualidade de vida, além de melhorar o seu desempenho nas atividades do dia a dia, através do melhor condicionamento físico. E o conselho do Josadac é imprescindível para dar início a qualquer prática esportiva: “Comece devagar, dê atenção às respostas do seu corpo e jamais treine até a exaustão. Assim, você saberá que no dia seguinte estará bem para recomeçar. E se não tiver, espere melhorar para só então retomar.”

Para mais informações sobre miastenia, acesse o site: https://www.miastenia.com.br/abrami/

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Informações para a imprensa
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Antipsicóticos Típicos vs Atípicos, quando usar cada um?

Introduzido em 1958, o haloperidol é utilizado para tratamento farmacológico das psicoses _ especialmente a esquizofrenia. O haloperidol mostrou menos riscos de hipotensão postural e mais ação sobre os sintomas da patologia em relação à clorpromazina, que foi o primeiro neuroléptico sintetizado e marcou o início da era dos antipsicóticos. Os antipsicóticos lançados posteriormente, chamados de atípicos, caracterizam-se por produzir menos sintomas extrapiramidais, em doses clinicamente eficazes.

Os atípicos podem trazer benefícios e ter ação mais efetiva sobre os sintomas negativos, como apatia-abulia e embotamento afetivo. Já os típicos são vistos com uma melhor eficácia em sintomas positivos, como alucinações e delírios.

Antipsicóticos típicos induzem mais taxa de efeitos extrapiramidais. Já os atípicos associam-se a mais risco de indução à síndrome metabólica e condições associadas, como diabetes mellitus.

O Haloperidol foi considerado um antipsicótico prototípico desde sua introdução até o advento dos antipsicóticos atípicos. Estudos mostram que apesar de risco de eventos adversos, em baixas doses, pode ser usado em pacientes com boa tolerabilidade, com menor desenvolvimento de efeitos extrapiramidais e a elevação da prolactina.

Doença celíaca e transtorno do espectro autista: existe relação?

A doença celíaca (DC) é uma doença de caráter autoimune induzida pela ingestão do glúten, uma proteína alimentar, que gera uma resposta inflamatória em pacientes geneticamente suscetíveis. Essa resposta é caracterizada por uma inflamação no intestino delgado com infiltração celular e consequente atrofia vilositária, resultando nos sintomas de disabsorção. Diversas comorbidades podem estar associadas à DC, como diabetes mellitus tipo I, deficiência de IgA e tireoidites autoimunes, mas um fato que chamou a atenção é a possibilidade da relação entre doença celíaca e o transtorno do espectro autista (TEA). O primeiro relato de caso que trouxe a presença simultânea de doença celíaca e transtorno do espectro autista foi descrito em 1960 em uma coorte de cerca de 65 crianças com diagnóstico de TEA. Desde então tem-se tentado encontrar uma possível relação entre essas duas condições.

Estudos recentes evidenciaram que os pacientes com DC têm uma maior possibilidade de apresentarem transtornos psiquiátricos de forma geral, como ansiedade, depressão e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Nos pacientes com TEA, é observada uma maior prevalência de sintomas do trato gastrointestinal (TGI), como constipação, diarreia e dor abdominal. Por essa linha de pensamento, alguns relatos de caso afirmam que pacientes com TEA tiveram melhora dos sintomas do TGI após a instituição de uma dieta sem glúten.

Qual mecanismo dessa relação entre DC e TEA?

Pesquisas iniciais trouxeram a hipótese da relação entre excesso de opioides e TEA após, em 1979, um pesquisador observar o comportamento de animais em uso dessas medicações e associar a semelhança de comportamento aos das crianças com TEA. A partir de então, surgiu a hipótese de que níveis excessivos de peptídeos opioides endógenos e/ou exógenos podem dificultar a neurotransmissão e o neurodesenvolvimento no sistema nervoso central (SNC), causando desordens que podem se assemelhar ao TEA. Essa hipótese levou à proposta de uma possível associação entre doença celíaca e transtorno do espectro autista, já que os peptídeos opioides podem ser produzidos pela hidrólise de proteínas alimentares, incluindo glúten e caseína.

De forma geral, a barreira hematoencefálica diminui a possibilidade da entrada dos opioides no SNC, porém, por alterações genéticas, essa barreira pode estar mais permeável, favorecendo a maior concentração destes no SNC. Outro ponto a se considerar é o aumento da permeabilidade da mucosa intestinal nos pacientes com DC, fazendo com que os níveis de opioides no sangue sejam mais elevados, consequentemente estando mais disponíveis para atingir o SNC.

Recentemente o Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition (JPGN) lançou uma revisão sistemática sobre a relação entre DC e TEA, avaliando estudos nos bancos de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) e Excerpta Medica dataBASE (EMBASE), pesquisando por estudos que relataram simultaneamente DC e TEA entre janeiro de 1946 e outubro de 2020. Os resultados obtidos foram os seguintes:

  • Um total de 298 trabalhos foram identificados e, desses, apenas 17 atenderam aos critérios de elegibilidade, trazendo simultaneamente a avaliação de DC e TEA.
  • DC em pacientes com TEA:
    • De treze estudos, nove não relataram nenhum caso de DC em suas respectivas amostras de pacientes com TEA (representada por 572 pacientes);
    • Quatro estudos relataram a presença de DC na amostra TEA (representando 21 casos de DC em 735 pacientes com TEA);
    • Calderoni et al. relataram uma prevalência de DC de aproximadamente 2,6% (intervalo de confiança de 95% [IC 95%]: 1,0-4,2) em crianças com TEA, sendo essa significativamente maior do que a prevalência na população geograficamente correspondente (P 1⁄4 0,013);
    • Badalyan e Schwartz observaram uma prevalência de DC de 4,3% em uma pesquisa que incluiu 211 crianças com síndrome de Asperger ou algum transtorno de comportamento não especificado e 1,3% em 79 crianças com TEA, respectivamente. Esses achados não foram estatisticamente significativos;
    • No geral, 21 casos de DC foram identificados em uma amostra de 1.307 pacientes com TEA (1,61%).
  • TEA em pacientes com DC:
    • Seis estudos (incluindo 2 discutidos anteriormente) investigaram casos de TEA em uma amostra de pacientes com DC;
    • Um estudo não relatou nenhum caso de TEA no grupo DC (representado por 120 pacientes);
    • Os demais cinco estudos relataram a presença de TEA em amostras de DC (representando 210 casos de TEA em 38.426 pacientes com DC);
    • Zelnik et al. encontraram 1 caso de TEA entre uma coorte de 111 pacientes enquanto Mazzone et al. observaram 2 casos em uma amostra de 100 crianças;
    • Butwicka et al. e Ludvigsson et al. (identificaram diagnósticos de TEA antes e após o diagnóstico de DC na população sueca. Ambos estes estudos relataram odds ratios não significativos. No entanto, descreveram um aumento do risco de TEA após o diagnóstico de DC com razão de risco de 1,5 (IC 95%: 1,2-1,8) e 1,39 (IC 95%: 1,13-1,71), respectivamente.

Discussão e conclusão

Os estudos presentes não conseguem sustentar a hipótese da relação direta de TEA e DC, sem evidências significativas para tal. A revisão sistemática em questão foi a primeira a tentar encontrar essa relação, no entanto, suas limitações podem ser atribuídas, principalmente, à heterogeneidade substancial entre os estudos em relação ao modelo do estudo, faixa etária, distribuição por sexo, critérios de diagnóstico e fatores geográficos.

É importante levarmos em consideração que o estabelecimento de uma relação entre TEA e DC é um desafio, tanto para o diagnóstico correto do TEA, baseado em sinais e sintomas subjetivos, quanto para o diagnóstico da DC na população pediátrica, que requer testes sorológicos e/ou análises de biópsia associados a presença dos sintomas compatíveis. Sendo assim, mais pesquisas são necessárias para confirmar claramente uma associação entre doença celíaca e transtorno do espectro autista.

Fonte: https://pebmed.com.br/doenca-celiaca-e-transtorno-do-espectro-autista-existe-relacao/

Autor(a): Jôbert Neves

Médico formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) ⦁ Residência Médica em Pediatria Geral e Puericultura pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP) ⦁ Formação em Alimentação Complementar Integrativa e Baby-Led Weaning (BLW) – Instituto BeLive ⦁ Especialização em curso – Gastroenterologia Pediátrica pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP)

Referências Bibliográficas:

Quan J et al. Association Between Celiac Disease and Autism Spectrum Disorder: A Systematic Review. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2021;72(5):704-711. doi: 10.1097/mpg.0000000000003051

Uso de probióticos na TDAH

O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é um transtorno do neurodesenvolvimento comum caracterizado por desatenção, impulsividade e hiperatividade. A etiologia do transtorno é multifatorial, com foco principal em fatores genéticos. No entanto, pesquisas recentes mostram o envolvimento de mudanças e desequilíbrios na microbiota intestinal com TDAH. As evidências da influência da microbiota intestinal no desenvolvimento do cérebro e na neurogênese são claras.1

Uma comunicação bidirecional entre o intestino e o cérebro (eixo intestino-cérebro) é reconhecida como fator de modulação imunológica do organismo, com a microbiota intestinal vista como um regulador chave dessa conversa cruzada. Atualmente, um conjunto de evidências pré-clínicas e, em menor extensão, epidemiológicas apoia a noção de que as interações hospedeiro-microrganismo desempenham um papel fundamental no desenvolvimento e na função do sistema nervoso central (cérebro) e na etiologia dos distúrbios do neurodesenvolvimento.1,2

Eventos no desenvolvimento do organismo e mudanças nos estilos de vida tradicionais são conhecidos por impactar a composição e função da microbiota intestinal e, portanto, podem aumentar o risco de acometimento por distúrbios do neurodesenvolvimento. O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é hoje o diagnóstico do neurodesenvolvimento mais prevalente.2

Apesar de muitos anos de pesquisa, a etiologia do TDAH não é clara e seu diagnóstico e tratamento ainda são desafiadores. Diferentes fatores relatados como associados ao risco de desenvolver TDAH e/ou vinculados a diferentes manifestações deste distúrbio também foram associados a mudanças na composição da microbiota intestinal, sugerindo uma ligação entre a microbiota e o transtorno. Evidências de estudos preliminares em humanos também sugerem que os componentes da dieta que modulam a microbiota intestinal podem influenciar o desenvolvimento ou os sintomas do TDAH, embora mais estudos sejam necessários para confirmar essa hipótese.2

A identificação de biomarcadores de neurodegeneração e o desenvolvimento de novos tratamentos, como o uso de probióticos, são alguns dos benefícios potenciais que podem derivar da pesquisa sobre o eixo intestino-cérebro em doenças neurológicas. A administração dos probióticos Lactobacillus sp. e Bifidobacterium sp., por exemplo, pode melhorar a constipação em pacientes neurológicos, mas não afeta outros sintomas da doença.2,3

Apesar dos avanços recentes acerca da compreensão do eixo intestino-cérebro, são necessários mais dados para avaliar se o conhecimento adquirido até o momento pode ser útil no ambiente clínico. Considerando a influência da microbiota intestinal em vários fatores de risco modificáveis ​​de doença cerebrovascular e sua influência nas complicações pós-AVC, em teoria muitos benefícios poderiam derivar do direcionamento à microbiota intestinal. Mais dados são necessários, contudo, para abordar a viabilidade de direcionar à microbiota intestinal o tratamento de pacientes neurológicos, a partir do uso de probióticos.3

Ensaios clínicos destacam o fato de que a suplementação com probióticos é suficiente para induzir efeitos consideráveis ​​em pelo menos três níveis de tratamento médico, a saber: a microbiota, a neuroquímica e o comportamento, sendo necessário mais dados experimentais para conectar esses domínios de maneira causal. Uma compreensão mais profunda desses mecanismos de comunicação será crucialmente importante para o desenvolvimento de qualquer estratégia terapêutica baseada na microbiota para doenças psiquiátricas.4

Uma pesquisa clínica recente, publicada em 2020, avaliou pacientes com TDAH que receberam o probiótico Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) ou placebo, em um estudo controlado, randomizado, duplo-cego. Os pacientes que receberam LGG® tiveram melhores escores de qualidade de vida, comparado aos que receberam placebo.5

Referências

1 – Anna Kalenik, Karolina Kardaś, Anna Rahnama, Katarzyna Sirojć, Tomasz Wolańczyk. Gut microbiota and probiotic therapy in ADHD: A review of current knowledge. Prog. Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2021 Feb 6; 110: 110277.

2 – María Carmen Cenit, Isabel Campillo Nuevo, Pilar Codoñer-Franch, Timothy G. Dinan, Yolanda Sanz. Gut microbiota and attention deficit hyperactivity disorder: new perspectives for a challenging condition. Eur Child Adolesc Psychiatry. 2017 Sep; 26(9): 1081-1092.

3 – Barbosa, Pedro Melo. Barbosa, Egberto Reis. The Gut Brain-Axis in Neurological Diseases. Int. J. Cardiovasc. Sci. Vol.33. Rio de Janeiro. Sept./Oct. 2020. Epub Aug 07, 2020.

4 – Luca BorrelliSerena AcetoClaudio AgnisolaSofia De PaoloLudovico DipinetoRoman M. StillingTimothy G. DinanJohn F. CryanLucia F. MennaAlessandro Fioretti. Probiotic modulation of the microbiota-gut-brain axis and behaviour in zebrafish. Scientific Reports. Nature. July, 15 2016.

5- Kumperscak HG, Gricar A, Ülen I, Micetic-Turk D. A Pilot Randomized Control Trial With the Probiotic Strain Lactobacillus rhamnosus GG (LGG®) in ADHD: Children and Adolescents Report Better Health-Related Quality of Life. Front Psychiatry. 2020 Mar 17;11:181.

Qual a relação do autismo e excesso de peso na infância?

O transtorno do espectro autista (TEA) é um conjunto de situações heterogêneas relacionadas ao neurodesenvolvimento, que se caracteriza por um prejuízo precoce nas habilidades sociais, comunicação social e comportamentos restritos e repetitivos.

Em todo o mundo, a prevalência de TEA é de aproximadamente 1% (em escolares, no Brasil, é de quase 0,3%). No entanto, há relatos de um aumento consistente e significativo nessa prevalência. Isso pode ser explicado pelos avanços nos critérios diagnósticos e pela maior identificação e conscientização desse transtorno.

Autismo e excesso de peso

Pacientes pediátricos que apresentam TEA possuem, presumivelmente, um maior risco de evoluírem com obesidade e doenças metabólicas relacionadas ao excesso de peso. Esse risco pode ser justificado pela ocorrência de comportamentos restritivos e repetitivos em pacientes com TEA, o que pode comprometer o desenvolvimento de habilidades motoras e os níveis de aptidão física.

Sendo assim, com o objetivo de avaliar o estado de crescimento e o desenvolvimento físico de crianças e adolescentes brasileiros entre quatro e 15 anos de idade com TEA, Toscano e colaboradores realizaram o estudo “Crescimento e massa corporal em crianças brasileiras com transtornos do espectro autista: um estudo longitudinal misto”, publicado recentemente no Jornal de Pediatria.

Os autores avaliaram se a variação nos padrões de crescimento e na massa corporal desses pacientes foi influenciada pelo uso de medicamentos psicotrópicos. Foram incluídas 120 crianças com idades entre 3,6 e 12,1 anos no início do estudo (média = 7,2 anos, DP = 2,3 anos) diagnosticadas com TEA. Essas crianças foram avaliadas em três ocasiões repetidas em um período de quatro anos. Os autores consideraram a estatura, a massa corporal e o índice de massa corporal (IMC). Foi utilizado um modelo multinível bayesiano para descrever os padrões de crescimento individual.

Resultados

Toscano e colaboradores descreveram os seguintes resultados:

O crescimento em estatura foi comparável ao percentil 50 específico para a idade para os dados de referência do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (Centers for Disease Control and Prevention – CDC) até cerca de oito anos. Entretanto, os autores notaram que houve uma diminuição considerável na taxa de crescimento depois dos oito anos, atingindo o percentil 5 específico para a idade aos 15 anos de idade;

Em média, tanto os valores de massa corporal quanto de IMC foram maiores comparativamente ao percentil 95 específico para a idade até aos oito anos da referência brasileira e do CDC. No entanto, foram abaixo do percentil 50 específico para a idade aos 15 anos de idade;

Houve uma influência aparente do uso psicotrópicos sobre o do peso.

O estudo apresenta limitações. Uma delas é que foram considerados apenas meninos com TEA, porque a amostra disponível de meninas foi bastante limitada. De acordo com os autores, o “menor número de meninas com TEA na amostra é compatível com a maior prevalência de TEA em meninos geralmente relatada”. Outra limitação consiste no fato de terem sido usadas referências americanas por não haver referência de crescimento na população brasileira.

Toscano e colaboradores (2019) concluíram que os meninos brasileiros com TEA entre quatro e 15 anos parecem ter retardo do crescimento na estatura após os oito a nove anos, o que, possivelmente, compromete o crescimento púbere.

Os autores observaram uma prevalência elevada de sobrepeso e obesidade na primeira infância, apesar de uma tendência de diminuição significativa na massa corporal e no IMC ter sido aparente quando as crianças com TEA entraram na puberdade.

Fonte: https://pebmed.com.br/qual-a-relacao-do-autismo-e-excesso-de-peso-na-infancia/

Autor(a): Roberta Esteves Vieira de Castro. Doutora em Medicina pela UERJ, mestre em Saúde Materno-Infantil pela UFF e pós-graduanda em neurointensivismo pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino

Referências Bibliográficas:

  • Toscano CV, Ferreira JP, Gaspar JM, Carvalho HM. Growth and weight status of Brazilian children with autism spectrum disorders: A mixed longitudinal study. J Pediatr (Rio J). 2019;95:705-12.

Caso Clínico TDAH

Um dos transtornos mais comuns na infância, o déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) afeta o desenvolvimento da criança, tanto em casa quanto na escola, além de ter impacto social, emocional e cognitivo. O TDAH pode prevalecer até a idade adulta – entre 3,4% e 4,4% dos pacientes.

Atualmente, as diretrizes pedem que uma correta avaliação seja feita, para que o tratamento seja adequado e o paciente responda corretamente a ele. A recomendação é que seja feita uma abordagem multimodal, em que a escolha da medicação é influenciada por diversos fatores. Mas medicações com ação prolongada costumam ser mais utilizadas, por permitir administração apenas uma vez ao dia, tornando o tratamento mais privativo.

O metilfenidato (MPH) é o psicotrópico mais utilizado na psiquiatria infantil. Sua rápida absorção pelo sistema nervoso central reduz as manifestações clínicas do TDAH, tanto as mais evidentes quanto as menos evidentes. O MPH é recomendado como terapia de primeira linha em muitos países.

Cada paciente tem resposta e necessidades únicas com relação ao MPH. Por isso, é preciso uma abordagem personalizada no tratamento do TDAH. Cada formulação do MPH tem seu próprio perfil e diferenças com relação ao modo de administração. Cada dose é individualizada de acordo com o paciente. O aumento da dose pode ser em intervalo de uma semana, quando necessário.

Assim, o tratamento com MPH, com todas as suas formulações, concede benefícios para os pacientes com TDAH. A medicação ajuda com os principais sintomas e mantém essa melhora, inclusive os relacionados ao desempenho, domínio de atenção e funcionamento executivo. Além disso, o MPH ajuda no controle sintomático durante todo o dia do paciente.

Leia a separata completa clicando no documento abaixo: